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Reabilitação vestibular em idosos. Revisão de literatura

Rehabilitación vestibular en personas mayores. Una revisión de la literatura

Vestibular rehabilitation in elderly people. Review

 

*Fisioterapeuta UFVJM, especialista em fisiologia do exercício

Mestre em Fisiologia e Farmacologia UFMG

Doutorando em fisiologia e farmacologia UFMG

**Fisioterapeuta UFVJM, especialista em acupuntura

***Fisioterapeuta PUC-Minas. Especialista em Fisioterapia Neurológica UFMG

Mestrado em Fisiologia e Farmacologia UFMG

Doutoranda em Fisiologia e Farmacologia UFMG;

****Professora Assistente do curso de Fisioterapia

da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri

Hércules Ribeiro Leite*

Débora Alves de Ávila Bueno**

Luciana Estefani Drumond***

Alessandra de Carvalho Bastone****

alebastone@hotmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          A disfunção vestibular assume particular importância na população idosa, pois, o aumento da idade é diretamente proporcional à presença de múltiplos sintomas otoneurológicos associados, tais como vertigem e outras tonturas, perda auditiva, zumbido, alterações do equilíbrio corporal, distúrbios da marcha e quedas ocasionais. A Reabilitação Vestibular (RV) é um procedimento terapêutico moderno, fisiológico, inócuo e eficaz, cujo objetivo é restaurar o equilíbrio do paciente, acelerando os mecanismos de compensação central. Assim, através de mecanismos tais como a compensação, habituação e substituição, a RV levará a uma recuperação funcional do desequilíbrio corporal por meio da neuroplasticidade no Sistema Nervoso Central. É Através de exercícios específicos que propiciam situações de desequilíbrio, com movimentos da cabeça, coluna cervical e olhos, podendo estar associados com a marcha, exercícios de controle postural e exercícios de condicionamento geral que os sintomas das desordens vestibulares diminuem consideravelmente, possibilitando melhoras no equilíbrio, redução das quedas, recuperação da função psicológica e aumento significativo na qualidade de vida desses pacientes.

          Unitermos: Idosos. Reabilitação vestibular. Equilíbrio.

 

Abstract

          The vestibular disorder assumes a particular importance among the elderly, so the increase of the age is directly proportional to the presence of several otoneurological symptoms, such as vertigo and other dizziness’s, audition loss, tinnitus, postural instability, gait impairments and accidentals falls. The Vestibular Rehabilitation (VR) is a modern therapeutic technique, physiologic, harmless and effective, whose aim is to restore the patient balance, increasing the mechanisms of central compensation. Therefore, across of mechanisms such as compensation, habituation and substitution, the VR will guide to a functional recovery in balance disturb through neuroplasticity in central nervous system. It is through specifics exercise that permit disturbance in balance, with head movements, cervical spine and eyes, that can be associated with the gait, postural control exercises and conditioning global exercises, permitting increases in balance, and significant decreases in falls, recovery of psychological function and increases in health quality of life of those patients.

          Keywords: Elderly. Vestibular rehabilitation. Balance.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 16 - Nº 156 - Mayo de 2011. http://www.efdeportes.com/

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    O Sistema Vestibular (SV) é responsável por informar a posição e o movimento da cabeça, provendo-nos do sentido do equilíbrio, auxiliando na coordenação dos movimentos da cabeça e dos olhos e nos ajustes da postura corporal (BEAR e cols., 2002). Esse sistema é constituído por três componentes: um sistema sensorial periférico, um processador central e um mecanismo de resposta motora. O aparelho periférico consiste num conjunto de sensores do movimento, os quais enviam informações ao Sistema Nervoso Central (SNC). As informações sobre a força da gravidade, inclinação e rotação da cabeça são detectadas pelos órgãos otolíticos e canais semicirculares (CSC), e enviadas especificamente ao complexo nuclear, vestibular e ao cerebelo (Figura 1) (HERDMAN, 2002).

Figura 1. O labirinto Vestibular. Localização dos órgãos otolíticos (utrículo e sáculo) e canais semicirculares

Fonte: Bear e cols. Neurociências: Desvendando o sistema nervoso. São Paulo: Manole, 2002

    O SNC processa essas informações combinando-as entre si e gera respostas por meio de reflexos que melhoram o controle postural e a orientação do corpo em relação ao espaço, permitindo ao indivíduo realizar suas atividades diárias. Os mais importantes são o Reflexo Vestíbulo-Ocular (RVO) e o Reflexo Vestíbulo-espinhal (RVE), sendo que o RVO permite a estabilização do olhar durante o movimento de cabeça e o RVE gera um movimento corpóreo de compensação com o objetivo de manter a estabilidade da cabeça e do corpo (NISHINO e cols., 2005).

Hipofunção vestibular e envelhecimento

    Com o envelhecimento, ocorre uma redução no número de células ciliares e de neurônios vestibulares, provocando alterações nas funções dos CSC. Além disso, também ocorrem alterações degenerativas nas otocônias dos utrículos e do sáculo (localizados nos órgão otolíticos) com o aumento da idade (HERDMAN, 2002).

    A hipoatividade inerente ao processo de envelhecimento contribui para a diminuição dos inputs sensoriais globais no idoso. Em se tratando do SV, a diminuição destes inputs determinaria um atraso e/ou uma menor eficácia na elaboração das respostas motoras necessárias à manutenção de equilíbrio, o que estará diretamente associado com a presença de quedas (RIBEIRO e PEREIRA, 2005).

    Quando o conjunto de informações visuais, labirínticas e proprioceptivas não é integrado corretamente ao SNC, origina-se uma perturbação do estado de equilíbrio, que pode ser manifestada por desequilíbrio, podendo culminar com o evento de quedas. O envelhecimento pode ser responsável por estes distúrbios. Os idosos podem apresentar dificuldade para regular refinadamente os estímulos, que pode ser melhorada através de programas específicos de treinamento. (RIBEIRO e PEREIRA, 2005).

    O controle postural pode sofrer influências decorrentes das alterações fisiológicas do envelhecimento, de doenças crônicas, de interações farmacológicas ou disfunções específicas. O processo de envelhecimento afeta todos os componentes do controle postural – sensorial (visual, somatossensorial e vestibular), efetor (força, amplitude de movimento, alinhamento biomecânico, flexibilidade) e processamento central. A integração dos vários sistemas corporais sob o comando central é fundamental para o controle do equilíbrio corporal (GAZZOLA e cols., 2006).

    Aratani e cols., (2006) realizaram um estudo onde 43 idosos (68,8% do gênero feminino) com média de idade de 73,5 anos, foram submetidos ao Brazilian OARS multi-dimensional functional assesment questionaire para avaliar a capacidade funcional de idosos com disfunção vestibular crônica. A doença vestibular e o diagnóstico sindrômico/topográfico tiveram prevalência respectivamente para VPPB (23,3%) e síndrome vestibular periférica deficitária unilateral (30,6%) e quanto à capacidade funcional, as atividades comprometidas tiveram média de 6,14 (+/- 4,11), sendo que 48,8% tiveram dificuldade em sete ou mais atividades, das quinze avaliadas. Cortar as unhas do pé foi a atividade física de vida diária com maior dificuldade (69,8%); subir e descer escadas (74,4%); entre as atividades instrumentais fazer compras (55,8%); sair de condução (55,8%) e limpar a casa (51,2%) foram as mais difíceis, concluindo assim, que a maioria dos idosos com tontura crônica e hipótese diagnosticada de síndrome vestibular, apresentam limitações na capacidade funcional. capacidade funcional, as atividades comprometidas tiveram mS multi-dimensional functional assment questionaire para avaliar a

Epidemiologia das desordens vestibulares

    O envelhecimento populacional no Brasil está ocorrendo de modo acelerado, com aumento relevante na prevalência de doenças crônico-degenerativas. Esta população de idosos tende a apresentar múltiplas comorbidades que potencializam grandes síndromes geriátricas como queda, iatrogênia, demência, imobilismo, que comprometem a independência e a autonomia destes pacientes, gerando incapacidades, fragilidade, institucionalização e morte (GAZZOLA e cols., 2006).

    A disfunção vestibular assume particular importância na população idosa, pois, o aumento da idade é diretamente proporcional à presença de múltiplos sintomas otoneurológicos associados, tais como vertigem e outras tonturas, perda auditiva, zumbido, alterações do equilíbrio corporal, distúrbios da marcha e quedas ocasionais, entre outros (GAZZOLA e cols., 2006).

    As citações sobre a prevalência da vertigem são diversas. É presente em 5 a 10% da população mundial; sétima queixa mais encontrada em mulheres e quarta nos homens; afligem 47% dos homens e 61% das mulheres com mais de 70 anos; a queixa mais comum após os 75 anos de idade; o segundo sintoma mais comum até os 65 anos e o mais comum após os 65 anos; presente em 65% dos indivíduos com 65 anos ou mais, 50% a 60% dos idosos que vivem na comunidade ou em 81 a 91% dos idosos atendidos em ambulatórios geriátricos (GAZZOLA e cols., 2006).

    As síndromes otoneurológicas mais freqüentes encontradas nos idosos são Vertigem Posicional Paroxística Benigna (VPPB), Doença de Ménière, Labirintopatias Vasculares, Labirintopatias metabólicas, Presbivertigem/ Presbiataxia/Presbitinnitus/Presbiacusia, Neurite Vestibular, Trauma labiríntico, Otoxicoses, Síndrome Cervical, Migrânea Vestibular, Surdez súbita, Doenças Imunomediadas, Schwannoma Vestibular, Insuficiência Vértebro-basilar e Esclerose Múltipla (GAZZOLA e cols., 2006).

    Kanashiro e cols., (2005) em um estudo retrospectivo investigou a freqüência das síndromes vestibulares em 512 pacientes em um ambulatório de vertigem, assim, foi verificado como sendo as principais desordens vestibulares: VPPB (35%), Vertigem postural Fóbica (15%), Vertigem Central (12%), Neurite Vestibular (12%), Doença de Ménière (11%), Enxaqueca (8%) e outros (7%). Além disso, esse mesmo estudo relacionou a distribuição de freqüência das síndromes vestibulares, da média de idade e de gênero dos pacientes (Tabela 1).

Tabela 1. Distribuição de freqüência das síndromes vestibulares, da média de idade e de gênero dos pacientes em um ambulatório de vertigem

Fonte: Kanashiro e cols. Diagnóstico e tratamento das principais síndromes

vestibulares. Arq Neuropsiquiatr 2005;63(1): 140-144

    A prevalência de afecções do SV é maior no sexo feminino, principalmente com o aumento da idade (VOLPI e NAVARRO, 2006), sendo que os tipos mais freqüentes são a VPPB (VOLPI e NAVARRO, 2006; HANDA e cols., 2005; DORIGUETO e cols., 2005; TEIXEIRA e MACHADO, 2006; MAIA e cols., 2001; GANANÇA e cols., 2005; PEREIRA e SCAFF, 2001) e a Doença de Ménière. A VPPB tem como causa comum a disfunção vestibular periférica, principalmente no idoso (VOLPI e NAVARRO, 2006), sendo que aos 70 anos 30% já apresentaram pelo menos um episódio de VPPB. Apesar da sua alta prevalência, é pouco diagnosticada, sendo estimado que a sua prevalência seja de 107 casos por 100000 habitantes/ano (DORIGUETO e cols., 2005).

Etiologia e quadro clínico das disfunções vestibulares

    Muitos são os sintomas que podem estar associados às queixas de vertigem e a outros tipos de tontura. Dentre eles, os sintomas otoneurológicos (zumbido, hipoacusia, otalgia, cefaléia e náusea, por exemplo) e psicológicos (ansiedade, depressão e medo) (PAIVA E KUHN, 2004). Sendo a ansiedade e depressão encontradas em alta incidência em pacientes labirínticos (VOLPI e NAVARRO, 2006).

    Dentre a variedade de sinais e sintomas encontrados nas disfunções vestibulares periféricas que envolvem os órgãos terminais vestibulares e/ou o nervo vestibular, encontram-se como determinantes as principais disfunções que se seguem: VPPB, Doença de Ménière e Neurite Vestibular (HERDMAN, 2002).

    A fisiopatologia da VPPB é explicada pela presença de cristais de carbonato de cálcio, que seriam fragmentos degenerados de otocônias do utrículo, deslocados para a região dos CSC, quase sempre no CSC posterior. Duas teorias são aqui levantadas. Na primeira teoria, chamada de Cupulolitíase, os fragmentos ficariam aderidos à cúpula do CSC posterior. Essa teoria foi descrita e evidenciada por Schuknecht, que, em 1962, encontrou esses cristais depositados na superfície da cúpula do CSC posterior em dois pacientes com quadro clínico de VPPB. A segunda teoria, chamada de Canalitíase ou Ductolitíase, sugere que os fragmentos degenerados não ficariam aderidos à cúpula, mas, sim, flutuando na endolinfa do CSC posterior. Em ambas as teorias, o movimento desencadeante da cabeça do paciente promoveria a movimentação dos fragmentos, que, por sua vez, acarretaria uma estimulação inapropriada da cúpula do CSC posterior e excitação do nervo ampular posterior, com os sintomas de vertigem (MAIA e cols., 2001).

    O mecanismo exato pelo qual as partículas saem do utrículo e caem no CSC, não é definida na maioria dos casos (VOLPI e NAVARRO, 2006; PEREIRA e SCAFF, 2001). Observou-se que aproximadamente 50% dos casos são idiopáticos, enquanto trauma, neurite vestibular, isquemia vértebro-basilar, pós-operatório, repouso prolongado, são as causas mais frequentemente encontradas (PEREIRA e SCAFF, 2001).

    Tipicamente o paciente com VPPB descreve ataques de vertigem rotatória de curta duração (>45 segundos) e de forte intensidade desencadeados por movimentos rápidos da cabeça, sendo os mais freqüentes os seguintes: levantar-se da cama pela manhã, deitar e virar na cama, estender o pescoço para virar para o alto e fletir o pescoço para olhar para baixo (VOLPI e NAVARRO, 2006; HANDA e cols., 2005; DORIGUETO e cols., 2005; MAIA e cols., 2001; GANANÇA e cols., 2005; PEREIRA e SCAFF, 2001).

    A doença de Ménière é atualmente reconhecida como a expressão clínica de uma síndrome idiopática de hipropisia endolinfática (localizado na orelha interna), caracteriza pela tríade sintomática composta por zumbido, perda auditiva e vertigem, em episódios paroxísticos (HERDMAN, 2002; BOAGLIO e cols., 2003).

    A doença de Ménière é caracterizada por crises vertiginosas recorrentes, com duração que varia de 4 a 72 horas. A perturbação da orientação espacial pode ser intensa e, e geralmente é acompanhada de instabilidade corporal, desvio da marcha e perda do equilíbrio, além de sintomas neurovegetativos que incluem mal estar, sudorese, taquicardia, palidez, micção e/ou defecação espontânea (HANDA e cols., 2005), nistagmo, e desequilíbrio postural (HERDMAN, 2002).

    A Neurite vestibular é a segunda causa mais comum da vertigem. O início é geralmente precedido pela presença de uma infecção viral do trato respiratório superior ou do gastrointestinal. O principal sintoma é um início agudo da vertigem rotacional grave e prolongada exacerbada pelo movimento encefálico e associada ao nistagmo horizonto-rotatório espontâneo na direção da orelha saudável, ao desequilíbrio postural e à náusea (HERDMAN, 2002).

Diagnóstico e avaliação da função vestibular

    O Diagnóstico das vestibulopatias baseia-se nos relatos da história clínica, além dos exames e testes complementares e específicos.

    A história clínica envolve a coleta de dados, através de uma anamnese detalhada com intuito de analisar minuciosamente as queixas do paciente relacionadas aos movimentos e posturas que desencadeiam o quadro clínico.

    Dentre os exames e testes complementares específicos encontram-se: exames otorrinolaringológicos, audiometria tonal liminar, discriminação vocal, imitânciometria, pesquisa do equilíbrio estático e dinâmico (por exemplo, através da escala de equilíbrio de Berg), eletronistagmografia computadorizada (ENG), (DORIGUETO e cols., 2005), vestibulometria (registro dos movimentos oculares) (NISHINO e cols., 2005) e manobras para verificar a presença VPPB (Dix-Hallpike e Manobra de posicionamento lateral) (DORIGUETO e cols., 2005; PEREIRA e SCAFF, 2001; BOAGLIO e cols., 2003).

Figura 2. (A) Manobra de Dix-Hallpike: A cabeça do paciente é rodada 45º para o lado que se quer examinar (A1). E em seguida o paciente é rapidamente colocado em decúbito 

dorsal, permanecendo com a cabeça rodada e inclinada para trás (A2). (B) Manobra de posicionamento lateral: a cabeça do paciente é rodada 45º para o lado oposto àquele que se 

deseja examinar (B1) e em seguida o paciente é rapidamente colocado em decúbito lateral, do lado examinado. A cabeça permanece rodada e o paciente olha ligeiramente para cima (B2).

Fonte: Pereira, BC e Scaff, M. Vertigem de posicionamento paroxística

benigna. Arq Neuropsiquiatr 2001;59(2B):466-470

    O diagnóstico da VPPB baseia-se na história clínica e no exame físico, uma vez que a vertigem e o nistagmo podem ser reproduzidos no consultório ao movimentar-se a cabeça do paciente para a posição de Dix-Hallpike e de posicionamento lateral (Figura 2) (BOAGLIO e cols., 2003). Ambas as manobras devem ser realizadas rapidamente, aumentando assim, a eficácia da manobra em deslocar o cálculo e provocar a vertigem o nistagmo (PEREIRA E SCAFF, 2001). O nistagmo aparece sempre após o período de latência de aproximadamente 5 segundos, sendo normalmente rotatório ou horizonto-rotatório, fatigável e revertendo de direção quando o paciente reassume a posição ortostática, quando do acometimento dos CSC posteriores; sendo horizontal quando do acometimento dos CSC laterais; e sendo vertical e inferior quando do acometido dos CSC superiores (BOAGLIO e cols., 2003).

    A constatação definitiva da alteração fisiopatológica que caracteriza a Doença de Ménière só pode ser comprovada por estudo anatomopatológico de ossos temporais (post mortem) e, portanto o seu diagnóstico deve ser baseado em critérios clínicos bem definidos (BOAGLIO e cols., 2003).

    Para que haja um direcionamento da terapia, é necessário identificar as alterações decorrentes de processos patológicos daqueles determinados pelo processo fisiológico do envelhecimento.

Reabilitação vestibular

    Existem três formas para o tratamento das disfunções labirínticas: a medicamentosa, a cirúrgica, e a reabilitação vestibular (RV) (VOLPI e NAVARRO, 2006; RIBEIRO e PEREIRA, 2004; KANASHIRO e cols., 2005). Alguns autores acrescentam, ainda, as mudanças dos hábitos e vícios inadequados (tabagismo, alcoolismo e erros alimentares) e, quando necessário, acompanhamento psicológico. Outros ressaltam que a RV é o melhor tratamento terapêutico e que pode ser usado com ou sem medicamento (RIBEIRO e PEREIRA., 2004; RESENDE e cols., 2003).

    A RV foi criada na Inglaterra em 1946 pelo médico Cawthorne e o fisioterapeuta Cookey, e implantada no Brasil há duas décadas. Essa reabilitação procura restabelecer o equilíbrio do paciente, permitindo que este realize os movimentos que estava acostumado a fazer antes de surgir a vertigem, sendo um procedimento terapêutico moderno, fisiológico, inócuo e eficaz, cujo objetivo é restaurar o equilíbrio do paciente, acelerando os mecanismo de compensação central (VOLPI e NAVARRO, 2006).

    Este método de tratamento visa por meio de exercícios físicos específicos, a provocar fenômenos fisiológicos de adaptação que consigam recuperar a orientação espacial e o equilíbrio estático e dinâmico. Seu objetivo é reaver a função de equilíbrio ou torna-la próxima do normal, permitindo que o paciente novamente execute os movimentos que realizava antes do distúrbio vestibular, reintegrando-o às atividades de vida diária (VOLPI E NAVARRO, 2006).

    Quando ocorre uma lesão vestibular, o SNC naturalmente efetua a recuperação funcional do desequilíbrio corporal, por meio da neuroplasticidade. Este mecanismo adaptativo do comportamento motor vestibular é chamado de compensação vestibular. Além deste mecanismo há também a adaptação a habituação e a substituição, mecanismos estes explorados na RV (NISHINO e cols., 2005).

    Na adaptação vestibular o sistema vestibular aprende a receber e processar informações, mesmo que inadequadas ou incompletas, adequando-as aos estímulos apresentados. A habituação vestibular é a correção ou a diminuição das respostas inadequadas, quando o sistema vestibular é estimulado e o organismo passa a responder de forma adequada (NISHINO e cols., 2005), e ainda, causa a redução de respostas sensoriais, baseada na repetição de estímulos sensoriais. É o fenômeno obtido por execução de movimentos repetitivos, que diminuem a resposta vestibular e amplitude do nistagmo. A repetição além de promover a adaptação ao movimento, estimula o órgão sensorial, criando novos automatismos (VOLPI e NAVARRO, 2006). A substituição vestibular é a priorização central da percepção sensorial que almeja substituir as informações relacionadas ao equilíbrio corporal que estejam ausentes ou conflitantes (NISHINO e cols., 2005).

    Dentre os diversos protocolos de RV citados na literatura científica encontram-se os seguintes: exercícios de Cawthorne (1944) e Cookey (1945); Protocolo de Herdman (1990 e 1996); Protocolo de Ganança (1989); Exercícios da Assoziazione Otologi Ospedaliere Italian (Bolonha, 1983); Exercícios de Davies e O’Leary (1995) e exercícios na vertigem posicional (exercícios de Brandt-Daroff, manobra de Dix-Hallpike, reposicionamento canalicular de Epley e manobra liberatória de Semont) (NISHINO e cols., 2005).

    Dentre esses diversos protocolos mais utilizados e que serão abordados a seguir estão os exercícios de Cawthorne e Cookey (Tabela 2) e os exercícios utilizados na VPPB.

Tabela 2. Exercícios de Cawthorne e Cooksey

Fonte: Ribeiro e Pereira. Melhora do equilíbrio e redução da possibilidade de queda em idosas após os exercícios de Cawthorne e Cooksey. Rev Bras Otorrinolaringol, 71(1) 38-45, 2005.

    Exercícios vestibulares, como os de Cawthorne e Cookey poderiam implementar subsídios para que novos rearranjos das informações sensoriais periféricas aconteçam permitindo que novos padrões de estimulação vestibular necessários em novas experiências, passem a ser realizados de forma automática. Este treino do equilíbrio seria capaz de promover melhoras nas reações de equilíbrio com conseqüente diminuição na possibilidade de quedas (RIBEIRO E PEREIRA, 2005).

    Ribeiro e Pereira (2004) consideram que uma terapia específica para o equilíbrio pode, além de proporcionar o aprendizado motor, potencializa-lo, através da aplicação dos conceitos do aprendizado motor como: prática, feedback, experiência e reeducação do equilíbrio. Os exercícios de Cawthorne e Cooksey utilizam estes conceitos, uma vez que propiciam situações de desequilíbrio, através de atividades variadas, nas quais os indivíduos devem buscar estratégias para a manutenção eficaz da postura, e incluem exercícios de habituação com movimentos da cabeça, pescoço e olhos, podendo estar associados com a marcha, exercícios de controle postural e exercícios de condicionamento geral.

    No estudo de Ribeiro e Pereira (2004) foram analisadas quinze mulheres, entre 60 e 69 anos, escolhidas aleatoriamente, submetidas aos exercícios de Cawthorne e Cooksey durante três meses, três vezes por semana, durante 60 minutos. Todas foram avaliadas segundo a Capacidade do Alcance Funcional (CAF). À comparação dos dados do grupo experimental, nas avaliações pré e pós-intervenção, observaram-se diferença significativa, com melhora no índice da CAF. Os exercícios de Cawthorne e Cooksey foram capazes de promover melhora significativa no equilíbrio desta amostra e podem ser aplicados como medida preventiva e curativa nos distúrbios do equilíbrio em idosos.

    No estudo clínico prospectivo de Ribeiro e Pereira (2005) 15 mulheres, entre 60 e 69 anos, escolhidas aleatoriamente, realizaram a série de exercícios de Cawthorne e Cookey durante 9 semanas, 3 vezes por semana, durante 60 minutos. Avaliou-se o equilíbrio através da escala de Berg, cujos escores determinaram a possibilidade de quedas. Na comparação dos resultados pré e pós-intervenção, observaram-se diferença significativa, com melhoras nos escores na escala de Berg e diminuição da possibilidade de queda. Concluiu-se que estes exercícios promoveram o aprendizado motor nesta amostra e podem ser aplicados como medida preventiva e de tratamento nas alterações do equilíbrio no envelhecimento.

    Num estudo envolvendo portadores de VPPB, numa faixa etária de 61 a 82 anos, foi aplicado a RV com o protocolo de exercícios de Cawthorne e Cookey sendo que para a verificação dos exercícios aplicou-se a escala de atividade de vida diária e desordens vestibulares proposta por Cohen e Kimball. Os resultados apontaram benefícios estatisticamente significativos promovidos pela RV no tratamento de idosos portadores de VPPB, revelando que a RV mostrou ser uma excelente estratégia terapêutica (RESENDE e cols., 2003).

    A VPPB é uma doença auto-limitada, na maioria dos casos regride espontaneamente sem qualquer tratamento, num período de tempo muito variável em cada caso. Algumas formas distintas são propostas: exercícios de habituação vestibular, medicamentos sedativos labirínticos, ablação cirúrgica do CSC posterior e manobras de reposicionamento (MAIA e cols., 2001).

Figura 3. Manobra de Brand-Daroff: Estando o paciente sentado, com o examinador à sua frente, deita-se o paciente rapidamente para o lado em que apresenta tontura. Deve 

continuar deitado desse lado, por 4 minutos. A seguir, é rapidamente deitado par o lado oposto, mantendo sempre o ouvido para baixo. É mantido nesta segunda posição também por 4 minutos.

Fonte: Maia e cols. Manobras de reposicionamento no tratamento da vertigem

posicional benigna. Rev Bras Otorrinolaringol 2006; 72(5) 612-616

    A VPPB é um problema mecânico do labirinto e deve ser tratada como tal. Existem várias manobras de liberação descritas na literatura, ou de reposicionamento, como também são denominadas (PEREIRA e SCAFF, 2001). As manobras de Brand-Daroff (Figura 3), de Semont (Figura 4) e Epley (Figura 5) são as utilizadas com maior freqüência.

Figura 4. Manobra de Semont: A cabeça do paciente é rodada 45º para o lado são (A). em seguida o paciente é deitado para o lado comprometido (B). 

rapidamente é realizado um grande arco, e o paciente é colocado em decúbito no outro lado, mantendo a posição da cabeça em 

relação ao tronco, isto é, o paciente olha para baixo, com o nariz encostado na maca (C). O paciente levanta rapidamente (D).

Fonte: Pereira BC e Scaff M. Vertigem de posicionamento paroxística

benigna. Arq Neuropsiquiatr 2001; 59(2B) 466-470

    Enquanto Brand e Daroff preconizam a realização da manobra várias vezes ao dia por dias consecutivos, as manobras de Semont e de Epley foram descritas originalmente para serem aplicadas uma única vez. Uma única aplicação da manobra de Semont tem índices de cura de aproximadamente 50% passando a 97% se a manobra for realizada várias vezes. Para a manobra de Epley, os índices de cura variam de 87 a 100% (PEREIRA e SCAFF, 2001).

Figura 5. Manobra de Epley: A cabeça do paciente é rodada 45º para o lado comprometido (A). em seguida o paciente é rapidamente deitado

 mantendo a posição da cabeça ao tronco (B). a cabeça é então rapidamente rodada em duas etapas de 90º (C e D). O paciente levanta rapidamente (E).

Fonte: Pereira BC e Scaff M. Vertigem de posicionamento paroxística

benigna. Arq Neuropsiquiatr 2001; 59(2B) 466-470

    Num estudo realizado por Yardley e cols., (2004) pacientes portadores de tonteira provocada por movimento, de origem vestibular, receberam individualmente exercícios de RV por 30 a 40 minutos usando um folheto desenhado profissionalmente, e foram comparados com um outro grupo de pacientes que recebeu apenas cuidado médico usual. O grupo de pacientes que se submeteu à RV tinha que virar a sua cabeça de um lado para outro, para baixo e para cima enquanto mantinha os olhos abertos (e focando simultaneamente ou não um objeto) ou mantendo-os fechados. Primeiro esses movimentos foram feitos lentamente enquanto estavam sentados, então mais rápidos e finalmente em pé ou enquanto caminhavam. Assistência adicional foi fornecida por telefone aos pacientes na primeira e terceira semana após a única sessão de ensinamento. Aos 3 meses, a melhora dos resultados no grupo que submeteu-se à RV foram significativamente maiores do que no grupo que recebeu apenas cuidado médico usual; e esta melhora foi mantida nos 6 meses subseqüentes. De 83 pacientes tratados, 56 (67%) relataram melhora clinicamente significativa comparada com 33 de 87 (38%) pacientes que receberam apenas cuidado médico usual. Este estudo demonstra notavelmente que os exercícios vestibulares diários na população idosa reduzem os sintomas, instabilidade postural, deficiências físicas e quedas devido à tonteira.

Conclusão

    Através desse estudo pode-se concluir que a RV é uma terapêutica eficaz no controle dos sinais e sintomas das vestibulopatias, possibilitando melhoras no equilíbrio, na diminuição das quedas, recuperação da função psicológica e aumento significativo na qualidade de vida desses pacientes. Uma vez que os exercícios vestibulares através dos mecanismos de adaptação, habituação e substituição induzem a uma neuroplasticidade no SNC, levando à recuperação funcional dos desequilíbrios corporais.

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EFDeportes.com, Revista Digital · Año 16 · N° 156 | Buenos Aires, Mayo de 2011  
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