Variáveis que influenciam o dano muscular: artigo de revisão Variables que influyen en el daño muscular: artículo de revisión Variables that influence the muscle damage: review article |
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Especialista em Musculação e Treinamento de Força Universidade de Brasília. Professor do Curso de Pós-graduação Lato Sensu em Musculação e Treinamento de Força, Faculdade Mauá Avaliador e Personal Trainer da Academia Club22 |
Rodrigo Alves França (Brasil) |
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Resumo Todo atleta ou praticante de atividades físicas já passou pela situação de sentir dores musculares após algumas horas acabado seu treino. Este artigo vem revisar quais as características dos indivíduos e dos exercícios que influenciam o dano muscular, estando diretamente ligado às dores musculares após as atividades físicas. Vários estudos descrevem a contração excêntrica como a maior causadora de danos musculares, sendo que fatores como a idade do individuo, a intensidade das contrações, o volume da atividade, o intervalo de descanso entre as séries de exercícios e a velocidade da contração, também podem influenciar. Além de ser monitorado por marcadores químicos, o dano muscular pode ser verificado por inchaço muscular, ressonância magnética, biópsia do tecido, mensuração subjetiva da dor muscular e a redução na produção de força após o estimulo causador. Essas possibilidades de avaliação fornecem grande fonte de dados para monitorar atletas e praticantes de atividades e possibilitam a realização de futuros estudos. Unitermos: Dano muscular. Dor muscular tardia. Exercício físico.
Abstract Every athlete or physical activity practitioner has passed the situation of feeling muscle soreness just a few hours after your workout. This article comes reviewing the characteristics of individuals and exercises that influence muscle damage, which is directly connected to muscle soreness after physical exercise. Several papers describe the eccentric contraction as the leading cause of muscle damage and this may be influenced by the age of the individual, the intensity of the contractions, the volume of the exercise, rest interval between sets of exercises and contraction speed. The muscle damage can be monitored by their chemical markers but also by muscle swelling, magnetic resonance, tissue biopsy, measurement of subjective soreness and reduced muscle force production after stimulation, providing great source of data to monitor athletes and physical activity practitioner, enabling the realization of many future studies. Keywords: Muscle damage. Delayed-onset muscle soreness. Physical exercise.
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 16, Nº 160, Septiembre de 2011. http://www.efdeportes.com/ |
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Introdução
Há mais de cem anos, temos a primeira inferência ao dano muscular (DM). Hough (1902) sugeriu que a dor muscular tardia (DMT) fosse causada por microlesões induzidas pela atividade física (1). Nos últimos anos, algumas discussões vêm sendo realizadas acerca dos mecanismos envolvidos no DM e na DMT.
Os músculos são os órgãos primários para a geração de força e movimento e são formados por várias estruturas contráteis chamadas sarcômero (2). O DM ocorre pela microruptura de estruturas do sarcômero causada a partir da tensão gerada por uma produção de força proveniente do músculo (3). A incidência destas microrupturas pode ser influenciada por alguns fatores e ser monitorada pelos seus marcadores. O DM pode ser observado de forma direta através de análise do tecido por biópsia ou ressonância magnética (4), bem como através do inchaço muscular por ultrasom (5). Podemos analisar o DM também por marcadores indiretos, como a redução na produção de força após o estímulo causador do DM, o aumento no volume sanguíneo de creatina quinase e mioglobulina (4, 6-12), troponina I (8) e da proteína de ligação da actina chamada Xin (13)[7].
Existem três tipos de contração muscular, a excêntrica, a concêntrica e a isométrica, sendo a contração excêntrica, demonstrada por vários autores, como a causadora da maior quantidade de DM nas fibras (4, 6, 10, 11, 14, 15).
Alguns estudos procuraram mostrar a influência da diferença de gênero no DM (5, 16-20), mas nenhum comprovou isso, sendo somente observada em experimentos com animais (17). Entretanto, este pode ser influenciado pela idade (21-24), intensidade das contrações (25), volume (26), intervalo de descanso entre as series de exercícios (27) e a velocidade de contração (28, 29).
Dano muscular e regeneração
A regeneração muscular é algo complexo, que requer uma modulação do processo inflamatório, mas o músculo esquelético de mamíferos é capaz de se regenerar frente a um grande dano muscular (30) e se adaptar rapidamente (21). A reconstrução da fibra muscular está ligada a uma pequena quantidade de células, as células satélites, que são mononucleadas e residem nos arredores das células multinucleadas da miofibra (31). Como resposta a ocorrência de um trauma à miofibra, elas migram para as áreas afetadas e na seqüência de um processo inflamatório, se fundem a miofibra, onde se espera um aumento de sua espessura (hipertrofia), ou se fundem entre si, formando uma nova fibra (hiperplasia), como representado pela Figura 1.
Figura 1. Ilustração do ciclo de regeneração da fibra muscular (adaptada de Hawke and Garry, 2001)
Os marcadores de DM podem ser divididos em diretos e indiretos, sendo as microlesões estruturais e o inchaço muscular mensurados por ressonância magnética, biopsia ou ultrasom os diretos, e o declínio na função muscular, dor muscular tardia, o volume plasmático de creatina quinase e mioglobulina (4, 6-12) os indiretos. A creatina quinase é uma enzima presente dentro da célula muscular, responsável pela formação de ATP através da quebra de creatina fosforilado. A mioglobulina é uma proteína similar à hemoglobina, porém está no espaço intracelular da musculatura e é responsável pelo armazenamento de oxigênio.
Alguns autores vêm associando outros marcadores químicos ao DM, como a troponina I, proteína que faz parte da estrutura contrátil do músculo e a Xin, uma proteína de ligação da actina. Para Stephen et al (1997) a troponina I é um melhor marcador do DM comparado com creatina quinase e mioglobulina, que aumentam no sangue devido à possibilidade de ultrapassar a membrana celular após sofrer microlesões. A troponina I está diretamente ligada ao DM, pois é parte da estrutura contrátil do músculo, e seu aumento plasmático necessariamente significaria maior DM (8). Para Hawke et al. (2007), existe outro marcador eficiente, a Xin, proteína de ligação da actina que participa da sua remodelação durante a ativação das células satélites, [7]fixando-a as outras estruturas contráteis durante a regeneração (13).
As diferenças no ganho de massa muscular e rendimento atlético motivaram estudos comparativos da fisiologia dos gêneros e o DM. Rinard et al (2000) não achou diferença alguma no DM entre homens e mulheres após realizar contração excêntrica de alta intensidade, Clarkson e Hubal (2001) associou uma menor produção de creatina quinase no repouso em mulheres, Sewright et al.(2008) demonstrou que mulheres perdem mais força logo após contração excêntrica de máxima intensidade e Fonseca (2010) observou que homens sentiram maior DMT e as mulheres tiveram um inchaço muscular mais duradouro, mas nenhum destes estudos achou diferenças significativas no DM entre os sexos. A diferença no DM somente foi encontrada em experimentos com animais (32).
Contração excêntrica
A contração excêntrica é tida como consenso entre os pesquisadores como a primaria causadora de DM, sendo uma forma de aumentar as respostas adaptativas dos músculos aos estímulos de força (14). A provável explicação é o fato de a contração excêntrica ser realizada mediante uma tensão de alongamento e pelo aumento da tensão individual sobre cada unidade motora.
As ações excêntricas possuem um baixo grau de ativação eletromiográfica (33), inibida por um mecanismo neural, em específico pelo órgão tendinoso de golgi. Em uma menor ativação neural, conseqüentemente, ocorre ativação de menor quantidade de unidades motoras. Tendo uma mesma tensão distribuída por uma menor quantidade de unidades motoras, estas estariam expostas a uma maior tensão individual, aumentando assim o DM, mostrando que fatores mecânicos estam envolvidos neste fenômeno (3).
Sabendo que um maior DM estimula a ativação de células satélites (31) e assim aumenta a regeneração da fibra, fundamenta-se a hipótese de que o treino com predominância de contração excêntrica maximize o ganho de massa muscular por hipertrofia miofibrilar.
Idade
O envelhecimento está ligado a uma série de mudanças no corpo, que podem trazer prejuízos há todos os sistemas fisiológicos do ser humano. Com os prejuízos trazidos com a idade, o sistema muscular acaba ficando mais susceptível ao DM (34) e também ocorre uma redução na eficiência da recuperação (21, 34). De acordo com Mcardle (2004), o passar dos anos causa uma redução na produção de força, um aumento no DM e uma piora na recuperação pós-treino que está associada a uma diminuição na eficiência do músculo em sintetizar proteínas de choque térmico (HSPs) (21). Essa síntese tem como função atuar na célula danificada, sendo ativada pelo trauma local, e estabilizar os polipeptídios recém formados, representando novos sítios específicos de transcrição para a síntese de proteínas (35), agindo na regeneração da fibra muscular (36).
O processo envolvido nos prejuízos ao músculo causado pelo envelhecimento não é inevitável, o treino resistido pode causar adaptações de proteção do músculo ao DM pela melhoria da função das HSPs (21) e por adaptações neurais (37). Uma adaptação que ocorre ao treino resistido é o ganho de força neuromuscular, com um aumento da quantidade de unidades motoras recrutadas (38) diminuindo a tensão individual em cada uma delas. Melhorias na vascularização também acontecem com o treino, causando aumento na chegada de oxigênio e de nutrientes a célula muscular, minimizando os danos causados pela hipóxia (39) e disponibilizando uma maior quantidade de carboidratos e proteínas que possuem um efeito protetor quando aumentada no músculo (40).
Em crianças, segundo Marginson (2005), o DM e a DMT é menor após a realização de exercícios pliométricos, sendo explicada pela melhor flexibilidade e uma menor quantidade de fibras musculares de contração rápida (23).
Intensidade e volume
De acordo com o American College of Sports and Medicine (2009) a intensidade refere-se à quantidade total de carga movimentada (41). Entretanto, outros autores definem a intensidade como um indicativo do aspecto qualitativo, ao qual um determinado estímulo é proporcionado ao organismo e está relacionada, por exemplo, com a realização de repetições máximas (42), enquanto o volume é encontrado pela equação repetições x séries (38) ou também pelo produto repetições x carga (41).
Segundo Nosaka e Newton (2002) o dano muscular é influenciado pela intensidade do exercício (25), mas em estudos posteriores com sua participação, encontrou resultados que negam esta afirmação. Em estudo realizado, em 2006, não encontrou diferenças na quantidade de creatina quinase, mioglobulina, DMT, e circunferência de braço (indicador de inchaço), observando somente uma diferença na produção de força após o estimulo de contrações excêntricas máximas e submáximas (10% da força máxima produzida isometricamente) (43). Esta metodologia foi confrontada em 2009, onde foi questionado o fato de que em seu estudo de 2002 levou-se em consideração somente a intensidade e não o volume total, por isso foram encontradas diferenças de DM. Uchida et al. (2009), realizou um estudo com diferentes intensidades (50%, 75%, 90% 110% de 1RM) e equalizou o estímulo adequando o volume para cada carga a qual o individuo era exposto sem encontrar diferença no DM (26).
Intervalo de descanso
Tradicionalmente, o American College of Sports and Medicine (2009) recomenda um intervalo de descanso de 1 ou 2 minutos em treinos resistidos para pessoas saudáveis, iniciantes e intermediários em programas de treinamento com a realização de séries múltiplas (41). Entretanto, a ligação entre o intervalo e o DM só passou a ser discutida recentemente.
Nos estudos de Mayhew et al. (2005) foram achadas diferenças estatisticamente significativas na quantidade de creatina quinase após as a realização de contrações no leg press quando comparados 2 grupos com o intervalo de 60 segundos e 180 segundos (27).
Já Rahimi et al (2010), não encontrou o mesmo resultado ao comparar 3 grupos com intervalos de 60, 90, e 120 segundos, realizando 4 séries até a falha mecânica, usando 85% de 1RM no agachamento (44).
A ausência da influência do intervalo de descanso no DM também é apoiada por Machado et al.(2010), que não observou nenhuma diferença na produção de creatina quinase em 4 grupos com intervalos de 60, 90, 120 e 180 segundos, onde os indivíduos realizavam 4 series de 10 repetições máximas em vários grupos musculares, afirmando o autor, que a intensidade e o volume são mais importantes para a relação do treino com o DM (45).
O intervalo é uma variável importante para manutenção do volume durante a realização de séries múltiplas em indivíduos sem ou com pouca experiência no treinamento resistido contrastando com as recomendações do ACSM (46).
Velocidade de contração
A velocidade de contração é uma variável muito controversa quando relacionada com o DM. Para Chapman (2006), quando controlado o tempo total de contração das séries, a contração rápida tem a capacidade de maximizar o DM (28), já em seu estudo realizado em 2008, o resultado encontrado é que a velocidade influencia minimamente quando a quantidade de repetições passa de 30, concluindo que não possuem diferenças estatísticas (47).
Para Shepstone et al. (2004), a contração muscular em rápida velocidade tem a capacidade de aumentar a hipertrofia muscular (48). Paddon-Jones et al (2005) em sua pesquisa achou que as contrações lentas aumentam a magnitude do DM e o tempo de recuperação (29), já Ellwanger et al (2007) só encontrou diferenças no tempo de recuperação dos marcadores (49). Barroso et al (2010) realizou um experimento onde a variável era diferença na velocidade, sendo estas de 60 e 180 graus por segundo sem encontrar diferença estatística entre os grupos (50).
Conclusão
Vários estudiosos do treino resistido citam em suas palestras e cursos a hipótese de que o DM e sua regeneração estejam diretamente ligados à hipertrofia muscular, sendo reproduzida como afirmação por profissionais no ambiente de academias e centros de treinamento, mesmo sem nenhuma prova categórica desta relação.
O uso de marcadores diretos e indiretos do DM traz uma vasta quantidade de dados para a produção acadêmica, mas estes também podem ter grande utilidade para monitorar atletas e praticantes de atividades físicas em geral. A dor muscular tardia é o marcador de mais fácil acesso, sem grandes custos, simples aplicação, e pode servir de controle das evoluções dos treinos de força.
Dentre as características do individuo, o gênero em seres humanos parece não ter uma ligação direta com o DM, mas a quantidade de estudos é relativamente pequena, não possibilitando efetuar esta afirmação, enquanto a idade demonstra ser uma variável importante. O envelhecimento parece causar um aumento no DM, mas a prática regular de treinos resistidos trazem uma proteção. Estudos mostram que crianças são menos susceptíveis a estas microlesões, sendo que um dos motivos é a sua alta flexibilidade, minimizando o componente mecânico envolvido.
A intensidade e o volume possuem um papel importante, pois é demonstrado que estas variáveis, se bem modulados na hora de prescrever exercícios, podem maximizar o estimulo causador do DM. Indo de encontro à conexão com o DM, o intervalo de descanso por si só parece não ter um alto grau de influência, mas possui uma relação direta com a manutenção da intensidade e volume na seqüência das séries de treino de força
A velocidade de contração demonstra ser uma variável muito controversa, poucas conclusões podem ser obtidas, porém a discussão levantada é a contração lenta aumentando o tempo total de exposição do músculo à tensão e a contração rápida aumentando a força produzida, que poderiam desta forma alterar o DM.
O aumento da quantidade de pesquisas realizadas nos últimos anos sobre o DM e suas implicações no treino de força mostra o grau de importância do tema, mas o volume de estudos ainda é muito abaixo das necessidades. Por ser uma área de conhecimento muito ampla, é essencial o aumento na produção de conhecimento e a conversão deste conhecimento em forma prática de aplicação no dia a dia dos profissionais.
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