efdeportes.com

A Educação Física na construção de um projeto educacional

transdisciplinar e integral. A experiência do Projeto JAGUAR

La Educación Física en la construcción de un proyecto educacional transdisciplinar e integral. La experiencia del Proyecto JAGUAR

 

*Pós-graduando em Estudos avançados em Psicologia Transpessoal Unipaz-Sul, SPEI

Graduado em educação física pela Escola de Educação Física da UFRGS

Educador Físico do Núcleo de Apoio à Saúde da Famíla (NASF) Sapucaia do Sul, RS

**Doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Mestre em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Graduado em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Professor adjunto da Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Médico psicoterapeuta junto ao Tawa Educação e Saúde

Diretor acadêmico da Associação Campus Unipaz-Sul

Diogo Silveira Heredia y Antunes*

Mauro Luiz Pozatti**

diogosha@hotmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          Descreve o Projeto JAGUAR, curso de extensão da Universidade Holística Internacional (Unipaz-sul), com sede em Porto Alegre-RS, Brasil. Tem como proposta pedagógica uma educação voltada para a busca da inteireza do Ser. Os pilares que a fundamentam são a Transdisciplinaridade, a Visão Integral e Holística. O presente estudo descreve a proposta pedagógica, a metodologia e as repercussões nos jovens (14-20 anos) que participaram da primeira turma no ano de 2009. Pretende contribuir para implementação de outros projetos educacionais e enriquecer as discussões do papel e possibilidade de ação da educação física frente este contexto. O estudo observou que no JAGUAR manifestou-se uma educação física que, integrada com conhecimentos da psicologia e das tradições, contribui para o desenvolvimento humano em sua inteireza. Os relatos e as observações apontam que o JAGUAR contribuiu para a re-significação de diversos aspectos dos jovens participantes, referentes às relações consigo, com os outros e com o planeta.

          Unitermos: Busca da inteireza do Ser. Transdisciplinaridade. Práticas corporais. Educação Integral. Adolescentes.

 

Resumen

          Se describe el Proyecto JAGUAR, que es un curso de extensión de la Universidad Holística Internacional (Unipaz-Sul) con sede en Porto Alegre-RS, Brasil. Tiene como propuesta pedagógica una educación dirigida a la búsqueda del Ser integral. Los pilares que la fundamentan son la Transdisciplinariedad, la Visión Integral y la Holística. El presente estudio describe la propuesta pedagógica, la metodología y las repercusiones en los jóvenes de 14 a 20 años que participaron del primer grupo en el año 2009. El intento es aportar a la implementación de otros proyectos educativos, así como enriquecer las discusiones sobre el papel y la posibilidad de acción de la Educación Física frente en este contexto. El estudio observó que en el Proyecto JAGUAR se manifestó una Educación Física que, integrada con conocimientos de psicología y de las tradiciones, contribuye al desarrollo humano integral. Los relatos y las observaciones indican que JAGUAR contribuyó a la resignificación de diferentes aspectos de los jóvenes participantes, referentes a las relaciones consigo mismos, con los otros y con el planeta.

          Palabras clave: Búsqueda del Ser. Transdisciplinariedad. Prácticas corporales. Educación Integral. Adolescentes.

 

Abstract

          Describes the Project JAGUAR, extension course of the International University for Holistic Studies (Unipaz-Sul), of Porto Alegre-RS, Brazil. The pedagogical proposal is an education aimed at achieving the wholeness of the human being. The foundations of it are Transdisciplinarity, an Integral and Holistic approach. The present study describes the pedagogical proposal, the methodology, and the resonation it had in the youngsters (14-20 years-old) who participated of the first group in 2009. It intends to contribute to the implementation of other educational projects and enrich the discussions on the role and possibility of action of physical education in the face of this context. The study observed that in JAGUAR it was applied a physical education that, integrated to the knowledge of psychology and of the traditions, contributed to human development in its wholeness. The reports and observations point to the fact that JAGUAR contributed to re-signify many aspects of the Young participants, in regard to the relationship with themselves, with others, and with the planet.

          Keywords: Search for human wholeness. Transdisciplinarity. Body practices. Integral education. Holistic education. Adolescents.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 16, Nº 160, Septiembre de 2011. http://www.efdeportes.com/

1 / 1

1.     Primeiros passos

    A emergência de novos paradigmas na ciência tem causado profundas repercussões sobre as diferentes áreas de conhecimento. O presente estudo se propõe a descrever o JAGUAR, um projeto educacional pautado a partir de uma proposta transdisciplinar e integral, que foi constituída com profundas contribuições da educação física, integrados a conhecimentos da psicologia e das tradições. Foi realizada uma pesquisa com abordagem qualitativa utilizando a metodologia da Avaliação Iluminativa (PARLETT & HAMILTON, 1972; LUDKE & ANDRÉ, 1986).

    Compreendemos ser relevante a descrição da experiência da implementação de uma proposta educacional transdisciplinar e integral, ampliando assim as discussões a respeito da educação alicerçada nos novos paradigmas e das contribuições da educação física neste contexto.

    Começaremos nossa jornada por uma breve discussão sobre paradigmas, para contextualizar a visão de mundo sobre a qual surge o Projeto JAGUAR. A seguir discorreremos sobre a busca da inteireza do ser. Depois descreveremos brevemente a história da Unipaz-Sul e do movimento dos Guardiães do Amanhã. Veremos a metodologia utilizada na realização desta pesquisa. Por fim voltaremos nosso olhar para proposta pedagógica, a metodologia e as repercussões nos jovens da primeira turma.

2.     Um outro olhar

    O paradigma moderno, chamado de Newtoniano-Cartesiano ou Mecanicista, brotou no século XVII (CREMA, 1989). Guiado pela física clássica e pelo materialismo, supõe que só a matéria é real, em outras palavras, que o universo é constituído, em sua totalidade, por partículas fundamentais (GOSWAMI, 2008).

    Mesmo com notáveis avanços científicos proporcionados por esse modelo, temos nos deparado com iminentes crises sociais, econômicas e ecológicas, que são fruto de nossas próprias ações. Passamos a perceber que o desenvolvimento “exterior”, tecnológico, não foi acompanhado por um desenvolvimento “interior”, da consciência que nos permita lidar com sabedoria com a tecnologia que desenvolvemos (WILBER, 2000). Agora, essas crises exigem que mudemos nossa forma de ver, ser e agir no mundo (CAPRA, 2006).

    Ao mesmo tempo em que o paradigma vigente tem nos conduzindo a essas crises, novas descobertas da ciência não tem sido explicadas por esse modelo. Em especial, a Física quântica (GOSWAMI, 2006; 2008), a biologia (SHELDRAKE, 1993) e a psicologia (GROF, 2000; RADIN, 2008) trazem evidências que põem em xeque o materialismo e tem permitido a emergência de novas visões de mundo, mais integradoras e sustentáveis. Essas novas perspectivas tem sido chamadas de Holística (CREMA, 1988), Transdisciplinar (NICOLESCU, 2005) ou Integral (WILBER, 2000) e é a partir destas visões que é concebido o projeto JAGUAR.

    Apesar de não serem idênticas, elas tem muitos pontos em comum. Buscam compreender o Universo e seus constitutivos em sua totalidade e complexidade. Podemos dizer que é um resgate do termo grego “Kosmos, que significa o todo padronizado de toda a existência, incluindo os reinos físico, emocional, mental e espiritual. A realidade suprema, não meramente o cosmos ou dimensão física, [material]” (WILBER, 2000, p.10). São perspectivas integrativas de todos os aspectos construtivos e colaborações preciosas provenientes da ciência, filosofia, arte, moral e tradições. (WILBER, 2000)

2.1.     Educação Física: Cultura Corporal do movimento humano

    Em nossa discussão entraremos nos terrenos da transdisciplinaridade. Uma vez que o fizermos, as fronteiras impostas pelas disciplinas, que fragmentam o conhecimento, passarão a se dissipar, os campos da educação física, da psicologia, das tradições, estarão emaranhadas em nossa discussão. Então, para que façamos isso sem perder de vista o espectro da Educação Física é importante termos claro, antes de iniciarmos, a nossa concepção de o que é educação física.

    Tomamos educação física como o campo que estuda a cultura corporal do movimento humano. Espaço onde homens e mulheres desenvolveram e desenvolvem uma imensa tecnologia gestual, dando a esses gestos (correr, saltar, dançar, lutar...) inúmeros significados. Indo muito além de suas exigências meramente funcionais, desenvolveram práticas como a ginástica, a luta, o teatro, as terapias corporais, manifestando através de seus corpos sentimentos, motivações, desejos e crenças (GAYA et. al., 2008).

    Tomamos então a cultura corporal do movimento humano como um campo amplo de saberes e conhecimentos plurais sobre a corporalidade. Um espaço de cognição, que envolve saberes complexos, articulando conhecimentos diversos, do senso comum, da ciência, da filosofia, da religião, das artes (GAYA et. al., 2008).

    Este universo de práticas corporais, rico de significados e simbolismos pode ser considerado como expressão de nossa humanidade (GAYA et. al., 2008) e ao mesmo tempo, a vivência desses espaços, ou seja, as experiências possibilitadas pelas mais diversas práticas corporais pode nos tornar cada vez mais humanos, desenvolvendo os mais diversos aspectos do nosso ser, o corpo, as relações, valores ... (BENTO, 2004) proporcionando uma caminhada em direção à inteireza.

3.     A busca da inteireza

    Caminhar em direção à Inteireza é iniciar uma jornada em busca de “si-mesmo” (GUARDINI, 1987; JUNG, 2001), é ir ao encontro das estruturas internais mais coesas e profundas do ser (MOORE; GILLETTE, 1993) isto só é possível através do desenvolvimento harmônico de todos (ou pelo menos dos principais) aspectos do ser em cada fase de sua existência.

    Podemos inferir que o ser humano se manifesta através de quatro quadrantes principais: interior e exterior, individual e coletivo (FIGURA 1). O quadrante individual e interior diz respeito aos aspectos mentais, o individual e exterior aos corporais, o coletivo e interior aos culturais e o coletivo e exterior aos sociais (WILBER, 2000; POZATTI, 2003; 2007). Desenvolver cada um desses quadrantes de forma harmônica e em sintonia com a fase da vida em que o sujeito se encontra é fundamental.

Figura 1. Adaptado de Wilber, 2000 p. 52

    O quadrante mental está ligado “à experiência íntima, subjetiva, dos seres” (POZATTI, 2007, p.59). Esse âmbito refere-se a aspectos cognitivos, à criatividade, à autoestima, aos sentimentos, pensamentos e intuição, à habilidade de relacionar-se, inclui ainda os aspectos transpessoais ou espirituais e aos diferentes tipos de personalidades (WILBER, 2000). O quadrante corporal diz respeito ao organismo do sujeito, sistema músculo-esquelético, sistema nervoso, etc. (WILBER, 2000). Refere-se também a postura, a alimentação, cuidados com o corpo e ao que pode ser percebido através das sensações (somática, comportamental, corporal) (POZATTI, 2007).

    O cultural está relacionado a valores, crenças, visões de mundo, práticas culturais, hábitos e princípios morais compartilhados pelos sujeitos (WILBER, 2000). O social corresponde “às estruturas físicas e instituições, modos tecno-econômicos, estilos arquitetônicos, modos de transferência de informação, estruturas sociais” (WILBER, 2000, p.59), ou seja, as relações dos sujeitos com o mundo exterior e às repercussões de seus comportamentos no meio em que vivem.

    Buscar a inteireza do ser consiste em desenvolver de forma harmônica cada um destes elementos. Quando isso ocorre, o ser transcende seu estado atual. A este movimento de ir além do que se era, chamamos de expansão da consciência. Assim, o ser passa a um nível qualitativamente diferente de sua existência. Neste momento ele tem a possibilidade de estar em harmonia consigo, com os outros, com o planeta e com o universo (POZATTI, 2003).

    Se conceituarmos “a saúde humana como a consciência de bem-estar resultante de um processo contínuo de harmonização entre os aspectos físicos, psíquicos, sociais, culturais, ambientais (em seu nível de realidade) e espirituais (entre níveis de realidade)” (POZATTI, 2003, p.118) então podemos inferir que um processo educacional orientado para a busca da inteireza do Ser contribui para a promoção da saúde humana.

5.     Como foi realizado este trabalho

    O presente estudo caracterizar-se-á como descritivo qualitativo, utilizando a metodologia de Avaliação Iluminativa (PARLETT & HAMILTON, 1972; LUDKE & ANDRÉ, 1986). Para realização desta pesquisa, observamos o JAGUAR, um curso de extensão da Universidade Internacional da Paz (Unipaz-Sul) em Porto Alegre, destinado a jovens com idades entre 14 e 20 anos.

    Optamos por utilizar a técnica da observação participativa. Para isto, foi usado um diário de campo onde as reações, atitudes e comentários da turma eram registrados.

    Avaliação Iluminativa foi criada para buscar compreender melhor os efeitos de inovações educacionais. Sua tarefa é compreender a realidade complexa do programa estudado, como ele opera quais suas vantagens e desvantagens, como é influenciado pelas várias situações do local e da instituição onde é realizado, qual a influência nos estudantes, etc. Ela leva em conta os amplos contextos onde acontecem os programas educacionais (PARLETT e HAMILTON, 1972).

    O principal papel do pesquisador é o de “desemaranhar” a situação observada, buscando compreender os elementos importantes, conectar as influências do projeto educacional com as transformações dos alunos, a relação entre a proposta educacional e sua aplicação. Ele deve se preocupar com todo o processo do projeto estudado, mais do que se o projeto simplesmente atingiu ou não os resultados esperados (PARLETT e HAMILTON, 1972).

    A Avaliação Iluminativa envolve três estágios: “os investigadores observam, a seguir indagam e então tentam explicar” (PARLETT e HAMILTON, 1972, p.18).

    Primeiro estágio: observação-exploração: A compreensão do sistema educacional e do ambiente em que ocorre o processo educacional, sua diversidade e complexidade, são fundamentais quando utilizada a Avaliação Iluminativa. (PARLETT e HAMILTON, 1972).

    O pesquisador teve uma profunda inserção no projeto estudado, uma vez que foi um dos facilitadores do mesmo, participando de todo o planejamento e implementação do Projeto JAGUAR. Essa aproximação com o fenômeno estudado permitiu ao pesquisador observar praticamente todo o processo e não haver a influencia de um pesquisador externo, que poderia interferir no funcionamento do grupo. Ao mesmo tempo, durante a realização da pesquisa, exigiu um afastamento do olhar de facilitador para o de pesquisador (FLICK, 2000).

    O segundo estágio, Inquirição, consiste na busca de dados para a compreensão do fenômeno estudado (LUDKE & ANDRÉ, 1986). A observação participativa foi um dos meios de obtenção de informações para a pesquisa. Estas foram registradas no diário de campo do pesquisador, foram consultadas também as bibliografias que embasam o projeto JAGUAR, especialmente na área da Educação e da Psicologia Transpessoal e manuais, deste e de outros cursos da Unipaz-Sul. Salientamos que não foi nossa preocupação usar qualquer meio que nos oferecesse algum dado quantitativo.

    Terceiro estágio, Explicação da realidade: neste momento, o pesquisador “busca compreender o contexto a partir da luz das informações obtidas” (PARLETT e HAMILTON, 1972, p.20). Vamos descrever a proposta pedagógica, a metodologia utilizada e as repercussões nos jovens que participaram do projeto JAGUAR durante o ano de 2009.

6.     O Projeto JAGUAR

    O JAGUAR foi criado como uma das possibilidades de promover uma mudança de paradigmas e um desenvolvimento harmônico do ser, concretizando a proposta de uma educação voltada para a busca da inteireza do Ser adolescente. O público alvo são adolescentes com idades entre 14 e 20 anos.

    Fizeram parte no primeiro grupo 14 aprendizes. O projeto teve duração de sete meses, de junho a dezembro de 2009. Ocorreu através de quatorze encontros, intercalados entre um encontro de imersão em casas de retiro junto à natureza e uma oficina realizada na sede da Unipaz-Sul em Porto Alegre.

    A escolha por realizar encontros de imersão, com duração de dois dias, em um local próximo à natureza, com espaço físico apropriado (um salão, uma sala, diversos quartos e ampla área verde) possibilitaram que o conteúdo fosse trabalhado de forma muito profunda. Cabe ressaltar que grande parte das atividades realizadas no JAGUAR tinham um caráter vivencial.

7.     Educando para a inteireza do ser

    A educação que temos é ao mesmo tempo fruto e reforçadora da visão de mundo mecanicista-materialista que ainda impera. Uma educação fragmentada que privilegia a inteligência do homem em detrimento de suas outras dimensões, não sendo capaz de conduzir os seres humanos e a sociedade a um desenvolvimento harmônico e sustentável (NICOLESCU, 2005).

    A emergência de novos paradigmas traz a possibilidade de agregar novas práticas e novos métodos à educação na busca de uma pedagogia equilibrada que contribua para o desenvolvimento harmônico do Ser. Nesse sentido, novas propostas educacionais já tem surgido (WEIL, 1993; NICOLESCU, 2005; DELORS, 2006 e TREVISOL, 2008) entre elas a da busca da inteireza do Ser (POZATTI, 2003; 2007). A Educação Física, com os conhecimentos específicos que tem desenvolvido e as práticas que a compõem, foi fundamental para a implementação desta proposta no JAGUAR.

    Segundo Pozatti (2003) uma educação voltada para a busca da inteireza do Ser deve se focar em:

Aprender a existir numa determinada realidade.

Aprender a viver de forma harmônica os diferentes ciclos da vida.

Aprender a significar realidades diferentes.

    De acordo com o biólogo Bruce Lipton, “quanto mais consciência um organismo tem de seu ambiente, mais chances tem de sobreviver” (LIPTON, 2007, p.49). Podemos expandir essa afirmação, colocando que quanto mais consciência um ser tem de seu ambiente, mais chances ele terá de ter uma vida saudável, harmônica, ética e feliz.

    Para aprender a existir numa determinada realidade é preciso desenvolver os quatro quadrantes apresentados anteriormente, corporal, mental, social e cultural. Dos diversos aspectos que fazem parte destes quadrantes, dois são fundamentais de serem desenvolvidos em uma educação voltada para a busca da inteireza do Ser, que são as funções da consciência (sensações, sentimentos, pensamento e intuição) e qualidades como Visão, Amor, Sabedoria e Vontade (POZATTI, 2003 e 2007).

    O segundo ponto refere-se aos diferentes ciclos de desenvolvimento do ser humano. Ao longo de seu desenvolvimento o ser humano passa por diferentes fases de sua vida, e tem a possibilidade de expandir sua consciência para níveis cada vez mais complexos (WILBER, 2000). Cada fase é única, e tem características mais ou menos comuns para os diferentes seres humanos. Estar harmonizado nos diferentes quadrantes (corporal, mental, social e cultural) e com as características de cada uma das etapas da vida é fundamental para um desenvolvimento saudável (POZATTI, 2007). Neste ponto é relevante citar a importância de uma pedagogia iniciática, que se utiliza de ritos, marcando a passagem entre as fases de desenvolvimento do ser.

    Moore e Gillette (1993) propõem que para que a psicologia do homem maduro exista é preciso haver uma morte simbólica da psicologia do menino e para que isso ocorra, é fundamental o rito iniciático. Para os autores, o homem maduro é centrado, ético, amoroso, posicionado, etc., enquanto o traficante de drogas, o líder político indeciso, o marido que bate na mulher, o jovem executivo metido a importante são alguns exemplos da manifestação da psicologia do menino nas ações do homem adulto.

    O terceiro aspecto aprender a significar realidades diferentes, está vinculado à conexão e significação de diferentes realidades ou campos da totalidade (POZATTI, 2003). O acesso a realidades usualmente desconhecidas ocorre através de estados holotrópicos1 ou ampliados de consciência (GROF, 2000) e uma vez ampliada (ou expandida), a consciência conecta-se com significados que podem ir além da realidade usualmente percebida por membros de uma determinada espécie (POZATTI, 2007).

    O acesso a estes estados de consciência é conhecido por muitas culturas do mundo todo, que desenvolveram diversas técnicas para alcançá-los. Essas técnicas envolvem trabalhos respiratórios, com hiper ou hipoventilação, música, danças e outras formas de movimento, isolamento social e privação sensorial, meios fisiológicos como jejum ou privação do sono, meditação, orações, substâncias psicotrópicas de plantas e animais e outras práticas espirituais (GROF, 2000).

    Nos estados holotrópicos ocorre uma mudança qualitativa de consciência de forma profunda e fundamental. Podem ocorrer profundos insights psicológicos relativos à história pessoal do sujeito, dificuldades emocionais, problemas interpessoais, questões filosóficas, metafísicas e espirituais (GROF, 2000).

    Assim, uma educação voltada para a inteireza do Ser se foca em desenvolver: 1) os quadrantes mental, corporal, social e cultural, focando em aspectos relacionados ao meio ambiente, as funções da consciência pensamento, sensações, sentimentos e intuição e qualidades como Visão, Amor, Sabedoria e Vontade 2) a harmonia no viver de cada ciclo do desenvolvimento humano 3) os aspectos transpessoais ou espirituais, através do acesso a estados ampliados de consciência.

    Algumas das repercussões positivas de uma pedagogia voltada à busca da inteireza do homem foram mostradas por Caminha (2003). Em sua pesquisa o autor buscou compreender a relação entre o trabalho desenvolvido no Movimento Guerreiros do Coração e a formação da identidade masculina. Segundo o autor, o trabalho desenvolvido nos grupos de homens possibilitou um espaço de reflexão sobre os processos pessoais de cada um, que são vistos a partir da partilha das experiências do outro. Além disso, através das vivências propostas os participantes relataram o desenvolvimento de uma consciência mais expandida em relação a si próprio e ao meio. Outro relato, este ligado diretamente ao campo da educação física, foi realizado por Frosi (2010) que desenvolveu um projeto com Karate e outras Práticas Integrativas no Curso de Extensão em Karate da UFRGS. Os relatos dos praticantes indicaram melhoras no quadro geral de saúde levando em consideração aspectos nas esferas corporais, mentais, vitais, sociais, culturais, ambientais e espirituais.

8.     Metodologia

    A metodologia utilizada no JAGUAR envolveu uma dança entre a Holologia – o estudo, a partilha, o ver, onde o foco principal está na palavra e no pensamento, – e a Holopráxis – a vivência, onde o foco principal está na experiência subjetiva, em tomar consciência, acessar e movimentar o corpo, os sentimentos e a intuição (CREMA, 1989).

    A Holologia envolveu palestras, realizadas principalmente nas oficinas, filmes e rodas de partilha. As partilhas são um espaço onde cada integrante pode compartilhar com os demais participantes do grupo sobre algum tema. As partilhas são um momento muito rico, de troca de experiências, e são fundamentais para auxiliar na significação e integração das experiências vivenciadas (GROF, 2000).

    Nas Holopráxis, foram utilizadas práticas corporais: Wu Shu, Tai Chi Chuan, Yoga e Danças Circulares e Sagradas; técnicas transpessoais: Visualizações criativas2, Bioenergética, Meditação, Mantras e Respiração Holotrópica3; dinâmicas de grupo: teatro, dinâmicas da Análise transacional e arteterapia; e ritos de passagem.

    Os ritos são “um processo educativo integrador, que trabalha as fronteiras entre as fases da consciência humana, [...] propiciam uma morte simbólica do ego e o nascimento de “outro” ego, mais atual” (POZATTI, 2007, p.91), por isso são conduzidos em períodos de mudanças críticas da vida de indivíduos que coincidem com importantes transições fisiológicas e sociais (GROF, 2000). Assim, a mudança de uma fase a outra pode ser facilitada através da utilização de ritos de passagem, pois eles marcam a saída de uma situação obsoleta para uma situação com novos significados (POZATTI, 2007).

    Dos cinqüenta e seis tempos destinados à realização das atividades do JAGUAR, que incluíam as sete oficinas, quarenta e duas atividades temáticas e sete holopráxis matinais, trinta e seis tinham como um dos elementos fundamentais atividades como dança, estímulos sensoriais, expressão corporal, consciência corporal, Wu Shu, Tai Chi, Yoga ou utilizavam o movimento corporal e a respiração como forma de acessar estados ampliados de consciência. Essas práticas, que fazem parte do universo da Cultura corporal do Movimento humano, foram integradas com dinâmicas da psicologia, das tradições e das artes e foram fundamentais para a criação e implementação de um projeto voltado para a busca da inteireza do Ser. A utilização de cada uma dessas práticas foi essenciais para que o Projeto JAGUAR tivesse uma profunda repercussão na caminhada dos jovens.

9.     As repercussões nos Jovens

    A meta de 2009 é implementar o projeto piloto, [...] na busca de plantar uma semente, fazendo com que os processos vivenciados por esses adolescentes desencadeiem ondas de mudança à sua volta, como uma pedra que cai na água. (ANTUNES et. al. In ROSA, 2009)

    Vejamos então, através dos relatos dos jovens e das observações do pesquisador, quais as repercussões do JAGUAR nestes adolescentes. Os dois primeiros pontos são referentes ao espaço de aceitação e partilha que se desenvolveu durante o JAGUAR.

    “Eu não vou voltar para casa, vou ficar aqui! E vou fazer o JAGUAR por mais três anos”

    Jovem D, 14/06/09

    “Fiquei com muito medo que não me aceitassem, porque entrei depois, mas todos me receberam muito bem”

    Jovem B 16/08/09

    As falas destes jovens refletem o sentimento de alegria e acolhimento, de estar em um espaço onde cada um pôde se colocar de forma autêntica, pois era respeitado e aceito pelo grupo. Assim, os jovens que no café da manhã do primeiro encontro de imersão estavam um tímidos e pouco interagiam entre si, no almoço do mesmo dia estavam em uma só mesa, trocando experiências e integrados. Neste ambiente de aceitação e integração que se criou já no primeiro encontro, foi se desenvolvendo um espaço de acolhimento, repleto de amorosidade.

    “não converso com meus amigos sobre as coisas que a gente conversa aqui”

    Jovem B 06/09/09

    “A gente não tem outros espaços para falar sobre essas coisas”

    Jovem F, 18/07/09.

    “... eu nunca havia contado isso para ninguém”

    Jovem A, 16/08/09

    No “círculo” do JAGUAR, os jovens encontraram um espaço para partilhar suas experiências, que envolviam muitas conquistas e da mesma forma muitos medos, dúvidas e vergonhas e que muitas vezes não tinham outro espaço para ser colocados.

    “Durante esse ano passei por várias turbulências. As coisas que fui vivenciando aqui e as partilhas me ajudaram um monte ... a minha relação com minha mãe tem mudado muito”

    Jovem C, 10/10/09

    “Nas vivências que fizemos ontem, eu tive que enfrentar vários medos meus. Eu ainda sinto medo, mas agora não deixo mais que esse medo me paralise e me impeça de agir”

    Jovem B, 16/08/09

    Profundas transformações foram observadas nos jovens. Durante o andamento do JAGUAR, re-significaram diversos aspectos do seu ser, referentes às relações consigo, com os outros e com o planeta. A melhor palavra que encontro para significar este processo é desabrochar, como se a vida que estava latente naqueles jovens se abrisse em uma nova forma de ser e conviver. Nas palavras de Guardini (1987), estes adolescentes se auto-afirmaram, na medida em que empoderaram-se de si mesmos. Isso foi observado na forma como eles se colocavam perante o grupo, onde jovens que raramente partilhavam suas experiências passaram a se colocar. Na forma de relacionar-se, onde passaram a expressar sua amorosidade e partilhar temas muito íntimos. Em como lidam com as dificuldades de suas vidas. E na postura corporal, onde jovens que nos primeiros encontros possuíam uma postura encurvada, “escondidos” atrás do corpo, visivelmente transformaram sua postura, se “abrindo” para as relações com os outros.

10.     Considerações finais

    As informações trazidas nas partilhas pelos jovens apontam que a participação no JAGUAR contribuiu para a auto-afirmação dos adolescentes, permitindo também uma re-significação de suas relações consigo, com os outros e com o planeta. Salientamos a importância de ter sido gestado durante o andamento do grupo um espaço de partilha, onde os jovens foram acolhidos e puderam ser autênticos.

    Com relação à metodologia utilizada no JAGUAR, a dança entre a Holologia e a Holopráxis permitiu a criação de uma proposta educacional que equilibra o pensamento (hipertrofiado na nossa educação) e a experiência com o corpo, os sentimentos e a intuição. Essa valorização da experiência proporciona o autoconhecimento através do trabalho vivido, sentido. Descrever esta metodologia talvez seja uma das principais contribuições deste trabalho, pois já existem diversas propostas educacionais transformadoras, mas pouca discussão sobre como implementar tais propostas e as repercussões das mesmas.

    Acredito ser interessante a realização de pesquisas que envolvam a aplicação de projetos voltados para uma educação integral e transdisciplinar, utilizando de metodologias que envolvam o estudo (Holologia) e técnicas vivenciais (Holopráxis) em escolas. Estas pesquisas possibilitariam compreender melhor as repercussões desta pedagogia em espaços de educação formal.

    Por fim, os conhecimentos e práticas da Educação física foram fundamentais para a construção e implementação de uma proposta educacional Transdisciplinar e integral, especialmente durante a criação das Holopráxis. Dos cinqüenta e seis tempos destinados à realização das atividades do JAGUAR, cada um em média com 2 horas de duração, trinta e seis tinham como um dos elementos fundamentais atividades como dança, estímulos sensoriais, expressão corporal, consciência corporal, Wu Shu, Tai Chi, Yoga ou utilizavam o movimento corporal e a respiração como forma de acessar estados ampliados de consciência.

    Consideramos que a utilização de tais práticas proporcionou aos jovens experiências que foram fundamentais para a obtenção das repercussões já mencionadas. Manifestou-se no JAGUAR uma educação física que, integrada com conhecimentos da psicologia e das tradições, contribui para o desenvolvimento humano em sua inteireza.

Notas

  1. Holotrópico significa “orientado para a totalidade/inteireza ou indo em direção à totalidade/inteireza” (GROF, 2000).

  2. Visualização criativa, ou seção de jornada, é uma técnica para acessar estados ampliados de consciência, que utiliza música e condução verbal do facilitador (HARNER, 1982; ARRIEN, 1997).

  3. A respiração holotrópica “é um método que pode facilitar estados holotrópicos profundos, de forma muito simples, uma combinação de respiração consciente, música evocativa e trabalho corporal” (GROF, 2000, p. 29).

Referências

  • ANTUNES, Diogo Silveira Heredia y. BORBA, Alessandro Rivellino de. FREITAS, Breno Irigoyen de. HENNEMANN, Joana. KRÜGER, Vera Lúcia. OLMOS, André Reali. POZATTI, Matheus Costa. POZATTI, Mauro Luiz. SALDANHA, Luiz Jaques. TORRES, Lucia. VELOSO, Karla de Lurdes Santos. Jovens Guardiães do Amanhã - JAGUAR: Educando jovens na busca da inteireza do Ser. in ROSA, Miriam Suzete de Oliveira. Fórum espiritualidade e Universidade 2009: saberes transdisciplinares em construção. Porto Alegre, 2009.

  • ARRIEN, Angeles. O caminho quádruplo: trilhando o caminho do guerreiro, do mestre, do curador e do visionário. Tradução: Eleny C. Heller. São Paulo: Ágora, 1997.

  • BENTO, Jorge Olímpio. Desporto: discurso e substância. Lisboa: Horizontes, 2004

  • CAMINHA, Marco Aurélio Ramos. Em busca de uma nova masculinidade. Universidade Luterana do Brasil, Centro de Ciências e Saúde, trabalho de Conclusão de Curso em Psicologia, 2003.

  • CAPRA, Fritjof. A teia da vida. Trad. Newton Roberval Eichemberg. São Paulo: Cultrix, 2006.

  • CREMA, Roberto. Introdução à Visão Holística: Breve relato da viagem do velho ao novo paradigma. São Paulo: Summus, 1989.

  • DELORS, Jacques. Educação, um tesouro a descobrir. 10ª ed. São Paulo: Cortez. 2006.

  • FLICK, Uwe. Introdução a pesquisa qualitativa. Trad.: Joice Elias Costa. 3ª Ed. Porto Alegre: Artmed, 2000.

  • FROSI, Tiago Oviedo. Lutando a saúde e a transcendência: experiências integrativas no Curso de Extensão em Karate da UFRGS. EFDeportes.com, Revista Digital - Buenos Aires - Ano 15 - Nº 146 - Julho de 2010. http://www.efdeportes.com/efd146/lutando-a-saude-e-a-transcendencia-experiencias-em-karate.htm

  • GAYA, Adroaldo (org.). GARLIP, Daniel ... [et. al.]. Ciências do movimento humano: Introdução à metodologia da pesquisa. Porto Alegre: Artmed, 2008.

  • GOSWAMI, Amit. REED, Richard. GOSWAMI, Maggie. O Universo autoconsciente: como a consciência cria o mundo material. Tradução: Ruy Jungmann. 2ª Ed. São Paulo: Aleph, 2008.

  • ______. O Médico Quântico: Orientações de um físico para a saúde e a cura. Tradução: Euclides Luiz Calloni e Cleusa Margô Wosgrau. São Paulo: Cultrix, 2006.

  • GROF, Stanislav. Psicologia do Futuro: lições da pesquisa moderna da consciência. Trad. Jussara de Avellar Serpa. Revisão técnica: Kiu Eckstein. Niterói: Heresis, 2000.

  • GUARDINI, Romano. A aceitação de si mesmo: as idades da vida. Tradução: João Camara Neiva. São Paulo: Palas Athena, 1987.

  • HARNER, Michael. O caminho do Xamã: um guia de poder e cura. Tradução Nair Lacerda. São Paulo: Cultrix, 1982.

  • JUNG, Carl Gustav. O Eu e o inconsciente. Tradução de Dra. Dora Maria Ferreira da Silva. 15ª edição, volume VII/2 das Obras Completas. Petrópolis: Vozes, 2001

  • LIPTON, Bruce. A Biologia da Crença. Tradução: Yma Vick. São Paulo: Butterfly Editora, 2007.

  • LUDKE, Menga E. ANDRÉ, Marli E. D. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986.

  • MOORE, Robert, GILLETTE, Douglas. Rei, guerreiro, mago, amante: A redescoberta dos arquétipos do masculino. Tradução: Talita m. Rodrigues. Rio de Janeiro: Campus, 1993.

  • NICOLESCU, Basarab. O Manifesto da Transdisciplinaridade. Trad. Lucia Pereira Souza. 3ª ed. São Paulo: Triom, 2005.

  • _____. 1o Encontro Catalisador do CETRANS – Escola do Futuro – USP. Itatiba, São Paulo – Brasil: abril de 1999.

  • PARLETTT, Malcom. HAMILTON, David. Evaluation as Ilumination: a new approach to the study of inovatory programs. In: Occasional Paper 9, Center for Research in the Educational Sciences, University of Endimburgh, 1972.

  • POZATTI, Mauro Luiz. Buscando a inteireza do Ser: Proposições para o desenvolvimento sustentável da consciência humana. Porto Alegre: Gênese, 2007.

  • _____. Busca da inteireza do Ser: Formulações Imagéticas para uma Abordagem Transdisciplinar e Holística em Saúde e Educação. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade de Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação, Programa de Doutorado 2003.

  • _____. Paradigmas médicos e práticas médicas: Análise de suas influências em um estágio de medicina comunitária. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade de Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação, Programa de Mestrado 1990.

  • RADIN, Dean. Mentes Interligadas: evidências científicas da telepatia, da clarividência e de outros fenômenos psíquicos. São Paulo: Aleph, 2008.

  • SHELDRAKE, Rupert. O renascimento da natureza: o reflorescimento da ciência e de Deus. São Paulo: Cultrix, 1993.

  • TREVISOL, Jorge. Educação Transpessoal: Um jeito de educar a partir da interioridade. São Paulo: Paulinas, 2008.

  • UNIPAZ-SUL. Quem somos. disponível em: http://www.unipazsul.org.br/ acesso em 14 out. 2010.

  • _____. Manual Projeto Jovens Guardiães do Amanhã- JAGUAR. Porto Alegre: UNIPAZ-SUL, 2009.

  • WEIL, Pierre. A arte de viver em paz: por uma nova consciência e educação.Tradução: Helena Roiz Taveira e Hélio Macedo da Silva. São Paulo: Gente, 1993.

  • WILBER, Ken. Uma Teoria de Tudo : uma visão integral para os negócios, a política, a ciência e a espiritualidade. São Paulo: Cultrix, 2000.

Outros artigos em Portugués

  www.efdeportes.com/
Búsqueda personalizada

EFDeportes.com, Revista Digital · Año 16 · N° 160 | Buenos Aires, Septiembre de 2011
© 1997-2011 Derechos reservados