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Importância das artes marciais no contexto militar: uma comparação

entre os fuzileiros navais americanos e o exército brasileiro

Importancia de las artes marciales en el contexto militar: una 

comparación entre los fusileros navales norteamericanos y el ejército brasileño

 

Centro Universitário de Belo Horizonte – UNIBH

(Brasil)

Aroldo Luis Ibiapino Cantanhede | Adriana Carolina Cunha Rezende

Eduardo Nascimento | Eyder Barbosa Senna Jerônymo

alicantanhede@yahoo.com.br

 

 

 

 

Resumo

          O presente trabalho de revisão bibliográfica analisa a utilização das Artes Marciais no Corpo de Fuzileiros Navais dos Estados Unidos e no Exército Brasileiro, delineando alguns contrastes na sua forma de treinamento e mostrando a importância do treinamento sistemático de Artes Marciais pelos militares. Conclui-se que há uma diferença entre a forma de treinamento entre as duas Forças Militares citadas, pois enquanto os Fuzileiros Navais treinam de maneira padronizada e sistemática os militares do Exército só o fazem em consonância ao Treinamento Físico Militar salvo exceções de unidades especiais. Conclui-se que o treinamento de Artes Marciais é importante em virtude da profissão do militar e das ações decorrentes dela. Conclui-se também, que as Artes Marciais são exercícios físicos e, por conseguinte, seu treinamento pode acarretar benesses ao seu praticante tais como: a melhoria da aptidão física e das habilidades motoras, a diminuição do risco de desordem mental e a melhoria da saúde geral.

          Unitermos: Artes marciais. Exército. Treinamento.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 16 - Nº 156 - Mayo de 2011. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    As Artes Marciais (AM) são práticas da cultura do movimento que se utilizam do corpo para ataque e defesa. Sua história remonta a Índia, quando os monges budistas que praticavam meditação por horas a fio se dedicavam a um exercício físico denominado Vajramushti ou do Sânscrito, Punho Real (NATALI, 1987; REID e CROUCHER, 2008). Oliveira (2007) afirma também, que o Fundador do budismo contemplativo (Zen), Bodhidarma, foi peça fundamental para o desenvolvimento das AM pelo oriente ao levar técnicas marciais através de exercícios físicos aos monges do Templo Shaolin na China.

    Após inúmeras fragmentações ocorridas ao longo do tempo as AM tornaram-se nas práticas que são conhecidas. É bom lembrar que ainda hoje as AM ainda se desenvolvem e buscam características próprias, a exemplo disso, temos o fenômeno midiático conhecido por Mix Martial Arts ou MMA, onde os lutadores têm, em sua maioria, conhecimento de diversas AM.

    Como método de autodefesa as AM ainda se mantêm em um patamar elevado e é por esse motivo que elas são treinadas e difundidas no meio militar e por diversas forças de segurança do Brasil e do mundo (YI, 2004; BRASIL, 2002).

    Profissionalmente o militar (tanto das Forças Armadas: Exército, Marinha e Aeronáutica quanto das Forças Auxiliares: Polícia Militar e Corpo de Bombeiros) é um indivíduo que em virtude do seu trabalho pode ser (no caso das Forças Armadas) ou é (militar das Forças Auxiliares) alvo de constantes ameaças à sua integridade física. Sendo assim faz-se necessário que esse profissional saiba se conduzir em uma situação de confronto corpo-a-corpo, desarmado ou com armas brancas. É válido lembrar que por suas ações algumas atividades militares possuem uma necessidade maior da utilização de AM, como por exemplo, as exercidas por Unidades de Choque e de Missões Especiais (BRASIL, 2002).

    Há concordância entre alguns autores que as AM são exercícios físicos com resultados positivos na obtenção da aptidão física e saúde em geral, (VUORI, 1995; MCARDLE et al., 1998) embora tenham especificidades relacionadas à sua prática (CANTANHEDE, REZENDE e NASCIMENTO, 2010). Assim sendo a prática regular de exercícios físicos através das AM pode contribuir para a obtenção de um melhor desempenho tanto físico como psicológico do militar além de condicioná-lo ao uso de técnicas marciais (Habilidades Motoras) em uma situação de confronto (MAGILL, 1984; BRASIL, 2002).

    O objetivo deste trabalho é comparar a forma de treinamento entre os Fuzileiros Navais Americanos e o Exército Brasileiro e mostrar através de uma Revisão Bibliográfica, a importância do treinamento de AM para o militar como forma de desenvolvimento de habilidades motoras de autodefesa e do condicionamento físico. Para tanto analisou-se o Programa de Artes Marciais do Corpo de Fuzileiros Navais dos Estados Unidos (MCMAP) através de documentos do Departamento de Defesa do Estados Unidos; o Manual de Campanha C 20-50 Treinamento Físico Militar – Lutas, do Exército Brasileiro.

Programa MCMAP

    O Programa de Artes Marciais do Corpo de Fuzileiros Navais Americanos (MCMAP em inglês) é uma forma de combate utilizada com o intuito de fazer com que o fuzileiro naval esteja apto a combater com o uso de: armas de fogo como elementos de ataque e defesa, armas brancas ou desarmado. Foi criado como parte de uma nova estruturação doutrinária do Corpo de Fuzileiros Navais que aconteceu no início dos anos 90 do século passado sob o comando do General James L. Jones. Nas palavras do Tenente General Edward Hanlon Jr. na ordem de serviço do MCMAP:

    “MCMAP is an integrated martial art designed forand executed by all Marines throughout their careers. MCMAP is a revolutionary step in the development of martial skills for Marines and replaces all other close combat-related systems preceding its introduction.” (US DEPARTAMENT OF NAVY, 2002, p. 1)1.

    Embora o MCMAP tenha uma característica combativa ela está além do treinamento prático-físico apenas, pois a sua doutrina visa o desenvolvimento de atributos relacionados não só com o corpo, mas com a parte psicológica, social e moral do fuzileiro. Como afirma Yi (2004, p.20)2: “MCMAP continually challenges Marines physically and mentally while testing and building ethical and moral character ...”.

    Ao participar do programa o militar usa em seu cinto de serviço pequenas “faixas” transversais que indicam o estágio que o fuzileiro naval se encontra.

Foto 1. Fuzileiros Navais em Treinamento MCMAP

Fonte: USMC

    O programa possui uma divisão especifica de “faixas” conforme o progresso do combatente. Gradativamente o mesmo se submete a testes para ascender a um próximo nível. Os níveis de técnicas ensinadas vão desde defesas simples até o uso de força letal sobre o adversário, sendo que todos os militares da infantaria devem ter a faixa marrom como objetivo mínimo (UNITED STATES OF AMERICA. DEPARTAMENT OF NAVY - USMC ORDER 1500 54a, 2002).

    Percebe-se então que há no MCMAP uma forma organizacional de treinamento de AM advinda de uma estrutura doutrinária determinante que visa preparar o fuzileiro naval americano para situações de combates. É importante ressaltar que este tipo especial de atividade não se atrela ao treinamento físico padrão, ou seja, o indivíduo possui treinamento físico militar distinto do treinamento do MCMAP.

Artes Marciais no Exército Brasileiro

    O treinamento de AM para o combate ou a autodefesa no Exército Brasileiro tem sua história na Guerra do Paraguai com o Batalhão dos Zuavos. Neste batalhão negros capoeiristas buscavam a liberdade ao servirem no Exército, muitos deles serviam no lugar de seus senhores (CANTANHEDE, REZENDE e NASCIMENTO, 2010; SOARES, 2004; SODRÉ, 2002; SOUZA, 1996; SENA, 1980).

    Ao se falar de AM orientais tem-se, como afirma Oliveira (2007) o Judô como a primeira luta integrante das unidades do Exército Brasileiro ao passar a fazer parte da grade curricular da disciplina “Lutas” da Escola de Educação Física do Exército em 1959. Contudo Faria já em 1935 já falava a respeito de técnicas de defesa pessoal e de combate desarmado a serem ensinados aos militares do Exército Brasileiro.

    Outra importante referência às AM se dá através de Filho (1959) ao fazer menção do Karatena Revista de Educação Física do Exército: “Não é, pois, exagerado afirmar que sua difusão [do Karate] no Exército, bem como a de outras ensinanças congêneres, aumentaria de maneira sensível o valor combativo das unidades” (p, 8).

    O Manual de Campanha C 20-50 Lutas, em sua 3ª edição de 2002, é a referência no Exército Brasileiro para o combate corpo-a-corpo. Ele traz métodos de ataque e defesa de diferentes AM tais como o Judô, Karate e Aikidô. Contudo, diferentemente do que acontece no MCMAP a prática de AM no Exército está aliada a programação do Treinamento Físico Militar (TFM): “o número de sessões por semana dependerá da programação do TFM...”. Relevante afirmar que o próprio manual afirma que: “... imprescindível que se pratique tais técnicas toda semana, visando estar o homem sempre apto a empregá-las em situação real.” (BRASIL, 2002, p10).

Figura 2. Treinamento de AM no Exército Brasileiro

Fonte: BRASIL, 2002 (Manual C20-50)

    Nas Forças Armadas ou Forças Auxiliares o treinamento de AM com horários e padrões específicos geralmente se dá apenas em unidades especiais como as de Choque, Operações Especiais e Comandos ou ainda em Organizações de Formação como as Escolas Militares. A literatura ainda carece de maiores trabalhos sobre este aspectos pois o tema ainda é pouco abordado, embora já comece a despertar interesse nas organizações de fomento do conhecimento militar.

Benefícios das AM para o militar

    O militar praticante de AM pode usufruir de benefícios em virtude de sua prática. As AM são exercícios físicos que por sua prática sistemática e planejada tendem a desenvolver a aptidão física, as habilidades motoras e também podem diminuir o risco de desordem mental. (NAHAS, 2003; ELSAYED e YOUNG, 2000; McARDLE et al, 1998; BARBANTI, 1990). A de se ter sempre em mente que o treino de AM possuem especificidades como por exemplo, o contato físico, o risco de lesões, a contaminação por sangue entre outras (CANTANHEDE, REZENDE e NASCIMENTO, 2010). No entanto ao se manter essas variáveis sobre controle as AM são exercícios físicos com comprovadas ações benéficas.

Conclusão

    Conclui-se que ao se comparar a forma do Programa de Artes Marciais dos Fuzileiros Navais Americanos com a forma de treinamento do Exército Brasileiro encontra-se uma diferença significativa entre a sistematização dos treinamentos. Pressupõe-se então, que o Exército Brasileiro ainda não dá a devida atenção ao tema, pois não procura, sistematizar o treinamento em AM de seus militares ao não desacoplá-lo do treinamento físico militar padrão.

    Conclui-se que o treinamento de AM é importante ao militar em decorrência da suas atividades profissionais.

    Conclui-se também que as artes marciais são exercícios físicos que com sua prática pode acarretar benesses aos seus praticantes o que é por si só uma demonstração de que ela deveria ser incorporada de maneira sistemática no treinamento militar.

    Como sugestão seria de grande valor se o treinamento de AM pudesse tomar maior escopo nas unidades do Exército Brasileiro ou que uma doutrina semelhante ao MCMAP pudesse ser implantada.

Notas

  1. MCMAP é um passo revolucionário no desenvolvimento das habilidades marciais para os fuzileiros navais e substitui todos os outros sistemas de combate aproximado anteriormente relacionados à sua introdução.

  2. MCMAP continuamente desafia o Fuzileiro física e mentalmente enquanto testa e constrói seu caráter moral e ética.

Referências bibliográficas

  • BARBANTI, V.J. Aptidão física: um convite à saúde. São Paulo: Manole Dois, 1990

  • BRASIL. Ministério da Defesa. Exército Brasileiro. Estado-Maior do Exército. Manual Técnico C 20-50 - Treinamento Físico Militar - Lutas. 3ª ed. Brasília: 2002

  • CANTANHEDE, A.L.I., REZENDE, A . C. C., NASCIMENTO, E. Artes marciais no Exército Brasileiro: uma análise histórica. Lecturas, Educación Física y Deportes, Revista Digital. Buenos Aires, Ano 15, n 140, janeiro 2010. http://www.efdeportes.com/efd140/artes-marciais-no-exercito-uma-analise-historica.htm

  • ELSAYED M. Ismail, A., H Young RJ. Intellectual differences of adult men related to age and physical fitness before and after an exercise program. J Gerontol, 2000.

  • FILHO, O. P, Artes Marciais Japonesas. Karate. [Artigo eletrônico]. Disponível em: www.revistadeeducacaofisica.com.br/artigos/1959/karate.pdf. Acesso em 20 de fevereiro de 2011.

  • MAGILL, R. Aprendizagem motora: conceitos e aplicações (Motor Learning: concepts and applications). São Paulo: Edgard Blücher, 1984.

  • MCARDLE, William D. et al. Fisiologia do Exercício: Energia, Nutrição e Desempenho Humano. 4. Ed. Guanabara Koogan S.A, Rio de Janeiro, RJ, 1998.

  • NAHAS, M.V. Atividade física, saúde e qualidade de vida: conceitos e sugestões para um estilo de vida ativo. 3 ed. Londrina: Midiograf, 2003.

  • NATALI, MARCO. Vajramushti: A arte marcial dos Monges Budistas. São Paulo, Ediouro, 1987.

  • OLIVEIRA, R. A. Mandim. Historia do Judô, da Criação à Esefex. Revista de Educação Física, n138, Setembro de 2007.

  • REID, H.; CROUCHER, M. O Caminho do guerreiro: O paradoxo das Artes Marciais. São Paulo: Editora Cultrix, 2008.

  • SOARES, C. E. L., A capoeira escrava e outras tradições rebeldes no Rio de Janeiro (1808-1850) 2 e. São Paulo, Unicamp, 2004

  • SODRÉ, Muniz. Mestre Bimba: Corpo de Mandinga. Produções Editoriais Manati, Rio de Janeiro, 2002.

  • SOUZA, J.P. Escravidão ou morte. Os escravos brasileiros na Guerra do Paraguai. RJ, Maua/ADESSA, 1996 .

  • SENA, Carlos. Capoeira: Arte Marcial Brasileira. Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Salvador, Bahia, 1980.

  • UNITED STATES DEPARTMENT OF NAVY Headquaters United States Marines Corps. Marine Corps Order 1500 54a. Disponível em: http://www.usmc.mil/news/publications/Documents/MCO%201500.54A.pdf. Acesso em 29 de janeiro de 2011.

  • VUORI, I. Exercise and physical health musculoskeletal health and functional capabilities. Res. Q. Exerc. Sport, Washington, D.C., v. 66, p. 276-85, 1995 .

  • YI, J. O programa de artes marciais do Corpo de Fuzileiros Navais e o ethos guerreiro do fuzileiro naval. Revista Military Review. P. 66-61, 2004.

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