efdeportes.com

Transferência bilateral em uma habilidade motora discreta

Transferencia bilateral en una habilidad motora discreta

 

* Graduado em Educação Física. Universidade Federal do Rio Grande do Norte

** Especialista em Exercício físico aplicado à reabilitação cardíaca

e a grupos especiais. Universidade Gama Filho

*** Especialista em Ensino da Educação Física

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

(Brasil)

Ana Kamily de Souza Sampaio Fonseca***

Carolina Oliveira de Carvalho*

Fernanda dos Santos Silvestre*

João Caetano de Farias Neto**

Juliano Pessoa**

Nossile de Lima Dantas*

anakamily@yahoo.com.br

 

 

 

 

Resumo

          O objetivo do presente estudo foi investigar a transferência bilateral do membro preferido para o não preferido e vice-versa em uma habilidade motora discreta. Fizeram parte da amostra 10 atletas Ginástica Rítmica Desportiva de uma equipe escolar, com idade entre 11 e 13 anos e sem experiência com a tarefa. A tarefa consistiu em acertar o maior número de vezes seguidas a bola com a raquete de frescobol em um alvo localizado na parede. O grupo 1 praticou a tarefa com o membro preferido e o grupo 2 com o membro não preferido. Os resultados evidenciaram que a transferência foi maior no grupo 2, sugerindo melhor transferência positiva do membro não preferido para o membro preferido.

          Unitermos: Transferência bilateral. Aprendizagem motora. Habilidade motora.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 15, Nº 154, Marzo de 2011. http://www.efdeportes.com/

1 / 1

Introdução

    A transferência de aprendizagem é o ato de transportar ou aplicar numa situação conhecimentos, habilidades, métodos, ideais, valores, hábitos e atitudes, adquiridos em outros setores, ou situações de vida (CAMPOS, 1970). De acordo com Magill (2000), transferência de aprendizagem é a influência que uma experiência anterior causa no desempenho de uma habilidade num novo contexto ou na aprendizagem de uma nova habilidade. Ela pode ser estimada a partir do ganho (ou perda) na proficiência em uma tarefa, como resultado da prática ou da experiência em outra (SCHMIDT, 2010). Ela está envolvida, toda vez que alunos praticam uma versão da tarefa com a idéia de que a aprendizagem alcançada será útil em alguma outra versão da tarefa, ou também quando os instrutores modificam as habilidades para torná-las mais fácil para praticar.

    A idéia de ensinar para transferência, segundo Schmidt (2010) envolve não somente a maximização da transferência de uma aprendizagem anterior, mas também a seleção daqueles métodos e formas de organizar a prática, que maximizem a transferência e a generalidade. Ela pode ser estimada como a porcentagem de ganho na tarefa critério que resultou da prática na tarefa de transferência anterior.

    Para quem já tem experiência na habilidade é óbvio que uma habilidade específica, que está sendo apresentada pela primeira vez, seja similar a uma outra, aprendida anteriormente. Mas para o aluno essa similaridade não fica tão clara de início. Por isso, Schmidt afirma que indicar padrões similares de ação em diversas habilidades pode ser usado para facilitar a transferência inicial da aprendizagem.

    A transferência de aprendizagem pode ter influência positiva, negativa ou nula na aprendizagem de uma determinada tarefa motora. A transferência positiva acontece quando a experiência com uma habilidade ajuda ou facilita o desempenho da habilidade em um novo contexto, ou na aprendizagem de outra habilidade. A transferência é negativa quando ocorre degradação em alguma habilidade por causa da prática ou experiência em outra, ou na mesma em outra situação (SCHMIDT, 2010; MAGILL, 2000). Já a transferência nula é quando a experiência em uma habilidade não influencia na aprendizagem de uma nova.

    Schmidt (2010) afirma que entre duas tarefas razoavelmente bem aprendidas, que parecem um tanto similares, é normal acontecer muito pouca transferência. A transferência que aparece normalmente é positiva, com as habilidades, facilitando uma a outra, em algum grau. Mas a quantidade de transferência geralmente é tão baixa que a transferência deixa de ser uma meta principal da prática, em contraste com os estágios iniciais da mesma, onde a transferência foi uma meta principal.

    Evidências em laboratórios sugerem que a transferência negativa quase nunca ocorre nas atividades motoras (SCHMIDT, 2010). Na verdade, um sujeito pode degradar uma habilidade, praticando outra, especificamente planejada para interferir, mas isso não é uma situação usual no mundo externo. A maioria das habilidades que as pessoas aprendem se tornam tão específicas com a prática que eventualmente não se transferem, seja positiva ou negativa entre si (SCHMIDT, 2010).

    A transferência da aprendizagem pode ocorrer também entre membros. Essa forma especial de aprendizagem é denominada de transferência bilateral (MAGILL, 2000; TEIXEIRA, 2006). Esse fenômeno demonstra nossa capacidade de aprender uma determinada habilidade com mais facilidade usando uma das mãos ou um dos pés, depois de já termos aprendido a habilidade com a mão ou o pé oposto. Algumas pesquisas que investigaram o direcionamento da transferência de aprendizagem têm identificado que um melhor resultado pode ocorrer do membro preferido para o não-preferido (BYRD, GIBSON, GLEASON, 1986; INUI, 2005; WANG, SAINBURG, 2004). Contudo, existem também estudos que identificaram maior eficiência na transferência do membro não-preferido para o preferido (KUMAR, MANDAL, 2005; LAVRYSEN et al, 2003; PURETZ, 1983; TAYLOR, HEILMAN, 1980).

    Como a maioria dos estudos citados acima investigou a transferência bilateral em tarefas de laboratório, o presente estudo foi realizado para investigar esse fenômeno em uma tarefa motora discreta com maior validade ecológica.

Método

Amostra

    Participaram do estudo 10 atletas da equipe de Ginástica Rítmica Desportiva de uma escola particular de Natal-RN. As atletas tinham idade entre 11 e 13 anos, e sem experiência com a tarefa.

Tarefa e instrumento

    A tarefa consistiu em acertar o maior número de vezes consecutivas a bola em um alvo localizado na parede utilizando uma raquete. O alvo foi um quadrado de 30 cm x 30 cm e os sujeitos ficaram posicionados a 2 metros do alvo.

Procedimentos e delineamento

    A tarefa foi realizada em um ambiente fechado. O aprendiz se posicionava fixamente a uma distância de 2 metros da parede, de pé em frente à mesma, de maneira confortável.

    O experimento foi dividido nas seguintes fases: pré-teste, prática da tarefa e pós-teste. As atletas foram aleatoriamente divididas em 2 grupos, sendo que, o Grupo 1 realizou o pré-teste com o membro preferido e depois com o não preferido. Em seguida foi dado um tempo de prática de dois minutos com o membro preferido. Ao terminar o tempo, o aprendiz repetia, em um pós-teste, o procedimento de início, ou seja, realizava a habilidade com o membro preferido, e depois com o não preferido (tabela 1). Já o Grupo 2 realizou o pré-teste com o membro não preferido, e depois com o preferido. Em seguida foi dado o mesmo tempo de prática, porém com o membro não preferido. Após a prática, foi realizado o pós-teste, inicialmente com o membro não preferido e, finalmente, com o membro preferido (tabela 1).

Tabela 1. Delineamento experimental do estudo

Resultados

    O desempenho foi avaliado pelo número de rebatidas consecutivas acertadas no alvo com a raquete.

    O cálculo da média de rebatidas, em função dos resultados obtidos no pré teste e no pós-teste dos grupos estão descritos na tabela 2.

Tabela 2. Média do número de rebatidas consecutivas

    De acordo com o grau de liberdade escolhido, que foi de 5%, verificou-se na tabela do teste T, o valor 2,78 como t tabelado. Realizando os cálculos referentes a tal teste, foi encontrado os valores 3,9 para o Grupo 1 e 3,56 para o Grupo 2 como t calculado.

    A partir desses resultados encontrados, a transferência bilateral da tarefa proposta parecer ter sido maior do membro não preferido para o preferido.

Considerações finais

    A partir dos resultados obtidos nesta pesquisa, concluímos que, na tarefa aplicada, a transferência bilateral de aprendizagem parece ter sido maior no sentido do membro não preferido para o preferido.

    O resultado pode ser justificado pelo fato de que, a prática da tarefa com o membro não preferido pode ter fortalecido mais a aprendizagem elementos cognitivos e mecanismos envolvidos na programação motora (HICKS, GUALTIERI, SCHROEDER, 1983; PARK, SHEA, 2002) e facilitado a transferência para o membro preferido. Talvez a maior dificuldade de realização da tarefa com o membro não preferido possa ter fortalecido os esquemas de aprendizagem, propiciando sua utilização em uma nova situação posterior (SCHMIDT, 2010).

    Diante disso, esses resultados aqui encontrados dão indicativos para que em situações de ensino de uma determinada tarefa, o professor inicie a atividade com a prática do membro não preferido; após o aluno estar razoavelmente familiarizado com o movimento, ele deverá então praticá-lo com o membro preferido. Assim, será transferida aprendizagem do membro não preferido para o membro oposto.

Referências

  • BYRD, R.; GIBSON, M.; GLEASON, M. H. Bilateral transfer across ages 7 to 17 years. Perceptual and Motor Skills, v. 62, p.87-90, 1986.

  • CAMPOS, D. M. S. Psicologia da aprendizagem. Petrópoles: Vozes Limitada, 1970.

  • HICKS, R. E.; GUALTIERI, C. T.; SCHROEDER, S. R. Cognitive and motor components of bilateral transfer. Journal of General Psychology, v.107, p.277-281, 1983.

  • INUI, N. Lateralization of bilateral transfer of visuomotor information in right-handers and left-handers. Journal of Motor Behavior, v.37, p.275-283, 2005.

  • KUMAR, S.; MANDAL, M. Bilateral transfer of skill in left- and right-handers. Laterality: Asymmetries of Body, Brain, and Cognition, v.10, p.345-352, 2005.

  • LAVRYSEN, A et al. The control of sequential aiming movements: the influence of practice and manual asymmetries on the one-target advantage. Cortex, v.39, p.307-325, 2003.

  • MAGILL, R. A. Aprendizagem motora: conceitos e aplicações. São Paulo, Edgard Blücher, 2000.

  • PARK, J.; SHEA, C. H. Effector independence. Journal of Motor Behavior, v.34, p.253-270, 2002.

  • PURETZ, S. L. Bilateral transfer: the effects of practice on the transfer of complex dance movement patterns. Research Quarterly for Exercise and Sport, v.54, p.48-54, 1983.

  • SCHMIDT, R. A. Aprendizagem e performance motora: dos princípios à prática. São Paulo: Artmed, 2010.

  • TAYLOR, H. G.; HEILMAN, K. M. Left-hemisphere motor dominance in righthanders. Cortex, v.16, p.587-603, 1980.

  • TEIXEIRA, L. A. Intermanual transfer of timing control between tasks holding different levels of motor complexity. Laterality, v.11, p.43-56, 2006.

  • WANG, J.; SAINBURG, R. L. Limitations in interlimb transfer of visuomotor rotations. Experimental Brain Research, v.155, p.1-8, 2004.

Outros artigos em Portugués

  www.efdeportes.com/
Búsqueda personalizada

EFDeportes.com, Revista Digital · Año 15 · N° 154 | Buenos Aires, Marzo de 2011
© 1997-2011 Derechos reservados