Dança: contribuições para a auto-estima e auto-conceito de crianças e adolescentes Danza: aportes para la autoestima y el autoconcepto de niños y adolescentes Dance: contributions of self-concept and the self-esteem of children and adolescents |
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*Mestre em Promoção da Saúde. Possui graduação em Educação Física e especialização em Recreação e Lazer e em Educação Especial e Educação Inclusiva. Atua na área de Educação Física adaptada e dança **Pós-Doutorado: Universidade Federal de São Paulo, UNIFESP Docente do Curso de Mestrado em Promoção da Saúde da Universidade de Franca |
Shirlei Aparecida Ferreira* Wilza Vieira Villela** (Brasil) |
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Resumo Este artigo é um relato de experiência realizada com crianças e adolescentes que freqüentam o ensino fundamental de duas escolas públicas do ensino comum e uma escola de educação especial do município de Poços de Caldas-MG. O trabalho teve como objetivo investigar se a prática da dança pode influenciar o autoconceito e auto-estima de 54 crianças e adolescentes de ambos os sexos, com idades entre nove e 16 anos que freqüentam o ensino fundamental de três escolas da cidade de Poços de Caldas. Foi avaliado o autoconceito antes e após o programa de dança através da Escala de Autoconceito Infanto-Juvenil e utilizado entrevistas semi-estruturadas com os pais e responsáveis. O programa teve duração de cinco meses e consistiu em um encontro semanal de duas horas. Foram desenvolvidos conteúdos da dança como: expressão corporal, criatividade, sensibilização e conscientização dos alunos para suas posturas e ações, facilitando seu desenvolvimento individual e social. Os resultados apontaram para uma melhora nas relações sociais e familiares, valorização pessoal e o respeito às próprias limitações. . Para os sujeitos participantes, portanto, a dança contribuiu para o desenvolvimento da auto-estima e do autoconceito. Unitermos: Autoconceito. Dança. Crianças. Adolescentes. Promoção de saúde.
Abstract This article is a report on a experience realized with children and adolescents that attend the elementary school from two schools of regular teaching and one special school from Poços de Caldas- Minas Gerais county. The work had as the objective investigating if practicing the dance can influence the self-concept and the self-esteem from the of fifty four children and adolescents, with both sex from nine to sixteen years old, that attend elementary school of three schools at Poços de Caldas city. The self-concept was evaluated before and after the dance programme through the Infant-Juvenile Scale of Self-Concept, and utilized semi-structured interviews with the parents and the legal responsible for them. The programme lasted five months and consisted of a weekly two-hours meeting. It was worked the contents from the dance like: body language, creativity, sensitivity, and the consciousness from the students to their posture and action, facilitating their individual and social growth. The results showed an improvement in the social relationship and provided for the students to perceive their potentialities, that influenced the process of personal value and the respect for the limitation from each one. The end results permits us to say that, for the people who participate, the dance contributed to the self-esteeam and self-concept growth. Keywords: Self-concept. Children. Adolescents. Healthy lifestyle.
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 16 - Nº 156 - Mayo de 2011. http://www.efdeportes.com/ |
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Introdução
Os seres humanos tendem a buscar continuamente o autoconhecimento, satisfação e o equilíbrio em todos os contextos de sua vida. (PEREIRA, S/D).
Para isto, é necessário conhecer as próprias potencialidades, as limitações e valorizar suas qualidades. Assim, a auto-estima e o auto-conceito, são considerados fatores importantes para a realização pessoal e, sobretudo para uma boa saúde, considerada como bem estar bio psíquico-social. (BRANDEN, 2000).
A auto-estima e o auto-conceito são construtos da personalidade que representam o sentimento com relação ao “Eu” e auxiliam na formação da identidade do sujeito.
Autores como Sisto; Martinelli (2004); Costa (2001); Tamayo; Abbad (2006) e Branden (2000) definem o autoconceito como as percepções que a pessoa tem de si, sendo que a auto-estima indica o grau de satisfação e aceitação de um indivíduo para consigo mesmo.
Já Gomes e Ribeiro (2001) abordam a importância destes construtos para se manter relações saudáveis e bem estar, principalmente quando o individuo apresenta uma enfermidade, já que um autoconceito realista e positivo reflete numa atitude de segurança e auto avaliações mais positivas, permitindo ao individuo criar estratégias para lidar com a doença.
Desta maneira a maneira como a pessoa se vê poderá exercer influência em seu bem estar. Em situação de doença, uma visão mais positiva poderá contribuir para o processo de reabilitação. (GOMES; RIBEIRO, 2001).
A dança, enquanto atividade física e comunicação não verbal vêm ao encontro das necessidades humanas, exercendo um papel importante no desenvolvimento das percepções de cada um sobre si mesmo. (NANNI, 2005).
Além de influenciar no desenvolvimento de atitudes emocionais e na estruturação da identidade, promove a formação do sujeito singular, com uma maneira própria de ser, sentir e agir, contribuindo para a construção da autonomia e da liberdade. (NANNI, 2005).
Na dança, o corpo torna-se um dos principais meios de interação do indivíduo com o mundo; sua prática é uma maneira de desenvolver a capacidade de percepção, a consciência corporal e novas possibilidades de comunicação (GODOY et al, 2005).
Pela sua dimensão de ludicidade, a dança também permite uma interação prazerosa com o outro, a descoberta de limites e possibilidades através de experiências e vivências corporais, facilitando os relacionamentos interpessoais e o desenvolvimento do autoconceito e da auto-estima (FALSARELLA; AMORIM, 2008).
Como meio de educação corporal, a dança mantém uma estreita relação com a educação, pois promove o desenvolvimento das potencialidades intelectuais, físicas e sociais e contribuiu na exploração das capacidades individuais e na formação do senso crítico e da autonomia (NANNI, 2003; WENDEL, 2007; COSTA et al, 2004)
Assim, a dança também pode ser uma ação pedagógica, contribuindo para a melhora do comportamento da criança ou adolescente, no resgate de valores culturais, no aprimoramento do senso estético e o prazer da atividade lúdica para o desenvolvimento físico, mental e social. (SANTOS et al, 2005).
Visando observar a influência da dança no autoconceito e na auto-estima de crianças e adolescentes e a percepção dos pais sobre a atividade, foi realizada uma experiência com atividades de dança em 03 escolas no município de Poços de Caldas.
Procedimentos e métodos
Para o desenvolvimento do trabalho foram contatadas 03 escolas no município, sendo 02 públicas estaduais, e 01 uma escola para pessoas com deficiência intelectual-APAE.
A direção das escolas ajudou a divulgar o projeto e a identificar os alunos interessados que se enquadravam nos critérios de inclusão, a saber: alunos que se interessaram pelo programa proposto, que apresentaram condições físicas que permitissem a realização de atividades corporais, com idade entre 9 e 16 anos, compreensão para responder às questões da escala de autoconceito e autorização dos pais.
No total foram selecionados 54 alunos, sendo oito na escola de educação especial (EE), cinco alunos do sexo feminino e três do sexo masculino com idade entre 9 e 15 anos. Na escola estadual (EP1) 31 alunos, 21 do sexo feminino e dez do sexo masculino com idade entre 11 e 16 anos e, na escola estadual (EP2) 15 alunos, 14 do sexo feminino e um do sexo masculino com idade entre 10 e 12 anos.
Para a coleta de informações sobre a atividade foram utilizados como instrumento a escala de Autoconceito Infanto-Juvenil (EAC-IJ), entrevistas com pais ou responsáveis, observação e anotações do diário de campo. A escala de autoconceito Infanto Juvenil (EAC-IJ) foi construída e validada por meio de análise fatorial, que permite a caracterização das quatro situações de ordem pessoal, familiar, escolar e social. (SISTO e MARTINELLI, 2004).
O instrumento apresenta vinte questões, sendo cinco do autoconceito pessoal e escolar, quatro do autoconceito familiar, e seis questões do autoconceito social. O autoconceito pessoal foi analisado através das questões 1P a 5P, o autoconceito escolar através das questões 1E a 5E, o autoconceito familiar 1F a 4F e o autoconceito social através das questões 1S a 6S.
As respostas do instrumento são dadas nas freqüências “sempre”, “às vezes” ou “nunca”. E a extensão de cada sub-escala varia de 0 a 26 pontos e para a escala geral varia de 0 a 104. Desta forma, as freqüências para as questões positivas recebem as seguintes pontuações: sempre (2), às vezes (1) e nunca (0). E as freqüências para as questões negativas são pontuadas da seguinte forma: sempre (0), às vezes (1) e nunca (2).
A aplicação da EACIJ foi realizada de acordo com as subescalas de autoconceito e os resultados foram distribuídos da seguinte forma: pontuação alta, quando as respostas dos sujeitos foram assinaladas compreendendo a classificação de menos 75%, 75% e mais 75%; a pontuação mediana para as respostas classificadas em menos 50% e 50% e pontuação baixa representada pela classificação de menos 25% e 25% da escala. (SISTO e MARTINELLI, 2004).
Os testes antes do programa foram aplicados nas três escolas em março de 2008, após o primeiro contato com os alunos e explicação da proposta de trabalho, A aplicação após o programa foi realizada em junho de 2008. Em agosto de 2008, foram realizadas as entrevistas visando conhecer as opiniões dos pais sobre a importância da dança para os filhos e possíveis mudanças de comportamento, relacionados com a prática da dança.
As entrevistas foram divididas em 6 categorias: A dança é importante para o desenvolvimento global; melhora do diálogo familiar; desenvolvimento das habilidades sociais; preocupação com o corpo (auto-cuidado); influência na motivação desenvolvimento da autonomia.
Resultados
O programa de dança teve ao total vinte encontros em cada uma das escolas, sendo desenvolvidas atividades de alongamento; descontração e socialização; exercícios de coordenação motora, espaço, tempo, ritmo, lateralidade, fluência, forma, criatividade, flexibilidade, agilidade, memória e equilíbrio.
A distribuição dos participantes, considerando sexo, idade e escola pode ser vista na tabela abaixo:
Tabela 1
Grupos |
Sexo |
Idade |
||||||||
M |
F |
09 |
10 |
11 |
12 |
13 |
14 |
15 |
16 |
|
EE |
03 |
05 |
01 |
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01 |
02 |
02 |
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02 |
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EP1 |
10 |
21 |
|
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11 |
08 |
06 |
02 |
03 |
01 |
EP2 |
01 |
14 |
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01 |
10 |
04 |
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O número de alunos do sexo feminino no programa foi bem maior que do sexo masculino, o que fica claro na tabela acima. Sendo que desistiram 24 alunos do sexo feminino e nove do sexo masculino.
Sabendo que existe um grande preconceito com relação ao homem participar de atividades de dança ou ginástica, estes resultados condizem com os estudos de Silva e Malina (2000) que indicam que meninos preferem o esporte e meninas a dança.
Neste contexto, Medina et al (2008) retrata a questão da masculinidade do homem que dança, revelando que a prática pedagógica desenvolvida na escola incentiva as meninas a gostarem da dança o que reforça os valores vivenciados em toda a sociedade, de que a dança é atividade direcionada ao sexo feminino.
No entanto, durante as aulas e nas apresentações, não foi relatado e nem observado nenhum ato que possa evidenciar o preconceito entre meninos e meninas que aderiram ao programa.
Da EE participou um aluno com nove anos, um aluno com 11 anos, dois alunos com 12 anos, dois alunos com 13 anos e dois alunos com 15 anos. Já da escola EP1 11 alunos de 11 anos, oito alunos de 12 anos, seis alunos de 13 anos, dois alunos de 14 anos, três alunos de 15 anos, um aluno de 16 anos. Da escola EP2 um aluno com 10 anos, dez alunos com 11 anos e quatro com 12 anos de idade.
No decorrer do programa 33 pessoas desistiram e 3 entraram no meio do programa.
A tabela 2 mostra uma comparação dos dados antes e após o programa dos alunos que permaneceram no programa de dança até o seu fim.
Tabela 2. Comparação antes e após o programa de dança dos alunos que permaneceram
No quesito familiar antes do programa a EE apresentou quatro (80%) alunos com pontuação alta e após o programa três (60%) alunos apresentaram alta pontuação. No quesito pessoal a EE apresentou dois (40%) alunos com pontuação baixa e pontuação média, após o programa a EE apresentou o mesmo resultado. No quesito escolar antes do programa da EE quatro (80%) alunos apresentaram pontuação alta e após o programa dois (40%) alunos apresentaram pontuação alta. No quesito social da EE um (20%) aluno apresentou pontuação alta antes do programa e manteve este resultado após o programa.
No quesito familiar da EP1 três (30%) alunos apresentaram antes do programa pontuação alta e após o programa um (10%) aluno apresentou pontuação alta. Antes do programa no quesito pessoal da EP1 três (30%) alunos apresentaram alta pontuação e após o programa sete (70%) alunos apresentaram pontuação alta. No quesito escolar antes do programa da EP1, três (30%) alunos apresentaram média pontuação e após o programa seis (60%) alunos apresentaram média pontuação. No quesito social antes do programa da EP1 dois (20%) alunos apresentaram baixa pontuação e após o programa nenhum aluno apresentou baixa pontuação. Ainda no quesito social quatro alunos apresentaram média pontuação antes do programa e cinco (50%) alunos apresentaram média pontuação após o programa e quatro (40%) alunos apresentaram pontuação alta antes do programa e cinco (50%) alunos apresentaram pontuação alta após o programa.
No quesito familiar antes do programa da EP2 quatro (66,6%) alunos apresentaram baixa pontuação e após o programa cinco (83,3%) alunos apresentaram pontuação baixa. No quesito pessoal antes do programa da EP2 quatro (66,6%) alunos apresentaram pontuação baixa e após o programa três (50%) alunos apresentaram baixa pontuação. No quesito escolar da EP2 antes do programa três (50%) alunos apresentaram pontuação baixa e manteve este resultado após o programa. No quesito social antes do programa da EP2 três (50%) alunos apresentaram pontuação alta e manteve este resultado após o programa.
As escalas de avaliação psicológica possuem limitações como qualquer instrumento que busca mensurar o comportamento, não devendo ser utilizada de forma isolada. (PEREIRA e AMARAL, 2004).
De acordo com Trinca (1984), técnicas psicológicas específicas devem ser entendidas como artifício que visa facilitar a captação do mundo interno e dos fenômenos relacionais, não podendo ser visto como verdade absoluta. Desta maneira, para se realizar uma análise mais profunda, utilizou-se entrevistas com pais e responsáveis e análise categorial das mesmas. A tabela 3 mostra como foram categorizadas as respostas dos entrevistados.
Tabela 3. Distribuição das categorias das respostas dos entrevistados
Ao todo entrevistamos 14 mães e uma avó. Sendo que, sete recusaram e duas não foram localizadas. Das entrevistadas, uma tinha seu filho no EP2, quatro eram mães de alunos da EE e nove eram mães de alunos do EP1 e uma era avó de aluna de EE.
Categoria 1. A dança é importante para o desenvolvimento global
No que se refere à opinião dos pais sobre a participação de seus filhos nas aulas de dança, todos disseram ser importante esta atividade para o desenvolvimento dos filhos.
Apenas uma mãe da EE relatou que as aulas de dança estavam sendo muito boas para sua filha, pois ela iria trabalhar tranqüila sabendo que a filha estava na escola.
“(...) eu vou trabalhar sem preocupação e minha menina não fica na rua.”
Categoria 2. Melhora do diálogo familiar
Ao perguntarmos se seu filho falava sobre as aulas, Dez entrevistadas relataram que houve uma melhora no diálogo entre a família. Pais e filhos começaram à conversar mais. Os pais queriam saber como foram as aulas e os filhos sentiam necessidade de falar à respeito das aulas
“(...) ela chega em casa e já vai mostrar os passinho, ensina as irmãs, ocê precisa vê!”
Cinco pais disseram que seus filhos comentavam à respeito das aulas somente quando eles perguntavam,, mas quando tinha alguma apresentação eles chegavam em casa entusiasmados e ansiosos falando à respeito das apresentações.
“(...) fala quando eu pergunto, não é de falar muito quando tem apresentação ele conta.”
Categoria 3. Desenvolvimento das habilidades sociais
Na categoria habilidades sociais quatorze mães relataram que os filhos estão mais comunicativos e relacionando melhor com os irmãos e colegas.
Embora tenha melhorado o relacionamento entre os irmãos e colegas, observamos na fala de uma mãe que ainda existem conflitos nestes relacionamentos.
“(...) Briga, briga e na mesma hora estão juntas.”
“(...) No fim elas se entendem.”
“(...) Ela não gosta que chama sua atenção, logo emburra, fala palavrão, mas depois da dança, quase não preciso chamar sua atenção.”
“(...) fez mais amigos, conversa mais, ajuda em casa, vai animada para a escola.”
“(...) Está se relacionando melhor e faz as coisas com mais motivação, sem ficar resmungando.
“(...) a dança ajudou ela, ela tinha medo, é muito tímida.
Elas não desgrudam uma da outra. Tudo que ela aprende na escola, chega e já vai ensinar para a coleguinha, filha de uma vizinha minha aqui.
Categoria 4. Preocupação com o corpo (autocuidado)
No que se refere ao autocuidado quatorze entrevistados falaram que após as aulas de dança seus filhos começaram a cuidar melhor do corpo, e uma disse que ainda tem que ficar orientado a filha na questão de sua higiene.
“(...) agora ela passa até batom,
“(...) tenho que ficar mandando tomar banho e lavar o tênis, ocê viu como ela ta gorda, ela é muito ansiosa come tudo o que vê pela frente até já foi na nutricionista, mas ela acha que se fechar a boca num dia só ela vai emagrecer e desisti logo.”
Categoria 5. Influência na motivação
Todos os entrevistados relataram que os filhos estão mais animados para as atividades e principalmente no que refere às atividades na escola.
Dez mães falaram sobre as atividades domésticas e no cuidado com os irmãos mais novos.
Categoria 6. Desenvolvimento da autonomia
No que se refere à autonomia, 14 entrevistados disseram que os filhos vão sozinhos para a escola e nas apresentações, não se preocupam e confiam nos filhos.
Percebemos que apenas uma pessoa entrevistada apresenta um comportamento de super proteção. Esta pessoa é avó de uma aluna, não quer, não confia e não permite que sua neta conquiste a independência.
“(...) Ela não sai sozinha, porque eu não deixo, eu controlo, vou atrás dela.”
Discussão
Ao analisar o teste aplicado, percebemos valores representativos para alcançar o objetivo desta pesquisa. Entretanto, o fato de termos um número de participantes pequeno, os resultados obtidos na escala foram analisados concomitantemente com outros métodos e também devemos levar em conta as situações familiares conflitantes do dia-a-dia que podem influenciar os resultados.
Analisando juntamente os três grupos na tabela II podemos notar que houve uma melhora do autoconceito familiar. A maioria dos entrevistados disse que incentivam a participação dos filhos e os estimulam a continuar nas aulas. Além disso, foi relatado que os alunos chegam em casa animados e ansiosos para conversar a respeito das aulas de dança. Esse fato sugere um aumento no nível de comunicação entre os alunos e seus pais.
Muitos estudos como de Harter (1993) apud Simão (2005) Weber, Stasiack e Brandenburg (2003) constataram que os pais são extremamente importantes na valorização e no apoio nas atividades que as crianças realizam na escola. Agindo assim, transmitem amor, respeito e valor contribuindo para o desenvolvimento positivo do autoconceito e da auto-estima dos filhos. Resultados dessas pesquisas mostraram que adolescentes com um alto relacionamento afetivo familiar, um alto envolvimento dos pais, uma alta comunicação sendo iniciativa dos pais ou dos filhos apresentaram uma auto-estima mais elevada. Então, a auto-estima elevada foi relacionada com uma interação familiar de qualidade.
Ao mostrarem entusiasmo e interesse pela vida de seus filhos, os pais expressam o amor e respeito que sentem por eles, contribuindo para o desenvolvimento da auto-estima.
Portanto, podemos perceber que a dança, como instrumento de expressão e auto-afirmação, proporciona liberação das emoções reprimidas e, além disso, abre canais de comunicação. Neste caso, entre pais e filhos, melhorando o relacionamento interpessoal. (D’AQUINO; GUIMARÃES; SIMAS, 2005).
Observamos em relação ao autoconceito escolar, que houve uma redução de 07 (33,3%) para 04 (19%) sujeitos que apresentaram uma alta pontuação. Destes, 03 (19,4%) somaram-se na população de média pontuação na escala. Baseado no manual da escala, os alunos que se encontram nessa faixa são avaliados como não muito espertos e rejeitados pelos colegas de escola. (SISTO; MARTINELLI, 2004).
As crianças que caíram para um nível na escala podem, por meio de acumuladas experiências sociais negativas na escola, cair ainda mais no seu rendimento. Pois, o autoconceito escolar está relacionado com o sentimento que o aluno tem no ambiente escolar e nas atividades escolares. (Idem).
Embora os pais sejam fundamentais para o desenvolvimento do autoconceito, a partir do momento que os alunos são inseridos na escola, os professores, colegas e amigos passam também a desempenhar um papel nessa formação. (SANCHES; ESCRIBANO, 1999).
Por isso, o fato do grupo de dança e dos ensaios acontecerem na escola, ambiente propício para observação e coleta de dados, contribuiu para observar que aumentou a popularidade destes alunos com a comunidade escolar, principalmente com o diretor, professores e colegas, o que pode ter influenciado positivamente o autoconceito, embora a escala não confirme isto.
Ugaya (2007) relata em sua pesquisa envolvendo crianças e adolescentes, que as apresentações das danças criadas pelos alunos, assistidas pela família, amigos e pela comunidade, contribuiu para que estes se sentissem importantes e valorizados, aumentando a auto-estima.
Esses efeitos das atividades extracurriculares no autoconceito de adolescentes foram averiguados em vários estudos como de Simão (2005) e Ugaya (2007). Tais estudos mostram efeitos positivos no desempenho acadêmico e no autoconceito.
Ao analisar o resultado do autoconceito pessoal observamos que quatro dos alunos que apresentaram uma baixa pontuação antes do programa, se somaram aos alunos de alta pontuação. Esses números sugerem uma mudança no comportamento destes sujeitos com relação a si mesmos, ou seja, estes adolescentes estão se vendo de forma mais positiva, estão se valorizando como pessoas, apresentam-se tranqüilos e seguros perante as situações do dia a dia. (SISTO; MARTINELLI, 2004).
Já no social, observamos que houve uma diminuição de seis para quatro sujeitos que apresentaram baixa pontuação no quesito social, embora dois alunos na segunda aplicação tenham apresentado melhores resultados, sendo que um aluno somou-se ao nível médio e um ao nível alto da escala. Observamos que a EE apresenta alunos com pontuação baixa neste quesito.
O meio social é uma fonte geradora de incapacidades, uma vez que é neste meio que determinados alunos tornam-se reconhecidos como deficientes. (SAETA, 1999).
Alunos que não se enquadram nos quesitos ditos “normais” são rotulados como deficientes e incapazes, o que colabora para a baixa auto-estima e anula suas possibilidades de assumir papéis sociais. Este fato pode ter contribuído para o baixo autoconceito dos alunos da EE, uma vez que estes também apresentaram baixo e médio autoconceito escolar.
No grupo EPI e no grupo EP2 três alunos apresentaram índices mais satisfatórios, e houve uma melhora no autoconceito social após o programa de dança. Esse resultado condiz com um estudo realizado por Sarto (2007) junto ao grupo Dança Comunidade com jovens da periferia da cidade de São Paulo, que mostrou que os participantes encontraram na dança uma forma de realização pessoal e inserção social, que possibilitou o aumento da sua auto-estima.
Da mesma forma, Lima (2006) constatou que a dança serviu como um instrumento para a promoção de saúde de crianças de uma escola do ensino público de Fortaleza que participaram de um programa durante seis meses. A dança proporcionou a descoberta das capacidades e limites e um aumento significativo da autonomia e auto-estima, evidenciando o “empoderamento” destes alunos. Nesta pesquisa também foi observado mudança na questão do auto-cuidado, significando uma melhor higiene corporal e hábitos mais saudáveis de vida, como prática de atividade física, no caso a dança.
Outros estudos realizados com alunos com paralisia cerebral na faixa etária de 10 a 15 anos revelaram que a dança e a música possibilitaram melhora no desenvolvimento motor, maior independência nas atividades de vida diária e melhora da auto-estima. As atividades lúdicas e coletivas proporcionaram a facilitação dos relacionamentos interpessoais, desenvolvimento da auto-estima e da autoconfiança. (FALSARELLA; AMORIM 2008).
Alvim, Pronsato e Lima (2005) observaram que adolescentes socialmente desfavorecidos com idade entre 12 e 17 anos participantes em um programa de dança, tiveram 1 a1ento do desenvolvimento psicomotor, melhora na sociabilidade diminuindo as atitudes agressivas. Com base nisto, a dança contribuiu para o desenvolvimento do aluno como um todo, possibilitando uma melhor adaptação ao meio social.
Através do potencial criativo incentivado nas aulas, expressão de idéias, as crianças e adolescentes ampliaram suas capacidades melhorando a autoconfiança. O que nos fez lembrar de uma adolescente participante que tinha no inicio dificuldades em realizar os movimentos devido à obesidade. Com o decorrer das aulas ela foi descobrindo suas capacidades criativas expressando suas opiniões sobre determinados passos de dança.
Considerações finais
Muito tem se falado sobre os benefícios da dança, visto que sua prática possibilita o desenvolvimento de habilidades motoras, sociais e o aumento do autoconceito e da auto-estima o que de fato é de suma importância para a saúde das pessoas que se identificam com esta prática.
Nos últimos anos, tem se investigado a importância do autoconceito e este assunto vem recebendo atenção de estudiosos e pesquisadores, à medida que se descobre a sua relevância no bem estar e na qualidade de vida do ser humano.
A idéia de que o autoconceito se desenvolve a partir das interações sociais, e passa por transformações nas diferentes fases da vida, levou-nos a pensar que a forma como se processam as relações interpessoais na família, no grupo social e na escola, pode influir na auto-estima e no autoconceito.
Partindo desta reflexão este estudo procurou investigar os benefícios da dança no autoconceito e na auto-estima de crianças e adolescentes.
Durante o programa, observamos a cada encontro uma maior integração e motivação dos alunos.
A participação dos pais fora de grande importância no programa. Embora poucos tenham assistido as apresentações de seus filhos e alguns não foram entrevistados por motivos já citados anteriormente, eles incentivaram a participação e sempre se mostraram atenciosos com o programa, o que facilitou o nosso trabalho.
Poucos alunos permaneceram até o final do programa devido a vários fatores, como problemas com horário, não se identificaram ou se sentiram motivados e mudaram de escola e cidade.
No início do programa encontramos dificuldades a respeito de que homem só dança hip-hop e que outras modalidades da dança são voltadas apenas para o grupo feminino. Com o tempo os alunos foram descobrindo que dançar é para todos, independente do tipo de dança, e isto melhorou a relação entre ambos os sexos.
A relação de ajuda de auto-cuidado, igualdade de direitos e no respeito às limitações possibilitou a descoberta de potenciais até então desconhecidos. Isto permitiu que estes alunos adquirissem autonomia e utilizassem suas capacidades para melhorar a sua qualidade de vida e de sua comunidade, o que evidentemente refletiu na auto-estima.
Considerando os resultados obtidos na escala de autoconceito, nos relatos dos responsáveis pelos alunos e na observação, podemos dizer que a dança beneficiou os alunos que permaneceram no programa até o final desta pesquisa. Percebemos mudanças relacionadas à maneira de se vestir, no autocuidado e na melhor convivência com os pares.
Através do autoconhecimento e desenvolvimento de capacidades motoras, observamos que houve um aumento significativo da autonomia e auto-estima, tornando estes mais seguros e com uma melhor consciência corporal.
A dança possibilitou uma perspectiva de vida com mais qualidade, isto foi possível pela descoberta da identidade favorecida pelo potencial criativo da dança que apontou caminhos para a socialização, lazer, o autoconhecimento, valorização pessoal e autonomia.
Baseados nos pressupostos teóricos, e nos instrumentos utilizados nesta pesquisa, este estudo nos permite constatar que a dança pode promover o desenvolvimento de um autoconceito positivo e aumento da auto-estima, o que contribuirá para a promoção de saúde de algumas pessoas, visto que os alunos que desistiram, não encontraram motivação nesta atividade.
Não queremos afirmar que a dança seja a solução para os problemas relacionados com a auto-estima e com o autoconceito, mas sim despertar novos questionamentos sobre os seus benefícios.
Referências
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SIMÃO, R. I. P. A relação entre atividades extracurriculares e o desempenho acadêmico, motivação, autocontrole e auto-estima dos alunos. 2005. 58 f. Monografia (Licenciatura em Psicologia) - Instituto Superior de Psicologia Aplicada, Lisboa, Portugal.
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