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Aspectos estruturais do ambiente e sua relação

 com o controle postural em crianças deficientes visuais

Aspectos estructurales del ambiente y su relación con el control postural en niños con discapacidad visual

 

*Laboratório de Instrumentação, Centro de Ciência da Saúde e do Esporte

Universidade do Estado de Santa Catarina, UDESC

**Laboratório de Desenvolvimento e Aprendizagem Motor, Centro de Ciência

da Saúde e do Esporte,Universidade do Estado de Santa Catarina, UDESC

(Brasil)

Lívia Willemann Peres*

Daniela Bosquerolli Prestes*

Rafaela Coelho*

Patrik Felipe Nazário**

Maria Helena Ramalho**

Susana Cristina Domenech*

livia_willemann@hotmail.com

 

 

 

 

Resumo

          Introdução: Nas aquisições motoras, a criança com deficiência visual (DV) é vitimada pela ausência ou limitação da visão, sendo o espaço físico a ser explorado totalmente desconhecido. Isto gera dificuldade em relação à adaptação de seus movimentos corporais às diversas solicitações do ambiente. Objetivo: Avaliar e comparar o equilíbrio quasi-estático, o comportamento motor e a qualidade e quantidade das oportunidades de estimulação motora infantil presente no ambiente familiar de uma criança com DV congênita e uma criança sem nenhuma deficiência física, sensorial ou mental diagnosticada. Materiais e método: trata-se de um relato de caso no qual foram incluídas duas crianças, uma com diagnóstico de cegueira por retinopatia da prematuridade, com idade de 54 meses e outra sem qualquer tipo de deficiência com idade de 66 meses. As coletas ocorreram na Fundação Catarinense de Educação Especial, na qual foi aplicado o questionário de AHEMD, seguindo por avaliação do controle postural e mensuração da estatura e do peso. Resultados: Em relação ao questionário AHEMD, a criança com DV apresentou pontuação 12 e o grupo controle, pontuação 8. Observou-se, também, que a criança DV apresenta maiores valores nos aspectos: deslocamento total da área, desvio padrão da oscilação ântero-posterior e médio-lateral , amplitude da oscilação ântero-posterior e médio-lateral, velocidade da oscilação ântero-posterior e médio-lateral e área percorrida durante a oscilação. Conclusão: A estrutura ambiental não favorece o desenvolvimento motor das crianças, concluindo a importância da intervenção do agente mediador no microssistema lar. Para suprir essas necessidades a participação ativa em outros microssistemas em que isso aconteça é imprescindível

          Unitermos: Deficiente visual. Controle postural. Aquisição motora.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 15, Nº 152, Enero de 2011. http://www.efdeportes.com/

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1.     Introdução

    No início da das aquisições motoras a criança com deficiência visual é vitimada pela ausência ou limitação da visão, sendo o espaço físico a ser explorado totalmente desconhecido. Este desconhecimento gera insegurança e compromete a sua mobilidade, tornando essencial que o lar seja adequado para uma exploração ambiental, apropriando-se de referenciais que lhe sejam úteis à construção do seu mapa mental e proporcionando melhor movimentação. Fatores como a tipologia dos espaços existentes nas casas, os tipos de solos, a variedade de brinquedos e objetos, a roupa que a usa presença ou não de irmãos, as práticas dos parentes ou de pessoas que vivem no ambiente da criança, o nível socioeconômico, entre outros, constituem fatores intervenientes nas oportunidades que conferem desafios ao indivíduo em desenvolvimento.

    Crianças deficientes visuais enfrentam dificuldades em relação às diversas solicitações do ambiente, levando a adaptações posturais e locomotoras e ocasionando uma dificuldade de interação e atuação de forma dinâmica no ambiente físico e social, e um déficit de equilíbrio corporal, comprometendo sua mobilidade [1]. Sendo assim, os problemas principais encontrados em crianças deficientes visuais são a ausência de ambientes adequados para uma mobilidade segura, equilíbrio falho, impondo assim, restrições ao desenvolvimento seguro e confiante da criança no ambiente, interferindo no conhecimento do próprio corpo, e na inter-relação entre objeto e indivíduo no ambiente.

    O presente trabalho apresenta resultados preliminares de um estudo em andamento com o objetivo de analisar a qualidade e quantidade das oportunidades de estimulação motora infantil presente no ambiente familiar e estudantil freqüentado pela criança deficiente visual congênita e sua relação com a estruturação do desenvolvimento motor e controle postural, bem como suas co-relações.

    A escolha do estudo com enfoque em crianças com deficiência visual congênita deu-se pelo sistema visual ser primordial no ser humano, principalmente nos primeiros anos de vida, possuindo um papel chave na percepção do ambiente, no desenvolvimento motor e no controle postural, pois tanto coloca a criança em contato com a realidade externa como lhe fornece estímulos que auxiliam em um papel importante na estabilização da postura, e no desenvolvimento motor, proporcionando a percepção a respeito da posição e dos segmentos do corpo em relação a eles mesmos e ao ambiente [2].

2.     Método

    O estudo teve caráter descritivo, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da UDESC, com parecer favorável número 49/2009.

    Participaram do estudo duas crianças, do sexo feminino, com diagnóstico de deficiência visual, por retinopatia da prematuridade, apresentando percepção luminosa na avaliação funcional da visão segundo laudo oftalmológico, com idade de 54 meses e outra sem qualquer tipo de deficiência com idade de 66 meses.

Procedimentos

    As coletas de dados foram realizadas na Fundação Catarinense de Educação Especial – FCEE, situada na rua Paulino Pedro Hermes 2785, São José – SC, em uma sala tranqüila, sem muitos estímulos e com clima confortável.

    As crianças foram acompanhadas pelos pais até a sala de avaliação, onde se mostraram confortáveis e a adaptação ao local aconteceu de forma rápida. Cada criança foi avaliada separadamente. Antes do início os pais preencheram o termo de consentimento livre e esclarecido, estando de acordo com a execução da pesquisa.

    Logo após os pais ou responsáveis preencheram o questionário AHEMD [3] que avalia as qualidades e quantidades de oportunidades de estimulação motora de 18 a 42 meses. O AHEMD é um questionário constituído de perguntas de fáceis respostas, endereçado aos pais, com o objetivo de verificar a caracterização familiar, o espaço físico da habitação, as atividades diárias da criança e os brinquedos e materiais existentes no lar [4]. Devido as crianças da pesquisa apresentarem uma idade superior a do referido questionário, solicitou aos pais ou responsáveis que respondessem de forma retrospectiva.

    Em seguida, foram tomadas as medidas da estatura e peso de cada um dos indivíduos segundo protocolo descrito por Petroski [5] As medidas de estatura foram tomadas utilizando fita métrica de 1.55 cm e intervalo de 0,1 cm, na posição em pé, com os braços ao longo do corpo com os calcanhares rente a parede. A massa corporal foi aferido em balança digital Filizola® com capacidade de 150 kg com exatidão de 100 g na em posição ortostática com mínimo de roupa.

    Por último, as crianças tiveram seu controle postural avaliado utilizando uma plataforma estabilométrica (plataforma de força), com freqüência de aquisição de 100 Hz.[6]. Anteriormente à medição, a avaliadora deixou as crianças explorarem e perceberem a plataforma quanto ao material, forma, o tamanho e altura. Os procedimentos foram divididos em duas condições experimentais: “com olhos abertos” (OA) e “com olhos fechados” (OF). As crianças foram instruídas a subirem na plataforma e ficarem na posição bípede mais confortável possível, olhando para frente e imóveis por 30 segundos. Na primeira condição, as crianças foram avaliadas com os olhos abertos. Na segunda condição, a avaliadora vendou os olhos das crianças que permaneceram por 30 segundos na mesma posição.

    A análise dos dados foi realizada através de rotina estabelecida no Software SCILAB® v.4.1.2 (INRIA, ENPS, França). A análise estatística foi efetuada por meio de medidas descritivas, empregando o software SPSS® for Windows v. 17.0 (SPSS ).

3.     Resultados e discussão

    Verificando fatores que podem alterar o comportamento motor, e conseqüentemente o controle postural, a exploração do ambiente é vista como desencadeante de diferentes estratégias adaptativas que permitem ao ser humano interação com o meio [4]. Nesse processo o indivíduo adquire uma enorme quantidade de habilidades motoras, as quais progridem de movimentos simples e desorganizados para a execução de habilidades motoras altamente organizadas e complexas, como a postura ortostática [5]. Para análise das oportunidades de estimulação motora infantil no ambiente da casa familiar, em que se inserem as crianças da pesquisa, utilizou-se o questionário AHEMD, obtendo-se os seguintes resultados:

    No caso da criança deficiente visual, a classificação AHEMD total foi de 12, sendo classificada como nível médio de oportunidades para o desenvolvimento motor da criança. Já a criança normovisual teve total de 8 na pontuação do referido questionário, considerada como pontuação baixa para o desenvolvimento motor da criança.

    Uma vez que parte da estrutura ambiental não favorece o desenvolvimento motor das crianças, fica explícita a importância da intervenção do agente mediador no microssistema “lar” para suprir essas necessidades a participação ativa delas em outros microssistemas em que isso aconteça é imprescindível. Assim, estudos que procuram associados estímulos ambientais e o desenvolvimento motor, por exemplo, testemunham a importância de materiais de jogos estimulantes como preditores do desenvolvimento [6] Para normalização dos dados estabilométricos, obteve-se os valores de massa (kg) e estatura (m). A criança deficiente visual apresentou massa de 20 kg e estatura de 1 metro e 21 centímetros, já a criança normovisual apresentou massa 18 kg e estatura de 1 metro e 18 centímetros.

    Com relação aos dados estabilométricos, obtidos através da plataforma de força, foram encontrados em ambos indivíduos do estudo, na condição com visão, olhos abertos, os valores do deslocamento total da área (DOT), desvio padrão da oscilação ântero-posterior e médio-lateral (SDAP e SDML) , amplitude da oscilação ântero-posterior e médio-lateral (AMPLAP e AMPLML), velocidade da oscilação ântero-posterior e médio-lateral (VMAP e VMML) e área percorrida durante a oscilação. Esses dados serão expressos em forma de tabela a seguir:

Tabela 1. Resultados da análise estabilométrica dos indivíduos do estudo (olhos abertos)

Figura 1. Estabilogramas das crianças: A) cega na situação olhos abertos B) normovisual na situação olhos abertos

    Através dos resultados encontrados na condição com visão olhos abertos, podemos observar que as crianças deficientes visuais apresentam maiores valores em todos os parâmetros obtidos: DOT, SDAP, SDML, AMPLAP, AMPLML, VMAP, VMML e área, vindo de acordo com os achados da literatura que trazem a maior oscilação em crianças deficientes visuais quando comparadas com crianças normovisuais, onde a presença de visão diminui em 50% a magnitude da oscilação corporal na posição em pé quando comparado com a mesma situação sem visão olhos fechado [8]

    Pode-se observar também nos resultados da criança deficiente visual, a maior oscilação foi na direção médio-lateral (ML), já na criança normovisual a oscilação apresentou-se maior no eixo ântero-posterior. Isto sugere que, devido à deficiência desse canal sensorial, o sistema de controle postural nesta criança é proveniente do sistema labiríntico e somatosensorial para alcançar ou manter determinada orientação corporal [9,10].

    Na tabela 2, são mostrados os resultados referentes à análise estabilométrica dos indivíduos do estudo, na condição sem visão (olhos fechados).

Tabela 2. Resultados da análise estabilométrica dos indivíduos do estudo (olhos fechados)

    São ilustrados abaixo na figura 2, os estabilogramas da criança deficiente visual e normovisual respectivamente.

Figura 2. Estabilogramas das crianças: A)cega na situação olhos fechados; B) normovisual na situação olhos fechados

    Na situação sem visão, a oscilação corporal foi influenciada diferentemente entre os grupos quando a informação visual foi manipulada (tabela 3). De forma geral, tanto para a direção ML quanto para AP, verificou-se que com a privação da informação visual, a oscilação corporal para as crianças sem comprometimento visual aumentou. Diferentemente, a privação da informação visual para as crianças deficientes visuais não provocou aumento da oscilação corporal.

    O sistema de controle postural identifica as informações sensoriais provenientes dos três canais sensoriais e produz respostas motoras eficientes para que a posição desejada seja alcançada ou mantida. Se um dos canais sensoriais não fornece informação sensorial adequada, como é o caso da informação visual para as crianças, pois são nos primeiros anos de vida, que as crianças são mais dependentes da informação visual em detrimento das informações somatosensoriais e vestibulares, e apenas por volta dos sete anos de idade é que elas passariam a integrar as informações provenientes destes três canais sensoriais da mesma forma que adultos [11, 12]

4.     Conclusão

    A partir dos dados obtidos através da realização deste trabalho, decidiu-se investigar as oportunidades de estimulação motora infantil presente no ambiente familiar e correlacionar com o controle postural, na população deficiente visual. Espera-se então, encontrar com a finalização do respectivo estudo, o quanto o contexto familiar e suas estruturas influencia no controle postural de crianças com alteração no sistema visual, sendo este responsável por detectar de forma instantânea e imediata os estímulos provenientes do ambiente.

Referências

  1. ALEXANDRE R, CORDOVIL, R. Percepção de affordances em desenvolvimento perceptivo de crianças cegas. Desenvolvimento motor da criança, Lisboa, 2007.

  2. PETROSKI E.L. Desenvolvimento e validação de equações generalizadas para a estimativa da densidade corporal em adultos. [Tese de Doutorado – Programa de Pós Graduação em Ciência do Movimento Humano]. Santa Maria (RS): Universidade Federal de Santa Maria; 1995.

  3. RODRIGUES L.P, SARAIVA L, GABBARD C. Development and structural validation of an inventory for assessing affordances in the home environment for motor development. Res Q Exerc Sport. 2005;

  4. NOBRE, F. S.S; COSTA, C. L. A; OLIVEIRA, D. L; CABRAL, D. A; NOBRE, G.C. Análise das oportunidades para o desenvolvimento motor (affordances) em ambientes domésticos no Ceará – Brasil. Rev Bras Crescimento Desenvolvimento Hum. 2009; 19(1): 9-18.

  5. PETROSKI E.L. Desenvolvimento e validação de equações generalizadas para a estimativa da densidade corporal em adultos. [Tese de Doutorado – Programa de Pós Graduação em Ciência do Movimento Humano]. Santa Maria (RS): Universidade Federal de Santa Maria; 1995

  6. BORGES JUNIOR, NG; DIAS, JA; BORGES, L; MATTOS, DJS; WENTZ, MD; DOMENECH, SC; KAUFFMANN,P. Validade de uma nova plataforma estabilométrica para avaliação do equilíbrio. Artigo não publicado. 2010.

  7. OLIVEIRA, N.O; BARRETO, S.Z. Avaliação do equilíbrio estático em deficientes visuais adquiridos. Ver Neurociências, 2005

  8. BORTOLAIA, A. P; BARELA, A. M. F; BARELA, J.A. Controle postural em crianças portadoras de deficiência visual nas faixas etárias entre 3 e 11 anos. Motriz, Rio Claro, v.9, n.2, p. 79 - 86, mai./ago. 2003

  9. GIBSON J.J. The ecological approach to visual perception. Hillsdale, New Jersey: Lawrence Erlbaum Associates, 1986.

  10. GOBBI L.T.B; MENUCHI , M.R.T.P; UEHARA, E. T, SILVA J.J. Influencia da informação exproprioceptiva em tarefa locomotora em tarefa locomotora com alta demanda de equilíbrio em crianças. Rev.Bras de CI e Mov.2003.

  11. HORAK, F. B.; MAcPHERSON, J. M. Postural orientation and equilibrium. In: ROWELL, L.; SHEPARD, J. (Ed.). Handbook of physiology. New York: Oxford University Press, 1996. p.255-292.

  12. PAULUS, W.; STRAUBE, A.; BRANDT, T. Visual stabilization of posture: physiological stimulus characteristics and clinical aspects. Experimental Brain Research, New York, v.107, 1984

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