A nova fase da educação: tendência à pós-modernidade, alteridade e interdisciplinaridade La nueva etapa de la educación: una tendencia a la postmodernidad, la alteridad y la interdisciplinariedad |
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Licenciatura Plena Educação Física Graduanda do Curso de Música-Licenciatura e é mestre em Educação na Linha de Pesquisa Educação e Artes pela Universidade Federal de Santa Maria, RS Grupo de Pesquisa em Fenomenologia da Universidade de São Paulo (USP), Ribeirão Preto coordenado pelo professor Dr. Cristiano Roque Antunes Barreira |
Mariana Zamberlan Nedel (Brasil) |
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Resumo Apresenta-se este artigo como recorte de uma pesquisa, em nível de mestrado, realizada no programa de Pós Graduação em Educação da Universidade Federal de Santa Maria-RS. A pesquisa girou em torno de compreender narrativas de professores de música e educandos, de 2º a 5º anos, a respeito da utilização de práticas corporais e educação musical como elementos participantes do processo de ensino-aprendizagem da educação infantil. Mas este artigo tem como foco a discussão da tendência à pós-modernidade, e da interdisciplinaridade, onde assiste-se a uma mudança à alteridade – passagem de uma sociedade puramente disciplinar para uma interdisciplinar, na qual passa a existir a valorização das relações baseadas no diálogo, entre o sujeito e aqueles que o rodeiam. Desta forma, a palavra chave da nova fase educacional é interdisciplinaridade e, para que esta seja levada adiante, busca-se a superação de algumas dicotomias e o uso consciente da linguagem, valorizando as particularidades de cada indivíduo e incentivando que o mesmo seja não apenas um reprodutor de histórias alheias, mas um produtor de sua história. Além disso, pensar que os educandos são seres integrados (corpo-mente), e que os mesmos têm suas particularidades e interesses próprios, é uma forma interessante de aproximação ao método apropriado para o processo educativo, para o qual faz-se, também, necessária a existência de um novo cientista, um professor que seja praticante de ações interdisciplinares, na busca por um futuro humanizador. Unitermos: Pós-modernidade. Alteridade. Interdisciplinaridade.
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 15, Nº 154, Marzo de 2011. http://www.efdeportes.com/ |
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Diante de uma tendência à pós-modernidade1, observa-se que esta retoma a arte (há tempos escurecida, apagada)...
À medida que as ciências naturais se aproximam das ciências sociais, estas se aproximam das humanidades. A revalorização dos estudos humanísticos acompanha a revalorização da racionalidade estético-expressiva das artes e da literatura... daí que o discurso científico se aproxime cada vez mais do discurso artístico e literário (Santos, 2002, p. 92).
Fala-se em tendência à pós-modernidade pensando-se em uma visão interdisciplinar em relação à educação, onde o professor se apropria e utiliza-se de diferentes recursos e áreas com a finalidade de realmente ensinar. Uma visão diferente da que pode ser vista no ciclo educacional disciplinar, no qual os educandos são meros “discípulos receptores” de um “mestre”, este sendo, na maioria das vezes, “instrutor de conhecimentos”.
Diante desta sociedade pós-moderna assiste-se a uma mudança para a alteridade2, ou seja, a passagem de uma escola e uma sociedade disciplinar, para uma interdisciplinar, na qual passa a existir a valorização das relações baseadas no diálogo, entre o sujeito e aqueles que o rodeiam.
Percebe-se assim que a palavra chave desta nova fase da educação é interdisciplinaridade, já que ambas, alteridade e interdisciplinaridade, giram em torno dos mesmos princípios: valorização da relação eu e o outro e a relação baseada no diálogo e na integração.
Interdisciplinaridade – palavra composta por um prefixo (inter) e um sufixo (dade), que se justapondo ao substantivo (disciplina) possibilitam a seguinte interpretação:
Inter, prefixo latino, que significa posição ou ação intermediária, reciprocidade, interação (como “interação”, temos aquele fazer que se dá a partir de duas ou mais coisas ou pessoas – mostra-se, pois, na relação sujeito-objeto). Por sua vez, dade (ou idade) sufixo latino, guarda a propriedade de substantivar alguns adjetivos, atribuindo-lhes o sentido de ação ou resultado de ação, qualidade, estado ou, ainda, modo de ser. Já a palavra disciplina, núcleo do termo, significa a epísteme, podendo também ser caracterizado como ordem que convém ao funcionamento duma organização ou ainda um regime de ordem imposta ou livremente consentida (Assumpção, 1993, p. 23-24).
Porém, a dúvida e a insegurança diante do novo, da mudança daquilo que sempre foi certo, faz com que poucos se aventurem nessa alteridade, acarretando assim escolas com uma miscelânea de conceitos e práticas patriarcais e interdisciplinares: disciplinas completamente separadas, com carga horária rígida e extensa, conteúdos não reciclados, currículo não renovado, dentre outros e a vontade de mudança, de pesquisa, de integração.
Diante dessa realidade é possível perceber que para que a interdisciplinaridade possa ser levada adiante, faz-se necessária a “tentativa”3 de superação da barreira teoria/prática e o uso consciente da linguagem, já que a mesma é, segundo Mortimer (2000 apud Neves, 2002), “[...] o mais importante instrumento social que o professor e os educandos utilizam para estruturarem o desenvolvimento das idéias” (p. 61).
Ao nascer, o homem se apodera da palavra, transformando as ações, sentimentos e experiências em discurso. Considerando, então, que cada ser tem sua própria linguagem e se utiliza dela para entrar em contato com o outro e com o mundo, percebe-se que é principalmente através da palavra que o homem interfere no mundo e deixa que este interfira nele. Fazenda (1995) conclui assim que “a palavra é a arma que o homem possui para dominar o mundo e fazer-se senhor dele” (p. 54).
Por ser a palavra algo tão individual de cada ser humano, pode-se observar que cada um pode refletir sobre o que bem entende, bem como externar, da forma como julgar apropriado, acerca das conclusões as quais chegou, o que torna a palavra um importante instrumento de liberdade e expressão, já que este pensamento externado faz uma revelação do interior do indivíduo, permitindo, também, que ele próprio tome consciência sobre si mesmo.
Segundo Dias (1993), essa descoberta de si mesmo, através da linguagem, é de extrema necessidade já que permite que o indivíduo seja produtor de sua história e não um mero reprodutor de histórias alheias. Sendo assim, além de ser um sujeito agente na oralidade, este indivíduo será um produtor de conhecimento próprio.
Pode-se dizer ainda que toda palavra está vinculada a uma ação, já que a mesma sai do campo do pensamento para o campo da realidade. Sendo assim, quando o indivíduo pensa, reflete e age, ele está interferindo no meio, modificando-o, e de forma única, já que ele é único, dotado de particularidades.
Os filósofos Laban (1978) e Freinet (1991), presentes no artigo de Scarpato (2001), dentre outros autores, concebem o homem como um ser integrado (corpo-mente), salientando a necessidade de se respeitar o ritmo interno de cada um. Isto é de fundamental importância, principalmente no âmbito da aprendizagem. Permitir que a espontaneidade emirja, levando em consideração este respeito à individualidade e à subjetividade de cada um é essencial, já que os atos e as atividades espontâneos são uma forma de exteriorização de idéias e sentimentos, dando espaço à criatividade, ao envolvimento e a auto-expressão dos educandos.
Dessa forma, pensar que os educandos são seres integrados (corpo-mente), e que os mesmos têm suas particularidades e interesses próprios, é uma forma interessante de aproximação ao método apropriado para o processo educativo.
O que pode ser entendido como método apropriado? Freire (2005) aponta que o saber pressupõe uma intencionalidade, ou seja, o mesmo sempre busca uma finalidade. A ferramenta para execução dessa intencionalidade é chamada de método. E o melhor método é aquele que propuser a melhor aproximação com o objeto, ou seja, aquele que propiciar a mais completa consecução da finalidade. Refletindo sobre esta aproximação com o objeto, pode-se chegar à conclusão de que a educação é o sujeito e os educandos são o objeto. Conseqüentemente, o método é o processo educativo.
Retomando o raciocínio de homem integrado, pode-se perceber que corpo/mente ou corpo/alma estão tão ligados que quando o corpo está doente a alma passa a ficar enfraquecida, tão doente quanto o primeiro. Percebe-se assim quão importante é prestar atenção em relação a este aspecto, em que corpo e alma comunicam-se através de seus males.
Foucault (1985) também trata desta concepção de homem integrado, corpo e alma como sendo um só. Para ele, “[...] os maus hábitos da alma podem levar a misérias físicas enquanto que os excessos do corpo manifestam e sustentam as falhas da alma” (Foucault, 1985, p. 62).
Sendo assim, se existe o interesse em viver, hoje, na educação, um momento de alteridade (como construção/produção de conhecimento), onde existe a valorização do ser humano integral, que se relaciona com o outro e com o mundo, é imprescindível que exista uma troca de experiências entre o professor e seus educandos, sendo através dessa atitude de abertura que o conhecimento pode ser mutuamente importante e eficaz (Peña, 1993).
Para que ocorra, então, um processo pedagógico voltado ao educando, é necessária a existência de um professor interdisciplinar, que traga em si o gosto pelo conhecimento e pela pesquisa em múltiplas direções, sejam de ordem teórica, prática, ou ambas; que possua um grau diferenciado para com seus educandos; que se permita ousar nas técnicas e nos procedimentos de ensino, além do cuidado em tornar essas técnicas transformáveis, de acordo com as necessidades e particularidades de cada educando (Fazenda, 1995). Um professor que primeiramente aprendeu a fazer uma leitura em relação a sua própria vida, aprimorando seu gosto pelo ensino e pela pesquisa, ousadia, criação e construção. Além disso, segundo Piaget (s/d apud Fazenda, 1995), o “bom professor” deve ensinar o educando a não ter pressa em aprender, em não se apressar em virar a página, mas, sim, se demorar nela. Vê-se, assim, um professor envolvido em cada ato, em cada momento, com cada educando... um professor envolvido com o todo, possibilitando o estabelecimento de uma relação entre os diferentes saberes como um todo.
Porém, para que tudo isso ocorra, existe um importante fator que pode passar desapercebido por muitos: antes de realizar qualquer atitude interdisciplinar é imprescindível que o professor reconheça sua identidade pessoal profunda, seu “eu verdadeiro”4 e se perceba interdisciplinar.
É às vezes na perseverança de alguém em tentar recorrer a outras fontes do conhecimento para compreender a complexidade de um texto teórico ou de um problema surgido na prática, que o indivíduo consegue perceber-se interdisciplinar. É no grau de envolvimento que o problema o conduz, na forma aberta como se dispõe a discuti-lo ou na paciência da espera para compreender facetas insuspeitadas de ângulos ainda por conhecer que o indivíduo consegue perceber-se interdisciplinar (Fazenda, 1995, p. 78).
Sendo assim, para que o professor torne-se praticante de ações interdisciplinares, faz-se necessário que ele pense em si mesmo como um ser total, integral, que vai muito além da simples junção do “eu professor”, o “eu amigo”, o “eu marido”, etc... Ou seja, deve-se pensar no “eu harmônico” ao invés de se pensar no “eu fragmentado”.
Louro (2004), em sua tese, explica a metáfora do girassol, para explicar que o ser humano tem um “eu central”, mas que desse centro, desta identidade profunda, partem as pétalas, que são os diversos âmbitos da vida de cada ser humano:
[...] Essa coisa que tu falastes do polvo com muitos tentáculos, quando tu estavas fazendo os gestos com a mão, me lembrou como se fosse uma flor, sabe, o girassol... que tem aquele centrão amarelão, assim, com aquele monte de pétalas [...] de fato, paralelo não pressupõe a idéia de que há uma interação entre essas faixas paralelas, e eu acho que o que tenho buscado é essa integração entre esses muitos lados, essas muitas faces, acho que é por aí. (Luciana, segunda entrevista, p.34-40 apud Louro, 2004, p.152).
Realizando, então, esse encontro consigo mesmo será possível que o professor, o educando, e o homem se encontrem, se sintam, para que podendo ser, possam então fazer (Peña, 1993).
Após o processo como um todo, ou seja, perceber-se interdisciplinar e pesquisar sobre este tema, o passo seguinte segue na direção da aplicação desse conhecimento, vivenciando-o e não apenas refletindo acerca do mesmo, já que para ser um professor/pesquisador interdisciplinar não basta ler inúmeros autores, acerca de diferentes temas, mas sim aplicar e agir a partir destes pensamentos, passando do individual para o coletivo, o que, segundo Tavares (1993), só será possível “quando o vírus da fragmentação estiver exterminado” (p. 30).
Quando se pensa neste novo cientista, o que se pode ver? Que se trata de um profissional aberto ao diálogo, à comunicação, às novas propostas para uma nova escola e uma nova sociedade, que utiliza todo o seu passado como base para a construção de um futuro humanizador.
Entende-se por futuro humanizador um futuro destinado ao desenvolvimento das crianças, ao crescimento das mesmas, nos diferentes âmbitos de suas vidas. Levando em consideração seus pensamentos, famílias, ideais e crenças. Além disso, um futuro humanizador seria aquele baseado em uma educação total, não no sentido de afirmar que exista uma educação completa e total, mas sim no sentido da necessidade que o ser humano tem na existência de uma educação que seja pautada na coletividade e na totalidade, como afirmam Melo; Antunes; Schneider (2005), que integra os diferentes conteúdos disciplinares entre si e considera a realidade dos educandos, proporcionando uma educação alegre e lúdica, baseada em improviso, criatividade, criticidade, motivação, e benefícios para os diversos âmbitos da vida do ser humano.
Notas
Aplica-se este termo no sentido utilizado pelo sociólogo Zygmunt Bauman que acredita ser este o tempo que combina pensamentos novos com realidades retrógradas, ocorrendo a existência de uma realidade ambígua (Francisco, s/d).
Termo adotado por C. Byington, referindo-se a um ciclo que instaura a reciprocidade, a relação dialética entre o eu e o outro, entre o sujeito e o objeto, uma busca intensa e profunda pela identidade, confronto entre os opostos (Fazenda, 1995).
Utiliza-se aqui a palavra tentativa, por acreditar que não exista uma superação real.
Termo utilizado por Isaia (2001 apud Louro, 2004, p.152).
Referências bibliográficas
ASSUMPÇÃO, I. Interdisciplinaridade: uma tentativa de compreensão do fenômeno. In: FAZENDA, I. C. A. (Org). Práticas Interdisciplinares na escola. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1993. cap. 3, p. 23-25.
DIAS, L. S. de M. e. Interdisciplinaridade: em tempo de diálogo. In: FAZENDA, I. C. A. (Org). Práticas Interdisciplinares na escola. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1993. cap. 6, p. 37-45.
FAZENDA, I. C. A. Interdisciplinaridade: história, teoria e pesquisa. 2. ed. Campinas: Papirus Editora, 1995. 143 p.
FOUCAULT, M. História da Sexualidade III: o cuidado de si. Tradução: Maria Thereza da Costa Albuquerque. Revisão técnica: José Augusto Guilhon Albuquerque. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1985. 234 p.
FRANCISCO, L. V. A modernidade da fusão social pela solidificação individual: Modernidade Líquida, de Zygmunt Bauman. In: Klepsidra. Disponível em: http://www.klepsidra.net/klepsidra23/modernidade.htm, Acesso em: 25 agosto 2009.
FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 43. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005. 213 p.
LOURO, A. L. de M. e. Ser docente universitário-professor de música: dialogando sobre identidades profissionais com professores de instrumento. 2004. 195f. Tese (Doutorado em Música) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2004.
MELO, C. K. de; ANTUNES, P. de C.; SCHINEIDER, M. D. Cuida(do) corpo: experimentações acerca do ‘cuidar de si’. In: SILVA, A. M.; DAMIANI, I. R. (Org). Práticas Corporais: experiências em Educação Física para a outra Formação Humana. Florianópolis: Nauemblu Ciência & Arte, 2005. 3v, cap. 5, p. 89-114.
NEVES, M. C. D. Lições da escuridão ou revisitando velhos fantasmas do fazer e do ensinar ciência. Campinas: Mercado de Letras, 2002. 119 p.
PEÑA, M. de los D. J. Interdisciplinaridade: questão de atitude. In: FAZENDA, I. C. A. (Org). Práticas Interdisciplinares na escola. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1993. cap. 8, p. 57-64.
SANTOS, B. de S. Para um novo senso comum: a ciência, o direito e a política na transição paradigmática. v. 1, 4. ed. São Paulo: Cortez, 2002. 415 p.
SCARPATO, M. T. Dança educativa: um fato em escolas de São Paulo. In: CADERNOS CEDES, v. 21, n. 53, abril 2001.
TAVARES, D. E. Aspectos da história deste livro. In: FAZENDA, I. C. A. (Org). Práticas Interdisciplinares na escola. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1993, cap. 4, p. 27-31.
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