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A busca pelo insólito nas manobras do basquete de rua

Buscando lo insólito, a través de habilidades en el baloncesto callejero

The search for the unusual through maneuvers in the streetball

 

*Mestranda em Ciências da Atividade Física

Universidade Salgado de Oliveira

**Doutor em Educação Física

Centro Universitário Augusto Motta

e Universidade Salgado de Oliveira

Morjana Brito Peçanha*

janaprepos@hotmail.com

Carlos Alberto Figueiredo da Silva**

ca.figueiredo@yahoo.com.br

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          O objetivo deste estudo foi analisar o discurso de um grupo de praticantes de basquete de rua sobre a utilização das manobras durante os jogos, de forma a verificar os sentidos atribuídos a elas por homens e mulheres. A coleta de dados deu-se no Centro Poliesportivo da Central Única de Favelas (CUFA). O instrumento utilizado foi a entrevista semiestruturada. A pesquisa apresenta uma abordagem qualitativa do discurso dos informantes. Conclui-se que o fato de o grupo masculino realizar maior número de manobras do que o grupo feminino deve-se à valorização destas, pelos homens, como uma forma de chamar o público e de contagiar a torcida, buscando o insólito como estratégia de desafio.

          Unitermos: Basquetebol. Educação Física. Basquete de Rua. Hip Hop.

 

Resumen
         
El objetivo de este estudio fue analizar el discurso de los practicantes de baloncesto callejero en el uso de habilidades en los partidos, a fin de comprobar los significados atribuidos a estas por parte de hombres y mujeres. La recolección de datos se llevó a cabo en el Centro Polideportivo de la Central Única de Favelas (CUFA). El instrumento utilizado fue la entrevista semiestructurada. La investigación presenta un enfoque cualitativo para el discurso de los informantes. Se concluye que el hecho de que los hombres realizan más habilidades que el grupo de mujeres se debe a la valorización que los hombres hacen de estas, como una manera de atraer al público y motivar a la gente, buscando la estrategia inusual y desafiante.

          Palabras clave: Baloncesto. Educación Física. Baloncesto de la Calle. Hip Hop.

 

Abstract

          The aim of this study was to analyze the discourse of practitioners of street basketball on the use of maneuvers during the games, so check the meanings assigned to them by men and women. Data collection took place at the Centro Poliesportivo da Central Única de Favelas (CUFA). The instrument used was the semistructured interview. The research presents a qualitative approach to the speech of the informants. We conclude that the fact that males perform more maneuvers than the female group is due to the appreciation of those of men, as a way of attracting the public and infect the crowd, looking for the unusual as a strategy to challenge.

          Keywords: Streetball. Basketball. Physical Education. Streetball. Hip Hop.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 16 - Nº 156 - Mayo de 2011. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    O basquete de rua (BR) como esporte espetáculo vem crescendo no âmbito dos esportes de maneira constante. A partir de uma metodologia de inserção do indivíduo na cultura do esporte, o BR tem proporcionado diversidade de conceitos e atividades devido ao leque de possibilidades que possui.

    A partir dos elementos que constituem o BR, observam-se características de espetáculo, de forma a cativar o público a participar ativamente.

    O BR apresenta uma abordagem diferente do basquete oficial (BO), principalmente, quando diz respeito à pontuação e às manobras ou moves, que se caracterizam por movimentos insólitos, inusitados, surpreendentes.

    Entretanto, alguns autores apontam que a lógica de mercado vem transformando o BR em um esporte racionalizado, provocando um distanciamento de suas origens, o que influencia no esquecimento e destruição da cultura das periferias (DUARTE, 2010; SILVA; CORREIA, 2008).

    Este estudo tem como objetivo geral analisar o discurso de um grupo de praticantes de BR sobre a utilização das manobras no BR. Como desdobramento deste objetivo, temos os seguintes objetivos específicos: 1) investigar as diferenças entre o grupo feminino e o masculino em relação à obtenção de pontos por meio de manobras ou por meio de cestas no BR; 2) interpretar os sentidos e significados das manobras.

Metodologia

    Esta pesquisa tem caráter qualitativo e descritivo, caracterizando-se como um estudo de caso (POSSELON, 2004). Os dados foram coletados por meio de entrevistas semiestruturadas, dando liberdade ao entrevistado para abordar aspectos sobre o que pensavam ser relevante sobre o tema (NETTO; TRIVIÑOS, 2004). Utilizou-se também a observação participante, que se caracteriza por um contato direto do observador com o fenômeno observado, buscando obter informações sobre a realidade dos atores sociais em seus próprios contextos (MINAYO, 1992).

    As informações foram coletadas nas etapas municipais da Liga Internacional de Basquete de Rua (LIIBRA) e o grupo de informantes (amostra intencional) foi composto por doze atletas, seis homens e seis mulheres que participaram da LIIBRA 2010, no viaduto Negrão de Lima, Centro Poliesportivo da CUFA.

    Os atletas foram esclarecidos sobre o tema da pesquisa e assinaram o Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE), de modo a atender a Resolução 196/96.

    Para análise e tratamento dos dados, foram feitos relatórios dos jogos, assim também como de todo o evento cultural por meio de uma observação participante. As entrevistas foram gravadas e transcritas, a fim de se compreender as falas dos atores sociais como ponto de partida para respondermos às questões do estudo. Após isto, foi realizada uma análise do conteúdo do discurso dos atletas (BARDIN, 1995).

    Ao término das categorizações, os pesquisadores retornaram ao campo de pesquisa de forma a verificar junto aos informantes se o procedimento de análise estava de acordo com suas falas. Em algumas análises, foram incorporadas sugestões dos informantes.

O espetáculo do basquete de rua

    A partir do ano de 2001, no armazém cinco no cais do porto, com uma cesta de lixo aconteceu um “racha de basquete” improvisado com uma bola similar à bola de basquete oficial (ATHAYDE, 2008).

    No ano de 2002, a CUFA absorveu a proposta do que é conhecido como Streetball nos EUA e no ano de 2002 criou o primeiro campeonato de BR dentro do Festival Hutúz, o Hutúz Basquete de Rua (HBR). Apesar de existir até hoje, o HBR ficou pequeno diante do grande número de atletas que se inscreveram. Então, no ano de 2005, a CUFA criou a Liga Brasileira de Basquete de Rua (LIBRA), que abrangia os campeonatos de BR em nível nacional (FILHO, 2003).

    Com o crescimento do BR e a divulgação da mídia, no ano de 2009 a LIBRA passou a se chamar LIIBRA, avançando para o que acontece todo o final de ano: o duelo “Os reis da rua”, com uma equipe internacional que joga com a equipe brasileira de BR.

    O BR hoje é tido como um espetáculo que possui compromisso cultural e social de inclusão, com jovens de comunidades buscando por meio do esporte a transformação crítica dos participantes.

    Nos jogos de BR temos cinco elementos: o MC é o apresentador. Sua narração ecoa de maneira a motivar o público e a manter o equilíbrio das equipes em jogo; DJ dita o ritmo das músicas tocadas durante os jogos e de acordo com o jogo muda o estilo de música. O rap e o hip hop estão sempre presentes nas letras e músicas que o DJ toca nos jogos; o Graffiti por meio de telas e painéis, ao entorno da quadra, aparece com caráter poético-político, enquanto os jogos estão em andamento, interferindo e modelando os espaços designados para essa arte (ATHAYDE, 2008).

    Por meio de movimentos do tipo “de quebrar” os dançarinos mostram um molejo, onde gingados e acrobacias, de certa forma, buscam transgredir e romper com o usual. O break é uma dança presente sempre nos jogos de BR, considerado também como um dos elementos do hip hop; já o skate, como esporte radical, é um representante da cultura das ruas, sempre presente com uma competição paralela nas arenas da LIIBRA, sendo mais um elemento do espetáculo (FILHO, 2003).

    Com uma proposta diferente do BO, o BR possui as manobras como elemento da cultura das periferias. Com malabarismos e muita criatividade, esses movimentos objetivam cativar o público. O jogo de BR possui vários tipos de manobras, as mais conhecidas são: Apagão - jogada em que o atleta cobre a cabeça do outro com a camisa; Coquinho - quando o jogador bate com a bola na cabeça de seu adversário; Espinha - quando o jogador esconde a bola nas costas de seu adversário; Mr. M - quando o atleta simula que passou a bola adiante e esconde-a entre as pernas; Se Liga - quando o jogador atira a bola levemente no seu marcador; Seu Boneco - quando o jogador esconde a bola na camisa.

    Sempre com muita descontração, os jogos de BR também são acompanhados das trançeiras, meninas que fazem tranças no público de forma gratuita e das libretes, dançarinas que animam os intervalos entre os jogos.

Cultura, globalização e basquete de rua

    Tratar o BR na sua dinâmica social, política e cultural requer um pensamento mais amplo; pois o pêndulo que o módulo de produção capitalista apresenta para a sociedade atual com a globalização e mercantilização das manifestações populares proporciona a exclusão do povo que as cria e as recria.

    O BR vem ganhando adeptos e torna-se importante na evolução de um grupo social que por vezes fica à margem da sociedade. No Brasil, o artigo 3º da Lei 9.615 de 1988 classifica o desporto nas seguintes manifestações:

    Art. 3º O desporto pode ser reconhecido em qualquer das seguintes manifestações: I- desporto educacional, praticado nos sistemas de ensino e em formas assistemáticas de educação, evitando-se a seletividade, a hipercompetitividade de seus praticantes, com a finalidade de alcançar o desenvolvimento integral do indivíduo e a sua formação para o exercício da cidadania e a prática do lazer; II - desporto de participação, de modo voluntário, compreendendo as modalidades desportivas praticadas com a finalidade de contribuir para a integração dos praticantes na plenitude da vida social, na promoção da saúde e educação e na preservação do meio ambiente; III - desporto de rendimento, praticado segundo normas gerais desta Lei e regras de prática desportiva, nacionais e internacionais, com a finalidade de obter resultados e integrar pessoas e comunidades do País e estas com as de outras nações (BRASIL, 1998).

    E o basquete de rua? Como poderíamos classificá-lo dentro destas manifestações? Seria uma nova manifestação?

    Sobre os esporte não-olímpícos, Dias (2008, p. 91) aduz que:

    Antes de tudo, a parcial singularidade de suas características frente aos esportes mais tradicionais e mais consolidados na mentalidade esportiva nacional faz com que suas próprias definições enquanto práticas esportivas sejam costumeiramente questionadas. Pergunta-se se esportes como o boliche, o basquete de rua, o skate ou o montanhismo seriam mesmo esportes e se poderiam ser tratados nessa esfera de preocupações governamentais.

    A par as reflexões sobre o espaço do BR no campo dos esportes, ele vem sendo influenciado por uma mídia que o pressiona a assumir propostas que se adaptem aos interesses mercadológicos. O fato de a globalização estar presente dentro das estruturas midiáticas influencia na homogeneização do jogo e na conseqüente perda de suas características mais singulares. Em alguns casos, o BR passa a se assemelhar com o BO (SILVA; CORREIA, 2009).

    Para Adorno (1979)

    A indústria cultural abusa na sua consideração para com as massas a fim de duplicar, consolidar e reforçar sua mentalidade pressuposta como imutável. Tudo que poderia servir para transformar esta mentalidade é por ela excluído. As massas não são o critério em que se inspira a indústria cultural, mas antes a sua ideologia, dado que esta só poderia existir, prescindindo da adaptação das massas (ADORNO, 1979 apud LINHARES; PEREIRA, 2006, p. 229).

Padronização e inovação no basquete

    Tanto o BR quanto o BO possuem em suas características padrões de linguagem corporal. As inovações surgem com o avanço da tecnologia, o passar do tempo e por meio da busca em se elaborar novas maneiras de se jogar um determinado esporte ou modalidade.

    O BR possui características como as pontuações feitas por manobras ou conversão de cestas; porém, as manobras que antes eram utilizadas como forma de resistência ou como forma de transgressão, passaram a ser contabilizadas como pontos e a partir daí tornaram-se previsíveis.

    Para Silva; Correia (2008) a mídia vem influenciando diretamente as características do BR, a ponto de fazer com que o esporte torne-se algo padronizado e homogeneizado, perdendo a sua característica mais importante: o insólito.

    A lógica do basquete de rua foge ao modelo dos esportes institucionalizados. A primazia pela estética, pelo belo que há no virtuosismo, pelo momento, pelo aqui e agora, pelo situacional, pode parecer trivial, mas, de fato, contém pontos subversivos, quando comparada à prática do sistema dominante do esporte (SILVA, CORREIA, 2008, p. 115).

    O padrão passa a ser algo inalterável e a inovação deixa de ser importante. Existem semelhanças entre o BR e o BO, principalmente no que diz respeito às pontuações e cestas. Entretanto, as manobras do BR são, efetivamente, o diferencial deste esporte.

Resultados

    A análise do conteúdo das entrevistas do grupo de informantes e a observação participante permitiram a construção das categorias apresentadas neste item, com base nas considerações de Bardin (1995) sobre a construção de categorias.

Categoria 1.     Trajetória pelo Basquetebol

    Há consenso em relação à prática do basquetebol desde a infância, quando esses jovens ainda estavam nas séries iniciais, como se pode ver na fala dos informantes:

    “Bom, foi no colégio o começo de tudo. Lá eu fiz todos os esportes e ganhei uma bolsa para jogar basquete no colégio Delta. Foi a minha primeira vitória” (Informante 1).

    “Desde criança sempre gostei de praticar esportes e me identifiquei mais com o basquete na escola, e na adolescência passei a jogar aqui no viaduto o BR” (Informante 2).

    Muitas crianças se motivam a praticar esportes a partir do incentivo das aulas de Educação Física escolar. O contato com as práticas esportivas na infância leva o futuro adolescente a pegar o gosto por algum ou vários esportes.

    No caso do BR, observou-se que, em sua maioria, o interesse começa na escola com o BO e quando chega à adolescência, começam a praticar o BR.

    Apesar de na CUFA existir o librinha, que consiste em um torneio para as crianças menores de 17 anos, percebe-se que o primeiro contato acontece na escola.

    Os entrevistados relataram praticar o BO há muito tempo e depois passaram a praticar o BR. O atleta mais antigo relatou que joga basquete desde a década de 90.

Categoria 2.     Sentimento dos atletas com o Basquete de Rua

    A maioria dos atletas afirma que se sente livre ao praticar o BR. Por ser um jogo desenvolvido ao ar livre, em contato com a natureza, com regras menos rigorosas, onde se tem a possibilidade de um contato maior com o adversário.

    Segundo Athayde (2008):

    Conhecido como (basquete-arte), marcado por jogadas geniais, divertidas e pelas diferenciadas dinâmicas de jogo, o Basquete de Rua não se prende às regras convencionais, cria suas próprias. Dentro das linhas que definem uma quadra de Basquete de Rua, a liberdade de criar novas regras é o que mais conta (p.14).

    Pode-se observar este sentimento relatado na fala dos informantes:

    “Gosto muito de praticar BR, é muito bom, pois nos torna livres. Quando jogo BR me sinto livre, acho que é pelo fato de ser praticado na rua e as regras serem mais amenas” (Informante 2).

    “É algo muito prazeroso, e diferente do BO, pois a gente tem mais liberdade para jogar e praticar jogadas sem se preocupar muito com as faltas e tal” (Informante 8).

    O contato com um ambiente urbano e ao ar livre propicia uma ligação muito positiva de liberdade entre os atletas e a natureza que os cerca.

    As regras diferenciadas também são destacadas, pois em relação ao BO, o BR possui regras mais moderadas onde o jogador pode se sentir mais livre para mostrar a sua habilidade e agilidade.

Categoria 3.     Manobras no Basquete de Rua

    Os entrevistados relatam que as manobras aparecem no jogo feminino e masculino. Dos doze, sete afirmam isso. Porém, ao observar o jogo, percebe-se que não é bem assim.

    No jogo masculino há o espetáculo, o show e os homens demonstram mais glamour ao realizarem uma manobra. Nas observações realizadas, os homens demonstraram ter mais necessidade de promover a satisfação da platéia. Para eles, não basta apenas fazer pontos, mas buscar a motivação e a vibração do público.

    Quando acontece uma manobra, a platéia vibra e o jogador sente-se como se estivesse chamando a platéia para contagiar junto com ele.

    No caso do jogo feminino, observa-se que há uma predominância em fazer manobras para obtenção de pontos e não para o show, para o espetáculo. As mulheres preocupam-se com a pontuação nos jogos, isso ficou claro ao observarmos jogos de BR feminino.

    Embora os respondentes tenham relatado que no BR as manobras são elaboradas por homens e mulheres de forma igual, na prática não se pode afirmar o mesmo. Entretanto, num dos relatos, aparece o que constatamos na prática.

    “Bom, pra mim aparece nos dois. Acho que as meninas se focam mais no fato do jogo em si e não se preocupam em fazer manobras para se mostrar como os meninos, mas rola das meninas também fazem manobras, sim” (Informante 7).

Categoria 4.     Preferência em Relação às Manobras

    Em relação à preferência sobre as manobras, os informantes afirmam que tanto utilizam a manobra para obtenção de pontos quanto para o espetáculo. Relacionam a importância da pontuação ao fato de as manobras trazerem o público para vibrar junto com os atletas. Assim como se vê nas falas abaixo:

“É uma maneira diferente e descontraída de se obter pontos entretendo a platéia” (Informante 12).

“São recursos para os pontos, como falei e para entreter a galera e chamar a torcida para o seu time” (Informante 1).

    Embora os informantes tenham relatado que são de igual importância, pode-se observar que há uma diferença entre os gêneros nesta questão.

    Nas observações realizadas, verificamos que os homens efetuam mais manobras do que as mulheres. No excerto de uma das falas (informante masculino), pode-se verificar como os homens usam as manobras com o intuito de espetáculo e show:

    As manobras fazem parte do espetáculo, e eu estaria mentindo se dissesse que é apenas para obter pontos. A galera vibra quando rola uma manobra bacana! Sem falar que mexe com o ego do jogador!” (Informante 6).

    As mulheres têm uma visão de jogo diferenciada, mais centrada no jogo em si e não necessariamente para o espetáculo. Procuram fazer mais cestas do que manobras, porém algumas afirmam que o fator habilidade influencia na hora de fazer a manobra, como se pode ver na fala seguinte:

    “Para mim acho que é obter pontos. Sei que o público gosta, mas como vale pontos fazemos pela pontuação, porque tem meninas que não sabem fazer as manobras mais difíceis” (Informante 7).

Categoria 5.     Importância das Manobras nos Jogos

    A maioria dos respondentes relaciona a importância das manobras com motivar a torcida e obter pontos, oito dos doze respondentes afirmaram tal posição:

“Obter pontos, animar e mexer com o público” (Informante 8).

“Os dois é o conjunto da obra, que torna o basquete de rua único, para zoar com o adversário e obter pontos” (Informante 1).

    O BR é um esporte que foge aos modelos dos esportes institucionalizados. Busca-se no jogo a obtenção de pontos juntamente com a motivação da torcida.

    Entretanto, a pontuação das manobras pode acarretar a perda de singularidade do BR. De fato, ao se padronizar e pontuar as manobras, o elemento insólito deixa de existir.

Categoria 6.     Qual será o caminho do Basquete de Rua

    O BR traz consigo uma série de tensões, mas não é inocente. De certa forma, aspectos fundamentais acabam sendo ignorados e a mídia tenta harmonizá-los (SILVA; CORREIA, 2008). Uma dessas tensões é materializada pelo caráter insólito do BR e a pressão por sua padronização. Para Linhares e Pereira (2006, p. 230),

    O papel assumido pela mídia foi tão decisivamente importante para a difusão do esporte que a denominação mais usual atualmente é esporte-espetáculo, mantido e dirigido por instituições. O que queremos dizer é que existem instituições cada vez mais organizadas que controlam as práticas esportivas (federações, confederações, C.O.B., C.O.I., etc.) e empresas ligadas a estas mesmas instituições que controlam o mercado esportivo e que acabam por controlar até mesmo as próprias instituições e seus regimentos internos, já que o que manda é o mercado e as questões econômicas.

    Todos os praticantes de BR entrevistados afirmaram que o esporte busca o diferente e que sempre estará em um constante processo de mudança como podemos ver nas falas seguintes:

    “Tem seu próprio caminho, uma vertente do basquete convencional, streetball com uma roupagem nova. Acho que vai ser difícil ter uma cara só, mas vai ter campeonatos norteadores que você vai saber neste determinado campeonato. Você vai jogar assim e no outro não. Mais ter uma cara padronizada vai ser difícil porque um dos atrativos do basquete de rua é ser livre” (Informante 1).

    “Acredito que o BR esta sempre se aprimorando, busca o diferente no sentido de ser diferente do BO, as regras são diferentes, se tem mais liberdade pra jogar então eu acho que a padronização não faz parte do BR e sim do BO” (Informante 4).

    O BR este sempre em constante mudança e nunca vai ser algo padronizado e sempre algo novo, algo a acrescentar” (Informante 12).

    O BR para seus praticantes sempre terá esta expectativa de mudança, de algo novo, de construção, de inovação. É um esporte praticado fora dos parâmetros, aos quais a sociedade está acostumada e isso demonstra sua singularidade. Podemos ver esta diferença nas regras, nas jogadas, nos improvisos e na festa que é o evento cultural BR.

Considerações finais

    Observa-se que no jogo masculino as características do BR, tais como: manobras, espetáculo, autopoesis, são em maior número e mais marcantes que no feminino, no qual as características se apresentam mais assemelhadas ao BO.

    No jogo de BR as manobras aparecem como seu fundamento. Não como o passe e o drible são fundamentos no BO, mas como essência do jogo. Entretanto, ao serem pontuadas, podem acarretar na perda do elemento insólito, inusitado, tornando-se mais um artefato padronizado.

    Embora toda a festa seja bem descontraída e dinâmica, percebe-se que a influência da mídia vem, aos poucos, padronizando-a. A mídia, com o papel de construir uma imagem para o BR, trata-o como algo a ser racionalizado, assim como o BO. Entretanto, existe resistência ao processo de padronização, racionalização e homogeneização.

    Silva; Correia (2008) até certo ponto são pessimistas ao dizerem que tal como na tragédia grega o BR deveria se preparar para a sua “dolorosa dissolução”, mesmo que viesse a ser uma morte por singularidade; o que seria uma bela morte. Mas o “amor é primo da morte, e da morte vencedor, por mais que o matem (e matam) a cada instante de amor” (Carlos Drummond de Andrade).

Referências

  • ANDRADE, C. D. As sem razões do amor. Disponível em: http://letras.terra.com.br/carlos-drummond-de-andrade/983318/. Acesso em: 4 de abril de 2011.

  • ATHAYDE, C. Regras Oficiais da Liga Brasileira de Basquete de Rua. Rio de Janeiro: CUFA, 2008.

  • BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1995.

  • BRASIL. Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998. Institui normas gerais sobre desporto e dá outras providências. Brasília, 1998.

  • DIAS, C. A. G. Que políticas para os esportes na natureza? In: ESPÍNDULA, B (Org.). Políticas de esporte para a juventude: contribuições para o debate. São Paulo: Centro de Estudos e Memória da Juventude: Instituto Pensarte, p. 91-100, 2009.

  • DUARTE, R. J. B. O basquete de rua como manifestação da cultura corporal étnica de Salvador. Revista África e Africanidades, Salvador, n. 8, fev. 2010.

  • FILHO, J. L. A. A sociedade do espetáculo revisada. Revista Famecos. Porto Alegre, n. 22, dez., p. 33-46, 2003.

  • LINHARES, R; PEREIRA, V. C. Uma outra metodologia de ensino do basquete é possível? Revista Especial de Educação Física – Edição Digital v. 3, n. 1, nov., p. 227-238, 2006.

  • MINAYO, M. C. de S. O. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. São Paulo: HUCITEC-ABRASCO, 1992.

  • NETTO, V. M; TRIVIÑOS, A. N. S. A pesquisa qualitativa na educação física: alternativas e métodos, Porto Alegre: UFRGS, 2004.

  • POSSELON, M. O estudo de caso na investigação em educação física na pesquisa qualitativa. In: CANDURO, M. T. (Org.). Investigação em educação. Feevale, 2004.

  • SILVA, C. A. F; CORREA, A. M. Espetáculo e reflexividade: a dimensão estética do basquete de rua. Revista Brasileira de Ciência do Esporte. Campinas, v. 30, n. I, p. 107-122, set, 2008.

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