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Reflexão sobre o desenvolvimento 

das políticas públicas de esporte e lazer

Reflexión sobre el desarrollo de las políticas públicas de deporte y recreación

 

Universidade Federal Juiz de Fora

(Brasil)

Msndo. Max Oliveira Madeira

Esp. Eduardo de Lima Duarte

Ms. Priscila Gonçalves Soares

Tamara Salviano Martins

Dr. Carlos Fernando Cunha Junior

priscilagsoares@yahoo.com.br

 

 

 

 

Resumo

          O presente trabalho é uma reflexão a cerca do desenvolvimento de políticas públicas de esporte e lazer. Neste, escrevemos sobre nossas intenções de ação a partir das primeiras aproximações com a temática. Dialogamos, ainda que timidamente, com a história da Educação Física permeada pelo esporte e lazer, e possível identificação entre as políticas públicas e sua utilização como emancipação ou alienação e controle social.

          Unitermos: Políticas públicas. Esporte e lazer. Controle social.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 15, Nº 151, Diciembre de 2010. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    O esporte e o lazer como fenômeno social de características universais constitui-se numa verdadeira forma de cultura e reflete valores políticos e ideológicos da sociedade. Apontado por Tubino (1987) como os maiores fenômenos sócio-culturais do final do século, o esporte e a atividade física podem preparar o indivíduo para uma ocupação sadia do tempo livre.

    A ocupação deste tempo livre se reflete, em algumas vezes, em políticas públicas assistencialistas oferecidas pelo governo que não dialogam como os conceito e intencionalidades trazidos pelos estudiosos do lazer.

    O conceito de lazer é carregado de pilares construídos ao longo da história sobre os quais as representações e significações do lazer foram e vão sendo construídas com o passar dos anos. Estamos certos que estes pilares, paradigmas e conceitos estruturam os pensamentos de nossa sociedade em torno desta temática, versando sobre questões que tangem diversos setores desta sociedade: social, econômico e educacional.

    Portanto, é de suma importância a reflexão e apreciação da condição humana e a compreensão de como os seres humanos constroem, influenciam e são influenciados por seus mundos e as culturas. Faz-se necessário um estudo que busque pensar esta relação entre indivíduo, sociedade, cultura, lazer e representações; uma convergência com a História da Educação Física e o desenvolvimento das políticas de esporte e lazer.

    As políticas públicas de esporte e lazer, nas suas capacidades transformadoras, deverão pensar em forma de romper com esses paradigmas assistencialistas, reprodutivistas e alienantes, propondo reformular suas atuações e modificando as suas práticas.

    Neste ensaio, escrevemos sobre nossas intenções de ação a partir das primeiras aproximações com a temática. Dialogamos, ainda que timidamente, com a história da Educação Física permeada pelo esporte e lazer, e possível identificação entre as políticas públicas e sua utilização como emancipação ou alienação e controle social.

    Para que possamos alcançar os propósitos acima descritos será necessária uma maior investigação e aproximação com as discussões sobre a temática.

    Algumas questões que emergiram de nossas discussões, em momentos futuros, poderão ser respondidas pelo aprofundamento e caminhar de nossos debates e pesquisas: identificar como o atual governo tem influenciado as práticas do esporte e lazer; discutir o esporte como mercadoria e difusão do atual sistema econômico; conscientizar os profissionais da área de qual é o verdadeiro “sentido” da Educação Física e do Esporte, evitando o reprodutivismo da mesma; verificar se estes tipos de propostas de políticas como o “Esporte e lazer da Cidade”, “Descoberta do Talento Esportivo”, “Bolsa Atleta”, “Segundo Tempo”, estão servindo aos interesses do governo, como uma política de “pão e circo”, faz–se necessário esclarecer o quão importante se faz uma política de conscientização da população, para que esta não seja capturada por políticas assistencialistas impostas pelo governo, através da mídia como canal de propagação. Certos de que este será um trabalho longo e que em estágios iniciais de pesquisa se faz assaz dialogar com conceitos e estudiosos que versão sobre a temática, consideramos pertinente pensar, juntamente com Darido e Rangel (2005) o conceito de Educação Física na intenção de melhor compreender esta prática em suas diversas possibilidades e vertentes. Assim:

    A Educação Física pode ser compreendida de três maneiras diferentes: como um componente do currículo das escolas, como uma profissão caracterizada por uma prática pedagógica no interior das escolas ou fora delas, e como uma área em que são realizados estudos científicos. (DARIDO; RANGEL, p.25, 2005).

    Ao atrelar a Educação Física à estas autoras, elas nos fornecem indicativos das atuações que o profissional-professor poderá exercer em sua intervenção, pensamos nos ambiente formais, não-formais e informais. A educação formal pode ser resumida como aquela que está presente no ensino institucionalizado. A educação informal é aquela que adquirimos através de experiência diária. A educação não-formal, por sua vez, define-se como qualquer tentativa educacional organizada fora dos quadros do sistema formal de ensino.

    É muito comum a associação entre Educação Física e esporte, é importante ressaltar que o esporte está contido dentro do universo maior que é a Educação Física, isto é, o esporte é um dos conteúdos da Educação Física, entretanto não é o único.

    Visualizamos o esporte, corroborando com Betti (1991) apud Darido e Rangel (2005)

    O esporte é uma ação social institucionalizada, composta por regras, que se desenvolve com base lúdica, em forma de competição entre dois ou mais oponentes ou contra a natureza, cujo objetivo é, por meio de comparação de desempenhos, determinar o vencedor ou registrar o recorde (p.179).

    Nesta vertente, as relações que envolvem o profissional-professor de Educação Física se configuram como uma atuação ampla que o possibilita na orientação de práticas de lazer. Para Melo e Alves Júnior (2003) o lazer é “um fenômeno moderno, surgido com a artificialização do tempo de trabalho, típica do modelo de produção fabril desenvolvido a partir da Revolução Industrial” (p.29).

    Atualmente visualizamos esta forma de atuação profissional atrelada ao lazer e aos esportes, principalmente configuradas e caracterizadas como políticas públicas, estas:

    [...] quando o assunto é políticas públicas, se está falando de um determinado tipo de intervenção [...] que, necessariamente, deverá trazer consigo e ter, como ponto de partida, a posição político-ideológica que a norteia e que deverá estar inserida na concretização de todas as ações que vierem a ser adotadas (STIGGER, p. 84, 1998 apud MARCELLINO p. 91, 2001).

Indícios históricos do lazer

    No decorrer da história humana é notável o interesse pela diversão e pelo prazer que o lazer proporciona, mas pode-se verificar em todas as épocas o claro favorecimento de determinadas práticas voltadas a determinadas classes sociais, e em contrapartida, a “oferta” de práticas assistencialistas para classes menos favorecidas.

    Na Grécia valorizava-se a contemplação e o cultivo a valores nobres, como a verdade, a bondade e a beleza. O trabalho nesta época era considerado um fator que atrapalhava essas contemplações, o tempo livre ganhava espaço, pois era o momento onde esses valores poderiam acontecer, mas havia ao mesmo tempo a necessidade do cumprimento das tarefas cotidianas. Nesse momento é que começam a ser visualizadas as diferenças sociais, pois enquanto a elite se permitia a esse tempo de contemplação, de ócio; aos menos favorecidos, que era a grande massa, o trabalho.

    Em Roma “todos” tinham acesso ao lazer, sabe-se que a elite utilizava-se de atividades de reflexão atrelada ao intelecto, enquanto para a classe popular eram oferecidas atividades de distração e alienação. É quando se torna evidente a política do “pão e circo” (já mencionada anteriormente), uma das formas de dominação e controle de massa.

    Na idade média, os nobres utilizavam-se do ócio, como um tempo de exibição social, do status no qual eles pertenciam, sem qualquer finalidade social. Já nas camadas populares não existia uma divisão de trabalho e não trabalho. A estas, sempre houve um controle social muito grande, para que não usassem seu tempo livre de forma “inadequada”.

    Com a modernidade nota-se uma artificialização dos tempos sociais, isto significa, que o tempo diário passa a ser marcado por uma supervalorização do trabalho, por conseqüência um sobrecarga de horas trabalhadas e menos horas de lazer. É nesta época que o controle do tempo de não trabalho era garantido através de instituições que nada mais eram que um reflexo do sistema político hegemônico, com a intenção de manter a “ordem” vigente.

    Assim, as imagens do “corpo” citado por Soares (1998) no decorrer da evolução dos métodos de ginásticas evidencia como as autoridades já se preocupavam com o tempo livre. Desde aquela época o esporte e lazer não eram vistos como fim, mas sim como meio de alcançar algo, uma visão utilitarista. Em exercícios aplicados por Amoros (precursor dos Métodos de Ginásticas na França), o próprio afirma que seus “métodos não eram para entreter, nem divertir por meio de demonstrações e usos de força física e muito menos fazer dos exercícios um mero e frívolo prazer” (SOARES, 2005, p.54). Neste “corpo moldado” Amoros tem como objetivo os exercícios ginásticos para a educação moral do indivíduo com a preocupação da submissão à norma geral imposta pela sociedade de classes.

    Dentro da mesma linha refletimos também o conceito de “corpo adestrado” como reflexo da utilização deste corpo pelo indivíduo assumindo uma relação direta com as necessidades e estilo de vida de cada um, utilizando esse corpo em prol do trabalho condicionando-o à alienação. Aspectos como estruturas físicas simétricas e sem desvios sempre foram muito valorizadas. A beleza, a disciplina, a harmonia dos movimentos sobrepujavam o sentido maior destas práticas e atividades, que existia com o objetivo de diversão, entretenimento e utilização do tempo livre para o alívio da repressão social.

    Indo um pouco além, acreditamos que Soares (1998) apesar de não ter esse objetivo, quis dar o caminho para o que chamamos de “corpo livre”. Este corpo onde se fuja de atos repressores desta moral estatal dominante, onde são impostos limites e limitações a cada indivíduo, em que o tempo livre, cada vez mais escasso acontece em inserções voltadas à políticas públicas de acesso ao lazer que, de certa forma, condicionam cada vez mais um indivíduo reprodutivista que é valorizado pelo seu corpo producente a favor do capital.

    Pode-se apontar que pelas discussões, acerca dos condicionantes que este corpo vem sofrendo, não existe o desejo que exista esse “corpo livre”, pois:

    Definitivamente a Educação Física (esporte e lazer) se propõe a aumentar o rendimento de todos que trabalham e a utilizar da melhor forma possível esse dispêndio de energia; é, portanto, para qualquer nação, uma questão econômica da maior importância (e não interessa senão condicionar este indivíduo que não seja para tal questão) (SOARES, 1998, p. 120).

    Não é fácil simplesmente apontar as principais causas para que as Políticas Públicas hoje estejam desacreditadas. É necessária uma fundamentação que vai além de simples fatos para sim formar um conjunto onde estabeleça uma abertura onde possa vislumbrar um verdadeiro avanço nesta causa. O grande passo é enxergar um movimento onde exista um trabalho integrado entre secretarias responsáveis direta ou indiretamente pelo lazer, citamos: educação, saúde, habitação, transporte, serviço social, obras e outras que possam facilitar este crescimento.

    A ação do poder público através de políticas setoriais, através de secretarias vinculando as iniciativas espontâneas da população e mais parcerias com iniciativas privadas, pode ser uma meta a ser construída para que o lazer seja enxergado para além de uma política pública voltada á apenas atividades reprodutivistas.

    Vale destacar o posicionamento de um dos mais respeitados estudiosos do lazer no Brasil:

    Falar numa política de lazer significa falar não só de uma política de atividades, que na maioria das vezes acabam por se constituir em eventos isolados, e não em política de animação com processo; significa falar em redução de jornada de trabalho – sem redução de salários, e, portanto, numa política de reordenação do tempo, numa política de transporte urbano etc.; significa, também, falar numa política de reordenação de solo – urbano, incluindo aí os espaços e equipamentos de lazer, o que inclui a moradia e seu entorno; e, finalmente, numa política de formação de quadros, profissionais e voluntários para trabalharem de forma eficiente e atualizada (MARCELLINO, 2001, p.11).

Considerações

    Notamos que em no decorrer da história das práticas de esporte e lazer na sociedade, estas sempre estiveram vinculadas a interesses vigentes em cada período histórico. Nesta trajetória, pouco se podia fazer. Muitas vezes por falta de conhecimento, de profissionalização na área e opressão da burguesia que a todo o momento defendia seu capital, seus interesses e a impossibilidade de ascensão dos menos favorecidos.

    O corpo que hoje nos é apresentado, ainda tem marcas de nossos antepassados, corpo este adestrado, moldado, controlado e alienado. E apesar da evolução da espécie humana, não só física, mas também social, ainda é percebido como algumas práticas, influenciadas pelo governo através de canais de propagação de massa, pregam o controle deste corpo.

    As perspectivas de democratização, inclusão social, bem-estar físico, promoção da saúde, desenvolvimento intelectual e humano que são encontradas nas propostas governamentais são interessantes, mas nós como profissionais da área de Educação Física e todos os que trabalham diretamente ou indiretamente, devemos nos posicionar: como estas práticas têm sido utilizadas?

    Não podemos apenas propagar o que os “donos do poder” querem, é necessária uma análise crítica dessas propostas, e uma conduta profissional e ética. Pois acreditamos que, transmitir sem refletir é apenas reproduzir.

    É notável que passamos e vamos novamente passar por um “grande momento” do esporte em nosso país. Sediamos os Jogos Pan-Americanos, acreditamos que este foi um alerta a todos os profissionais da área. Temos que discernir claramente entre o “esporte da escola” para o “esporte na escola”. Pois concordamos com Marcellino (2001) que “profissionais de esporte e lazer devem ser (antes de tudo) educadores, no sentido amplo da palavra, e não mercadores como habitualmente vêm ocorrendo”.

    Nossa intenção não é apontar erros ou defeitos nas atuais políticas públicas de esporte e lazer, mas sim fazer com que cada profissional que esteja trabalhando direta ou indiretamente com propostas deste tipo, reflita e analise qual a sua verdadeira função nessa “máquina política”. Acreditamos sim em propostas possíveis e não queremos ser desmotivadores destas, apenas semear novas propostas que possam atingir a todas as classes, oportunizando assim acesso ao esporte e lazer para todos.

Referências bibliográficas

  • BETTI, M. Educação Física e sociedade. São Paulo: Movimento, 1991.

  • CAVALCANTI, K. B. Esporte para todos – um discurso ideológico. São Paulo: Ibrasa, 1984.

  • DAOLIO, J. Educação Física e o Conceito de Cultura. Campinas: Autores Associados, 2005.

  • DARIDO, S. C., RANGEL, I. C. A. Educação Física na Escola: Implicações para a Prática Pedagógica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005.

  • DEMO, P. Pobreza Política. São Paulo: Autores Associados, 1994.

  • ________. Política social, educação e cidadania. Campinas: Papirus, 1994.

  • ELIAS, N., DUNNING, Eric. A busca da excitação. Lisboa: Difel, 1992.

  • MARCELLINO, N. C. Lazer e esporte: políticas públicas. Campinas: Autores Associados, 2001.

  • MELO, V. A., ALVEZ JÚNIOR, E. D. Introdução ao lazer. Barueri: Manole, 2003.

  • TUBINO, M. J. G. Teoria geral do esporte. São Paulo: Ibrasa, 1987.

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