Creatina, da biossíntese à aplicação: um estudo de revisão La creatina, de la biosíntesis a la aplicación: un estudio de revisión Creatine, biosynthesis of the application: a study of review |
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Centro Universitário Metodista do IPA, Centro de Pesquisa Grupo de Pesquisa Desenvolvimento Urbano e Alterações Biológicas (Brasil) |
Lilian Linck Gustavo Rodrigues Marcello Mascarenhas |
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Resumo A creatina é um composto guanidínico sintetizado endogenamente pelo fígado, rins e pâncreas. A maior parte da creatina se encontra estocada nos músculos esqueléticos e o restante está situado no cérebro, coração e testículos sob a forma fosforilada ou livre. Por esse motivo, ela também pode ser consumida por meio de certos alimentos, como carne vermelha e peixes. Através de uma reação não-enzimática, a creatina se converte em creatinina, forma sob a qual é excretada após filtração nos túbulos renais. A creatina desempenha um papel essencial em um dos três sistemas produtores da energia utilizada na contração muscular. Além disso, a suplementação de creatina melhora o rendimento em exercícios de força e potência muscular (principalmente em múltiplas séries de exercícios anaeróbios intermitentes), além de auxiliar na hipertrofia e ganho de massa muscular, tornando-se, assim, o suplemento mais procurado e utilizado por praticantes de atividade física. Porém, seu consumo em excesso, e em longos prazos, pode vir a desencadear efeitos adversos. Portanto, o objetivo da presente revisão foi buscar na literatura principais funções, características e efeitos desencadeados pela creatina. Unitermos: Creatina. Suplementação. Esporte.
Abstract Creatine is a guanidine compost endogenously synthesized by the liver, kidneys and pancreas. Most creatine is stocked in the skeletal muscle, and the rest of it is in the brain, heart and testicles, either in a phosphorylationed form or free. For this reason, it can also be ingested through some foods, like red meat and fish. Through a non-enzymatic reaction, creatine can be converted into creatinine, form in which it is excreted after being filtered in the renal tubes. Creatine plays an essential role in one of the three energy production systems used in the muscle contraction. Moreover, creatine supplement improves performance in strength exercises and muscle power (especially in multiple series of intermittent anaerobic exercises), besides helping in hypertrophy and muscular mass gain. Due to this, it is the most used and sought-after supplement by people who do physical activities. However, its excessive and long term consumption may lead to harmful effects. Therefore, the aim of this review was to search in the bibliography the main functions, characteristics and effects unleashed by creatine.Keywords: Creatine. Supplementation. Sport.
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 16, Nº 159, Agosto de 2011. http://www.efdeportes.com |
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Introdução
Atualmente, observa-se grande interesse pela nutrição aplicada ao esporte, e a busca pelo sucesso leva muitos atletas a experimentarem qualquer regime dietético ou suplemento nutricional na esperança de atingirem um melhor nível de bem-estar ou desempenho esportivo (Theodoro et al., 2009).
A valorização do considerado corpo ideal leva a excessos que comprometem a saúde, principalmente no que se refere ao consumo indiscriminado de suplementos alimentares e medicamentos. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), associada ao Ministério da Saúde, recomenda a orientação sobre os efeitos adversos desses produtos quanto à dose e ao tempo de uso (BRASIL, 2006).
Os suplementos alimentares, para praticantes de atividade física, funcionam como repositores de energia e normalmente são utilizados para suprir carência nutricional ou para a modificação do desempenho físico (Rebollo, 2002; MOLINERO et al., 2006).
A freqüência desse uso varia entre os tipos de esporte, como na musculação (60%) e fisiculturismo (40%), nos quais seu uso é mais disseminado, bem como devem ser considerados os aspectos relacionados à cultura, faixa etária e sexo, apresentando maior uso por homens (Trabbold, 2010).
Tendo por base as informações acima descritas, o objetivo do estudo é fazer uma revisão da literatura sobre a creatina - quanto à biossíntese, efeitos desejados, adversos e estudos realizados através de revisão bibliográfica de artigos clássicos e atuais.
Definição da Creatina
A creatina, ácido α-metil guanidino acético, é uma amina nitrogenada sintetizada no fígado, rins e pâncreas a partir dos aminoácidos glicina e arginina, tendo também metionina como doadora de metila (GUALANO et al., 2008).
A produção endógena (1g/dia) concomitante à quantidade adquirida na dieta (1g/dia), que se equilibra à taxa de degradação espontânea da creatina e fosfocreatina, resulta em creatinina por reação não-enzimática. A creatina é encontrada no corpo humano nas formas livres (60 a 70%) e fosforilada (30 a 40%) (GUALANO et al., 2008).
Estrutura química da Creatina
O peso molecular da creatina é 130 daltons, sendo 36,92% correspondentes aos quatro carbonos, 32,31% aos três nitrogênios, 24,62% aos dois oxigênios e 6,15% aos oito hidrogênios (Figura 1) (BUDAVARI, O’NEILL, SMITH, 1996).
Figura 1. Estrutura Química da Creatina (ALVES et al., 2010)
Função da Creatina
A creatina é a principal molécula de ressíntese de trifosfato de adenosina (ATP) nos primeiros 10 segundos de atividades máximas, o que significa que, quando sua concentração é elevada pela suplementação, a ressíntese de ATP é mais eficiente e a recuperação é mais rápida; assim como no caso da glutamina, o seu efeito osmótico tem sido relacionado a uma maior síntese protéica (Febbraio et al., 1995).
A creatina desempenha um papel essencial em um dos três sistemas produtores da energia utilizada na contração muscular. Pode existir em duas formas distintas na fibra muscular: a creatina livre (não-ligada) e a fosfocreatina - esta última representando dois terços do estoque de creatina do corpo (Febbraio et al., 1995).
Quando ocorre a contração muscular, tendo como combustível inicial o ATP, este fornece energia através da liberação de uma das moléculas de fosfato, convertendo-se em difosfato de adenosina (ADP) (Febbraio et al., 1995). Infelizmente, o sistema é capaz de fornecer energia durante apenas cerca de dez segundos, a partir dos quais se torna necessária a produção de novas moléculas de ATP. O fosfato de creatina participa doando uma molécula fosfato para o ADP restaurando, dessa forma, o ATP (Febbraio et al., 1995).
Necessidades diárias da Creatina
O turnover diário da creatina à creatinina foi estimado em torno de 1,6% do pool total de creatina. Com base em mensurações da excreção renal de creatinina, a necessidade diária de creatina suprida por meio da dieta ou da síntese endógena é de aproximadamente 2g/dia em um homem de 70kg, por exemplo. (WILLIAMS, KREIDER, BRANCH, 2000; WOLINSKY, HICKSON, 2002).
Embora a creatina não seja um nutriente essencial, devido à necessidade corporal ser atendida pela síntese endógena, ela está intensamente envolvida no metabolismo humano e casualmente é catabolizada à creatinina na musculatura e excretada pelos rins (HOFFMAN, 2006).
Dependendo da massa corporal do indivíduo e da taxa de turnover, a necessidade diária de creatina é de aproximadamente 2g a 3g/dia ou estimada em torno de 1,6% do pool total de creatina (BALSOM et al., 1995). Os peixes e a carne bovina são os principais fornecedores de metade das necessidades diárias de creatina; a outra é sintetizada a partir dos aminoácidos glicina, arginina e metionina, principalmente no fígado, nos rins e no pâncreas (HOFFMAN, 2006).
Fontes da Creatina
A creatina é proveniente de fontes de alimentos animais, como as carnes e peixes, porém é proporcionada em pouca quantidade, em geral na concentração de aproximadamente 4g/kg (Trabbold, 2010).
O organismo humano possui a capacidade de produzir aproximadamente 1g de creatina por dia (WILLIAMS, KREIDER, BRANCH, 2000; WOLINSKY, HICKSON, 2002). Além disso, maioria das pessoas ingere cerca de 1g por dia, proveniente da alimentação habitual, cujas fontes alimentares são: atum, bacalhau, salmão, arenque, além da carne bovina e suína; pequenas quantidades estão presentes no leite (GUALANO et al., 2008).
O preparo do alimento elimina uma parte da concentração da creatina existente nos mesmos. Um quilograma de filé contém apenas 4g de creatina, enquanto possui 119g de gordura. Por esse motivo, criou-se o suplemento, sem a adição de gordura ou colesterol, denominado monoidrato de creatina (WILLIAMS, KREIDER, BRANCH, 2000; WOLINSKY, HICKSON, 2002).
Farmacocinética da Creatina
A via de administração da creatina adquirida é oral e sua apresentação se encontra sob as formas de tabletes, cápsulas, em pó para dissolução em líquidos (HARRIS et al., 1992; HULTMAN et al., 1996; GREENHAFF, 1997). O protocolo de sobrecarga mais comum utilizado é a ingestão diária de um total de 20g a 30g de creatina, usualmente monoidrato de creatina, em quatro doses iguais de 5g a 7g dissolvidas em cerca de 250ml de líquido. Isso deve ser ingerido em três dosagens ao longo do dia por um período de 5 a 7 dias. Quando baseada no peso corporal, a dose recomendada é de 0,3g/kg de massa corporal. GREENHAFF (1997) avaliou que o uso de mais de 20g/dia por cinco dias não fornece benefícios adicionais. Após a fase de sobrecarga, a dose de manutenção recomendada é consideravelmente menor - aproximadamente 2g a 5g de creatina diariamente ou 0,03g/kg de massa corporal por dia (HARRIS et al., 1992; HULTMAN et al., 1996; GREENHAFF, 1997).
A combinação da creatina com um carboidrato simples, como a glicose, pode aumentar o transporte de creatina para o interior do músculo, mesmo em indivíduos que parecem ser menos sensíveis à suplementação de creatina (HARRIS et al., 1992; HULTMAN et al., 1996; GREENHAFF, 1997).
O principal destino final da creatina sintetizada é o tecido muscular esquelético, o qual detém aproximadamente 95% do pool orgânico; os 5% restantes distribuem-se entre órgãos como o coração, cérebro, retina e testículos (Balsom et al., 1995).
O ciclo da creatina finaliza quando é convertida em creatinina por uma reação contínua e irreversível de desidratação (não-enzimática), sendo excretada pela urina. A quantidade de creatinina reciclada e eliminada é constante de um dia para outro e é produzida em proporção à massa muscular de um indivíduo (Balsom et al., 1995).
Biossíntese da Creatina
A creatina é um composto nitrogenado não essencial à dieta. Sua necessidade diária é atingida por absorção intestinal de dieta creatina (via exógena), especialmente encontrada nas carnes ou por biossíntese de creatina (via endógena), sintetizada em duas etapas: a transferência de um grupo amino da arginina para a glicina numa reação de transaminação, formando o guanidinoacetato e ornitina (HARRIS et al., 1992; HULTMAN et al., 1996; GREENHAFF, 1997).
Este composto é sintetizado nos rins e transportado para o fígado, no qual o grupo metil proveniente da metionina forma o S–adenosilmetionina, que é transferido para o guanidinoacetato, formando a creatina. A creatina e a fosfocreatina sofrem reações irreversíveis de ciclização e desidratação, tendo como metabólico a creatinina. Esta, em função de seu caráter não-iônico, se difunde constantemente para o meio extracelular e para a corrente sanguínea até ser excretada pelos rins (Figura 2) (Balsom et al., 1995).
Figura 2. Biossíntese de creatina (MUJIKA et al., 2000).
Atividade antioxidante da Creatina
Estudos realizados com suplementação de creatina, previamente ao exercício intenso, contataram queda tanto na produção de amônia como na de hipoxantina. Portanto, é possível que o aumento nos estoques intracelulares de creatina pelo treinamento físico, ou por seu consumo adicional previamente à realização do exercício intenso, possa servir como antioxidante indireto (SOUZA, PEREIRA, 2008). Ou seja, a menor produção de hipoxantina, em decorrência de tal procedimento e devido à redução paralela de seu catabolismo em xantina e urato, poderia resultar em menor produção de espécies reativas de oxigênio na fibra muscular durante o exercício físico (SOUZA, PEREIRA, 2008).
Formas apresentadas da Creatina
A creatina monohidratada pura é a mais comumente utilizada e pode ser ingerida misturada a algum líquido (BARGIERI et al., 2010).
Existem também as creatinas monohidratadas que são associadas a cofatores que potencializam a sua absorção (BARGIEIRI et al., 2010). Estes cofatores, em geral, são hipoglicemiantes naturais, aminoácidos e minerais permeabilizadores de membrana que aumentam o transporte e a captação do sal da creatina. Dentre os hipoglicemiantes, os mais comuns são: cromo picolinato, vanadyl sulfato, ácido alpha lipóico e taurina (BARGIERI et al., 2010).
A creatina líquida sublingual, mais conhecida como soro de creatina, é uma nova fórmula a partir da qual se torna dispensável a supersaturação, pois sua concentração e absorção são altas e rápidas repondo, assim, os níveis de ATP em poucos minutos (BARGIER et al., 2010). É provável que essa creatina não retenha tanta água como as outras encontradas na forma de pó.
Creatina efervescente é uma das fórmulas que desenvolve bastante efeito. Primeiramente, em termos de sabor, é a forma que apresenta uma palatibilidade maior e de mais fácil administração, conferindo uma absorção melhorada por ação efervescente (BARGIERI et al., 2010) - o gás carbônico ajuda no transporte de íons extra e intracelulares maximizando a absorção do sal de creatina dentro das fibras musculares (BARGIERI et al., 2010).
As barras com creatina são formas muito fáceis de administrar esse composto. Geralmente a alta presença de carboidratos simples e complexos e média proteína, além de alguns cofatores como o vanadyl sulfato presentes nesse alimento, potencializam e melhoram a sua absorção (GUALANO et al., 2008). Elas podem ser consumidas logo antes do treino e ao término do mesmo (BARGIERI et al., 2010). Alguns esportistas as comem lentamente durante as seções de treino; outros, que possuem uma boa adaptação digestiva ao consumo de alimentos, ingerem-nas de uma só vez. O perigo de se ter uma hipoglicemia durante o treino é praticamente nula, isto porque durante o exercício há um efeito tampão sobre a insulina (GUALANO et al., 2008).
Efeitos desejados pelo uso da suplementação da Creatina
A suplementação de creatina melhora o rendimento em exercícios de força e potência muscular (principalmente em múltiplas séries de exercícios anaeróbios intermitentes), além de auxiliar na hipertrofia e ganho de massa muscular (HOFFMAN et al., 2006). Aumenta também a concentração total de creatina intramuscular, que é responsável pelos efeitos ergogênicos dessa substância, uma vez que se torna apta a acelerar a ressíntese de fosfocreatina no intervalo da prática esportiva. Como resultado, a taxa de refosforilação de ADP consequente pode ser mantida durante o exercício aumentando a capacidade de contração muscular (BEMBEN, LAMONT, 2005).
Efeitos adversos pelo uso da suplementação de Creatina
Apesar de alguns relatos indicarem que atletas profissionais utilizam a suplementação com creatina desde 1960, seu uso disseminado só ocorreu a partir dos anos 90. Em estudos com pacientes em estados pré e pós-operatório, indivíduos destreinados e atletas profissionais que ingeriram quantidades entre 1,5 a 25 g\dia por um período de até um ano, o único efeito colateral encontrado foi o ganho de peso corporal (WILLIAMS, KREIDER, BRANCH, 2000; SOUZA, PEREIRA, 2008).
A suplementação parece impedir a biossíntese normal, mas é reversível quando a suplementação é interrompida; após este evento, o nível de creatina armazenado diminui muito lentamente até normalizar ao longo de quatro semanas (MAUGHANMM, 2000).
Em doses mais elevadas, podem provocar náuseas, desconforto abdominal, fraqueza e tonturas (Pearlman, Fielding, 2006). Em dosagens superiores a 20g, quando utilizadas regularmente, há a possibilidade de ocorrer lesões renais, além de causar uma sobrecarga hepática (SOUZA, PEREIRA, 2008).
Os efeitos colaterais encontrados em alguns estudos de casos referentes à função renal reportam-se ao uso abusivo de creatina com doses quase dez vezes maiores que o recomendado em indivíduos com pré-disposição a doenças renais (CLARK, 1998; MAUGHAN, 2000; WILLIAMS, KREIDER, BRANCH, 2000).
Estudos em modelos experimentais utilizando Creatina
Há relatos que demonstram elevações dos níveis plasmáticos de enzimas hepáticas como Aspartato aminotransferase (AST), Alanina aminotransferase (ALT), Gama glutamiltransferase (GGT), Fosfatase Alcalina (FA), as quais estão relacionadas ao aumento da taxa metabólica do fígado indicando toxicidade hepática, principalmente quando expostas a drogas, agentes virais ou bacterianos (Bjornsson,1995, Takahashi et al.,1995).
Estudos clínicos prévios avaliando possíveis efeitos da suplementação com creatina sobre o fígado têm procurado relacionar o seu uso às alterações da resposta hepática. Entretanto, esses trabalhos ainda deixam muitas dúvidas, não permitindo uma afirmação de que a suplementação com creatina leva a essas disfunções, principalmente por se tratar de relatos de casos e estudos retrospectivos (VIEIRA et al., 2008).
Outro estudo de Robinson et al.,(2000) demonstra que a suplementação com creatina tanto aguda quanto cronicamente não alterou significativamente parâmetros hematológicos, hepáticos e renais, com exceção dos níveis de albumina. Entretanto, os mesmos autores demonstraram que esses níveis, apesar de significativamente aumentados, permaneceram dentro dos valores de normalidade, referindo-os como resultados sem significância clínica. Tarnopolsky et al.,(2003) avaliaram os efeitos da suplementação com creatina, em diferentes doses e em 21 tecidos de ratos e camundongos, geneticamente modificados ou não, após 50, 56, 150, 159 e 365 dias de suplementação com creatina. Os resultados demonstraram que a suplementação com esse composto levou ao aparecimento de um infiltrado inflamatório difuso hepático, tanto nos camundongos quanto nos ratos, geneticamente modificados ou não. Os autores também comentaram que nenhuma outra alteração foi encontrada em qualquer um dos 20 outros tecidos analisados e concluíram que a suplementação com creatina, independentemente da dose, induz a um quadro de hepatotoxicidade típico de hepatite aguda (Tarnopolsky et al., 2003).
Entretanto, a presença de pequenos e isolados focos inflamatórios no fígado, como os apresentados por Tarnopolsky et al.,(2003), poderia ser mais bem classificada como alterações hepáticas transitórias e isoladamente não pode ser considerada como um achado de grande importância clínica, ainda mais no caso do trabalho citado no qual os autores não evidenciaram nenhuma outra alteração da morfologia e da função hepática (VIEIRA, 2008).
Ação da Creatina no tecido cardíaco
As características energéticas da creatina são também fundamentais para outros tecidos, como é o caso do tecido cardíaco (SOBROSA et al., 2000). Visto que a disponibilidade reduzida de creatina tem sido associada à insuficiência cardíaca, prevalência aumentada de arritmias ventriculares, isquemia e também instabilidade de membranas das células do miocárdio durante o processo isquêmico (ANDREWS et al., 1998; NAGAI et al., 2004), a administração intravenosa de fosfato de creatina oral tem sido proposta como agentes cardioprotetores para pessoas com doenças isquêmicas do miocárdio (SOBROSA et al., 2000; FONTANA et al., 2003; PRIETO, 2004), fato sugerido também em estudos com ratos realizados em 2004 (Moran et al., 2004).
Ação da Creatina no tecido muscular
A creatina no tecido muscular desempenha um papel muito importante na transferência de energia e reposição das reservas celulares de ATP. Nos músculos, é utilizada para alimentar o processo de contração combinando-se com o fosfato e convertendo-se em fosfocreatina, a qual é essencial para produzir rápidos e curtos surtos de energia (CLARK, 1998; MAUGHAN, 2000; WILLIAMS, KREIDER, BRANCH, 2000).
A depleção de fosfocreatina pode ter como resultado a fadiga e o desaparecimento da força muscular. Nessa circunstância, vários estudos demonstram que a creatina produz melhorias significativas em modalidades que requerem níveis elevados de força (BEMBEN,LAMONT, 2005).
O composto também é fundamental para o metabolismo energético. Durante exercícios de elevada intensidade, o fosfato da creatina-fosfato é clivado para fornecer energia para a ressíntese de ATP. A energia derivada da degradação da creatina-fosfato permite que o ATP seja reciclado mais 12 vezes durante um esforço máximo (BEMBEN, LAMONT, 2005).
Ação da Creatina no tecido hepático
Em seres humanos não existem muitos estudos relacionados à interferência do uso de creatina na função hepática. Porém, em estudos com modelos experimentais, como ratos, comprovou-se que a suplementação oral de creatina induz a uma sobrecarga hepática protéica.
Outra pesquisa demonstrou que os animais sujeitos à ação da creatina apresentaram um acentuado incremento do seu peso corporal, provavelmente explicado pela retenção hídrica (DUARTE et al., 2001). O conteúdo total de proteínas e as concentrações de fosfocreatina no fígado desses animais, comparativamente aos animais do grupo controle, apresentaram aumento (DUARTE et al., 2001). No que diz respeito à atividade das enzimas hepáticas estudadas, a AST diminuiu, enquanto que a ALT evidenciou uma tendência de aumento. Estas modificações na concentração de substratos e na atividade enzimática podem ser explicadas pelas alterações metabólicas induzidas pela sobrecarga de aminoácidos componentes da creatina. Os resultados sugerem que o suplemento de creatina induz sobrecarga hepática de proteínas com alterações concomitantes do metabolismo desse tecido (DUARTE et al., 2001).
Ação da Creatina no tecido nervoso
O cérebro, embora constitua apenas 2% da massa corporal, pode ser responsável por até 20% do consumo energético total. Portanto, um substancial turnover de ATP se faz necessário para manter potenciais de membrana, assim como as atividades de sinalização do sistema nervoso central (SNC) e periférico.
Assim como no tecido muscular, a creatina funciona como uma ligação altamente energética para manter os níveis de ATP durante a contração muscular (IN 'T ZANDT, RENEMA, STREIJGER et al., 2004).
A presença de isoformas de creatina quinase (CK) no cérebro e na medula sugere que o sistema CK exerça um papel essencial na provisão energética do SNC (ANDRES, DUCRAY, SCHLATTNER et al., 2008). De acordo com essa hipótese, evidências apontam para que a depleção de creatina no cérebro seja associada às severas disfunções neuronais típicas em encefalomiopatias e miopatias mitocondriais (IN 'T ZANDT, RENEMA, STREIJGER et al., 2004). Além disso, síndromes que comprometem a síntese ou transporte de creatina levam a retardos mentais, autismo, epilepsia e distúrbios de fala (SALOMONS, VAN DOOREN, VERHOEVEN et al., 2003). Esses achados em conjunto revelam o potencial terapêutico da suplementação de creatina sobre o SNC.
Ação da Creatina no tecido renal
Os efeitos da suplementação de creatina sobre a função renal são debatidos intensamente na literatura científica. Enquanto alguns pesquisadores se posicionam cautelosamente quanto ao uso dessa substância, uma vez que estudos de caso têm sugerido efeitos deletérios à função renal, há autores que se aprofundam em estudos longitudinais, que, embora possuam sérias limitações metodológicas, indicam a segurança da suplementação de creatina. Diante da incerteza em torno do tema, a mídia e os órgãos reguladores de cada país têm tomado suas próprias posições acerca dos riscos desse suplemento (GUALANO et al., 2008).
Segundo alguns autores, a creatina é convertida espontaneamente em creatinina, a qual é excretada pelos rins. O excesso de creatina obtida pela suplementação, contudo, geraria uma sobrecarga renal ao ser excretada (CLARK, 1998; MAUGHAN, 2000; WILLIAMS, KREIDER, BRANCH, 2000).
Apesar da existência de inúmeros relatos de caso na literatura indicando que a creatina possa prejudicar a função renal, não há evidências sustentáveis de que essa substância possa apresentar riscos a homens saudáveis. Pesquisas controladas, no entanto, devem investigar sujeitos com doenças renais pré-existentes e com propensão à nefropatia (CLARK, 1998; MAUGHAN, 2000; WILLIAMS, KREIDER, BRANCH, 2000). Aos sujeitos saudáveis que consomem regularmente esse suplemento, é indicado a não-ultrapassagem de 5g/dia, pois não há evidências científicas suficientes que garantam a segurança da ingestão acima dessa dosagem em longo prazo (Shao, Hathcock, 2006).
Análise laboratorial da Creatina
A creatina constitui uma pequena fração do nitrogênio não-protéico total do plasma e da urina. É instável em pH alcalino e ácido, sofrendo uma rápida conversão à creatinina. A creatina na urina é habitualmente dosada com diferença entre creatinina pré-formada e os cromogênios de creatinina, que são realizados por método de determinação de creatinina (BURTIS, ASHWOOD, 2001). Também é possível realizar determinação da concentração de creatinina utilizando espécimes de urina de 24 horas no momento pré e pós-suplementação. A coleta de urina de 24 horas pode ser iniciada a partir da segunda micção de um determinado dia, prolongando-se até a primeira do dia seguinte (Burke, et al, 2001; Rawson, et al, 2004). Após o volume urinário total ser registrado, a amostra deve ser armazenada em congelador a -70º C. A análise das concentrações de creatinina tem como método o sistema cinético colorimétrico, através de kits comerciais (Narayanan, Appleton, 1980).
Embora o efeito de maior oferta de creatina ao organismo seja mais bem avaliado por meio de biópsia muscular, a determinação da creatinina urinária tem se mostrado eficiente como indicador da retenção de creatina pelo organismo (Rawson et al., 2004). Assim, a maioria dos estudos tem utilizado coletas de urina de 24 horas para determinar as concentrações de creatinina urinária.
Considerações finais
Para que ocorra o aumento do rendimento físico, costuma-se utilizar recursos ergogênicos nutricionais, como a creatina que proporciona maior eficiência muscular, dentre outras substâncias.
Através da revisão bibliográfica, foi observado que ocorrem diversos mecanismos de ação pelos quais a suplementação de creatina tem sido hipotetizada para incrementar a capacidade de trabalho na atividade de alta intensidade e curta duração.
Sua biossíntese possui uma ampla discussão. De acordo, com os autores clássicos, a creatina não é considerada um nutriente essencial devido à possibilidade de ser sintetizada no organismo a partir de aminoácidos. Com base nesta afirmação, autores atuais empenharam-se em desenvolver estudos para elucidar o propósito de sua ingestão.
Desta forma, pessoas que não consomem fontes de creatina, encontrada, por exemplo, na carne vermelha, devem sintetizar toda a creatina que necessitam.
Os efeitos ergogênicos da suplementação desse composto sobre o desempenho em tarefas anaeróbias já foram extensivamente estudados e demonstrados. Assim, não há dúvidas de que a suplementação de creatina melhore o rendimento em exercícios de força e potência musculares (principalmente em múltiplas séries de exercícios anaeróbios intermitentes), além de auxiliar na hipertrofia e ganho de massa muscular.
Se, por um lado, não há muitas dúvidas acerca dos efeitos positivos da suplementação de creatina sobre o desempenho, o mesmo não se pode dizer dos seus possíveis efeitos prejudiciais sobre os sistemas fisiológicos. A principal preocupação sobre esse consumo prolongado é o possível efeito nefrotóxico.
Porém, apesar da existência de diversos relatos na literatura indicando que a creatina possa prejudicar a função renal, não há evidências sustentáveis de que essa substância possa apresentar riscos a homens saudáveis. Portanto, são sugestivos e necessários estudos futuros experimentais para os esclarecimentos de seus reais efeitos maléficos à saúde.
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EFDeportes.com, Revista Digital · Año 16 · N° 159 | Buenos Aires,
Agosto de 2011 |