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A inserção da Educação Física na saúde: 

reflexões baseadas na prática do SUS

La implantación de la Educación Física en la salud: reflexiones a partir de la práctica del SUS

 

Especialista em Atividade Física, Desenvolvimento Motor e Saúde

Centro de Educação Física e Desportos

Universidade Federal de Santa Maria – RS

Jorge Luiz dos Santos de Souza

jorge.jotaluiz2003@gmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          O Presente trabalho pretende problematizar a visão atual que tem as atividades físicas nos diversos meios para que os profissionais de Educação Física sejam inseridos como membros de equipes de saúde, pois o que está em voga é a diminuição dos índices de risco à saúde reduzindo a intervenção do Professor de Educação Física como mais um especialista, sem nenhuma conexão com os indivíduos que buscam uma assistência à saúde, não levando em consideração o contexto histórico e social, tampouco a questão dialógica que a cultura corporal tem com seus praticantes. Por fim fizemos um paralelo entre o entendimento dos órgãos oficiais de saúde do nosso país por meio de seus programas institucionalizados, a realidade de algumas intervenções profissionais encontradas na literatura e a ajuda da teoria crítica superadora para transpormos esta realidade.

          Unitermos: SUS. Atividades físicas. Intervenção. Teoria crítico superadora.

 

Abstract

          This work intends to question the current view is that physical activities in different ways for physical education professionals are included as members of health teams, for what is in vogue is to decrease the levels of risk to health by reducing intervention professor of Physical Education as another expert who has no connection with the individuals seeking health care, not taking into consideration the historical and social context, nor the issue dialogical body that culture has to its practitioners. Finally we made a parallel between the understanding of the official organs of the health of our country through their institutionalized programs, the reality of some professional interventions in the literature and critical theory helps overcome to transpose this reality.

          Keywords: SUS. Physical activity. Intervention. Critical theory overcome.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 16, Nº 161, Octubre de 2011. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Atualmente é cada vez maior a exposição do papel das atividades físicas na saúde tanto pela mídia quanto nos meios acadêmicos, todavia o que sustenta este diálogo é simplesmente a questão de diminuição dos índices de risco à saúde reduzindo a ação do Professor de Educação Física como mais um especialista da área biomédica. Esta visão onde a atividade física, ou prática corporal como preconiza o MS (2004), serve como mais um instrumento de terapêutica para determinadas doenças ou transtornos de saúde acaba com o elemento mais importante da profissão, a educação.

Objetivos

    Com este trabalho queremos problematizar algumas questões fundamentais para o papel da Educação Física na saúde e refletir sobre para chegarmos a um paradigma que sustente a integralidade, autonomia e emancipação do sujeito nos espaços de saúde e na sociedade.

Metodologia

    Usaremos um diálogo com a literatura e as vivências práticas de intervenção do Professor de Educação Física, buscando nestas intervenções problematizar quais paradigmas estão permeando tais ações, bem como propor e expor nossa opinião de como se sustentará nossa prática no seio das equipes de saúde.

A inserção profissional

    Quando falamos em integralidade temos que reportar a um dos princípios básicos do SUS que foram pensados a partir da 8ª conferência nacional de saúde e estão presentes na constituição de 1998. Integralidade pressupõe que estejamos prontos para cuidarmos das pessoas em todas suas diversas manifestações e complexidades. Vemos que quando pensamos a ação da atividade física somente, por exemplo, reduzir os índices glicêmicos do sangue estamos indo na contramão da integralidade e contra uma Educação Física que poderia ter na sua ação todas as diversas manifestações de corpo e sociedade por meio da cultura corporal.

    A “moda” atividade física e saúde é amplamente divulgada por meio da mídia escrita, falada e televisiva, mas Carvalho (2006) nos chama a atenção para o pensar, o falar, o escrever e o agir sobre a doença, indicando a prática da atividade física como uma solução para os problemas relativos ao processo saúde-adoecimento como a mídia induz na população. A autora mostra que não podemos desconsiderar a doença e nem a contribuição que as medicinas têm nos proporcionado, mas temos que ficar atentos para o fato de que, a depender de como se considera o processo saúde-doença, desloca-se “o foco do sujeito doente para o fenômeno doença e se perde o sujeito, transformando a doença em estigma para o doente” e é neste ponto que a inserção do Professor de Educação Física pode ser de maior valia, problematizando esta relação mídia - atividades físicas – doenças – sujeito histórico em busca de sua identidade de cidadão frente aos serviços de saúde e frente a sociedade durante seu processo de saúde – adoecimento – reconstituição da saúde.

    Também ressaltamos na relação entre Educação física e saúde que se por um lado os benefícios orgânicos gerados por meio das atividades físicas são indiscutíveis por outro temos situações que tornam este argumento discutível, pois muitas vezes os gestores e profissionais da saúde adotam uma postura conservadora e uma dimensão moral de culpabilização dos usuários pelo seu adoecimento desconsiderando os processos históricos sociais e individuais de cada sujeito, erro este que não deve ser reforçado com a presença de um profissional de Educação Física na equipe, o que não precisamos é de mais uma pessoa dizendo que se não fizer tais ou tais procedimentos irá “morrer”.

    No caso descrito acima, despreza-se a possibilidade de reconhecer as (diferentes) atividades físicas como modos de ser/estar no mundo, com vínculos explícitos nas redes de interações sócio-culturais, como produtoras de satisfação pessoal, de prazer sem obrigatoriedades de se obter o corpo ideal ou o índice ideal de saúde (Soares Neto Apud Bagrichevsky & Estevão, 2008).

    Sugerimos que quando pensarmos em atividade física como meio de intervenção e terapêutica na saúde lembremo-nos de Bracht (1989) quando mostra que o tema da Educação Física é o movimento corporal, mas não qualquer e todo movimento corporal, é o movimento que contenha no movimentar-se um significado, um sentido, conferido num contexto histórico, cultural e social contribuindo assim para a formação da emancipação do indivíduo, logo compreender somente o movimentar-se não justifica a Educação Física para a saúde, onde temos ainda o corpo/movimento objeto de profissões como a Fisioterapia e a Terapia Ocupacional.

    Para Coqueiro et al (2006) o Professor de Educação Física, uma vez inserido na equipe de saúde, será capaz de desenvolver ações que sejam compatíveis com as metas e estratégia de promoção e prevenção de uma dada localidade. Este poderá atuar avaliando o estado funcional e morfológico dos sujeitos acompanhados, estratificando e diagnosticando fatores de risco à saúde; prescrevendo, orientando e acompanhando atividades físicas (o que parece muito mais uma especialidade médica), tanto para as pessoas ditas "saudáveis", objetivando a prevenção e a promoção da saúde, como para grupos portadores de doenças e agravos, utilizando-a como tratamento não farmacológico, e intervindo nos fatores de risco; socializando junto à comunidade a importância da atividade física com base em conhecimentos científicos e desmistificando as concepções equivocadas acerca de sua prática, olhando de modo geral isto representa ser o ideal para justificar mais este profissional nas equipes, porém, peca por ser muito centrado na biologia sem considerar o papel social da educação na saúde como meio de desenvolvimento de identidade de classe e de luta social.

    Alguns autores já reconhecem o papel da Educação Física num patamar um pouco mais elevado que somente a parte biológica, podemos ver isto em Miranda et al (2007) quando refere que juntamente com os órgãos públicos de saúde o Professor de Educação Física pode atuar diretamente nas comunidades, vivenciando as necessidades e realidades das mesmas, trabalhando nos locais disponíveis para a prática de atividade física, em prol de uma melhor qualidade de vida da população; parece uma visão insipiente e simplória da atuação social que pode ser realizada com o auxílio da nossa profissão, mas se partirmos que vivenciar a realidade e necessidades das comunidades é o início de um trabalho social para melhores condições de vida, incluindo a busca de espaços adequados para práticas de atividades físicas, emprego e moradia à todos temos algo diferencial.

    Seguindo uma linha mais ampla de inserção profissional na saúde vemos Alcântara (2004), diz que a atuação do Profissional de Educação Física deve fomentar e promover um estilo de vida saudável através da atividade física nas suas diferentes manifestações, constituindo-se em um meio efetivo para a construção coletiva da qualidade de vida, e não construção da “equipe de saúde”, visando também o exercício como terapia e como estímulo à adesão ao tratamento através da autoestima, consciência corporal, autonomia na vida e em seu processo terapêutico, bem como articular as redes sociais, incluindo o PSF e todos os atores no território, a fim de elaborar e programar projetos e atividades para a promoção de estilo de vida saudável por meio da conscientização popular.

    Apesar de vermos em alguns autores a preocupação não somente biológica da inserção da Educação Física na saúde ainda sentimos falta de uma reflexão mais aprofundada sobre que saúde é essa e para quem serve? Podemos ver esta pergunta respondida no livro divisor de águas para a Educação Física, o Coletivo de Autores (1992) no seu primeiro capítulo onde discute sobre a aptidão física, no nosso caso entenda aptidão física como saúde:

    Apóia-se nos fundamentos sociológicos, filosóficos, antropológicos, psicológicos e, enfaticamente, nos biológicos para educar o homem forte, ágil, apto, empreendedor, que disputa uma situação social privilegiada na sociedade competitiva de livre concorrência: a capitalista...Recorre à filosofia liberal para a formação do caráter do indivíduo, valorizando a obediência, o respeito às normas e à hierarquia. Apóia-se na pedagogia tradicional influenciada pela tendência biologicista para adestrá-lo. Essas concepções e fundamentos informam um dado tratamento do conhecimento (Coletivo de Autores, 1992).

    Vemos claramente com o extrato acima para quem serve o modelo saúde que está ai posto, temos a atividade física no contexto de prevenir doenças, de diminuir o tempo de afastamento do trabalho ou ainda de “construir pessoas saudáveis” para que a classe dominante possa cumprir seu objetivo histórico de acúmulo de riquezas contrapondo as necessidades de sobrevivência da classe dominada. Isto nos faz lembrar como o MS entende a participação das atividades físicas para a população:

    Ações que propiciem a melhoria da qualidade de vida da população, a redução dos agravos e dos danos decorrentes das doenças não-transmissíveis, que favoreçam a redução do consumo de medicamentos, que favoreçam a formação de redes de suporte social e que possibilitem a participação ativa dos usuários na elaboração de diferentes projetos terapêuticos (Brasil, 2008).

    Vemos que a principal motivação do MS em inserir as atividades físicas para população resume-se na questão econômica oposição, embora possa parecer um pouco melhor ao colocar a possibilidade de participação dos usuários na sua terapêutica, mas mais uma vez aqui vemos que a responsabilização é o fator mais predominante.

    Em oposição ao escrito acima temos ainda a ajuda do livro citado para nos apoiarmos na verdadeira inserção do papel do Professor de Educação Física na saúde, junto a comunidade, em especial na atenção básica:

    Na perspectiva da reflexão sobre a cultura corporal, a dinâmica curricular, no âmbito da Educação Física...Busca desenvolver uma reflexão pedagógica sobre o acervo de formas de representação do mundo que o homem tem produzido no decorrer da história, exteriorizadas pela expressão corporal: jogos, danças, lutas, exercícios ginásticos, esporte, malabarismo, contorcionismo, mímica e outros, que podem ser identificados como formas de representação simbólica de realidades vividas pelo homem, historicamente criadas e culturalmente desenvolvidas (Coletivo de Autores, 1992).

    Não é descaracterizada nenhuma manifestação da cultura corporal, muito menos reduzido a uma caminhada para diminuir índices pressóricos ou de glicemia sanguínea, o escrito há quase vinte anos atrás mostra que por meio das expressões corporais o homem vivencia suas realidades simbólicas e históricas, e isto consideramos saúde.

    O Coletivo de Autores nos mostra uma concepção Crítico-Superadora da Educação Física, inicialmente voltado para as escolas, mas contém elementos muito interessantes de ser trabalhada nas comunidades, oportunidade hoje concretizada pela nossa inserção na atenção básica. Citando alguns aspectos de relevância da concepção Crítico-Superadora ela é diagnóstica porque pretende ler os dados da realidade, interpreta-los e emitir um juízo de valor, se colocamos no caminho da saúde por sí só teremos uma saída do paradigma da doença, pois ao interpretar e emitir um juízo de dada realidade será impossível reduzirmos o adoecimento a um único índice. Este juízo é dependente da perspectiva de quem julga solicitando uma visão ampliada de mundo e sociedade para termos uma correta leitura da realidade. É judicativa porque julga os elementos da sociedade a partir de uma ética que representa os interesses de uma determinada classe social. Esta concepção é também considerada teleológica, pois busca uma direção, dependendo da perspectiva de classe de quem reflete.

    As elucidações sobre a atividade física e o papel do educador físico junto com as comunidades nos remetem diretamente ao programa de saúde da família (PSF/ESF), pois o PSF tem como princípio, ao menos no papel, a reorganização da prática assistencial em novas bases e critérios, que significa em outras palavras uma mudança no paradigma vigente centrado na “cura” de doenças para o cuidado centrado na família a partir de sua realidade com foco na promoção e prevenção, ampliando assim a compreensão do processo saúde/doença (Brasil, 2007), o que infelizmente não vemos na prática, pois o que estamos vivenciando é a precarização deste programa e sua conseqüente terceirização, um programa pobre para pobres e muito menos que é a concepção ideal de “assistência”, por mais que tente se afastar da doença ainda falta uma aproximação com questões históricas e sociais influentes no processo de emancipação e aquisição da saúde.

Considerações finais

    Para finalizarmos nossa conversa queremos por em destaque nossa opinião que se voltarmos a ação do professor de Educação Física visualizando apenas questões de “doenças”, prevenção e promoção de agravos à saúde estaremos indo na contramão da ação educativa e social que pode representar nossa intervenção neste espaço. Enquanto a lógica da inserção estiver baseada na questão econômica estaremos fadados a sermos mais um ramo de especialistas nas equipes de saúde, esse não é nosso objetivo, e sim sermos apoiadores na construção de uma sociedade saudável nas suas mais diversas manifestações.

Bibliografia

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