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Natação para crianças com deficiência

física e seu desenvolvimento psicomotor

La natación para niños con discapacidad física y su desarrollo motor

 

*Especialista, FAFIPA. Educadora física

**Graduado, UNIFEBE. Educador físico

***Especialista, FAFIPA. Educadora física

****Mestrando, CEFID/UDESC. Educador físico

*****Doutoranda, CEFID/UDESC. Educadora física

(Brasil)

Luciana Ferreira*

Denis William Gripa**

Isabela de Espíndola Conceição***

George Roberts Piemontez****

Ana Claudia Vieira Martins*****

mestri_@hotmail.com

 

 

 

 

Resumo

          Este artigo procura analisar alguns fatores relacionados com a prática de natação em crianças com deficiência e seu desenvolvimento psicomotor. Realizou-se uma pesquisa bibliográfica, onde as informações relevantes sobre a temática foram levantadas e a análise recebeu tratamento qualitativo. O estudo mostra que as crianças com algum tipo de deficiência física necessitam de atividades que as façam crescer de forma sadia, onde o afetivo, o cognitivo e o motor não podem ser ignorados em detrimento um do outro. Independentemente das atividades selecionadas, o importante é que a criança tenha a oportunidade de experimentar os mais diversos movimentos, que ela mesma possa ir criando. Quanto mais numerosas e ricas forem as experiências vividas pelo corpo, maior será o número de esquemas motores desenvolvidos e mais rico será o desenvolvimento psicomotor dos portadores de deficiência. A natação, por todos os seus benefícios mostra-se uma alternativa interessante de atividade física pelos deficientes, desde que sua prática gere satisfação, prazer e alegria de viver aos praticantes.

          Unitermos: Deficiente físico. Psicomotricidade. Natação.

 

Abstract
          This article analyzes some factors related to the practice of swimming for children with disabilities and their psychomotor development. We conducted a literature search, where the relevant information about the topic was raised and received treatment qualitative analysis. The study shows that children with a disability in need of physical activities that make them grow in a healthy way, where the affective, cognitive and motor can not be ignored to the detriment of each other. Regardless of the selected activities, it is important that the child has the opportunity to experience the most diverse movements, that she can go creating. The more numerous and wealthy are the experiences of the body, the greater the number of motor schemes will be developed and richest psychomotor development of the disabled. Swimming, for all its benefits shows an interesting alternative to physical activity by disabled people, since it generates its practice satisfaction, pleasure and joy of living practitioners.
          Keywords: Physical disability. Psicomotricidad. Swimming.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 15, Nº 151, Diciembre de 2010. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    A Educação Física faz parte da formação integral da criança, onde ela passa a ser vista não apenas em seu aspecto biológico, mas também psicológico e social, envolvendo não apenas a mente, mas também com a amplitude e o aperfeiçoamento dos movimentos do indivíduo, para que ele possa melhorar sua relação com a natureza e com os outros homens, e tenha condições de aproveitar melhor a vida (BARBOSA, 2010).

    Dentre os vários tipos de atividades físicas, merece destaque a natação, que vem sendo muito utilizada para ajudar pessoas com algum tipo de deficiência a ganhar mais saúde e qualidade de vida. Além da sensação de liberdade sentida com os movimentos na água, o deficiente físico tem condições de se desenvolver mais facilmente, sua auto-estima fica elevada e todo o seu quadro clínico apresenta uma significativa melhora (MARTINS, RABELO, 2008).

    O professor de Educação Física tem extrema importância para o desenvolvimento psicomotor da criança, uma vez que é ele quem faz com que os alunos se sintam motivados para dar prosseguimento às atividades aquáticas e obter os melhores resultados (FILHO, MANOEL, 2002).

    A água pode ser considerada uma ferramenta de trabalho e é um elemento terapêutico, sendo que nesse ambiente as crianças com deficiência desenvolvem sua coordenação motora com mais facilidade e liberdade, devido à diminuição da gravidade na água, possibilitando o deslocamento das mesmas de forma independente (TSUTSUMI, et al, 2004).

    Diante do exposto, verifica-se a possibilidade de abordar e discutir esta temática tendo como objetivo analisar a relação entre psicomotricidade e a natação. Assim, procurou-se buscar respostas para o nosso questionamento: Como a natação pode auxiliar no desenvolvimento psicomotor de criança com deficiência física?

    Trata-se de uma pesquisa bibliográfica realizada em livros e artigos científicos, desde 1986, onde as informações relevantes sobre a temática foram levantadas e a análise recebeu tratamento qualitativo. As bases de dados utilizadas foram às disponíveis do site da Capes.

Desenvolvimento

    Para melhor entendimento da temática, o texto foi dividido em quatro partes, sendo que a primeira delas trata do deficiente físico, logo após tratamos sobre a psicomotricidade, depois a relação entre a criança e o movimento, e para finalizar, a relação existente entre psicomotricidade e natação.

Deficiente físico

    Pode-se considerar uma pessoa deficiente aquela que sofre de alguma limitação devido a perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica. Esta limitação gera dificuldades na pessoa de desempenhar uma determinada atividade dentro dos padrões considerados normais para o ser humano. (MEDEIROS APUD BEVIAN, 2000; BRASIL APUD SCHIRMER ET AL, 2007; SCHIRMER ET AL, 2007).

    Com base na Organização Mundial da Saúde, Cunha (2001) apresenta a distinção entre deficiência, incapacidade e impedimento:

  • deficiência – diz-se de toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica;

  • incapacidade – é toda restrição ou falta (devido a uma deficiência) da capacidade de realizar uma atividade na forma ou na medida que se considera normal a um ser humano;

  • impedimento – situação desvantajosa para um determinado indivíduo, em conseqüência de uma deficiência ou de uma incapacidade, que limita ou impede o desempenho de um papel que é normal em seu caso, em função de idade, sexo, fatores sociais e culturais.

    É preciso reconhecer que sempre haverá um determinado número de indivíduos com deficiência e incapacidades, mas que nem por isso devem ser impedidas de manter o convívio social e praticar alguma atividade física.

    No último Censo Demográfico, realizado em 2000 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) o número de pessoas com deficiência era de 24,6 milhões, totalizando 14,5% da população total do país. Já em pesquisa citada por Soler (2005), constatou-se cerca de 10% da população com alguma necessidade especial (portadores de deficiência mental, auditiva, visual, física e deficiência múltipla). A divergência dos dados deve-se ao fato de que a pesquisa citada por Soler (2005) foi realizada pela ONU com base em um sistema de amostragem, já o Censo Demográfico é um levantamento estatístico de toda a população brasileira em que 100% das pessoas que habitavam o país na data de 01 de agosto de 2000 foram contadas pelo Censo.

    Estes números contabilizam todas as deficiências, tanto as congênitas como as adquiridas. A deficiência congênita é quando a criança já nasce com a deficiência, enquanto a adquirida é quando a deficiência é causada por acidente ou doença. (BRASIL APUD SCHIRMER ET AL, 2007).

    O comprometimento da função física ocorre quando existe a falta de um membro (amputação), sua má-formação ou deformação (alterações que acometem o sistema musculoesquelético). Podemos encontrar também alterações funcionais motoras que são decorrentes de alguma lesão do sistema nervoso, onde pode-se observar principalmente a alteração do tônus muscular da pessoa: atividades tônicas reflexas, hipertonia, hipotonia, movimentos descoordenados e involuntários. (SCHIRMER ET AL, 2007).

    É necessário que se adote uma definição precisa do que realmente seja uma deficiência para a prática de atividades aquáticas. Conforme Amiralian (1997, p. 33):

    A deficiência, para quem a possui, interfere no seu desenvolvimento, na sua aprendizagem, nas suas relações familiares, na organização dinâmica de sua personalidade, enfim, é um elemento constitutivo dos aspectos estruturais e funcionais de sua pessoa total. Todavia, a influência da deficiência está relacionada a inúmeros fatores: o tipo de deficiência, sua intensidade, sua extensão, época de sua incidência e, principalmente, as oportunidades de desenvolvimento e ajustamento que foram oferecidas ou negadas às pessoas dela portadora.

    Qualquer deficiência física é uma condição dificultadora para as interações com o ambiente. Portanto, ter conhecimento sobre as deficiências, suas limitações e implicações para o desenvolvimento físico e emocional é de fundamental importância para que os profissionais de Educação Física possam aplicar qualquer tipo de intervenção junto às crianças com deficiências.

    Amiralian (1997) comenta que muitos acreditam na existência de técnicas especiais ou procedimentos específicos para o atendimento das necessidades de pessoas com deficiência, como se, pelo fato de apresentarem mutilações físicas ou déficits mentais, em nada se assemelham à maioria dos sujeitos, e esquecem que muitas de suas necessidades são as mesmas que todos nós vivenciamos.

    Deficientes ou não, todas as pessoas necessitam de uma auto-estima elevada, de saber que são capazes de superar os obstáculos, de confiança em si mesma e nos outros etc., sendo que no caso específico das crianças com deficiência física, o que vai influenciar no seu desenvolvimento físico e emocional através das atividades aquáticas é sua interação com o profissional de Educação Física.

Psicomotricidade

    O conceito de psicomotricidade surgiu com Dupré em 1920, devido seus trabalhos sobre a debilidade mental e motriz, quando percebeu as estreitas relações que unem as anomalias psíquicas e motrizes. A partir de então, a psicomotricidade vem sendo estudada tanto do ponto de vista da psicologia, como da neurologia e da psiquiatria infantil. (DAMASCENO, 1997).

    A psicomotricidade pode ser entendida como sendo a ciência que tem como objeto de estudo o homem através de seu corpo em movimento e em relação ao seu mundo interno e externo. Ela se relaciona ao processo de maturação, onde o corpo dá origem às aquisições cognitivas, afetivas e orgânicas. A psicomotricidade não se refere apenas ao desempenho motor da criança, ela é a capacidade de movimentar com intencionalidade, ação na qual o movimento explicita pensamentos e ações (Sociedade Brasileira de Psicomotricidade, 2008; Campos, 2006).

    Entretanto, alguns autores têm um entendimento diferenciado sobre a psicomotricidade, levando a um conceito mais amplo. Para eles a psicomotricidade é uma neurociência que modifica o pensamento em ato motor harmônico, sendo uma sintonia fina que coordena e organiza as ações gerenciadas pelo cérebro e as transforma em conhecimento e aprendizado. A ação é vivida no seu desenvolvimento para uma meta e este desenvolvimento do ato resulta em um complexo funcionamento fisiológico, não se limitando somente à soma de contrações musculares, pois é constituída também pela tomada de consciência (Instituto Superior de Psicomotricidade e Educação, 2010; Damasceno, 1997).

    Autores como Fonseca (2008) e Galvani (2002) tem um entendimento mais restrito quanto à definição deste termo. Para eles a Psicomotricidade pode ser definida, em termos necessariamente reduzidos, como a ciência que tem como princípio a própria essência da vida, estudando e investigando as relações e as influências recíprocas e sistêmicas, entre o psiquismo e a motricidade.

    De maneira bem simples, a psicomotricidade envolve mutuamente a atividade psíquica e a função motora. É preciso desejar e querer fazer cada movimento. Portanto, diz respeito ao modo como cada indivíduo possui para se relacionar com o meio, através do intelectual, emocional e motor (Fonseca, 2008; Galvani, 2002).

    Sendo a Psicomotricidade um termo empregado para uma concepção de movimento organizado e integrado, em função das experiências vividas pelo sujeito cuja ação é resultante de sua individualidade, sua linguagem e sua socialização, podemos observar sua atuação em três campos distintos (Ramos e Mello apud Archer, 1998; Sociedade Brasileira de Psicomotricidade, 2008):

  1. educação psicomotora – se baseia no processo educativo do indivíduo independente de faixa etária, quando vivencia situações, implicando em movimentações/habilitações novas;

  2. reeducação psicomotora – possibilita ao indivíduo o retorno da relação adequada com seu mundo e o mundo exterior;

  3. terapia psicomotora – movimentação utilizada para estabelecimento de relações adequadas que são prejudicadas por patologias.

    Independentemente do campo de atuação, o principal objetivo da psicomotricidade é estimular e desenvolver o desenvolvimento psicomotor do indivíduo, para que tenha uma imagem positiva de seu corpo, domínio e equilíbrio dos movimentos, possibilitando melhor adaptação ao mundo exterior (ROCHAEL, 2009).

A criança e o movimento

    A relação da criança com alguma atividade física está diretamente ligada às suas capacidades motoras, ou seja, para que ela tenha um bom domínio sobre as atividades físicas, faz-se necessário que tenha um qualificado domínio sobre os seus movimentos.

    Conforme Nacarato (2002) o desenvolvimento motor da criança é constituído de diversas fases e estágios, a saber:

  1. período de 0 a 2 anos – caracteriza-se pela inibição e controle de movimentos reflexos e aparecimento de movimentos básicos com formas rudimentares;

  2. período de 2 a 6/7 anos – caracteriza-se pela aquisição de movimentos fundamentais como andar, correr, saltar, arremessar, etc.;

  3. período de 7 a 10 anos – caracteriza-se pela combinação de movimentos fundamentais, possibilitando à criança participar de jogos de baixa para alta organização;

  4. a partir dos 10 anos – surge a possibilidade de orientá-la para atividades esportivas de forma generalizada e específica.

    Como se pode observar, cada fase e estágio têm suas próprias características e períodos de duração, sendo todos de suma importância para o desenvolvimento integral da criança. Nacarato (2002) ainda menciona que os movimentos são divididos em três categorias:

  1. locomoção- são os movimentos pelos quais o corpo é transportado na direção vertical ou horizontal, de um ponto para outro no espaço;

  2. manipulativos- movimentos que possibilitam ao indivíduo, um relacionamento com mais objetos, como arremessar, receber ou agarrar, chutar e rebater;

  3. estabilidade ou equilíbrio – movimentos que possibilitam ao corpo permanecer no lugar, mantendo uma postura no espaço e em relação à força de gravidade, como se equilibrar em um pé, apoio invertido, flexionar, etc.

    Além dessas categorias, ainda pode-se mencionar os movimentos combinados, como por exemplo, enquanto a criança corre, ela pode arremessar e receber uma bola. Por esta razão, a faixa etária de 2 a 6/7 anos de idade é muito importante na vida da criança, pois é a fase de aquisição dos movimentos fundamentais, que se não for bem desenvolvida pode comprometer as etapas seguintes.

    A educação pelo movimento fundamenta-se principalmente na proposta de Le Boulch apud Matos e Neira, (1999, p. 18-19):

    Toda a educação pressupõe tomar decisões enquanto à finalidade da ação educativa. O objetivo por nós apontado é o de favorecer o desenvolvimento de um homem capaz de atuar num mundo em constante transformação por meio de um melhor conhecimento e aceitação de si mesmo, um melhor ajuste de sua conduta e uma verdadeira autonomia e acesso às suas responsabilidades no marco da vida social.

    Assim sendo, o movimento, através de sua ação sobre atitudes e movimentos corporais, abrange o indivíduo como um todo, envolvendo o motor, o intelectual e o afetivo. Desta forma, nada mais adequado do que utilizar-se do movimento como um meio de permitir a criança expressar-se livremente, colocando em prática toda a sua criatividade.

    Como afirma Bueno (1998, p. 33): A criança para poder atuar no mundo por meio de seus movimentos dispõe de suas capacidades motoras, intelectuais e afetivas. Com isso, ela estabelece a relação com o mundo conforme sua carga tônica pessoal, a qual é construída no dia-a-dia com as estimulações e limitações impostas pelo meio e pelas pessoas que convivem com ela. Através dos movimentos ela desenvolve-se como um ser integral, único e social.

    Os movimentos são de fundamental importância, pois criam a base para o indivíduo desenvolver sua independência e autonomia corporal e sua maturidade sócio-emocional, já que, ao experimentar diferentes situações, a criança sempre se encontra em relação ou com o outro ou com o espaço ou com o objeto.

    Para Bueno (1998, p. 19), as inúmeras investigações realizadas no campo da psicomotricidade têm recaído sempre na esfera do conceito: “não há movimentos para os indivíduos, mas indivíduos que se movimentam, assim como não há objetos para os indivíduos, mas indivíduos que os utilizam”.

    O movimento resulta da integração de estímulos isolados e das situações concretas que o determinam, e ocupa grande parte das manifestações da história do indivíduo, dado que como exteriorização significativa é uma revelação do concreto vivido inerente ao indivíduo. O movimento é sempre a expressão de uma existência.

Psicomotricidade e a natação

    Desde cedo as crianças devem ser incentivadas a exercerem alguma atividade física. As vantagens de um esporte iniciado logo cedo são inúmeras. A natação é uma excelente dica ao público infantil. Melhorando a capacidade cardiorrespiratória, o tônus, a coordenação, o equilíbrio, a agilidade, a força, a velocidade, desenvolve habilidades psicomotoras como a lateralidade, as percepções tátil, auditiva e visual, as noções espacial, temporal e de ritmo, sociabilidade e autoconfiança (SANTOS e SOUZA, 2010)

    Antes de ser uma ferramenta utilizada para a formação de atletas, a natação deve garantir o desenvolvimento equilibrado da personalidade do indivíduo, permitindo que ele mesmo atinja os seus objetivos. A natação deve proporcionar o inter-relacionamento entre o prazer e a técnica, através de procedimentos pedagógicos criativos, principalmente sob a forma de jogos, que facultem comportamentos inteligentes de interação entre indivíduo com o meio líquido, visando ao seu desenvolvimento (Damasceno, 1997; Fonseca, 2002).

    Portanto, a natação destinada às crianças portadoras de deficiência deve ser antes de tudo, uma prática que lhe traga prazer, cujo maior objetivo é obter seu desenvolvimento físico, motor e emocional. É preciso ter em mente que uma criança com deficiência não participa de uma atividade aquática para praticar um desporto, mas que através dela ocorre um autoconhecimento, uma vivência do próprio corpo.

    O principal objetivo da psicomotricidade é estimular e desenvolver o movimento, sendo que para Archer (1998, p. 31), as funções psicomotoras podem ser atingidas com indivíduos portadores de deficiência física através da prática dos estilos de nado, “desde que eles (estilos) sejam colocados ao aluno de maneira que ocorra um respeito às suas características próprias.”

    Observando as fases do aprendizado dos estilos de natação, Archer (1998) verificou que a flutuação e deslize somente podem ocorrer quando existir uma consciência do próprio corpo, tônus de postura e domínio do equilíbrio. Por sua vez, a propulsão ocorre quando a criança realiza de forma adequada e coordenada, os movimentos das pernas e braços. A respiração envolve lateralidade, orientação espacial e temporal, e o mergulho necessita de domínio orientado do corpo no espaço.

    Reafirmando o vínculo natação/Psicomotricidade, Archer (1998) apresenta as funções psicomotoras envolvidas nos movimentos dos estilos crawl e peito:

  1. movimentação de braços – imagem corporal, tônus de postura, orientação temporal, orientação espacial, ritmo, dissociação e relaxamento;

  2. movimentação de pernas – imagem corporal, tônus de postura, orientação temporal, orientação espacial, ritmo, dissociação e relaxamento;

  3. respiração – imagem corporal, orientação temporal, orientação espacial, ritmo e lateralidade;

  4. nado completo – imagem corporal, tônus de postura, dissociação de movimento, coordenações globais, orientação temporal, orientação espacial, ritmo, lateralidade, equilíbrio, relaxamento.

    Isso mostra que os estilos de nado estão vinculados com as funções psicomotoras, criando um vínculo muito estreito entre a natação e a Psicomotricidade. Dessa forma, ao induzir uma criança com deficiência ao aprendizado da natação, está se dando significado ao movimento.

    Conforme Fonseca (2004), “enquanto a adaptação terrestre exige a integração tônica da gravidade da qual decorreu uma das mais relevantes adaptações hominídeas – a postura bípede -, a adaptação aquática atenua a função da gravidade” (p. 94). Esta é a razão pela qual algumas pessoas deficientes motoras atingem na água uma profunda sensação de liberdade e expandem sua auto-estima e sua auto-segurança, pois em terra a gravidade os impede de se locomoverem com a autonomia desejada.

    Esta afirmativa mostra como as atividades aquáticas podem ser importantes para o desenvolvimento psicomotor das crianças portadoras de deficiência, cujos alguns movimentos são realizados com mais facilidade na água, desde que sejam observadas as condições de segurança, conforto e prazer, uma vez que permanecer ou estar na água é totalmente diferente do que estar situado ou posicionado em terra.

    Estudo feito com crianças de 7 e 12 anos mostram que quando iniciado ao programa de atividades aquáticas essas crianças apresentaram melhoras nos cinco aspectos psicomotores, o que provavelmente afetou positivamente a qualidade da vida diária dessas crianças (ARROYO, OLIVEIRA,2007).

    Realizar todos os movimentos que um programa de atividades aquáticas exige, implica expandir e ampliar o repertório psicomotor do indivíduo. Se para uma criança sem deficiência isto já é uma vitória, imagina para uma criança com dificuldades. Assim sendo, torna-se necessário que as crianças com deficiência se sintam seguras em realizar todos os exercícios, garantindo estabilidade emocional e autonomia.

    Viana (1986) afirma que assim como as demais pessoas, os deficientes também são capazes de assumir riscos, desde que sejam de sua própria e livre escolha, e não resultado da incompreensão ou negligência alheia, por isso não basta que o indivíduo deficiente esteja em segurança, é preciso que ele através de sua percepção se sinta seguro, principalmente ao ser manuseado na piscina. Os monitores devem ter como objetivo ganhar a confiança e nunca fazer os deficientes se sentirem como um estorvo. O riso e o prazer sempre serão grandes auxiliares neste processo.

    Num ambiente de confiança o deficiente tem condições de alcançar sua independência e depender cada vez menos da intervenção do monitor. Com isso, tanto deficiente quanto monitor vão se sentir realizados devido aos progressos alcançados com a realização dos exercícios.

    De acordo com Fonseca (2004), “a criança só poderá adaptar-se à água se o seu cérebro conhecer que tipos de problema e de situação surgem quando ela está mergulhada ou submersa.” (p. 101). Quando a criança nada de uma forma adaptativa, seu cérebro está organizando de forma eficiente as sensações da gravidade, da impulsão, da respiração, dos membros, do corpo, etc. Se esta resposta não for expressa, ou se for produzida de forma muito lenta, a criança sofrerá com o desconforto, a insegurança, os bloqueios respiratórios, além do que engolirá água e até poderá se afogar.

    Nesse processo, o papel do profissional de Educação Física é de suma relevância. Ele tem que ter consciência que a natação é apenas um pretexto para atingir encorajamento e adaptá-lo às necessidades específicas de desenvolvimento da criança, o que exige conhecimentos específicos nesta área.

    Segundo Viana (1986), além da deficiência física aparente, uma criança ainda pode apresentar outros problemas de deficiência, como o medo agudo de cair, a dificuldade de se fazer entender, o corpo assimétrico, a dificuldade de realização de movimentos, a incapacidade para controlar movimentos, a circulação e capacidade respiratória deficientes, a falta de compreensão da palavra falada, a incontinência (falta de controle das funções urinária e intestinal) e as lesões de pele, ossos e articulações.

    Assim sendo, é de sua importância que o profissional de Educação Física faça uma avaliação de cada criança antes de começar qualquer programa de atividade aquática, pois somente desta forma terá condições de oferecer o apoio físico e emocional necessário para que o deficiente realize as atividades e alcance os objetivos traçados.

    Segundo Velasco (2006, p. 87) a natação se constitui numa das melhores práticas para o desenvolvimento psicomotor, “Não a natação pedagógica regular, realizada com principiantes do esporte, nem a competitiva para formar campeões, mas a que valoriza a motricidade aquática, pondo em situação uma nova arquitetura psicomotora.”

    A prática da natação contribui para a melhoria da qualidade de vida, através da manutenção de uma boa saúde física e mental, proporcionando as crianças portadoras de deficiência novas perspectivas de vida, devido às vantagens que esse exercício proporciona como o treinamento do coração, o fortalecimento da musculatura e a aprendizagem de novas habilidades. Destaca-se a alegria e o prazer que a contato com o meio líquido pode proporcionar ao indivíduo, além do envolvimento com sentimentos, imaginação, valores, atitudes, aprendizagem, tomada de decisão, liberdade, autodisciplina, entre outras coisas que levam a natação a ser considerada um exercício completo (ALVES, 2006; VELASCO, 2006).

    Almeida e Tonello (2007), ao estudar um grupo de 10 alunos com lesão medular, com idade entre 13 e 46 anos, que praticam natação observaram que houve um grande aumento em relação ao seu desenvolvimento psicomotor. Martins e Rabelo (2008), investigando portadores de deficiência física, através de um programa de natação com duração de 24 semanas, mostraram que a natação adaptada, colaborou para a melhora da coordenação psicomotora e também para uma melhora na qualidade de vida dos deficientes físicos.

    A tendência dos estudos na área é relacionar a prática de natação com o desenvolvimento psicomotor e o aumento da qualidade de vida dos deficientes físicos, e observa-se que em todos os estudos observados esta relação é efetiva. (MARTINS E RABELO, 2008; ALMEIDA E TONELLO, 2007; ARROYO, OLIVEIRA, 2007).

    Como se pode notar, a prática da natação traz vários benefícios aos seus praticantes. No caso das crianças com deficiências a idéia não é formar atletas, mas executar uma educação motora, levando em consideração que a psique estará totalmente envolvida no processo de aprendizagem.

Considerações finais

    Assim como as demais pessoas, uma criança com deficiência também é reconhecida como indivíduo, apesar de suas dificuldades. Isso mostra que a criança portadora de deficiência não pode ser vista como sem utilidade para a sociedade e incapaz, mas alguém que na maioria dos casos precisa de incentivo, preparação e oportunidade para mostrar que também tem capacidade de levar uma vida normal.

    A realização de um programa de natação para crianças com deficiência deve respeitar, além dos dados das avaliações realizadas, contribuir para a autonomia corporal, despertar o prazer de viver e melhorar sua qualidade de vida. O objetivo não é fazer com que a criança saia nadando, mas que tenha confiança em si mesma e comece a movimentar seu corpo e que esse movimento lhe traga satisfação, prazer e a alegria de viver.

    Se a criança com deficiência não estiver disposta a realizar os movimentos propostos pelos profissionais de Educação Física, seu repertório de movimentos fica debilitado, dificultando seu relacionamento consigo mesmo e com os outros.

    O vínculo natação/Psicomotricidade tem por objetivo conduzir a criança deficiente ao descobrimento do próprio corpo e dos outros, fazendo com que a criança se sinta capaz de realizar os movimentos de forma ordenada e equilibrada, garantindo uma vivência corporal que leve ao progresso das habilidades físicas, psíquicas e sociais.

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EFDeportes.com, Revista Digital · Año 15 · N° 151 | Buenos Aires, Diciembre de 2010
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