Aspectos éticos em pesquisas envolvendo seres humanos Aspectos éticos en investigaciones con seres humanos Ethics aspects in research with humans |
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* Nutricionista. Pós-Graduanda em Ciência dos Alimentos pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Pelotas, RS e Bioética e Pastoral da Saúde pelo Centro Universitário São Camilo (São Paulo-SP). ** Nutricionista. Mestre em Saúde Coletiva. Universidade Luterana do Brasil (ULBRA) Docente do Curso de Nutrição do Centro Universitário Franciscano (Unifra) (Santa Maria-RS) *** Graduanda em Nutrição. Universidade de Cruz Alta (Unicruz) (Cruz Alta-RS) |
Gisele Medianeira Barbieri Moro* Karen Mello de Mattos** Franciele Sartori*** (Brasil) |
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Resumo Há muitos anos utiliza-se o Ser humano como sujeito de pesquisa. A evolução das áreas de Ciências Biológicas e da Saúde pode ser atribuída à pesquisa em seres humanos, mas muitas vezes esta pode interferir de uma maneira prejudicial para os sujeitos da pesquisa. O objetivo deste estudo foi descrever os aspectos éticos em pesquisas envolvendo seres humanos, através de uma revisão da literatura, com bases de dados PubMed e Medline, utilizando a interface de pesquisa da biblioteca virtual de saúde BIREME e livros específicos da área. Alguns fatos tiveram grande impacto histórico, impondo a necessidade de discussões de cunho ético, como as experiências atrozes realizadas pelos cientistas com os prisioneiros na última grande guerra, o que motivou a edição do Código de Nuremberg, que estabeleceu, pela primeira vez, regras a serem observadas na pesquisa em seres humanos. A partir disso, surgiram mais normatizações em resposta às atrocidades cometidas em pesquisas, as quais devem ser executadas dentro de padrões éticos. Unitermos: Bioética. Etica em pesquisa. Declaração de Helsinque.
Abstract For many years we use the human being as research subjects. The development of areas of Life Sciences and Health can be attributed to research in human beings, but this can frequently interfere in a manner that is harmful to the research subjects. The aim of this study was to describe the ethical aspects of research involving humans, through a literature review, with the PubMed and Medline using the search interface of the virtual library of health books and BIREME specific area. Several factors had a great historical impact, and imposed the need for discussions of an ethical nature, such as the atrocious experiments conducted by scientists in prisoners during the last World War, which motivated the publication of the Nuremberg Code, which for the first time, established rules to be observed in research involving human beings. From this, regulations appeared in response to the atrocities committed in research, which must be performed within ethical standards.Keywords: Bioethics. Research ethics. Declaration of Helsinki.
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 15, Nº 153, Febrero de 2011. http://www.efdeportes.com/ |
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Introdução
Nos últimos anos, as pesquisas científicas nas áreas das Ciências Biológicas e da Saúde proporcionaram grandes descobertas sobre a fisiologia humana e os processos patológicos que geram as enfermidades. Além do conhecimento sobre as causas das doenças e sua evolução, essas pesquisas trouxeram a perspectiva do desenvolvimento de novas tecnologias biomédicas para o controle ou até mesmo a cura dessas doenças (ALMEIDA, 2009).
Diferentemente do que acontece em outras áreas, o estudo clínico, também conhecido como ensaio clínico ou pesquisa clínica, aplica-se a toda forma de experimento planejado que envolve paciente e é destinado a elucidar o tratamento mais apropriado de futuros pacientes com uma determinada condição médica (POCOCK, 1987 apud CARNEIRO; ANDRADES; BASTOS, 2009). Há evidências científicas de que os estudos clínicos são essenciais para o avanço da ciência médica e considerados prioridade para os centros de saúde acadêmicos, universitários e, também, para as agências nacionais e internacionais que financiam pesquisas (EMBI et al., 2005).
A realização dos experimentos em seres humanos pode expor a saúde individual e coletiva de pessoas que indiretamente não serão beneficiadas pelos resultados da pesquisa. Nesse contexto, as discussões da ética nos ensaios clínicos despertam o interesse de pesquisadores e ocasiona grandes debates. A pesquisa clínica é fundamental para a melhoria da qualidade de vida das populações, mas a questão que emerge é até que ponto pode-se permitir a participação de pessoas em estudos dessa natureza, em função dos avanços da Medicina. Visto que, o limite ético das investigações e experimentos em seres humanos está entre a real necessidade da experimentação científica e a violação do direito à saúde, o objetivo do presente estudo foi descrever os aspectos éticos em pesquisa envolvendo seres humanos.
Pesquisas clínicas envolvendo seres humanos
Há muitos anos utiliza-se o Ser humano como sujeito de pesquisa (VIEIRA; HOSSNE, 1987). O crescente desenvolvimento das Ciências Biológicas e da Saúde, principalmente na área da Medicina, fez com que a pesquisa e os ensaios clínicos se tornassem estudos cada vez mais comuns (ALMEIDA, 2009).
A reflexão ética sobre os estudos de cadáveres e de seres vivos tanto humanos quanto não-humanos está presente desde muito tempo. A dissecação anatômica do cadáver humano foi oficialmente autorizada por Clemente VII, em 1537, uma vez que fazê-lo anteriormente era considerado um sacrilégio, a menos que se tratasse de um homem e, possivelmente, de um criminoso. O valor e a certeza do conhecimento residiam no estudo teológico e não na observação natural, a qual era menos estimada nessa época (KOTTOW, 2008).
A partir de então se deu o início da ciência experimental. Para muitos autores tem início no século XVI com Galileu Galilei (1564-1642) como precursor, o qual postulava sempre que a verdade deveria ser buscada na experimentação e na observação (HOSSNE, 2002).
Desde esta época e durante os dois séculos seguintes, acontece o que alguns denominam de Revolução Científica, que da Itália de Galileu, passa para a França e para a Inglaterra, com Isaac Newton. As questões éticas advindas e ou relacionadas aos novos conhecimentos que surgiam a todo instante nesse período da história até as primeiras décadas do século XX, eram tratadas de acordo com a ética da virtude do próprio pesquisador (HOSSNE, 2002).
Nesse período, os pesquisadores utilizavam como sujeitos dos experimentos não somente eles próprios (fenômeno da auto-experimentação), mas também seus familiares e vizinhos. Logo após o descobrimento da necessidade de provas mais conclusivas a partir da realização dos experimentos, passou-se a incluir um número cada vez maior de participantes nos estudos, surgindo assim, a preocupação com a eticidade requerida para sua realização (DINIZ; GUILHEM; SCHUCKLENK, 2005).
No início do século XX, em 1901, Walter Reed já apontava alguns requisitos fundamentais para haver um mínimo de ética em pesquisa, como o consentimento dos participantes bem como o pagamento em dinheiro pela participação destes nos estudos (DINIZ; GUILHEM; SCHUCKLENK, 2005).
Na época da escravidão, novos tratamentos eram experimentados em indivíduos que apresentavam sintomas ainda não conhecidos, ou mesmo em indivíduos que não “respondiam” aos tratamentos já definidos cientificamente. Todavia, nesse mesmo período, também já havia um castigo para os pesquisadores que errassem seus experimentos, conhecido como o Código de Hammurabi. O Código conferia castigos que variavam desde o pagamento de simples multas, como a doação de novos escravos para o Senhor de engenho, e até mesmo a amputação das mãos do médico, para que esse não cometesse novos erros (VIEIRA; HOSSNE, 1987).
A evolução da Medicina fez surgir desafios sociais que exigiam soluções. Alguns fatos, nessa época, tiveram grande impacto histórico, impondo a necessidade de discussões de cunho ético (COSTA; GARRAFA; OSELKA, 1998).
Os trágicos acontecimentos durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), envolvendo práticas de eutanásia e experimentos médicos em grupos étnicos e raciais, levaram ao surgimento do Código de Nuremberg em 1947, cujo conteúdo estabelecia condutas que os pesquisadores médicos deveriam seguir quando da realização de experimentos que envolvessem seres humanos. Aspectos como a essencialidade do consentimento prévio e individual por parte do participante em um experimento, o direito de o indivíduo retirar-se do grupo a qualquer momento e a definição de que os experimentos em humanos somente seriam realizados quando não houvesse outra metodologia disponível para se obter os resultados desejados, excluindo-se experiências ao acaso ou desnecessárias, estavam descritos neste Código (SCHATZMAYR; MÜLLER, 2008). Esses aspectos deveriam ser obedecidos por todos aqueles que pretendiam utilizar o ser humano como objeto de estudo, principalmente na Medicina, área que mais se desenvolvia no período (JUNIOR, 2008).
No ano seguinte, a Assembléia Geral das Nações Unidas criou a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Anos mais tarde, depois de várias discussões sobre pesquisa, foi criada na 18ª Assembléia Geral da Associação Médica Mundial, realizada em Helsinque (Finlândia) a Declaração de Helsinque (1964) que teve considerável aceitação mundial e importância histórica. Nos anos seguintes, a Declaração de Helsinque passou por diversas revisões, como em Tóquio (1975), Veneza (1983), Hong Kong (1989), Somerset West (1996), e mais recentemente, em Edimburgo (2000), tornando-se um documento de referência essencial aos Comitês de Ética em todo o mundo (GARRAFA; PRADO, 2001).
Com a criação dos Códigos de Nuremberg e da Declaração Helsinque, a comunidade científica passou a conduzir as pesquisas de maneira diferente e vários casos de utilização desrespeitosa de seres humanos vieram à tona. É o caso do estudo de Tugeskee, experimento conduzido pelo Serviço de Saúde Pública dos Estados Unidos. Entre 1932 e 1972, cerca de 400 homens negros portadores de sífilis, agricultores do estado de Alabama, em sua maioria pobres e analfabetos, serviram, sem saber, de “cobaias” para se estudar a progressão da doença com ausência de cuidados. A eles foi oferecido apenas placebo, mesmo após a descoberta da penicilina, que seria o medicamento fundamental para a o tratamento de tal doença (CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA, 1970 apud CARNEIRO; ANDRADES; BASTOS, 2009). Além deste, pais de crianças deficientes da Willowbrook State School, que entre os anos de 1956 e 1970, foram coagidos a aceitar a injeção de cepas de vírus da hepatite em seus filhos para estudar uma nova forma de profilaxia eficaz; e em 1963, médicos de um hospital no Brooklyn em Nova York, com a autorização do diretor do hospital judeu para pacientes de doenças crônicas, injetaram células cancerosas em 22 pacientes debilitados, sem avisar a nenhum deles, ou mesmo a suas famílias, que se tratava de células com a finalidade de analisar a resposta do organismo a células estranhas (CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA, 1970 apud CARNEIRO; ANDRADES; BASTOS, 2009).
A atitude da imprensa foi fundamental para a divulgação de tais práticas, permitindo, pela pressão da sociedade, o nascimento de um novo campo de estudos conhecido como Bioética (MARSICANO et al., 2008).
A Bioética é um ramo da Ética que abrange a área interdisciplinar, de extrema importância na sociedade atual. Tem a finalidade de elucidar e solucionar questões éticas provocadas pelo avanço das tecnociências biomédicas. Baseia-se na análise rigorosa dos fatos, buscando meios coerentes para a resolução de dilemas morais relacionados à vida (PUCCI, 2009).
O termo Bioética foi empregado pela primeira vez no início da década de 1970 pelo biólogo Van Rensseler Potter, da Universidade de Wiscosin, que se preocupou com o desenvolvimento da ciência e com a preservação do equilíbrio entre o homem e o ecossistema, bem como suas possíveis repercussões para a vida humana (URBAN, 2003). Assim, tornou-se necessário avaliar sob diferentes pontos de vistas os benefícios e riscos que a pesquisa pode apresentar para o sujeito e a sociedade, obrigando os projetos a passarem por comitês de ética para serem analisados (MARSICANO et al., 2008). Potter publicou a obra Bioethics: a bridge to the future (Bioética: uma ponte para o futuro), no qual definiu a Bioética como a “ciência da sobrevivência humana”, que auxiliaria a humanidade no sentido de participação racional e cautelosa no processo da evolução biológica e cultural (PUCCI, 2009).
Em 1971, André Hellegers, obstetra holandês, fundou o Instituto Kennedy na Universidade de Georgetown, nos Estados Unidos, sendo o responsável pela contextualização institucional do conceito de Bioética, consagrando-o nos meios acadêmicos. Através do Instituto Kennedy foram publicadas três edições (1978/1995/2004) da Enciclopédia de Bioética, que até hoje são modelo e referência para o estudo da Bioética em todo o mundo (PUCCI, 2009). Na terceira e última edição desta Enciclopédia, Post (2004), definiu Bioética como o exame moral interdisciplinar e ético das dimensões da conduta humana nas áreas das ciências da vida e da saúde. Outros pesquisadores também conceituam Bioética, como faz Schramm (2008, p.13.):
Em suma, a bioética pode ser pensada como meio prático para proteger seres e entes vivos contra ameaças que podem prejudicar de maneira irreversível suas existências, além de ser também um meio "de segunda ordem" para entender a moralidade e seus conflitos, imanentes ao próprio viver juntos.
De acordo com Goldim (2006, p.91), a Bioética é uma reflexão compartilhada, complexa e interdisciplinar sobre a adequação das ações que envolvem a vida e o viver.
Em 1978, foi divulgado o Relatório de Belmon. Este relatório é o resultado das deliberações da Comissão Nacional para Proteção de Sujeitos Humanos em Pesquisas Biomédicas e Comportamentais, que duraram aproximadamente quatro anos, e visavam definir os princípios éticos norteadores para a condução de pesquisas em seres humanos como uma forma de coibir condutas abusivas (COSTA; GARRAFA; OSELKA, 1998).
O Relatório de Belmont deu um novo enfoque ético de abordagem metodológica aos conflitos resultantes das pesquisas com seres humanos. Logo após a divulgação de tal Relatório, os estudiosos Tom L. Beauchamp e James Childress publicaram o livro “Princípios da Ética Biomédica”, introduzindo a Bioética a teoria principialista, na qual são abordados quatro princípios éticos como referência: autonomia, beneficência, não-maleficência e justiça (COSTA; GARRAFA; OSELKA, 1998).
A revolução tecnológica e a biológica foram responsáveis pela explosão da Bioética. A tecnológica ressaltou a revolução terapêutica que, ao mesmo tempo em que deu ao homem o poder de triunfar sobre doenças que durante muito tempo haviam sido fatais, também demonstrou a necessidade de investigação rigorosa sobre novos medicamentos, avaliando suas vantagens e desvantagens. A revolução biológica, mais recente, trouxe os conceitos de patologia molecular, responsável pelos campos da reprodução - e hereditariedade, por meio da engenharia genética (VEATCH, 1994).
A primeira tentativa de regulamentar a pesquisa em seres humanos no Brasil, por meio de uma legislação, foi em 1988, com a Resolução do Conselho Nacional de Saúde (CNS), pois a legislação vigente até então regulamentava somente alguns aspectos em relação à importação de drogas destinadas às pesquisas não registradas no país – Lei nº 6.360/76 e Decreto nº 70.094/77 (NISHIOKA, 2006).
As discussões acerca da utilização de humanos em pesquisas levaram a criação de documentos, como as “Diretrizes Internacionais para Revisão Ética de Estudos Epidemiológicos” em 1991 e posteriormente, as “Diretrizes Éticas Internacionais sobre Pesquisas Biomédicas Envolvendo Seres Humanos”, em 1993, produzidas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) (GARRAFA; PRADO, 2001).
Em 1993, foi lançada a revista Bioética pelo Conselho Federal de Medicina (CFM); e em 1995, foi fundada a Sociedade Brasileira de Bioética, com o objetivo de formar profissionais e discutir as políticas de saúde no país (FORTES, 1998).
Em 1996, o CNS fixou a resolução 196/96, normatizando pesquisas em seres humanos e, desde então, inúmeras publicações têm sido lançadas divulgando o assunto, entre elas, uma das de maior destaque foi o livro Iniciação à Bioética, também editado pelo CFM (VEATCH, 1994).
Foi criada, também, a Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP), vinculada ao Ministério da Saúde, que tem como objetivo proteger os voluntários em pesquisas que envolvam direta ou indiretamente os seres humanos. Ao CONEP, são vinculados os Comitês de Ética em Pesquisa (CEPs) que representam o CONEP em âmbito regional. Sendo assim, são criados vários CEPs ao longo do território nacional visando analisar, julgar de maneira crítica e imparcial, aprovando ou não projetos envolvendo vidas humanas. Os CEPS devem estar vinculados a Instituições que realizem pesquisas envolvendo Seres Humanos, em qualquer área do conhecimento (JUNIOR, 2008).
A primeira legislação sanitária sobre a pesquisa clínica surgiu com a Portaria nº. 911 da Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária (SVS), publicada em 1998, e ainda vigente, contempla a lista de documentos e procedimentos necessários para a aprovação de protocolos em ensaios clínicos no Brasil. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), criada em 1999, passou a fazer o papel da SVS na regulamentação dos ensaios clínicos no país (ALMEIDA, 2009).
Atualmente o Brasil é membro da Pan American Network on Drug Regulatory, promovida pela Organização Pan-Americana de Saúde, que incluí um grupo de pesquisadores que buscam boas práticas clínicas dentro do continente, garantindo a segurança das pessoas envolvidas e a credibilidade do país (ALMEIDA, 2009).
Aspectos éticos na pesquisa com seres humanos
Todo projeto de pesquisa que se propõe a trabalhar com seres humanos apresenta implicações éticas que necessitam serem discutidas e adequadas para sua execução. Para se cumprir com as determinações éticas previstas é necessário observar rigorosamente as recomendações contidas na Resolução nº 196/96 (BRASIL, 1996).
Segundo esta Resolução, vigente em todo o país, pesquisa envolvendo seres humanos é aquela que “individual ou coletivamente, envolva o ser humano, de forma direta ou indireta, em sua totalidade ou parte dele, incluindo o manejo de informações ou materiais”. Desta forma, os procedimentos incluem, entre outros, os de natureza instrumental, ambiental, nutricional, educacional, sociológica, econômica, física, psíquica ou biológica, sejam eles farmacológicos, clínicos ou cirúrgicos e de finalidade preventiva, diagnostica ou terapêutica (BRASIL, 1996).
O desenvolvimento de pesquisas com a finalidade de obter diagnósticos, medicamentos, novos procedimentos e vacinas, faz com que as Ciências Biológicas e Biomédicas apropriam-se do imenso potencial do saber instituído, submetendo indivíduos a antigos e novos riscos em busca de prováveis benefícios, nem sempre diretos. Surge, daí, a necessidade de criar regulamentações, nacionais e internacionais, como meio de manter a eticidade dos procedimentos, a privacidade e proteção das informações geradas e o consentimento livre e esclarecido dos participantes das pesquisas. Portanto, é necessário compreender a liberdade científica como ato cultural orientado pelos princípios da autonomia do indivíduo, da justiça, da beneficência, da não maleficência, da responsabilidade e da prudência, movida pela sensibilidade ética própria da natureza humana (VIEIRA, 2003).
A pesquisa envolvendo seres humanos deverá prever procedimentos que assegurem a confidencialidade e a privacidade dos indivíduos pesquisados, garantindo a proteção da sua imagem, a sua não estigmatização e a não utilização das informações em prejuízo dos indivíduos e/ou das comunidades, inclusive em termos de auto-estima, de caráter econômico e/ou financeiro (VIEIRA, 2003).
A pesquisa deve respeitar os valores culturais, sociais, morais, étnicos, religiosos e éticos, bem como os hábitos e costumes quando a pesquisa envolver trabalhos em comunidades, cuidando para que ocorra o retorno dos benefícios obtidos através dos conhecimentos adquiridos para as pessoas e comunidades onde a mesma foi realizada (SARDENBERG et al., 1999).
O Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE) consiste no consentimento livre por não haver nenhuma limitação que possa influenciar a vontade e a decisão do voluntário em participar da pesquisa e esclarecido, por que considera que o compromisso com o voluntário não é apenas o de informar, mas também o de esclarecer os riscos e os benefícios de sua participação. Deverá ser apresentado em linguagem acessível e que inclua a justificativa, os objetivos e os procedimentos a serem utilizados na pesquisa, assim como os desconfortos, os riscos possíveis e os benefícios esperados. Ainda hoje, inúmeros projetos de pesquisa são devolvidos para modificações, devido a não clareza na redação do TCLE, levando inúmeros pesquisadores a refazerem projetos inteiros visando à aprovação e início da fase experimental (CASTILHO; KALIL, 2005).
A ponderação entre riscos e benefícios para os sujeitos da pesquisa, tanto atuais como potenciais, tanto individuais como coletivos, deve comprometer-se com o máximo de benefícios e o mínimo de danos e riscos, assim como também garantir que danos previsíveis serão evitados (beneficência e não maleficência) (VIEIRA, 2003).
A pesquisa em qualquer área do conhecimento envolvendo seres humanos deverá ser adequada aos princípios científicos que a justifiquem e com possibilidades concretas de responder às incertezas que a precederam, prevalecendo sempre as probabilidades dos benefícios esperados sobre os riscos previsíveis e, assegurar aos sujeitos da pesquisa os seus benefícios (VIEIRA, 2003).
Desta forma, as revista científicas nacionais e internacionais restringem a aprovação de publicação de artigos científicos a aqueles aprovados previamente por um CEP, e atualmente, um grande numero de revistas aderiram a esta regra, inviabilizando a publicação de pesquisas que ferem a ética, ou pelo menos algum ponto inerente a proteção do sujeito da pesquisa (SARDENBERG et al., 1999).
Considerações finais
A Bioética promove uma reflexão e suas discussões representam, a vertente de pluralidade que cabe atribuir a nossas sociedades tecno-científicas, numa leitura que espelhe efetivamente quantos são os caminhos e quantas as trocas que temos que fazer no mundo atual. Dessa forma, as pesquisas científicas, principalmente aquelas que envolvem seres humanos, devem ser executadas dentro de padrões éticos. Entretanto, a observância de normas, leis e recomendações éticas não garante a eticidade da pesquisa. A discussão sobre o tema deve ser incentivada e estar presente nos cursos de graduação e pós-graduação, bem como nos eventos e periódicos científicos.
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