efdeportes.com

Parceria público/privado no voleibol: um estudo de caso sobre a

transferência da equipe Rexona/Unilever do Paraná para o Rio de Janeiro

Colaboración público-privado en el voleibol: un estudio de caso sobre la 

transferencia del equipo Rexona/Unilever desde Paraná a Río de Janeiro

 

*Estudantes **Orientadora

Universidade Federal do Paraná, Curitiba

(Brasil)

Lisiane de Matos* | Luana de Oliveira*

Michelle Consentino* | Patrícia de Moura*

Sâmela Simões* | Vanessa Dyck*

Natasha Santos**

luaninha.ef@hotmail.com

 

 

 

 

Resumo

          O esporte vem, cada vez mais, criando um espaço próprio, tanto na mídia quanto no gosto e admiração por parte do espectador, abrindo assim brechas para a criação de inter-relações como o caso de associações entre empresas ou entidades públicas e privadas, o que pode ser evidenciado na associação que culminou na criação do Centro Rexona de Excelência em Voleibol que foi instalado no Paraná em 1997. Na qual a divisão era feita de forma que o Governo deveria desempenhar a manutenção do ginásio e a empresa Unilever faria o pagamento de atletas e outros bens necessários. Assim uma série de acontecimentos demarcou a trajetória do projeto, desde a saída do, até então, técnico Bernardo Rezende (Bernardinho) até uma nova marca associada, o Ades. Em certo período apresentou a oportunidade e, de certa forma, uma necessidade de mudança de cidade, essa mudança pode ter sido acarretada por diversos fatores entre os quais estariam estratégias de marketing e até mesmo a influência do ex-técnico na decisão. O objetivo do presente estudo é demarcar e analisar as relações de ligação entre o privado e o público, a partir de um estudo de caso da equipe de voleibol feminino do Rexona.

          Unitermos: Equipe Rexona. Mudança de sede. Inter-relações. Voleibol.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 15, Nº 152, Enero de 2011. http://www.efdeportes.com/

1 / 1

Introdução

    A equipe de Voleibol Rexona se constitui como objeto de estudo científico desta pesquisa. Delimitando o campo esportivo para as transformações sócio-econômicas ocorridas de 1997 a 2003, quando é lançada em Curitiba a equipe profissional feminina Rexona de Voleibol (FOLHA DO PARANÁ, 19/06/1997).

    Justifica-se tal pesquisa porque o esporte está cada vez mais forte, ocupa grande espaço na mídia mundial, recebe grandes investimentos e quantidade de verbas públicas. Fatores que demonstram esse crescimento são: as inter-relações entre empresas privadas com governo e a economia; e pessoas que vivem ou estão envolvidas com o esporte de alguma forma, pois o mesmo possui um campo muito abrangente, onde setores administrativos, financeiros, empresariais, jornalísticos, dentre outros, estão diretamente ligados com o campo esportivo.

    Como foi se constituindo, progressivamente, este corpo de especialistas que vive direta ou indiretamente do esporte? [...] E mais precisamente, quando foi que este sistema de agentes e de instituições começou a funcionar como um campo de concorrência onde se defrontam agentes com interesses específicos, ligados às posições que aí ocupam? (BOURDIEU, 1983b, p. 142).

    Um exemplo de interrelação entre empresas privadas e o setor público é o caso do Centro Rexona de Excelência que foi instalado no Paraná em 1997. A parceria ocorreu entre o Governo do Paraná, a empresa Unilever e o técnico Bernardo da Rocha Rezende (Bernardinho). A empresa Unilever se utilizou da marca Rexona para realizar a parceria.

    O Governo nessa sociedade ficou responsável em manter o local onde a seleção treinaria, o Ginásio do Tarumã, em ordem e reformá-lo. Além dessa responsabilidade, o governo escolheria as escolas onde seriam implantados os núcleos esportivos de voleibol. A Unilever seria responsável pelo time profissional, no pagamento dos atletas, técnicos, dos materiais utilizados e das viagens para campeonatos.

    Todas as vantagens foram analisadas pela Unilever para que esta obtivesse o “marketing” almejado para o desodorante Rexona, o “rejuvenescimento” e a divulgação desta marca. A empresa analisou em qual esporte investir, onde tivesse menos contato físico, mostrasse a preocupação do cuidado com o corpo. Dessa forma escolheu o vôlei, segundo esporte mais praticado no país e a equipe feminina, mostrando um lado sensível, preocupado em cuidar do corpo. Bernardo Rezende aceitou coordenar o projeto e ser técnico do time.

    Segundo Juliana Vlastuin (2008, p. 66), já no primeiro ano “a empreitada foi repleta de sucesso” e os dois produtos da Unilever (núcleos de iniciação e a equipe feminina) tiveram grande êxito. E já na temporada de estréia, a equipe Rexona conquistou o título da Superliga Feminina de Voleibol.

    Em 2001, Bernardinho deixou de ser técnico da equipe do Rexona após a Superliga, quando o time tinha ficado em quarto lugar, permanecendo apenas como coordenador do projeto no Paraná. Em 2004, a Unilever decide unir ao Rexona a marca Ades, para formar a equipe de Voleibol Rexona Ades e todo o projeto passa a se chamar Centro Rexona Ades de Voleibol, em referência às duas marcas da empresa. Conforme apresenta Juliana Vlastuin (2008, p. 84), durante esse período aconteceu a última participação da equipe Rexona na Superliga antes de deixar a sua sede na capital do estado. Desse modo, “o vitorioso ciclo da equipe que durante sete anos representou o Paraná na Superliga Feminina de Voleibol chegava ao fim em Curitiba, com o término da parceria entre a equipe profissional e o Governo Estadual”, culminado com a transferência do time para a cidade do Rio de Janeiro, oficializada em março de 2004, quando a equipe passou novamente para o comando do técnico Bernardinho.

    A partir dos dados apresentados, questiona-se: quais as inter-relações entre os setores público e privado que ocasionaram a saída e o reordenamento do campo esportivo da equipe Rexona no Paraná? Bernardinho foi o grande motivo para a equipe profissional mudar de sede? Assim, o objetivo da presente pesquisa é explicitar os fatos que levaram a mudança de sede do time feminino Rexona de Voleibol e analisar como o marketing pode influenciar positiva ou negativamente na parceria público/privado. Assim como demonstrar como Bernardinho, o renomado técnico detentor de elevado “capital simbólico”, exercia influências na equipe, seja no marketing e/ou nas decisões tomadas.

Metodologia de pesquisa

    A presente pesquisa é de cunho qualitativo e histórica, já que se pauta na análise de fontes – no caso, referentes ao jornal “Gazeta do Povo” e ao “Jornal do Estado”. Os conceitos utilizados para analisar tais fontes fazem parte da teoria reflexiva de Pierre Bourdieu no que diz respeito aos conceitos de campo, capital simbólico e habitus.

    Segundo Bourdieu, o espaço social é organizado por dois princípios de diferenciação: o capital econômico e o capital cultural. Essa teoria do espaço social, composição de grupos e competição simbólica foi generalizada em The Logic of Practice, no qual dois modos de dominação, pessoal e estrutural, são diferenciados e seus modos de operar traçados por meio da modelagem do “corpo como um operador analógico” da prática. Daí, então, a categoria do poder simbólico, definida como habilidade para conservar ou transformar a realidade social pela formação de suas representações, isto é, pela indicação de instrumentos cognitivos de construção da realidade que escondem ou iluminam suas arbitrariedades inerentes.

    As ideias de Boudieu podem ajudar na compreensão do que foi ocorrido com o time feminino Rexona de Voleibol já que seus conceitos são muito claros. Segundo ele campo é o espaço social relativamente autônomo, com regras de funcionamento. Habitus representa a internalização da história no corpo do sujeito, ou seja, um conhecimento adquirido e variável. E por fim, o capital simbólico,

    “não é outra coisa senão o capital, qualquer que seja sua espécie, quando percebido por um agente dotado de categorias de percepção resultantes da incorporação da estrutura da sua distribuição, quer dizer, quando conhecido e reconhecido como algo de óbvio.” (BOURDIEU, 1989, p.145).

Implicações na mudança de sede

    Após a transferência da equipe profissional Rexona-Ades do Paraná para o Rio de Janeiro, a nova sede dos jogos da equipe foi o Tijuca Tênis Clube. Juntaram-se ao time mais quatro parceiros: o Metrô Rio, Site Ingresso Rápido, Pólo Gastronômico da Tijuca e CBV. Estas parcerias proporcionaram várias vantagens para a empresa e para os torcedores, como por exemplo: apresentando o bilhete duplo ou múltiplo do Metrô Rio na bilheteria do ginásio, os torcedores do Rexona-Ades garantem a entrada franca nos jogos, além de poderem comprar seus ingressos pela internet através do Site Ingresso Rápido; o Pólo Gastronômico da Tijuca oferece 15% de desconto em seu estabelecimento aos torcedores que apresentarem o ingresso em dia de jogo e aos que possuírem o Cartão do Torcedor, 20% de desconto. O Cartão do Torcedor, associado da CBV, oferecia desconto no preço dos ingressos para os jogos no Tijuca Tênis Clube (VLASTUIN, 2008, p.85).

    O representante da Unilever, Gomyde, justifica a transferência da sede do Rexona-Ades para o Rio de Janeiro alegando que não estava mais sendo compensador o investimento realizado pela empresa na equipe (VLASTUIN, 2008, p.87). Diminuiu o número de público que assistia aos jogos, os resultados não eram mais animadores e os investimentos também não.

    Bernardinho, em outra entrevista (JORNAL DO ESTADO, 13/05/2004, p. b5), conta que não foi pelo fato da redução do público nos jogos do Rexona e pela queda do desempenho que a equipe profissional tenha sido transferida para o Rio de Janeiro. Ele relata ainda que para a empresa, o que interessava era a imagem passada para os jovens. Era uma questão de marketing, pois eles não cobravam resultados bons nos jogos, mas sim a imagem que as jogadoras e o técnico passavam para o público. O mandatário da Paraná Esporte relata que pesquisas mostram o motivo da transferência da sede do Rexona-Ades para o Rio de Janeiro como uma questão de mercado (VLASTUIN, 2008, p.87):

    As análises empreendidas indicam que a transferência da equipe “foi determinada por uma decisão institucional corporativa do patrocinador Unilever para a conquista de novos mercados”, seguindo as lógicas próprias do marketing esportivo, considerando que o mercado consumidor na Região Sul já estava bastante consolidado (MARTINES, MEZZADRI, 2009, p.8).

    A saída de Bernardinho como técnico é um ponto que talvez tenha dificultado a manutenção da equipe no Paraná. Bernardinho se colocou a disposição para voltar a ser técnico, desde que estivesse na cidade do Rio de Janeiro, talvez porque tinha moradia fixa no local e assim poderia conciliar a profissão com a família. O retorno dele à equipe tinha uma relação direta com o lugar onde a Seleção Brasileira Masculina treinava, senão seriam dois trabalhos incompatíveis. Em outras palavras, com a retomada do poder simbólico proveniente da imagem vitoriosa de Bernardinho, a venda do produto se tornou mais viável no universo das relações comerciais, neste caso o Voleibol e a marca Rexona. Faz-se jus, então, a afirmativa de Pierre Bourdieu:

    A história do esporte é uma história relativamente autônoma que, mesmo estando articulada com os grandes acontecimentos da história econômica e política, tem seu próprio tempo, suas próprias leis de evolução, suas próprias crises, em suma, sua cronologia específica (BOURDIEU, 1983b, p. 137).

    Mesmo com a transferência da equipe do Rexona Ades para o Rio de Janeiro, o projeto com as escolas, com a intenção de treinamento, formação de novos atletas permaneceu e ganhou grande força e apoio, pois o projeto passou a ter um cunho mais social, recebendo investimentos mesmo com a seleção Rexona Ades não estando mais inserida no Paraná.

    Segundo uma nota no Jornal Estado do Paraná do dia 19 de junho de 2004, Bernardinho relata que sua intenção era a de estar sempre dando apoio a esse projeto social, pois continua a ser o coordenador do projeto e relata, ainda, que as jogadoras do Rexona-Ades também estarão auxiliando, ligadas ao projeto que tem como objetivo formar atletas para as categorias de base.

    Sobre o interesse da empresa em investir no projeto para além do time, a coordenadora do Programa Rexona Ades Esporte Cidadão, Ana Moser, é enfática ao afirmar que “a Unilever fez uma pesquisa primeiro. Ela não entrou no esporte social porque gosta de esporte. Ela entrou no esporte porque fizeram uma pesquisa de mercado para saber qual seria o caminho para veicular a marca” (VLASTUIN, 2008, p. 108.). As competições esportivas passaram a ser eventos de oportunidade empresarial. As organizações valorizam cada vez mais os atributos do esporte e da marca, além de utilizar os exemplos de vida dados pelos atletas para inspirar e motivar a juventude, funcionários e clientes.

    A cada temporada, é como se iniciasse “uma ‘temporada de caça’ das empresas aos clubes e vice-versa, na qual as cifras variam conforme o ‘fôlego financeiro’ do investidor e a capacidade de divulgação do patrocinador em espetáculos esportivos e na mídia” (MARCHI JÚNIOR, 2004, p. 152).

    Para se compreender essa expansão geral da produção esportiva, é necessário entender essa dinâmica relacional paralela ao desenvolvimento da cultura de consumo. A cultura de massa está relacionada aos conhecimentos, informações e ideologias que abrangem um maior número de pessoas e interfere na forma como elas pensam, vestem-se, posicionam-se diante de um fato. A esse respeito, convém focalizar o surgimento do que Bourdieu (1984) chama de “novos intermediários culturais”, pessoas fascinadas com a identidade, a apresentação, a aparência, o estilo de vida e a busca incessante de novas experiências.

    Segundo Juliana Vlastuin (2008, p. 30) quanto maior a venda de produtos de determinado esporte, maior demanda, maior será o retorno econômico (lucro) para as empresas que investiram no esporte.

    Os estudos de Bourdieu acentuam, sobretudo, essa dimensão social em que as relações entre os homens se constituem em relações de poder, mais ainda, em que elas reproduzem o sistema objetivo de dominação interiorizado enquanto subjetividade; a sociedade é, dessa forma, apreendida como estratificação de poder (ORTIZ, 1994, p. 25).

Considerações finais

    As interrelações assim como foi focado uma grande parte do presente estudo, apresentam significativa importância para alcançar novos patamares sociais, objetivando maior desenvolvimento para um todo. Assim, aproximar empresas privadas do público, por meio dos governos estaduais pode muitas vezes trazer benefícios, para ambos os lados. Diga-se de passagem, também para a população em geral, pois como no caso do Centro Rexona de Excelência de Voleibol, muito se ganhou com o estabelecimento deste em Curitiba: desde um ginásio muito bem equipado e com estrutura compatível para abrigar uma seleção; até uma maior proliferação do esporte, tornando o voleibol algo viável e de fácil acesso aos moradores da cidade. Assim, acredita-se e espera-se que parcerias como esta possam ajudar no desenvolvimento de uma modalidade, ou até mesmo para possibilitar melhores condições de vida, quanto a uma vida mais ativa que futuramente vai proporcionar conseqüências positivas e benefícios.

    Porém no caso aqui abordado, o principal ponto a ser questionado é o fato da mudança de sede desse Centro de Excelência, porque muito se especulou a respeito do verdadeiro motivo para tal atitude. Sabemos que a saída do até então técnico Bernardinho afetou de certa forma a equipe. Vários jornais da época (GAZETA DO POVO, 11/03/1998 e 05/04/1999; JORNAL DO ESTADO, 25/01/2000) mostram a equipe feminina Rexona como um exemplo de sucesso, devido as conquistas de tantas e tantas vitórias. Uma grande parcela do possível sucesso era colocada no técnico, por já ter demonstrado sinais de altíssima competência. E assim com a saída de Bernardinho acreditou-se estar perdendo um grande ponto de referência.

    Muitas informações sobre tal tema alegam que o técnico teria se proposto a voltar a dirigir a equipe do Rexona desde que esta estivesse localizada no Rio de Janeiro, até porque seria uma forma de conciliar o treinamento da seleção masculina e da equipe feminina – por sinal, como ocorre até hoje (2010). Assim, como a figura “Bernardinho” tinha grande influência sobre as decisões na área, a mudança de fato se deu, passando a localizar-se no Rio de Janeiro, contando com a participação, associação e patrocínio da Unilever. Bernardinho tinha várias conquistas com a equipe feminina e estava sendo técnico da seleção masculina de voleibol o que remetia a um grande prestígio, isso poderia ser utilizado para que o público tivesse maior “afeição” ao time Rexona, e assim, consequentemente, ocorreria a propagação da marca.

    Mas, ao pensar por este lado, observa-se que a empresa Unilever, com suas marcas Rexona e Ades, também pôde tirar proveito diante da situação, porque o impacto em Curitiba já havia consolidado a marca. A partir do nome Rexona estampado nas capas de jornais com uma equipe vitoriosa a marca se fortaleceu e ganhou mais adeptos. Assim uma mudança de local proporcionaria que essa abrangência que houve em Curitiba atingisse novos horizontes e novas pessoas. Basicamente, evidencia-se a questão do marketing implícito à situação, pois se buscava um capital maior e viu-se uma forma possivelmente viável para alcançar tais objetivos.

    A Unilever algumas vezes acabou deixando bem claro que a associação se deu por conta de questões basicamente de marketing, desde o início, quando deliberadamente escolheu um esporte menos violento do que o futebol e voltou-se para as mulheres justamente na questão de ter um maior cuidado consigo mesmas. Tudo isso para promover e rotular a marca de forma a atingir o maior público possível. Não está se dizendo que a empresa não levou em consideração a importância e o bem que estaria fazendo à comunidade, mais talvez o principal foco fosse levar às pessoas o conhecimento da marca e vender seus próprios produtos.

    Pode-se considerar que se está diante de uma balança, praticamente com pesos semelhantes, onde de um lado temos um técnico supervalorizado e respeitado e de outro as questões de marketing e possibilidade de divulgação da marca por parte da Unilever. O que pode-se dizer é que a junção destes fatores culminou na mudança de cidade por parte da equipe de voleibol feminino Rexona.

Referências bibliográficas

Fontes

Outros artigos em Portugués

  www.efdeportes.com/
Búsqueda personalizada

EFDeportes.com, Revista Digital · Año 15 · N° 152 | Buenos Aires, Enero de 2011
© 1997-2011 Derechos reservados