efdeportes.com

Perfil epidemiológico dos casos de violência 

doméstica em Montes Claros, Minas Gerais, Brasil

Perfil epidemiológico de los casos de violencia doméstica en Montes Claros, Minas Gerais, Brasil

 

*Graduando em Enfermagem pela Universidade Estadual

de Montes Claros (UNINONTES), Minas Gerais (MG)

Membro do Grupo de Pesquisa em Enfermagem da Unimontes

**Graduando em Enfermagem pela UNINONTES, Minas Gerais (MG)

Pós-Graduando em Didática e Metodologia do Ensino Superior – UNIMONTES

***Fisioterapeuta, Gerência Regional de Saúde de Montes Claros, MG

****Enfermeira, Secretaria Municipal de Saúde de Montes Claros, MG

*****Enfermeira, Mestre em Ciências, Professora da UNIMONTES

Luís Paulo Souza e Souza*

José Rodrigo da Silva**

Maria Fernanda Loiola Ruas***

Ludmila Pereira Macedo****

Orlene Veloso Dias*****

luis.pauloss@hotmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          O presente estudo objetiva identificar o perfil epidemiológico dos casos de violência doméstica notificados no ano de 2010, na cidade de Montes Claros, norte de Minas Gerais, Brasil. Trata-se de uma pesquisa documental, de abordagem quantitativa e de caráter descritivo. Os dados foram coletados do Sistema de Informações de Agravos de Notificação (SINAN), no período de dezembro de 2010 a março de 2011. Os aspectos éticos dessa pesquisa foram considerados, contando com a autorização da Diretoria de Vigilância em Saúde da Secretaria Municipal de Saúde de Montes Claros. Identificou-se no SINAN 131 casos de violência notificados. As marcas físicas são as mais relatadas (74%), seguida de violência psico/moral (43,5%) e violência sexual (29%). As agressões ocorreram principalmente em casa (82%), sendo as vítimas predominantemente do sexo feminino (82%). A faixa etária mais agredida foi de 20 a 39 anos (40%), raça parda (53%), estado civil solteiro (37%), ocupação estudante (14,5%), seguido de dona de casa (10%). Ao analisar o número de casos de violência por zona de ocorrência encontrou-se que 85% dos casos ocorreram na zona urbana. Conclui-se que a violência ameaça a liberdade e a integridade física, moral e social das famílias, atingindo, principalmente, as mulheres. A identificação do perfil epidemiológico contribui para conhecer a dimensão do problema e propor ações de enfrentamento que envolvam toda a sociedade.

          Unitermos: Violência doméstica. Políticas públicas. Epidemiologia.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 16 - Nº 158 - Julio de 2011. http://www.efdeportes.com/

1 / 1

Introdução

    Violência pode ser definida como "uso intencional da força física ou do poder, real ou em ameaça, contra si próprio, contra outra pessoa, ou contra um grupo ou uma comunidade, que resulte ou tenha a possibilidade de resultar em lesão, morte, dano psicológico, deficiência de desenvolvimento ou privação" destaca a intencionalidade do ato violento, excluindo os incidentes não intencionais. Inclui o uso do poder, exemplificado por ameaças de agressões ou intimidações e por negligências e omissões (SCHRAIBER, et al., 2006).

    A Organização Mundial da Saúde considera que o fenômeno da violência doméstica ocorre em todos os países e em todas as classes sociais. E devido à sua magnitude tornou-se uma questão de saúde pública. Pode acarretar graves consequências, constituindo um problema que compete tanto à esfera jurídica, pois resulta de ações criminosas, quanto aos setores de saúde, pelos agravos que acometem suas vítimas (DOSSI, et al., 2008).

    A maior prevalência de comportamentos violentos em algumas comunidades não pode ser explicada por um fator isoladamente. Sendo assim, compreender a maneira como esses determinantes estão vinculados à violência é um dos passos importantes no enfoque da Saúde Pública para que este fenômeno seja prevenido (DOSSI, et al., 2008).

    Considerando esse contexto, o objetivo geral deste estudo foi identificar o perfil epidemiológico dos casos de violência doméstica notificados no ano de 2010, na cidade de Montes Claros, Minas Gerais, Brasil.

Metodologia

    Este estudo caracterizou-se como documental, descritivo, transversal e de cunho quantitativo.

    A coleta de dados foi realizada no site do DATASUS, no Sistema de Informações de Agravos de Notificação (SINAN), em março de 2011. Esse banco de dados é de livre acesso ao público, sendo assim esse estudo encontra-se em conformidade com as normas da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, que regulamenta a pesquisa com seres humanos, desta forma não requerendo parecer do Comitê de Ética em Pesquisa. Os dados se referem a todos os casos de Violência Doméstica e Sexual notificados de janeiro a dezembro do ano de 2010 pelos profissionais dos hospitais e equipes da Atenção Primária à Saúde do município de Montes Claros, Minas Gerais, Brasil.

    As características analisadas foram: sexo, faixa etária, tipos de violência, raça, ocupação, local de ocorrência, situação conjugal e zona urbana ou rural de ocorrência.

    Os dados foram digitados e tabulados em planilha eletrônica, Excel 2003 para análise e posteriormente confronto com a literatura vigente.

Resultados e discussão

    Pesquisas epidemiológicas têm produzido evidências que apontam a violência como um dos maiores problemas social com impacto na saúde dos brasileiros (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2005).

    Ao analisar o número de casos de violência notificados no SINAN, em Montes Claros, no ano de 2010, encontrou-se 131 casos.

Gráfico 1. Número de casos de Violência Doméstica em Montes Claros em 2010 por sexo

Fonte: Dados do Sistema de Informações de Agravo de Notificação (SINAN), 2010.

    Do total de casos notificados, notou-se que 82% das vitimas foram mulheres.

    A desigualdade tem como uma de suas extremas formas de manifestação a violência contra as mulheres, a qual é resultado de uma diferença de poder que se traduz em relações dominação e força. Assim, a violência baseada no gênero tem se constituído em um fenômeno social que influencia sobremaneira o modo de viver, adoecer e morrer das mulheres (GUEDES et al., 2009).

    Os maus tratos infligidos à mulher repercutem em perdas significativas na saúde física, sexual, psicológica e nos componentes sociais, este último como rede de apoio para a qualidade de vida (MONTEIRO; SOUZA, 2007).

    Observou-se que a maioria das vítimas de violência possuía idade entre 20 a 39 anos, seguida da faixa etária entre 10-19 anos. Encontrou-se ainda, notificações de casos de violência contra crianças e idosos (Gráfico 2).

Gráfico 2. Número de casos de Violência Doméstica, em Montes Claros, no ano 2010 por faixa etária

Fonte: Dados do Sistema de Informações de Agravo de Notificação (SINAN), 2010

    Schraiber et. al, (2006), ao analisar o Relatório Mundial, descreve a violência juvenil (10 a 29 anos) possui uma grande representatividade social. Sendo a mais visível das violências, que também é peculiar, pois os jovens são os principais agressores e vítimas. Seus estudos são os que mais apontam para a articulação das violências fatais e não fatais; as do espaço público com as domésticas; as de tipo interpessoal com as coletivas. Estima-se que de 4% a 6% da população idosa experimenta alguma forma de abuso doméstico. Entre idosos há que se considerar, ainda, os maus-tratos em instituições, tema raro nas pesquisas.

    Minayo e Souza (2010) definem alguns tipos de violência: violência física se refere ao uso da força física para ferir, provocar dor, incapacidade ou morte ou para compelir o idoso a fazer o que não deseja; violência psicológica são agressões verbais ou gestuais com o objetivo de aterrorizar, humilhar, restringir a liberdade ou isolar o idoso do convívio social; violência sexual se refere a atos ou jogos sexuais de caráter homo ou heterorrelacional que utilizam pessoas idosas visando obter excitação, relação sexual ou práticas eróticas por meio de aliciamento, violência física ou ameaças.

    Verificou-se que houve notificação de violência física, psicologia, moral e sexual. Lembrando que em muitas vezes uma vítima pode sofrer mais de um tipo de violência (Gráfico 3).

Gráfico 3. Tipos de violência doméstica no ano de 2010 no município de Montes Claros

Fonte: Dados do Sistema de Informações de Agravo de Notificação (SINAN), 2010.

    Houve constatação que as marcas físicas são as mais relatadas nesse estudo. Os casos das violências domésticas e intra familiares, com agressões físicas, sexuais e psicológicas, além da privação e negligência, geralmente acometem, sobretudo, mulheres, crianças e idosos. Uma grande superposição das violências física, sexual e psicológica tem sido encontrada, o que também se deve esperar das violências contra crianças e idosos. (SCHRAIBER et. al, 2006). Segundo este mesmo autor a superposição das formas física, sexual e psicológica foi apontada, prevalecendo as formas combinadas: a violência física com a psicológica e a violência sexual com a física.

    Outra característica encontrada foi casos de violência por raça. Notou-se maioria na raça parda (53%) (Gráfico 4).

Gráfico 4. Número de casos de Violência Doméstica em Montes Claros em 2010 por raça

Fonte: Dados do Sistema de Informações de Agravo de Notificação (SINAN), 2010.

    Os negros (pretos e pardos) predominaram em todos os tipos de eventos violentos, confirmando as estatísticas encontradas no Brasil (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2006). Segundo análises realizadas a partir de dados disponibilizados pelo Ministério da Saúde, 2005, a população negra apresenta os maiores coeficientes de mortalidade por causas externas.

    Embora um grupo social não se defina por relações de raça ou cor, diferenças étnicas associam-se a desigualdades sociais e condicionam a forma de viver e de morrer de grupos de pessoas. A etnia, em si, não é um fator de risco, mas a inserção social adversa de um grupo racial-étnico sim, pode significar condição determinante de vulnerabilidade (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2006).

    Quanto à ocupação das vítimas foi predominante o número que se declarou "estudante" (19), "dona de casa" (13), "aposentado ou pensionista" (3), e “economia informal” (1) (Tabela1).

Tabela 1. Número de casos de Violência Doméstica em Montes Claros em 2010 por ocupação

Variáveis

N

Ocupação

Total de agredidos

Estudantes

19

Dona de casa

13

Aposentado/Pensionista

3

Desempregado crônico ou cuja ocupação habitual não foi possível obter

1

Secretário/Executivo

1

Comerciante atacadista

1

Comerciante varejista

2

Fisioterapeuta

1

Supervisor de ensino

1

Jornalista

1

Professor de nível médio no ensino fundamental

1

Inspetor de alunos de escola privada

1

Consultor contábil (técnico)

1

Auxiliar de escritório em geral

1

Caixa de banco

1

Empregado doméstico diarista

1

Cozinheiro geral

1

Manicure

2

Baba

1

Auxiliar de lavadeira

1

Vendedor em comércio atacadista

1

Atendente de Farmácia - balconista

1

Fonte: Dados do Sistema de Informações de Agravo de Notificação (SINAN), 2010

    Tal achado está em consonância com a pesquisa realizada por Dossi et al., 2008, quanto à ocupação dos agredidos, foi predominante o número que se declarou "do lar", "estudante", "aposentada ou pensionista", e "economia informal". A este respeito, Deslandes et al., 2006, verificaram em estudo realizado junto às mulheres atendidas em dois hospitais que a maior parte das vítimas estava desempregada (23,2%) à época da agressão e algumas desempenhavam somente as funções do lar (16,1%). Os altos índices de pessoas violentadas que não exercem atividade remunerada podem explicar, em parte, a permanência das mesmas junto ao agressor, ou seja, são dependentes economicamente dele.

Gráfico 5. Número de casos de Violência Doméstica em Montes Claros em 2010 por local de ocorrência

Fonte: Dados do Sistema de Informações de Agravo de Notificação (SINAN), 2010.

    A residência e os espaços públicos apareceram como locais privilegiados para a ação violenta 82 casos e 22, respectivamente.

    Os espaços públicos (ruas, bares e outros locais) são os principais cenários para a ocorrência de eventos violentos, especialmente quando envolvem agressores e vítimas do sexo masculino (SOUZA, 2005). No espaço privado do lar, ocorre a maioria das violências contra a o sexo feminino. O domicílio, espaço onde os eventos violentos tomaram lugar, favorece a ocorrência de agressões e abusos contra crianças, adolescentes e mulheres. Ao permanecer mais tempo em seus lares, essas pessoas acabam sendo violentadas, mais freqüentemente, nesse ambiente privado (COSTA, et al., 2007).

    Encontrou-se, ainda, que a maior parte dos agredidos eram solteiros (37%). A zona de ocorrência dos casos de violência predominante foi a zona urbana (84%), seguido de ignorado ou branco (11%), zona rural (4%) e periurbana (1%).

    A violência apresenta-se de forma mais dramática nas áreas metropolitanas, atingindo especialmente as populações com piores condições de vida e jovens das periferias urbanas (MINAYO; SOUZA, 2003).

Conclusão

    Conclui-se que houve constatação factual que as marcas físicas são as mais relatadas. As agressões ocorreram principalmente em casa, sendo as vitimas predominantemente mulheres e maioria dos agressores eram parceiros íntimos. A faixa etária mais agredida foi de 20 a 39 anos, raça parda, solteira, ocupação estudante, seguido dona de casa, aposentados/pensionista e “economia informal”. A maior ocorrência foi na zona urbana. A falta de informações gerada pela presença de campos em branco, ignorado ou não se aplica compromete o real conhecimento do problema.

    A violência origina sentimentos adversos a liberdade e atinge a integridade física, moral e social das famílias, dificultando a busca de soluções para problemas. Desvelar esse contexto, na trajetória do cuidado de pessoas vitimadas pela violência, possibilita debates nos espaços de participação social do Sistema Único de Saúde (SUS), movimentando os cidadãos, na busca da promoção da saúde e dignidade humana.

Referências

  • COSTA, C. O. M; CARVALHO, R.C.; SANTA BÁRBARA, J. F. R; SANTOS, C. A. S. T; GOMES, W. A.; SOUSA, H. L. O perfil da violência contra crianças e adolescentes, segundo registros de Conselhos Tutelares: vítimas, agressores e manifestações de violência. Ciência & Saúde Coletiva. Vol. 12; p. 1129-1141; 2007.

  • DESLANDES, S. F.; GOMES, R.; SILVA, C. M. F. P. Caracterização dos casos de violência doméstica contra a mulher atendidos em dois hospitais públicos do Rio de Janeiro. Cad Saúde Pública. v.16, p.129-37. 2006.

  • D'OLIVEIRA, A. F. P. L.; SCHRAIBER, L. B.; HANADA, H..; DURAND, J. . Atenção integral à saúde de mulheres em situação de violência de gênero: uma alternativa para a atenção primária em saúde. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 14, n.4, Ago. 2009.

  • DOSSI, A. P.; SALIBA, O.; GARBIN, C. A. S; GARBI, A. J. I. Perfil epidemiológico da violência física intrafamiliar: agressões denunciadas em um município do Estado de São Paulo, Brasil, entre 2001 e 2005. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 24, n.8, Ago. 2008.

  • GUEDES, R. N.; SILVA, A. T. M. C.; FONSECA, R. M. G. S. A violência de gênero e o processo saúde-doença das mulheres. Esc. Anna Nery, Rio de Janeiro, v.13, n.3, Set. 2009.

  • MINAYO, M. C. S.; SOUZA, E. R. Violência sob o olhar da saúde: a infrapolítica da contemporaneidade brasileira. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2003.

  • MINISTÉRIO DA SAÚDE. Secretaria de Vigilância em Saúde. Saúde Brasil 2006: uma análise da desigualdade em saúde. Brasília: MS; 2006.

  • ______________________. Secretaria de Vigilância em Saúde. Saúde Brasil: uma análise da situação de saúde. Brasília: MS; 2005.

  • MONTEIRO, C. F. S.; SOUZA, I. E. O. Vivência da violência conjugal: fatos do cotidiano. Texto contexto - enferm., Florianópolis, v. 16, n. 1, Mar. 2007 .

  • SCHRAIBER, L. B.; D'OLIVEIRA, A. F. P. L.; COUTO, M. T. Violência e saúde: estudos científicos recentes. Rev. Saúde Pública, São Paulo, v. 40, Ago. 2006.

  • SOUZA, E. R.; MINAYO, M. C. S. Inserção do tema violência contra a pessoa idosa nas políticas públicas de atenção à saúde no Brasil. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 15, n. 6, Set. 2010.

  • SOUZA, E. R. Masculinidade e violência no Brasil: contribuições para a reflexão no campo da saúde. Ciência & Saúde Coletiva. Vol. 10, p. 59-70. 2005.

  • VIAL, E. A.; ASQUIDAMINI, F.; JUNGES, J. R. Vulnerabilidades socioeconômicas e violência no contexto juvenil. In: ASQUIDAMINI, F.; VIAL, E. A. (orgs.). Sustentabilidade eis a questão: juventudes, trabalho e economia. São Leopoldo: ConTexto Gráfica, p. 31-42. 2010.

Outros artigos em Portugués

  www.efdeportes.com/
Búsqueda personalizada

EFDeportes.com, Revista Digital · Año 16 · N° 158 | Buenos Aires, Julio de 2011  
© 1997-2011 Derechos reservados