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Aspectos socioculturais na atuação do 

profissional de Educação Física e Esportes

Aspectos socioculturales en la práctica profesional de la Educación Física y el Deporte

Sociocultural aspects in the professional practice of Physical Education and Sports

 

Professor Doutor da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo

Pesquisador, membro da equipe da USP do Núcleo de Estudos, Ensino

e Pesquisa do Programa de Assistência Primária

de Saúde Escolar – PROASE

José Eduardo Costa de Oliveira

prof.zedu@usp.br

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          Observa-se no cenário brasileiro, a partir de 80, um reordenamento do trabalho em Educação Física, que era tido como um afazer tipicamente docente. Pois, nichos de mercado, a exemplo das academias de ginástica, clubes, spas e etc., ganharam grande espaço no Brasil, impulsionadas pela política de desobrigação do Estado, no que diz respeito à garantia aos direitos sociais, dentre eles a saúde. Na intenção de conhecer e analisar os aspectos socioculturais da atuação do profissional de EF e Esporte, o presente ensaio apresenta duas perspectivas para aqui tratar o tema. Na primeira, discutindo os principais nichos de atuação profissional para o bacharel, na sociedade contemporânea; e, por fim, analisando a possibilidade destas intervenções através de uma a ótica sociocultural. Ao longo do texto afirmou-se que a Educação Física e o Esporte devem ter uma atuação eminentemente cultural, e que, para que isso ocorra, ela necessita penetrar no universo das representações sociais. Reconhecendo-se que a área é uma representação do social, pois é o produto de uma prática simbólica que se transforma em outras representações. Acredita-se que a atuação profissional da EF está inserida num contexto que aponta um terreno fértil para nossa formação, pois apresenta uma grande variedade de opções de trabalho e que estão materializadas em diferentes práticas, em diversos contextos institucionais, profissionais, acadêmicos podendo, portanto, ser também identificada por variados objetos de conhecimento.

          Unitermos: Aspectos socioculturais. Atuação profissional. Educação Física. Esporte.

 

Resumen

          Se observa en el escenario brasileño a partir de 1980, una reorganización del trabajo en Educación Física, que era visto como una tarea típicamente docente. De esa manera, distintos nichos de mercado como los gimnasios, clubes, spas, etc., ganaron grandes espacios en Brasil, impulsados por la política de abandono del Estado, en lo que respecta a garantizar los derechos sociales, incluida la salud. Con la intención de comprender y analizar los aspectos socioculturales de la práctica profesional de la Educación Física y el Deporte, se presentan aquí dos enfoques para abordar la cuestión. En primer lugar, discutir los campos de desempeño profesional para el profesor en la sociedad contemporánea y, por último, considerar la viabilidad de estas intervenciones a través de una perspectiva sociocultural. A lo largo del texto se afirma que la Educación Física y el Deporte debe ser una actividad eminentemente cultural, y que para que eso suceda, es necesario penetrar en el universo de las representaciones sociales. Reconociendo que el área es una representación de lo social, porque es el producto de una práctica simbólica que se convierte en otras representaciones. Se cree que los profesionales de Educación Física se encuentran en un contexto que sugiere un terreno fértil para nuestra formación, ya que ofrece una amplia variedad de opciones de trabajo y están incorporados en las diferentes prácticas en diversos contextos institucionales, profesionales, académicos y por lo tanto pueden también ser identificados por varios objetos de conocimiento.

          Palabras clave: Aspectos socioculturales. Desempeño profesional. Educación Física y Deporte.

 

Abstract

          It’s observed in the Brazilian scenario, from 80, a reorganization of work in Physical Education, which was viewed as a typically-do - teaching. For niche markets, like the gyms, clubs, spas, etc., Won wide space in Brazil, driven by the policy of disengagement of the state, with regard to ensuring social rights, including health. In the intention to understand and analyze the sociocultural aspects of the professional practice of physical education and sports, this paper presents two approaches to address the issue here. At first, discussing the niche of professional performance for the bachelor, in contemporary society and, finally, considering the feasibility of these interventions through a sociocultural perspective. Throughout the text it was stated that the Physical Education and Sports should be an eminently cultural activities, and that for that to happen, it needs to penetrate the universe of social representations. Recognizing that the area is a representation of the social, because it is the product of a symbolic practice that turns into other representations. It is believed that the professional EF is set in a context that suggests a fertile ground for our training as it offers a wide variety of job options and is embodied in different practices in various institutional contexts, professionals, academics and therefore can also be identified by various objects of knowledge.

          Keywords: Sociocultural aspects. Professional performance. Physical Education and Sport.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 16 - Nº 158 - Julio de 2011. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Observa-se no cenário brasileiro, a partir de 80, um reordenamento do trabalho em Educação Física (EF), que era tido como um afazer tipicamente – docente. Pois, nichos de mercado, a exemplo das academias de ginástica, clubes, spas e etc., ganharam grande espaço no Brasil, impulsionados pela política de desobrigação do Estado, no que diz respeito à garantia aos direitos sociais, dentre eles a saúde (BRACHT e CRISÓRIO, 2003).

    Além disso, destaca-se que o contexto histórico atual da formação profissional, que sofre profundas transformações, oriundas de modificações nas práticas econômicas, políticas, sociais, culturais, entre outras, exigindo, portanto, uma reestruturação da sociedade nos seus mais diferentes setores (MOLINA NETO e MOLINA, 2003).

    Devido ao avanço da ciência e da tecnologia, esse processo de mudanças altera a estrutura do sistema de produção e de contratação, bem como requer também novas exigências profissionais (novos conhecimentos, habilidades, atitudes e valores). Neste contexto, o trabalho em EF transcende os muros escolares, sendo que, é ainda nos anos 80, sob o parecer do CNE 03/87, que se viu a divisão da - formação profissional - em licenciatura e bacharelado (BRACHT e CRISÓRIO, 2003).

    Nessa esteira da divisão da formação em EF em licenciatura e bacharelado, o intuito desse segundo, viés do presente ensaio é a formação para atuação nos campos de trabalho - não escolares – descaracterizando-o do tradicional trabalho assalariado do magistério e o caracterizando como um profissional liberal, flexível, mais empreendedor. Nessa vertente, é possível a formação do profissional com ênfase na saúde ou no esporte.

    A formação dos profissionais é feita em curso de graduação, diferente da licenciatura, que visa atender às diferentes manifestações da cultura do movimento e dos esportes presentes na sociedade. Por formação profissional, entende-se como um processo sempre inacabado, em constante movimento de reconversão; e a escola reconhecida como um espaço privilegiado para tal (NOVOA, 2007).

    Para o ensaio, estar em formação implica num investimento pessoal, um trabalho livre e criativo sobre os percursos e os projetos próprios, com vista à construção de uma identidade, que é também uma identidade profissional.

    Processo que costuma acontecer com os estudantes cursando um eixo comum, durante os dois primeiros anos, e, definindo nos dois últimos, a ênfase que será dada a sua formação.

    As disciplinas que fazem parte deste currículo estão agrupadas em seis grandes áreas do conhecimento: conhecimento do homem e da sociedade; científico e tecnológico; do corpo humano e desenvolvimento; didático- pedagógico; técnico-funcional aplicado e conhecimentos sobre a cultura do movimento (MOLINA NETO e MOLINA, 2003).

    Considerando o que foi supracitado, e, na intenção de conhecer e analisar os aspectos socioculturais da atuação do profissional de EF e Esporte, o presente ensaio apresenta duas perspectivas para aqui tratar o tema. Na primeira, discutindo os principais nichos de atuação profissional para o bacharel na sociedade contemporânea; e, por fim, analisando a possibilidade destas intervenções através de uma a ótica sociocultural.

    Assim, em qualquer que seja o viés da formação na EF (bacharelado e a licenciatura), o estudante é forjado para intervir profissional e academicamente no contexto específico, a partir de conhecimento de natureza técnica, científica e cultural. É preciso considerar também as características regionais e os diferentes interesses identificados com o campo de atuação profissional.

    Existem trabalhos que identificam mais de 30 atuações possíveis para esses profissionais, sendo que, em todos os setores é o profissional de EF quem define o tipo de atividade física mais indicada para cada pessoa, orientando-a quanto à postura, intensidade e freqüência de cada exercício, sempre, norteados pelos objetivos dos beneficiários (PILATTI E VLASTUIN, 2005).

    De forma bem sintetizada, mas, por auxiliar na discussão, bem como por ter vinculo direto com os processos de atuação profissional, ao se discutir a formação profissional verifica-se que esse procedimento é fundamental na construção do professor/profissional e no exercício de suas próprias atitudes e ações, considerando o caráter político do trabalho docente/profissional, a articulação entre teoria e prática, o trabalho coletivo e a consciência do caráter subjetivo e social da intervenção profissional.

    Paralelamente, a formação continuada em EF também não pode ser esquecida, em face da necessidade permanente de atualização profissional. Pois, as transformações socioculturais da sociedade vêm provocando profundas mudanças e alterando as necessidades da população brasileira (MOLINA NETO e MOLINA, 2003).

    Hoje, a atividade física e a prática esportiva formal e informal são direitos dos cidadãos definidos na Constituição e constituem-se num meio efetivo para a conquista de um estilo de vida ativo dos seres humanos, reconhecido como importante fator para a qualidade de vida de toda a população.

    Portanto, é nesse mesmo sentido que a formação continuada deverá atender à necessidade do profissional compreender a natureza dinâmica do conhecimento especializado e obter a competência do desenvolvimento intelectual e profissional autônomo e permanente (MOLINA NETO e MOLINA, 2003).

    Desta forma, destaca que as novas diretrizes curriculares sinalizam para a preparação de um profissional adaptável a situações novas e emergentes; tendo progressiva autonomia profissional; e possuindo condições para contribuir na produção de conhecimentos.

    Aprender a aprender, aprender a fazer aprender a ser - são termos utilizados na linguagem das diretrizes que buscam referenciar a preparação do profissional, balizadas pelo parecer CNE1/2001, que assevera que a educação continuada é parte do desenvolvimento de um estado de alerta proporcionado ao aluno, ainda na formação inicial, quanto à dinâmica da produção do conhecimento técnico e científico, fator que caracteriza os cursos de graduação como o passo inicial de uma longa caminhada de formação profissional (BRACHT E CRISÓRIO, 2003).

Principais nichos de atuação profissional para o bacharel em Educação Física

    Portanto, na área do bacharel em EF, diversas são as possibilidades contemporâneas de atuação, delegando os profissionais a poderem operar nos diversos segmentos da organização social, quer sejam públicas ou particulares, com exceção do sistema escolar.

    Como exemplos, cita-se: o técnico em esportes (atuante da iniciação ao alto nível, do competitivo ao recreativo); o professor de academias (das atividades aquáticas, nas ginásticas de solo, incluindo-se a musculação, o pilates, as artes marciais e etc.).

    Esta atuação profissional também pode se dar nos clubes recreativos e esportivos, ou nas associações atléticas, nas associações classistas e no desporto comunitário.

    Como um novo campo, surgido após o fim do século XX, estão também os hospitais (como os profissionais incluindo-se em programas de reabilitação, onde os processos de fomento de alguma capacidade física seja necessário à completa reabilitação do paciente); em hotéis (em programas recreativos, lúdicos, e com esportes de aventura principalmente); e em spas (em programas de condicionamento físico e emagrecimento).

    Em programas específicos com a primeira infância (nos processos de aprimoramento e desenvolvimento motor destes); em programas específicos para terceira idade (na prevenção e promoção da saúde, frente aos processos de envelhecimento do organismo humano); em programas de EF adaptada (na inclusão e no desenvolvimento motor e intelectual dos portadores de necessidades especiais).

    Em programas de ginástica laboral em empresas e indústrias (na prevenção das enfermidades oriundas das diferentes atividades profissionais); na organização e arbitragem de torneios esportivos (nas mais diversas modalidades, tanto na atuação como árbitros, mesários, fiscais e etc.).

    Enquanto Personal Trainer (que apesar do vínculo com as atividades do professor de academia, constitui um dos principais nichos, em relação ao numero de vagas disponíveis no mercado contemporâneo para o bacharel, principalmente pelo fato desta intervenção ter transcendido o próprio ambiente da academia, para a atuação nas residências, parques, nas corridas de rua e no forte apelo estético, tão valorizados pela sociedade contemporânea, na busca por este tipo de serviço).

    Na organização e supervisão de eventos esportivos; na recreação e no lazer (tanto nos processos de prescrição, bem como na orientação e empoderamento dos beneficiários para o uso correto do tempo livre do trabalho).

    E, como o mais recente e emergente nicho de atuação do profissional de EF e esporte, a – gestão esportiva - (atuando no gerenciamento, na direção, na gestão de pessoas e de recursos humanos, materiais e financeiros de academias, escolas, clubes e entidades esportivas, das mais variadas razoes sociais, que prestam serviços na área de atividade física e/ou de esportes).

    É nessa última – na gestão esportiva – que tem sido objeto de varias publicações e estudos, da abertura de vários cursos de pós-graduação (lato senso), no sentido de capacitar o profissional de EF, que sempre foi concebido para atuar enquanto licenciado e/ou bacharel, mas, sobretudo, enquanto um empregado (entenda-se funcionário, colaborador) nas instituições que oferecem serviços em EF. E que agora, vislumbra-se a possibilidade do profissional também ser concebido - enquanto um empreendedor - um empresário do ramo da atividade física. Colocado não só como gestor, mas, sobretudo enquanto proprietário desses estabelecimentos.

    Processo este que tem acontecido de maneira exponencial, em face da observação que se faz do grande numero de egressos das IES, e que abrem seus próprios negócios, principalmente no ramo das academias de ginásticas e nas clinicas ou estúdios de treinamento personalizado, de pilates, de natação e etc.

    O campo de atuação da administração esportiva poderá ainda estender-se a consultoria e a prestação de serviços a órgãos públicos, empreendimentos particulares e aos meios de comunicação de massa, no que se relacionar à EF e ao esporte.

    Portanto, depreende-se que o Profissional de EF e Esporte é especialista em atividades físicas, nas suas diversas manifestações – das ginásticas, dos exercícios físicos, dos desportos, jogos, lutas, danças, atividades rítmicas, expressivas e acrobáticas, da reabilitação e a ergonomia, do relaxamento corporal, ioga, exercícios compensatórios à atividade laboral, perpassando por outras práticas corporais, tendo como propósito prestar serviços que favoreçam o desenvolvimento da saúde, contribuindo para a capacitação e/ou restabelecimento de níveis adequados de desempenho e condicionamento físico-corporal dos seus beneficiários (CONFEF, 2001).

    Visando também à consecução do bem-estar e da qualidade de vida, da consciência, da expressão e estética do movimento, da prevenção de doenças, de acidentes, de problemas posturais, da compensação de distúrbios funcionais, contribuindo ainda para o fomento da autonomia, da auto-estima, da cooperação, da solidariedade, da integração, da cidadania, das relações sociais e a preservação do meio ambiente.

As intervenções profissionais, através de uma a ótica sociocultural

    Acerca da questão da possibilidade destas intervenções serem balizadas por uma ótica sociocultural, o presente ensaio afirma que historicamente, a EF e o esporte priorizaram e enfatizaram a dimensão biofisiológica em suas intervenções e práticas. Não que isto não seja legítimo para a área.

    Entretanto, também é a partir dos acontecimentos da década de 80 citada na introdução do presente ensaio, em razão de uma crise epistemológica que se instaurou na área, fruto da degradação de paradigmas que norteavam as reflexões e intervenções, sem que outros fossem satisfatórios o suficiente para substituí-los, verificou-se a presença de outros campos do saber, especialmente das ciências sociais e das ciências humanas, que emergiram no universo da EF e do esporte, participando dos seus debates, questionando esta predominância epistemológica e metodológica (FENSTERSEIFER, 2001).

    Nesse mesmo ínterim, novas questões advindas da percepção da complexidade das ações humanas tem sido trazidas por este outro campo científico (MAUSS, 1974).

    Sendo assim, passou-se a estudar a atividade física em uma visão mais ampla, priorizando a multidisciplinariedade, onde o homem cada vez mais deixa de ser percebido como um ser essencialmente biológico, para ser concebido segundo uma visão mais abrangente, onde se considera os processos sociais, históricos e culturais.

    Nesse sentido, afirma-se o quão se faz urgente à solidificação da concepção de EF e de esporte enquanto produção corporal e o corpo enquanto matriz de signos sociais e culturais.

    Pois, ainda segundo Geertz (1989), é por meio desse mecanismo chamado - cultura - que o homem adquiriu a capacidade de ser o construtor de sua própria história, desde a utilização de ferramentas, passando pelo convívio social, pela linguagem, chegando a outras formas mais complexas de significar o fazer humano.

    A EF, ao balizar-se nos conceitos de cultura, traz imbricada a necessidade de entender o que ela é, e como ela influencia as ações de um determinado grupo, sendo preciso também identificar e perceber como as pessoas são, como se relacionam, como agem e interagem.

    É necessário, portanto, ir além do visível, mergulhar de fato no significado das ações desenvolvidas pelos indivíduos em suas diferentes sociedades.

    Percebe-se a partir dessa visão, que mais do que uma decorrência biológica, a questão cultural é essencial para o desenvolvimento humano, pois, os aspectos culturais transcendem fronteiras e necessitam ser decifrados como teias de significados que obtêm sentidos próprios.

    Os conceitos e definições de cultura propostos por Geertz, e que balizam a ótica deste ensaio, tem forte influência das idéias de Max Weber. Uma vez que para este - “o homem é um animal amarrado a teias de significados que ele mesmo teceu” (GEERTZ, 1989. p. 41).

    Portanto, foi o convívio entre povos quem teceu esta teia de significados supracitada, que foram ganhando densidade ao longo da história da humanidade. Significados estes, que por sua vez, estão em constante processo de re-significação.

    Ainda nessa linha de raciocínio, faz-se necessário lembrar que o ser humano não deve ser visto de forma que as relações entre os fatores biológicos, psicológicos, sociais e culturais da vida humana estariam compostos de níveis superpostos aos inferiores e reforçando os que estão acima dele. E sim, deve ser visto de forma sintética, na qual todas as relações entre os itens apontados acima estão em constante sintonia, não sendo possível analisar um, sem a influência do outro.

    É essa compreensão da necessidade de uma construção própria para as ações humanas e a relação delas com a vida cotidiana das pessoas que deve pautar as reflexões afetas à EF e o Esporte. O entendimento dado a ele é o de que as intervenções na área devem ser realizadas em situações específicas, com significados próprios a cada grupo, que dela tem acesso.

    Neste sentido, a noção de construção cultural é fundamental para a compreensão de como devem ser desenvolvidas estas mesmas intervenções, o que justifica a importância de se discutir qual a influência que os aspectos culturais têm sobre elas.

    A Cultura corporal e a EF e o Esporte, relacionados ao significado atribuído à cultura é o ponto de partida da ótica do presente ensaio; é ele que dá subsídios para as discussões sobre as formas de manifestações culturais que estão relacionadas ao “corpo”.

    Formas que são absorvidas ativamente, recebendo um sentido, um significado no próprio processo de recepção, e, portanto, que vão adotando significados diferentes em sociedades distintas.

    Obviamente, que a priori, estas formas e significados não se tornam acessíveis, ao menos de imediato, a todos os atores que fazem parte desse contexto. Decifrá-las, portanto, é uma das tarefas a ser cumprida pelos professores, uma vez que o comportamento das pessoas também é “condicionado”, em grande parte, pelas regras sociais estabelecidas culturalmente. Regras estas construídas com base num significado simbólico, que toma forma aos poucos.

    De acordo com essa idéia, pode-se afirmar que o processo cultural delimita, em grande parte, como as pessoas escolherão suas formas de manifestarem-se nas mais diversas situações, inclusive, em relação às questões afetas ao seu corpo.

    Afirma-se também, ser inegável a existência de conjuntos de motivações orgânicas que conduzem os seres humanos a determinados tipos de comportamento. A cada uma dessas motivações biológicas, a cultura atribui uma significação especial, em função da qual assumirá determinadas atitudes e desprezarão outras.

    Percebe-se, em conseqüência disso, que não há comportamento que não passe pela influência cultural, e é sobre a égide dessa influência que os corpos também são formados.

    Por cultura corporal de movimento, entende-se "aquela parcela da cultura geral que abrange as formas culturais que se vêm historicamente construindo, nos planos material e simbólico, mediante o exercício da motricidade humana - jogo, esporte, ginásticas e práticas de aptidão física, atividades rítmico-expressivas e dança, lutas/artes marciais" (BETTI, 2001).

    A motricidade humana é entendida como capacidade de movimento do ser humano para a transcendência, e como agente e criadora de cultura (REZER, 2006).

    Assim, percebe-se que o ser humano modifica constantemente seu corpo, sem se dar conta da importância e da ligação entre essa necessidade e o resto de suas relações sociais.

    Nos achados de Daólio (1995) percebe-se um entendimento parecido a esse, quando o autor afirma que o homem, por meio do seu corpo, pode assimilar e se apropriar dos valores, normas e costumes sociais, num processo que ele denomina de inCORPOração.

    Essa incorporação, nada mais é do que o processo pelo qual os seres humanos passam a internalizar em seus corpos os valores que estão contidos na sociedade, e assim, balizam a forma como se movimentam, e, por conseqüência, esse mesmo "movimentar-se" e o "comportar-se", moldam seus corpos.

    Obviamente, que se o corpo passa a ser compreendido, no que diz respeito ao seu “desenvolvimento”, numa perspectiva cultural, pode-se inferir que a cultura deve ser entendida como um dos principais conceitos para a EF e para o Esporte.

    Acrescenta ainda, que quando se assume essa postura, ou seja, de que a EF deva ter uma atuação eminentemente cultural, há que se considerar primeiro a história, a origem e o local daquele grupo específico, e depois, suas representações sociais, trazidas juntas pelas suas necessidades, seus valores e seus interesses.

    Nota-se pelas afirmações feitas pelo texto até o momento, que o corpo não foge as influências culturais, que ele é o meio de expressão fundamental do ser humano, expressão essa que se dá pela interlocução do movimento. Sendo assim, não há possibilidade de existência de uma dimensão física isolada da sua totalidade.

    Assim, o presente ensaio, ao se debruçar sobre estas questões, mesmo que de forma sintética, propõe que mudanças sejam feitas na forma de olhar dos que atuam com a EF e o Esporte.

    Mudanças essas que necessitam fazer com que os professores viabilizem os processos de entendimento dos aprendizes sob sua tutela, entendam que o homem não nasceu executando movimentos e gestos esportivos. Todas essas atividades corporais foram construídas em determinadas épocas históricas, como respostas a determinados estímulos, desafios, ou necessidades humanas.

    Essa percepção reforça a necessidade de se compreender que o ser humano é mais do que um ser determinado biologicamente, como já mencionado; entenda-se – determinado geneticamente - uma vez que ele é fruto da cultura em que vive.

    A contribuição das discussões sobre as questões culturais são fundamentais para a EF e para o Esporte, e isso está justamente na possibilidade de propiciar uma mudança no seu olhar sobre o corpo, para, conseqüentemente, não observá-lo – apenas – através de uma visão estritamente biológica e apto a desenvolver capacidades físicas resultantes de estímulos – também apenas - fisiológicos e/ou biomecânicos.

    Portanto, não mais a partir de uma visão segmentada, cartesiana, e sim, mais sistêmica do sujeito, e de como ele se movimenta.

    A visão de um corpo essencialmente biológico afasta a área de uma compreensão ampla do ser humano, da compreensão de que são os significados atribuídos pela sociedade que definem o que é corpo e como ele age nas mais diferentes situações.

    Nesse sentido, observar o trabalho da área com essa lente permite afirmar que é necessário garantir aos educandos no processo de formação profissional, o ensino dos jogos, das lutas, da dança, da ginástica e outras manifestações culturais do movimento humano de uma forma contextualizada, possibilitando a aquisição de um olhar crítico sobre as informações que lhes são transmitidas.

    Pois somente assim, a compreensão do que se faz com o próprio corpo poderá ser re-significada e, percebida dentro de um contexto que pode ser lido como a cultura o pode.

Considerações finais

    Face ao que foi exposto, numa perspectiva de uma análise conclusiva, o presente ensaio afirma que após essa breve discussão acerca da influência dos aspectos culturais sobre o que se faz, e como se enxerga o próprio corpo, e a relação disso com as intervenções da Educação Física e o Esporte, é um equívoco continuar a imaginar o ser humano fragmentado em biológico, sócio-cultural e psicológico.

    Neste contexto, percebe-se também, que mais do que uma conseqüência biológica, a cultura é fundamental para a “evolução” do ser humano, pois toda ação humana é considerada um ato social que obtém, tem e transmite significados diferentes, dependendo da sociedade em que ocorre.

    As intervenções em Educação Física e esporte devem superar o ensino, apenas, das modalidades e técnicas esportivas, e, principalmente, o ensinar por ensinar.

    Os professores devem estar atentos aos interesses dos alunos, reconhecendo e respeitando o aporte cultural de cada um, garantindo com isso o ensino contextualizado das manifestações relativas à cultura corporal de movimento, possibilitando que os alunos adquiram senso crítico em relação ao que lhes é transmitido.

    Ao longo do texto afirmou-se, também, que a Educação Física e o Esporte devem ter uma atuação eminentemente cultural, e que, para que isso ocorra, ela necessita penetrar no universo das representações sociais. Reconhecendo-se que a área é uma representação do social, pois é o produto de uma prática simbólica que se transforma em outras representações.

    Acredita-se que a atuação profissional da EF está inserida num contexto que aponta um terreno fértil para nossa formação, pois apresenta uma grande variedade de opções de trabalho e que estão materializadas em diferentes práticas, em diversos contextos institucionais, profissionais, acadêmicos podendo, portanto, ser também identificada por variados objetos de conhecimento.

    O profissional de EF desempenha suas atividades relacionadas com a aquisição e controle do movimento. Atua sob diversas formas na expressão corporal, sistematizadas no campo educacional, do rendimento esportivo, do lazer, na educação motora, da reabilitação, da gestão de empreendimentos relacionados com as atividades físicas, com o esportivo e o lazer, sendo desenvolvidas através de atividades de ginásticas, esportes, lutas, danças, jogos, recreação e do ensino personalizado, entre outros.

    Assim, é que se encera afirmando que o graduado em EF e esporte está habilitado para intervir na sociedade como professor/pesquisador nos diversos níveis de ensino, desempenhar funções burocráticas (verificação de súmulas, criar tabelas de campeonato, etc.), podendo ainda prestar orientação técnica, assessoria e consultoria a órgãos e instituições públicas e privadas na educação e em equipes multidisciplinares na área da saúde e no ensino personalizado.

Referências bibliográficas

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