O ensino da capoeira como instrumento de conscientização da cultura afro-brasileira La enseñanza de la capoeira como un recurso de concientización de la cultura afro-brasileña |
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Prefeitura Municipal de Curitiba Secretaria Municipal de Educação Departamento de Tecnologia e Difusão Educacional Projeto Escola & Universidade (Brasil) |
Evaldo Cezar Rodrigues Andressa Pires Vilmar Vieira Daniele Seninski |
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Resumo Este artigo aponta a capoeira como um patrimônio histórico da humanidade, refletindo sobre os elementos que a compõem, buscando sua inserção em alguns dos registros da cultura negra, inclusive as contribuições que esta apresenta na formação da sociedade brasileira. Ao longo dos anos a capoeira vem inserindo-se nos mais diferentes espaços institucionais. A escola, como instituição social, favorece aos seus alunos crescimento pessoal e social por meio de valores e de princípios, daí a importância da Lei 10639/03 que torna obrigatório o ensino sobre a Cultura e História Afro-Brasileira. A capoeira somente será compreendida em sua totalidade a partir de uma abordagem cultural, por meio da qual possa captar a essência da produção da vida. Todas as reivindicações propostas aos movimentos em favor ao estudo da Raça Negra apontam a área da Educação, a melhor e mais eficaz forma de encaminhamento para eliminar a discriminação e valorizar as relações étnicas - raciais. Unitermos: Capoeira. Cultura afro-descendente. Escola. Educação Física.
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 16, Nº 159, Agosto de 2011. http://www.efdeportes.com |
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Introdução
Ao decidirmos trabalhar a capoeira, pensamos em um novo posicionamento pedagógico que vem valorizar a raça negra, considerando que as relações sociais e culturais entre negros e brancos em nosso país não são harmoniosas.
Torna-se fundamental possibilitar a mudança desse quadro já na escola, nas séries iniciais, a fim de resgatar a influência positiva desta raça que representa quase cinqüenta por cento de nossa população.
É importante que cada aluno tenha a consciência que lhe permita responder questões como: “Quem somos e de onde viemos?”, afim de que percebam a si mesmos e os outros. Todas as reivindicações propostas aos movimentos em favor ao estudo da Raça Negra apontam a área da Educação, a melhor e mais eficaz forma de encaminhamento para eliminar a discriminação e valorizar as relações étnicas - raciais.
Desta forma, abordamos conteúdos que trouxeram para a sala de aula a história da Africanização no Brasil, buscando cumprir o objetivo como educadores, que é de levar a reflexão sobre a discriminação, e compreender a enorme diversidade cultural do povo brasileiro possibilitando o direito à igualdade.
Partimos de algumas problematizações como: a escola esta preparada para realizar uma análise crítica dos valores sociais, padrões de beleza, estética e saúde escolhidos como padrão pela sociedade brasileira em contrapartida ás expressões por meio da corporeidade da diversidade étnico-racial brasileira? Como é visto o esporte capoeira pela sociedade atual? A história da capoeira se confunde com a dos negros no Brasil? Como se deu esse processo?
Motivados por essas problematizações, estabelecemos como objetivo geral do projeto a conscientização dos alunos da importância da diversidade cultural, fazendo-os reconhecer e respeitar características físicas e de desempenho de si próprio e dos outros, sem discriminação, participando de atividades corporais e teóricas.
Para alcançarmos este objetivo buscamos promover o trabalhar com o corpo da criança em todos os movimentos que a capoeira exige. Abordamos todo o histórico que envolve a arte da capoeira desde a chegada ao Brasil até os dias de hoje. Levamos as crianças a participar de atividades corporais e teóricas, estabelecendo relações equilibradas e construtivas com os outros. Proporcionamos conhecimentos relacionados às nossas heranças e a origem dos nossos costumes encontrados em todas as classes sociais indiferente de cor, sexo, idade ou poder aquisitivo. Enfatizamos a importância de valorizar as contribuições africanas como parte essencial da formação social brasileira. Incentivamos os educandos a adotar atitudes de respeito mútuo, dignidade e solidariedade em situações lúdicas e esportivas, repudiando qualquer espécie de violência.
Desenvolvimento
Através da escola é que o indivíduo pode contemplar os conhecimentos sobre os movimentos historicamente construídos e socialmente transmitidos favorece aos alunos seu crescimento pessoal e social por meio de valores e de princípios, pois o espaço pedagógico oferece alternativas práticas que possam inquietar, reavivar as parcerias, despertar para novas idéias e atitudes, daí a importância da Lei10639/03, que torna obrigatório o ensino sobre a Cultura e História Afro-Brasileira.”
Todos os segmentos sociais, governo, escola e comunidade devem se empenhar na modificação de seus modelos sociais para que o homem novo possa emergir mais autêntico e mais integrado com seus valores (Vilmar Bittencourt, Metodologia do ensino de Ciências, Georg. J. Henning, p. 395).
Não há como negar que a educação é um processo amplo e complexo da construção de saberes culturais e sociais que fazem parte do acontecer humano. Porém, não é contraditório que tantos educadores concordem com essa afirmação e, ao mesmo tempo, neguem o papel da escola com o trato étnico-racial? Como podemos pensar a escola brasileira, principalmente a pública, decolada das relações sociais que fazem parte construção histórica, cultural e social desse país? E como podemos pensar as relações raciais fora do conjunto das relações sociais? (GOMES, 2005, p.146).
Pensar o Jogo/brincar enquanto possibilidade de intervenção pedagógica dos professores requer pensar ações em diferentes perspectivas.
Do ponto de vista pedagógico, encontramos situações em que brincar e jogar refere-se a livre expressão lúdica ou são conteúdos ou estratégicas metodológicas intencionalmente utilizadas para realizar o objetivo de ensinar algum conhecimento a alguém.
O povo africano vem ser o maior e melhor exemplo de luta pela liberdade e igualdade, pois desde que chegou ao Brasil, sua caminhada ficou marcada por pegadas que jamais o tempo poderá apagar, pegadas estas que alçamos mapear para tecermos a nossa própria história.
Não lhes foi dado o direito de questionamento e tão pouco condições de sobrevivência, tendo que se adaptar a um novo ambiente, longe de suas famílias e entes queridos. Conforme o tempo foi passando, o negro foi de integrando e misturando a outros povos que tinham o Brasil como sua morada, então uma nova identidade foi se constituindo originando a mestiçagem. Embora tenham se integrado a novas raças, seus costumes, hábitos e cultura permaneceram dominantes, assim como a raça também o é (GOMES, 2001, p 85)
O jogo da capoeira geralmente é visto como uma manifestação cultural Genuinamente Brasileiro, algo que se configuraria, como se possível fosse, uma síntese de elementos africanos com outras formas de expressão corporal aqui já existentes antes e durante o período de escravidão. Ele combina-se como jogo. Luta e dança, com um conjunto de outros elementos mediados pelo corpo e presentes na cultura afro-descendente. Tal como mostrou Soares (1999)
(.....) Todas as nações africanas tiveram representantes presos como capoeiristas, nas diversas proporções, por todo o período estudado (século XIX). Esses dados reforçam a idéia da capoeira como uma invenção escrava, isto é, ter sido criada no Brasil, nas condições peculiares da escravidão urbana, mesmo majoritariamente por africanos.
Apresentação e análise dos resultados
Iniciamos as atividades partindo da história da capoeira, que esta diretamente ligada da vinda dos negros africanos para o Brasil. Enfatizamos o modo de viver, na época escravizados, e quem detinha do poder. Abordamos também os dois tipos de capoeira e as suas características, a angolana e a regional. Foi trabalhado como era a vida nos quilombos, e também a história de um dos grandes líderes, Zumbi dos Palmares, também capoeirista. Todas as atividades partiram de pesquisas realizadas pelas crianças. A parte teórica foi abordada pelo professor de Educação física e pela professora regente da turma, a parte prática desenvolvida com alunos pelo professor de Educação Física.
Após essa abordagem, entramos na cultura afro-brasileira. Primeiramente propomos o "Jogo da África", para trazer conhecimentos gerais e instigar outros novos conhecimentos. O jogo é sempre um atrativo para as crianças, tendo uma ótima aceitação por parte de todos.
Jogo contando a história da escravidão
Muitos caminhos foram percorridos desde a escravidão até os dias de hoje. Foram muitas vitórias alcançadas pelos escravos e seus descendentes. Sendo assim, suas influencias na cultura do nosso país são bastante significativas. Abordaremos algumas delas com nossas crianças.
Falamos sobre as comida de origem africana que se fizeram presentes aqui no Brasil. Destacamos a influência africana nos nossos hábitos alimentares, como: o uso de diversos tipos de pimentas e do azeite do dendezeiro, que é fundamental no preparo de alguns pratos. Esse trabalho se desenvolverá partindo de receitas de origem africana: canjica, pamonha, paçoca, cocada, feijoada, quibebe, etc. Sugerimos a construção de um livro de receita da turma. Se for possível faremos uma receita em sala de aula.
O folclore e as lendas que fazem parte da cultura afro-brasileira, também serão abordados, de maneira breve, para conhecimento de nossos alunos: a mais popular lenda brasileira, Saci (século XVIII); a lenda do Zumbi; a lenda do Quibungo; lenda do Chibamba e a lenda do Negrinho do Pastoreio. Como sempre as lendas atraem a atenção das crianças com muita facilidade. Será realizado uma produção textual, onde as crianças poderão reescrever as histórias ouvidas ou então criar outras, ou até dramatizá-las.
Há também jogos, brincadeiras e cantigas de origem africana, ou criada pelos escravos, que estão espalhados por todo nosso país. Um desses jogos é a "Mancala", surgiu na África, especialmente na Etiópia e no Egito, 2000 a. c., sendo jogado inclusive pelos faraós. Confeccionaremos esse jogo, em sala de aula, com caixas de ovo. Outra brincadeira, associado à cantiga popular, é o "Escravos de Jó". Essa brincadeira já foi realizada, várias vezes, pelo professor de Educação Física. As crianças poderão confeccionar um chocalho para essa brincadeira. "Batata quente" também é uma brincadeira originária da África, era praticada ao redor de uma fogueira, os participantes a passavam uns para os outros para que ela fosse esfriando. O jogo do "Capitão do Mato" é muito comum em vários estados do Brasil, conhecido também por "polícia e ladrão". Esse jogo foi realizado nas atividades de Educação Física, sendo utilizados os passos da capoeira. E a última brincadeira a ser abordada, "Chicotinho-queimado", muito conhecida pelas nossas crianças, antigamente os movimentos eram marcados por uma cantiga que tem os elementos típicos do período da escravidão: a corda e o chicote. A cantiga era a seguinte:
"Chicotinho queimado
Tome bem cuidado
Quem olhar para trás
Leva chicotada”.
O trabalho com jogos e brincadeiras sempre tem resultados positivos, pois qual criança não gosta de brincar? A história do surgimento dos jogos e brincadeiras foram abordados antes de cada prática. Até mesmo jogos já conhecidos despertaram interesse pelo fato de conhecerem como surgiu.
As festas populares são uma tradição em todas as regiões do Brasil. Abordaremos uma de influência da cultura africana, a história do Boi-bumbá. Partindo sempre da pesquisa. As máscaras também são utilizadas em várias festas. Propomos para essa atividade construção de cartazes, em grupos.
As vestimentas também trazem marcas da cultura afrobrasileira, com seus cortes e cores. Sem dispensar acessórios como colares, pulseiras e brincos. As crianças tiveram a oportunidade de conhecer um pouquinho sobre isso, em trabalho realizado na Feira sobre Africanidades, que aconteceu na escola. Reforçaremos em sala de aula algumas características importantes.
O nosso vocabulário é muito rico em influências afro-brasileiras, abordamos também palavras de origem africanas, construindo um dicionário com as crianças. As crianças ficaram impressionadas com várias palavras que são utilizadas por elas e que desconheciam sua origem. Esta sendo um trabalho bem gostoso e proveitoso.
Nas aulas de Educação Física, os professores trabalharam as diferenças dos tipos de capoeiras que existem, a angolana e a regional. Em data show explicaram aos educandos, que puderam perceber claramente as característica de cada uma.
Diferenças entre a capoeira de Angola e Regional
Os passos executados na roda de capoeira também foram trabalhados com as crianças. Houve uma ótima
aceitação por parte de todos, que participaram de todas as atividades com muito interesse e entusiasmo.
Ginga da Capoeira
Considerações finais
As nossas experiências com o desenvolvimento do projeto mostra que temos ainda muito que aprender e refletir sobre questões históricas que influenciam na formação da sociedade brasileira e conseqüentemente na nossa formação humana.
Acreditamos que o grande desafio é construir, fazer avançar uma capoeira solidária, que garanta dignidade a todos, construindo a ética da liberdade e responsabilidade.
A capoeira tem conquistado seu espaço, atravessando fronteiras chegando a inúmeros países e no Brasil, diariamente reúne seus adeptos para praticá-la como uma expressão do folclore nacional, da cultura corporal, e principalmente, como um instrumento educativo importante para consciência da nossa cultura.
Por isso, a capoeira e uma modalidade que pode ser vivida dentro e fora da escola, como uma atividade da cultura corporal, pois a capoeira faz parte da nossa história; contribuem na formação de valores das crianças, jovens e adultos.
Referências
DIRETRIZES CURRICULARES para a Educação Municipal de Curitiba. 2006, Ensino Fundamental.
FREITAS, Jorge Luis de. Capoeira Infantil Jogos e brincadeiras. Editora torre de papel 2007.
FREITAS, Jorge Luis de. Capoeira na Educação Física como ensinar?. Editora Progressiva Curitiba, 2007.
FREITAS, Jorge Luis de. Capoeira pedagógica. Editora Torre de Papel 2007.
LEI 10.639, de 9 de janeiro de 2003.
PRICE, Leontyne. Aída (adap.). Editora Ática, 2001.
REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS DO ESPORTE, Campinas, Colégio Brasileiro de Ciências do esporte, 1979. Editora Autores Associados.
ROCHA, Ruth. O Amigo do Rei. São Paulo: Editora Ática, 2000.
RODRIGUES, José Carlos. O corpo na história. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1986.
ROSA, Sônia. O Menino Nito. Rio de Janeiro: Editora Pallas, 2002.
SANTOS, Joel Rufino dos. Gosto de África. Histórias de lá e de cá. Editora Onda Livre.
VASSALO, Márcio. A Fada Afilhada. Rio e Janeiro: Editora Salamandra, 2001.
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