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Introdução

    No Brasil tem sido detectada a progressão da transição nutricional, caracterizada pela redução na prevalência dos déficits nutricionais, ocorrência mais expressiva de sobrepeso e obesidade não só na população adulta, mas também em crianças e adolescentes^1,2.

    Estima-se que no país haja cerca de três milhões de crianças com idade inferior a dez anos apresentando excesso de peso. Destes casos, 95% estariam relacionados a má alimentação, enquanto, apenas, 5% seriam decorrentes de fatores endógenos³.

    O aumento da prevalência da obesidade entre crianças e adolescentes representa um complexo desafio para as famílias e a sociedade, pois, uma vez instalada, predispõe a uma série de comorbidade, além de afetar, de forma expressiva, a qualidade de vida dessas pessoas⁴.

    Essa epidemia se dá por fatores nutricionais inadequados conseqüentes ao aumento descontrolado no consumo de alimentos ricos em gordura e com alto valor calórico, associados ao sedentarismo condicionado por redução na prática de atividade física e incremento de hábitos que não geram gasto calórico como assistir TV, uso de vídeo games e computadores^5,6.

    No entanto um estudo realizado por Haddock, Siegel, Wikin⁷ que utilizou bicicletas estacionárias com e sem controle de um jogo de vídeo game mostrou que na bicicleta em que as crianças controlavam o jogo houve um maior gasto energético do que na que não controlava e ainda sem aumento no esforço percebido.

    Sendo a aptidão física um marcador de grande contribuição e indicador para o nível de desenvolvimento infantil, a aptidão física de crianças e adolescentes como um todo gera preocupação, cabendo a responsabilidade primária, provavelmente, à escola e aos pais^8-10.

    O estudo do desenvolvimento das qualidades físicas básicas em escolares¹¹ vem se tornando bastante interessante, pois através dos resultados e das intervenções espera-se criar um vetor que motive a criança a incorporar hábitos saudáveis ao longo da vida.

    Por muitos anos, os exames médicos e biométricos foram realizados nas escolas brasileiras no início do ano letivo. Os mesmos tinham o propósito de identificar prováveis comprometimentos à saúde dos jovens e adolescentes. No entanto, esses dados eram arquivados e na maioria das vezes não contribuíam para diagnosticar possíveis implicações no desenvolvimento dos escolares. Para tanto o presente objetiva identificar o perfil lipídico e suas implicações em qualidades físicas básicas de crianças e adolescentes.

Metodologia

    De acordo com os objetivos do estudo e com o teor das informações obtidas, define-se a presente pesquisa como sendo de caráter descritivo. A amostra foi composta de 180 escolares do sexo feminino com faixa etária variando entre sete e 16 anos no ano de 2010.

    Todos os responsáveis pelas escolares participantes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido, e os clubes assinaram o termo de informação à instituição, atendendo aos critérios de ética em pesquisa aprovados, de acordo com a resolução 196/96, pelo Comitê de Ética da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte protocolo n.89/2010.

    A primeira avaliação consistia na coleta de dados antropométricos (Peso, estatura e dobras cutâneas). Na segunda foram coletados os resultados do teste de flexibilidade (Sentar e alcançar e velocidade (Corrida de 20m) respectivamente.

    As medidas de estatura foram realizadas por intermédio de um estadiômetro de parede Sanny® com um milímetro de precisão. As medidas de massa corporal foram realizadas utilizando uma balança digital com precisão de 100 gramas Tanita®. As medidas de dobras cutâneas de tríceps e subescapular com um adipômetro com 0,1 milímetro de precisão Sanny®. O cálculo do percentil de gordura obedeceu ao protocolo proposto por Slaughter¹².

    Os testes motores utilizados incluíam velocidade (corrida de 20m) que consiste em avaliar o componente motor associado à velocidade de deslocamento de mesma direção por um percurso de 20 metros, iniciando-se na posição parada a partir de um cronômetro (Cassio) com precisão centesimal e o de flexibilidade (sentar e alcançar) que consiste em avaliar a flexibilidade do tronco deslocado à frente dos quadris com os joelhos estendidos no Banco de Wells (Sanny) com precisão de um milímetro. A apresentação dos dados foi utilizada a estatística descritiva através da medida de tendência central – média aritmética, de dispersão - desvio padrão e a freqüência relativa ¹².

Resultados

    Observando os resultados podemos ver no Gráfico 1 uma distribuição dos valores de Índice de Massa Corporal nas curvas de crescimento notando uma grande aglomerado de indivíduos nas faixas de sobrepeso e obesidade, dos quais 58% encontram-se eutróficos, 25% com sobrepeso, 10% com obesidade e 7% desnutridos.

Gráfico 1. Curva de crescimento relacionada à meninas da rede pública de ensino da cidade de Natal-RN

    Pode-se observar nas dobras cutâneas de tríceps e subescapular que há um aumento da espessura com o aumento da idade no Gráfico 2. Embora a dobra triciptal esteja maior durante a infância a dobra subescapular aumenta em maior proporção até o início da adolescência, em seguida ela estabiliza e termina maior do que a do tríceps.

Gráfico 2. Valores referentes às dobras de tríceps e subescapular e %G de meninas da rede pública de ensino da cidade de Natal-RN

    Este fato se repete com os valores de peso e estatura (Tabela 1) que também vão aumentando com a idade. O coincidente aumento dos valores de peso coincidente com o pico de velocidade do aumento estatural (9 anos), embora o aumento da espessura de dobra cutânea subescapular tenha sido apenas aos 11 anos. Ao observar a média geral das medidas de espessura subcutânea não observamos diferenças significativas nas médias, sendo de tríceps 14,41 mm e subescapular 13,40 mm. A gordura corporal também sofreu aumento nos valores a partir dos nove anos que perdurou até os indivíduos de 16 anos.

Tabela 1. Valores referentes à média e desvio padrão de peso, estatura, IMC e %G

    Com relação aos testes motores vemos na Tabela 2 ocorre uma diminuição do tempo percorrido nos 20 metros em relação à idade, no entanto a classificação das médias dos tempos foi de Muito Fraca de acordo com tabela proposta por Gaya, Silva¹³, tendo maior diferença observada nos resultados encontra-se entre 9 e 11 anos. Já na flexibilidade os valores referentes tiveram uma grande oscilação, tendo aumento e diminuição com o decorrer da idade até os 13 anos e a partir dai os índices aumentam na tabela a seguir. Isso provavelmente acontece devido ao não treinamento dessa constante física. Em contra posição à velocidade, a flexibilidade se apresentou classificada como Razoável (Tabela 2).

Tabela 2. Valores médios e classificação dos testes de velocidade e flexibilidade referentes a meninas da rede pública de ensino da cidade do Natal/RN

Discussão e conclusões

    Tanto para os valores de IMC abaixo do limite, como para os acima, os riscos a saúde são elevados, refletindo a subnutrição e a obesidade, respectivamente. Os achados nesta pesquisa são confirmados em estudos^14,15,16 que mostraram que houveram concentrações de excesso de peso (Sobrepeso) e obesidade semelhantes aos do presente estudo e, além de mostrar a maior concentração de sobrepeso/obesidade nas escolas públicas.

    Tal fato pode provavelmente ser explicado por conta da população de menor poder aquisitivo ter dificuldade em adquirir alimentos mais saudáveis ou ter pouco acesso a informações sobre alimentação e saúde¹⁷. No entanto Gabriel, Santos, Vascocelos¹⁸ e Brasil, Fisberg, Maranhão¹⁹ mostram controvérsias sobre essa relação do poder aquisitivo com os maus hábitos alimentares.

    Lyra, Mendonça, Sousa²⁰ quando realizou um estudo verificando o excesso de peso em escolas pública em Natal-RN apresentou valores de IMC maior ou igual ao percentil 90 em 17% dos avaliados. Sendo assim no atual estudo a prevalência de sobrepeso/obesidade somam 35% considerando-se alta quando comparados com estudos realizados em outros estados do Brasil como em Bragança Paulista, São Paulo 10,8%²¹, Feira de Santana, Bahia 13,7%²², Recife, Pernambuco 14,7%²³ e em cidades do Nordeste e Sudeste 17,3%²⁴.

    Com relação às dobras cutâneas um estudo²⁵ que avaliou meninas dos sete aos 10 anos constatou o aumento de adiposidade subcutâneas com decorrer da idade. Apesar de a amostragem do estudo feito em Londrina, Paraná, ser apenas até os 10 anos, ao contrário dos achados em Natal, o autor afirma que o incremento de adiposidade subcutânea é um preditor para um maior percentual de gordura além de ter forte poder na elevação dos índices de sobrepeso/obesidade poderem perdurar durante a adolescência (podendo perdurar na vida adulta) assim como os elevados índices de gordura corporal.

    Já Bergmann²⁶ mostrou uma relação entre o Pico de Velocidade em Estatura (PVE), Pico de Velocidade em Massa Corporal (MVMC) e Pico de Velocidade de Dobra Cutânea de Tríceps e Subescapular (MVDC) ocorrendo entre 10 e 11 anos de idade em meninas confirmando os achados do presente estudo na tabela 1.

    Charchat-Fichman, Oliveira²⁷ afirma que crianças mais novas são mais lentas, havendo uma correlação positiva com a nomeação. O processo de aprendizado (experiência) também interfere nesses resultados, uma vez que crianças mais novas não tiveram a experiência para assim adquirir coordenação favorável ao teste, bem como o período de maturação motora não ter amadurecido²⁸.

    Fazendo uma relação entre a qualidade física velocidade com a composição corporal, tais resultados de Muito Fraco podem ser explicados pelo alto índice de sobrepeso/obesidade entre as escolares apesar de haver diminuição no tempo com aumento da idade, bem como a elevação do percentil de gordura com o decorrer da idade podem ter afetado na qualidade do desempenho motor. A queda no tempo entre nove e 10 anos provavelmente está relacionada à maturação onde a partir desta idade ele passa a oscilar confirmando achados em outros estudos^29,30, bem como os maus resultados justificados pela prática de exercícios mais leves.

    Minatto, Ribeiro, Achour Junior, Santos³¹ afirmam que a flexibilidade não sofre influência das variá­veis de idade, massa corporal, estatura, composição corporal e maturação sexual, mantendo-se estável por toda a infância e adolescência. Já Roman³² afirma em seu estudo que existe uma diminuição dos níveis de flexibilidade alcançados proporcional ao aumento da idade.

    A criança e o adolescente tendem a ficar obesos quando sedentários, e a própria obesidade poderá fazê-los ainda mais sedentários, sendo atividade física importante na composição corporal, por aumentar a massa magra e prevenir a obesidade, bem como melhorar as capacidades físicas^18-20.

    Hábitos sedentários, como assistir televisão, jogar vídeo game e a internet, contribuem ainda mais para obesidade, pois além de diminuir o gasto calórico colabora para ingestão de alimentos menos saudáveis²⁹. Os escolares que praticam atividade física tendem a ingerir alimentos menos calóricos, além de contribuir significativamente para um melhor desempenho no esporte.

    Portanto, pode-se concluir que grande parte das meninas encontra-se em sobrepeso/obesidade, com forte indício de um percentual de gordura alto o que provavelmente prejudicou no desempenho do teste de velocidade. A queda no tempo entre nove e 10 anos e a estabilização da flexibilidade pode estar fortemente relacionada à puberdade.

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