Influência do treinamento físico sobre a freqüência cardíaca de repouso Influencia del entrenamiento físico sobre la frecuencia cardíaca en reposo |
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*Graduado em Educação Física Especialista em Aspectos Biodinâmicos do Movimento Mestrando em Aspectos Biodinâmicos do Movimento Humano Faculdade de Educação Física. Universidade Federal de Juiz de Fora **Acadêmico de Educação Física. Universidade Federal de Juiz de Fora ***Acadêmica de Educação Física Bolsista FAPEMIG de Iniciação Científica Universidade Federal de Juiz de Fora |
Tiago Peçanha de Oliveira* Rhenan Bartels Ferreira** Josiane Pereira da Silva*** Raphael de Alvarenga Mattos** (Brasil) |
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Resumo Introdução: Uma baixa freqüência cardíaca de repouso reflete uma boa condição de saúde, enquanto valores maiores estão associados a um pior prognóstico de saúde. Um dos efeitos comumente associados ao treinamento físico é a diminuição da frequência cardíaca de repouso. Entretanto, a literatura ainda apresenta resultados controversos quando à real influência do treinamento físico sobre a freqüência cardíaca de repouso. Objetivo: Verificar a influência do nível de treinamento físico na freqüência cardíaca de repouso, em indivíduos jovens e saudáveis. Métodos: Participaram do estudo, 39 indivíduos, saudáveis, do sexo masculino. O protocolo experimental constou de aplicação do questionário de atividade física (Baecke, 1982) e registro da freqüência cardíaca de repouso. Dividiu-se a amostra nos seguintes grupos, de acordo com o nível de treinamento físico: BaixoTF, ModeradoTF e AltoTF. Comparou-se a freqüência cardíaca entre os grupos. Resultados: Não houve diferença estatisticamente significativa na freqüência cardíaca de repouso entre os grupos. Conclusão: O treinamento físico não influenciou a freqüência cardíaca de repouso em indivíduos jovens e saudáveis. Unitermos: Freqüência cardíaca. Exercício. Sistema nervoso autônomo.
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 15, Nº 153, Febrero de 2011. http://www.efdeportes.com/ |
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Introdução
Uma baixa freqüência cardíaca de repouso, também conhecido como bradicardia de repouso, reflete uma boa condição de saúde, enquanto valores maiores desta variável estão associados a um pior prognóstico de saúde (JOUVEN et al., 2005).
Um dos efeitos comumente associados ao treinamento físico é a diminuição da frequência cardíaca de repouso. Os mecanismos responsáveis por este fenômento seriam o aumento do tônus parassimpático, diminuição do tônus simpático e/ou diminuição do ritmo intrínseco de despolarização cardíaca (TULPPO et al., 2003). Entretanto, apesar de diversas evidências indicarem que indivíduos muito bem treinados ou condicionados, apresentam menores valores de FC de repouso (WILMORE et al., 1996; BONADUCE et al., 1998; UUSITALO et al., 1998; LEVY et al., 1996; TULPPO et al., 2003), alguns estudos não encontraram resultados similares (Melanson & Freedson 2001; MARTINMÄKI et al., 2008), o que coloca em dúvida o paradigma exposto.
Não se sabe ao certo se é o treinamento físico que proporciona a diminuição da freqüência cardíaca de repouso ou se o principal determinante de tal resposta seria uma condição genética favorável, típica de atletas. Fatores como idade, carga de treinamento, modulação autonômica cardíaca de base, também podem explicar as diferenças de resultados encontradas.
Baseado nisto, o objetivo do presente estudo foi verificar a influência do nível de treinamento físico na freqüência cardíaca de repouso, em indivíduos jovens e saudáveis.
Métodos
Sujeitos
Participaram do estudo, 39 indivíduos, saudáveis, do sexo masculino (idade = 22,5±3 anos; IMC = 24,4±2 kg/m2). Todos os indivíduos foram aconselhados a não ingerir bebida alcoólica ou cafeinada, assim como a não praticar qualquer exercício físico 24 horas antes dos testes. O uso de medicamentos que afetassem a função cardiovascular foi critério de exclusão para o estudo. Os indivíduos foram devidamente orientados quanto aos procedimentos a serem realizados e assinaram o termo consentimento livre e esclarecido. O protocolo experimental foi aprovado pelo comitê e ética em pesquisa com seres humanos da Universidade Federal de Juiz de Fora.
Protocolo experimental
Inicialmente os indivíduos responderam a uma anamnese. Após isto, foi realizado: avaliação antropométrica (massa corporal e estatura), aplicação do questionário de atividade física e registro dos iRR de repouso.
Avaliação do nível de atividade física
O nível de atividade física foi avaliado por meio do questionário internacional do nível de atividade física (QIAF) (BAECKE et al., 1982), validado para estudos com adultos brasileiros (FLORINDO & LATORRE, 2003). Considerou-se apenas a prática sistematizada de exercícios físicos/esportes; ou seja, o treinamento físico (TF) dos mesmos, através do cálculo do escore bruto da questão nove do QIAF, relativa à prática de esportes/exercícios físicos.
Registro e análise da FC de repouso
Registrou-se, com a utilização do cardiofrequencímetro Polar S810i (freqüência de aquisição de 1000 Hz), a FC de repouso. Para isto, os indivíduos permaneceram na posição supina, durante 15 minutos, com respiração espontânea. Selecionou-se os últimos 5 minutos de registro e a média da FC deste período foi definida como a FC de repouso dos indivíduos.
Análise estatística
Os dados foram apresentados em média ± desvio padrão. Os indivíduos foram divididos - quanto ao TF - em três grupos iguais: baixoTF (n=13), moderadoTF (n=13) e altoTF (n=13). Para comparação de grupos, utilizou-se de anova one way para medidas independentes.
Resultados
A tabela 1 mostra a caracterização da amostra. Não houve diferenças significativas quanto à idade ou ao IMC entre os grupos.
Tabela 1. Caracterização da amostra
(*) Diferença significativa em relação ao BaixoTF (p<0,05)
(**) Diferença significativa em relação ao BaixoTF e ao ModeradoTF (p<0,05)
A Figura 1 mostra os valores de FC de repouso nos grupos formados. Não houve diferença estatisticamente significativa na FC de repouso entre os grupos.
Figura 1. Comparação da FC de repouso entre os grupos
Discussão
O presente estudo não foi capaz de encontrar qualquer influência do treinamento físico sobre a freqüência cardíaca de repouso. Os resultados do presente estudo não dão suporte ao discurso que associa o treinamento físico à menores valores de freqüência cardíaca.
Almeida & Araújo (2003), em uma revisão sobre os efeitos do treinamento aeróbico sobre a freqüência cardíaca, reiteram que ainda é incerto se o treinamento físico provoca, sozinho, a diminuição da freqüência cardíaca de repouso. A maioria dos estudos não leva em consideração o nível de condicionamento aeróbio, a função autonômica dos atletas antes do programa de treinamento. A carga de treinamento também pode estar por trás dos resultados inconclusivos.
É possível que as mudanças na freqüência cardíaca associadas ao treinamento físico se dêem em maior magnitude em indivíduos com níveis mais baixos de condicionamento físico. Neste caso, o treinamento físico aperfeiçoaria o condicionamento físico e este fator estaria por trás da queda da freqüência cardíaca. Neste sentido, é de extrema importância a devida distinção entre treinamento físico e aptidão aeróbia. O primeiro refere-se às cargas de treinamento físico as quais o indivíduo é submetido de forma regular. O segundo diz respeito a uma condição física, associada ou não com o treinamento físico, que indica a capacidade e potência do indivíduo para realização do exercício aeróbico. O treinamento físico é normalmente medido através de questionários ou métodos mais avançados, enquanto a aptidão aeróbia é medida através do cálculo do VO2 máximo. Buchheit et al., (2007) demonstraram que a aptidão aeróbia parece ser a principal determinante de adaptações positivas em variáveis cardiovasculares de repouso. Para tais autores, o treinamento físico influenciaria diretamente variáveis da recuperação ou em outras situações associadas ao exercício físico. O objetivo do presente estudo foi avaliar o efeito do treinamento físico, e não da aptidão aeróbia, sobre a freqüência cardíaca de repouso. É possível que a confusão dos termos esteja por trás dos resultados controversos encontrados na revisão de literatura.
Quanto à influência da modulação autonômica cardíaca de base, uma das hipóteses diz que a diminuição da freqüência cardíaca de repouso após um programa de treinamento físico está mais associada a um maior tônus vagal cardíaco de base, do que ao treinamento físico propriamente dito (BOUTCHER et al., 1995). Neste caso,
Outro fator que deve ser considerado é a carga de treinamento. Tem sido mostrado que programas de treinamento mais intensos têm provocado diminuição da FC de repouso (CARTER et al., 2003; LEICHT et al., 2003; MOUROT et al., 2004). Por outro lado, estudos que propuseram exercícios menos intensos e/ou volumosos, tais como o de Melanson & Freedson (2001), não encontraram diferenças significativas na freqüência cardíaca de repouso após o treinamento físico. No referido estudo, os indivíduos exercitaram apenas três vezes por semana, durante 30 minutos, em uma intensidade que variou de 70 a 80% da FC de reserva, durante 16 semanas.
O nosso estudo, de caráter transversal, dividiu três grupos em função de um escore de treinamento físico medido a partir de um questionário. Não foi medido o condicionamento aeróbico, nem a modulação autonômica cardíaca de base e é possível que, mesmo o grupo AltoTF não apresente níveis de treinamento físico condizentes com a diminuição na freqüência cardíaca de repouso. Os fatores acima abordados expliquem o fato de não ter sido observado qualquer influência do treinamento físico sobre a freqüência cardíaca de repouso, demonstrado no presente estudo.
Conclusão
O treinamento físico não influenciou a freqüência cardíaca de repouso em indivíduos jovens e saudáveis. Fatores como nível de condicionamento físico, modulação autonômica cardíaca de base e carga de treinamento provavelmente interferem nos resultados e devem ser levados em consideração nos próximos estudos.
Referências
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