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Comprometimento no incremento da força 

durante a realização de treino concorrente

Compromiso con el aumento de la fuerza durante la realización del entrenamiento concurrente

 

Universidade Federal do Rio Grande do Sul, UFRGS, Porto Alegre

Escola de Educação Física, ESEF

(Brasil)

Cleiton Silva Correa

Luciano Sousa

cleitonesef@yahoo.com.br

 

 

 

 

Resumo

          Nas últimas décadas, diversos estudos investigaram o efeito do treinamento concorrente, no qual o exercício de endurance e o exercício de força são realizados simultaneamente na mesma sessão de treino. Nesse artigo de revisão enfatiza-se três mecanismos possíveis ao efeito do treinamento concorrente: a hipótese crônica, esta que relata as diferenças entre as adaptações morfológicas e funcionais ocasionadas pelo treinamento de resistência e de força quando realizados de forma isoladas. Outro ponto a ser tratado é o overtraining como a questão de um grande volume de treino; e a hipótese aguda relacionada à fadiga residual gerada pelo treinamento de resistência aeróbica. Portanto, a hipótese crônica quanto aguda, foram propostas para explicar o fenômeno da existência de inibição de força, durante treinamento concorrente. No entanto, existem limitadas evidências, para ambas as hipóteses. Enfim, promover novos métodos de investigação é também necessários para identificar outros possíveis mecanismos responsáveis pela já observada inibição no desenvolvimento de força após treinamento concorrente.

          Unitermos: Treino concorrente. Interferência na força. Hipótese crônica e aguda.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 15, Nº 151, Diciembre de 2010. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Nas últimas décadas, diversos estudos investigaram o efeito do treinamento concorrente, no qual o exercício de endurance e o exercício de força são realizados simultaneamente na mesma sessão de treino [13]. Uma vez que atletas e indivíduos fisicamente ativos adotam essa estratégia de treinamento, existe um grande interesse com relação à interferência que a primeira atividade teria sobre a atividade subseqüente.

    Existe um interesse na compatibilidade fisiológica do treinamento de força e de resistência aeróbia. Esta revisão tem como objetivo compreender as respostas obtidas por meio do treinamento concorrente, analisar qual é a influência da realização de um exercício submáximo de longa duração: endurance sobre o desempenho de força subseqüente.

    De acordo com Leveritt e colaboradores (1999), atletas envolvidos em muitos esportes que necessitam do desenvolvimento de força e resistência passam a realizar treinamento concorrente, é o caso de nadadores, jogadores de rugby, futebol e corredores de meia distancia [8]. Alguns estudos têm demonstrado que treino concorrente inibe a formação e o desenvolvimento da força[13].

    Kramer e colaboradores, citado por McCARTHY indica que o treino de endurance aliado ao treino de força prejudica a hipertrofia das fibras do tipo 1, mas não afeta o desenvolvimento da aptidão física [4]. Outros estudos mostraram que treinamento aeróbio e de força, não tem nenhum efeito inibidor sobre o desenvolvimento de força ou resistência [1]. Isso pode estar relacionado com o número de sessões de treino e condição física dos atletas, indivíduos destreinados realizaram treino concorrente em 3 sessões semanais por 10 semanas e tiveram resultados semelhantes nos tópicos estudados comparado com grupo que treino somente força [4].

    Entende-se por treinamento concorrente a associação de exercícios resistidos e aeróbios no mesmo programa de treinamento. Há dúvidas quanto à resposta ao tipo de treino de uma dessas variáveis: força e resistência (endurance). Relacionando-se com o incremento ou não das mesmas quando treinadas concorrentemente, ou de forma isolada. Há dúvidas também quanto à ordem, de qual deverá ser treinada primeiro numa sessão por exemplo [10].

    Bell e colaboradores (2000) e Guedes (2004) sugerem que o treinamento concorrente pode prejudicar o desenvolvimento da força, da hipertrofia e da potência muscular. Isso devido às diferentes adaptações neurais [2, 6].

    Também há estudos que sugerem como causador dessa incompatibilidade a menor hipertrofia como resposta ao treinamento concorrente, pois o tempo de recuperação sendo insuficiente levaria a uma depleção crônica das reservas de glicogênio, a longo prazo ao overtraining, acarretando na redução do volume do músculo e na performance do indivíduo [2, 12].

    Estudos indicam que o treinamento concorrente não prejudica o desenvolvimento de endurance [1, 9, 12].

    Nesse artigo de revisão enfatiza-se três mecanismos possíveis ao efeito do treinamento concorrente: a hipótese crônica, esta que relata as diferenças entre as adaptações morfológicas e funcionais ocasionadas pelo treinamento de resistência e de força quando realizados de forma isoladas. Outro ponto a ser tratado é o overtraining como a questão de um grande volume de treino; e a hipótese aguda relacionada à fadiga residual gerada pelo treinamento de resistência aeróbica caso anteceda o de força, poderia vir a comprometê-lo [8].

Proposta de mecanismos inibitórios

    Muitos estudos têm encontrado que o desenvolvimento da força é inibido pelo treinamento concorrente, entretanto poucos autores tentaram verificar porque ocorre este fenômeno. O overtraining foi sugerido como um possível mecanismo. Estudos também propõem hipóteses crônicas e agudas responsáveis pela inibição do desenvolvimento da força durante o treinamento concorrente.

Hipótese crônica

    O treinamento de força é representado pela superação de uma determinada resistência, por meio da contração muscular. O mesmo sempre foi associado ao aumento da massa muscular, por meio da hipertrofia muscular e ao aumento da força máxima. Sendo importante para muitos esportes, para melhora da condição física geral, aumento da potência ou da resistência muscular [8].

    Entretanto, se tem como resultantes do treinamento de força o aumento da área de secção transversa das fibras musculares tipo I, IIa e IIb. As adaptações que decorrem do exercício de força ocorrem por meio de mudanças estruturais e funcionais características de cada estímulo nos diferentes tipos de fibras do músculo. Podendo essa combinação ocasionar prejuízos nas adaptações, devido aos mecanismos diferentes a serem acionados.

    Pensando-se na especificidade do treinamento, Abernethy e colaboradores (citado por Leveritt, 1999) relatam que os efeitos exibidos na hipertrofia muscular, substratos endógenos, atividades das enzimas metabólicas estrutura da proteína contrátil e a capilarização do treinamento de força são diferentes e às vezes opostas as do treinamento de resistência aeróbia [1].

    O treinamento de resistência aeróbica tem como objetivo o aumento do consumo de oxigênio de pico e associação as funções cardiovasculares [9]. Estes incrementos metabólicos trazem como resposta para o treinamento de endurance: o aumento das atividades das enzimas oxidativas, os estoques de glicogênio intramuscular, a densidade e capacidade mitocondrial, da difusão pulmonar, controle da saturação da hemoglobina, a densidade capilar, e aumento do débito cardíaco [11, 13].

    Normalmente, o exercício da força resulta em um aumento na massa do músculo, e em resultados do exercício de endurance em um aumento na densidade capilar do músculo, na proteína mitocondrial, em enzimas oxidativas, e mais metabolicalicamente em formulários eficientes de proteínas contráteis e regulatórias [10,13].

    Macdougall (citado por Docherty, 2000) demonstra que dependendo da intensidade do treinamento aeróbico a adaptação pode ocorrer no componente central ou periférico. Em baixas intensidades a adaptação fisiológica ocorre primeiramente no componente central. Já com intensidades baixas de treinamento estão associadas com mudanças no mecanismo cardio-pulmonar como a difusão pulmonar. Quando o treino é de maiores intensidades a adaptação ocorre principalmente no componente periférico com mudanças na capilarização muscular, atividade de enzimas oxidativas, volume e densidade mitocondrial e mioglobina. O artigo relata que foram estudados dois grupos um com treino intervalado e outro com treino continuo, mas de menor intensidade. Os resultados indicam que ambos os grupos mostram significativamente similares incrementos no VO2 máx, o grupo do treino intervalado demonstrou maior incremento na diferença artério-venosa de oxigênio do que o grupo de treinamento contínuo. Refletindo maior adaptação periférica. O grupo de treinamento contínuo obteve uma maior adaptação central [12].

    Na mesma revisão, o autor relata que o treinamento de força muscular pode ser incrementado por mudanças na área de secção transversa do músculo, pela síntese protéica e por adaptações neurais como realce da ativação das unidades motoras. A variação na intensidade do treinamento e no protocolo parece diferenciar as adaptações neuro-musculares: altas intensidades (3-6 RM) e baixo volume estão associados a um incremento na geração da força sem aumento da hipertrofia muscular e estando relacionado a adaptações neurais. A hipertrofia muscular é produzida com menores intensidades (8-12 RM) e maior volume ocasionando aumento da síntese protéica na fibra muscular [12].

    Leveritt e colaboradores (1999) descreveram que, para estimular a hipertrofia muscular, a carga tem de ser abaixo de 90% de 1 RM e volume (8-12 RM), aumentando assim a síntese protéica na fibra do músculo. Sugerem também que haveria uma maior adaptação neural com programas de treinamento que utilizam altas cargas e baixo volume (1-6 RM) [1] .

    Docherty & Sporer (2000) propuseram um modelo com o objetivo de investigar o fenômeno de interferência baseado nas adaptações fisiológicas dos diferentes protocolos de treinamento conhecidos para força e endurance. O modelo primeiramente focou na intensidade do treinamento. Normalmente quando a intensidade do treinamento aumenta, o volume diminui. Para o modelo a hipótese da interferência pode se maximizada quando atletas usam alta intensidade de treinamento intervalado para aumentar a potência aeróbica e múltiplas séries (8 a 12 RM) de treinamento de força. O protocolo de treinamento de força pode realçar a síntese protéica do músculo e estressar o sistema anaeróbico com o aumento do lactato muscular. O treinamento aeróbico intervalado pode gerar hipóxia no músculo requerendo incremento na capacidade oxidativa muscular, com o TC não houve prejuízos nesses parâmetros [13]. Nessa situação o músculo requereria adaptação em caminhos fisiologicamente e anatomicamente distintos, podendo reduzir a adaptação de um dos sistemas. Se o treinamento intervalado aeróbico for combinado com o treinamento de força (3 a 6 RM) o modelo prediz menor interferência porque o estímulo para que haja o incremento da força deve estressar o sistema neural e não as demandas metabólicas no músculo. Pressume-se que o músculo pode incrementar sua capacidade oxidativa sem afetar a adaptação neural como a freqüência de disparo, sincronização das unidades motoras, diminuição da inibição e co-ativação dos músculos antagonistas.

    O estudo sugere que o treinamento concorrente compromete o desenvolvimento de força, comparado ao treinamento de força apenas. O desenvolvimento da potência aeróbica parece não ser afetado. A variedade dos sistemas de treinamento e suas variáveis dificultam qualquer conclusão definitiva. O modelo conclui que os protocolos de treinamento podem maximizar ou minimizar o nível de interferência [12].

    Kraemer 1995 (citado por Aoki e colaboradores 2003) relata que a combinação do treinamento de força com um programa de treino aeróbico de intensidade elevada parece interferir nos desempenhos de força e potência, esta que parece ser o principal efeito deste treinamento. Ao contrário, é possível que não haja comprometimento nas adaptações aos efeitos do treinamento concorrente e os resultados sobre o ganho de força, pois a combinação de estímulos pode exigir um maior tempo do organismo até que as adaptações possam ocorrer, podendo haver uma maior necessidade de agregação de proteínas, adaptações ultra-estruturais e enzimáticas simultâneas [4].

    McCarthy e colaboradores buscaram examinar as adaptações morfológicas e neurais da ação do músculo (quadríceps) como resultado da interação entre o treinamento concorrente da força e da resistência. Foram utilizados trinta indivíduos homens sedentários saudáveis, estes foram divididos em três grupos: um executou o treinamento de força (s), treinamento de endurance (E) e um grupo que treinou resistência aeróbia com treinamento de força: concorrente (C). O treinamento foi executado durante dez semanas, três dias por semana. Os grupos S e CC demonstraram similares incrementos em ambas extensões da coxa (12 e 14 %) e flexão/adução da coxa (7 a 6%) na área do músculo. A área das fibras tipo II aumentou similarmente nos grupos S (24%) e no grupo CC(28%). Já nas fibras tipo I no grupo S (19%) e também similar e não significativa no grupo CC (13%). O artigo conclui que um desempenho simultâneo da força e do treinamento de resistência não danifica as adaptações na força muscular, na hipertrofia e na ativação neural induzida pelo treinamento de força sozinho. Os resultados fornecem uma base fisiológica que indica que o treinamento simultâneo de três vezes por semana não danifica o desenvolvimento da força a curto prazo [7].

    Em um estudo realizado por Nelson e colaboradores (citado por Leveritt 1999) traz que ocorrem melhorias na capacidade de VO2 máx durante a segunda metade da vigésima semana do programa de treinamento. Os ganhos do treinamento do grupo concorrente foram comprometidos quando comparado com o treino de resistência aeróbia somente.

    De acordo com Leveritt (1999) o TC não altera a transição normal do tipo de fibra do músculo, associados com o treino de força. O treinamento de força foi indicado para aumentar a área de secção transversa do músculo. A quantidade de força a ser gerada tem relação direta com o diâmetro da fibra muscular. Foram observadas após o treinamento de força que há hipertrofia nas fibras rápidas e lentas. Porém em outros estudo seccionais e longitudinais relatam que há maior hipertrofia no tipo IIa do que nas do tipo IIb e I [1].

    O estudo de Kraemer citado por Leveritt (1999), traz que o treinamento de força causou hipertrofia nas fibras lentas I, nas fibras tipo IIa e IIc, quando o treinamento de resistência aumentou a área de secção transversa das fibras lentas I e fibras IIc somente e o treinamento concorrente causou hipertrofia de fibras IIa somente. Isto pode explicar o porquê da força (no pé) dentro do grupo simultâneo não ter melhorado tanto quanto no grupo de força [1].

    Nelson e colaboradores (citado por Leveritt) relatam que o treinamento concorrente interfere na hipertrofia das fibras associado com o treinamento de força ou de resistência sozinhos. Notou-se significantes aumentos nas áreas das fibras lentas, IIa e IIb após treinamento concorrente. O treinamento de força somente aumentou a área de secção transversa das fibras tipo IIb. O desenvolvimento da força nesse estudo não foi inibido pelo treinamento concorrente[1].

    Sale e colaboradores (citado por Leveritt 1999) relatam similares incrementos na AST somente como resposta aos treinamentos: de força e concorrente. Incrementos na força de 1 RM eram também similares nesses dois treinamentos. Sugerindo que o desenvolvimento da força não é inibido quando ocorrem mudanças bruscas e similares na hipertrofia muscular no treinamento dos grupos de força e de treino concorrente [3].

    De acordo com Leveritt (1999) há uma enorme variação dos programas de treinamento que demonstram resultados controversos ao efeito do treinamento concorrente de força e resistência (TC). O efeito do treinamento concorrente ainda é obscuro em relação a um incremento hipertrófico nas fibras musculares. Rompimentos em vários sub-grupos de tipos de fibras foram evidenciados no teste padrão do treinamento concorrente. Entretanto isso não parece estar associado com nenhuma inibição no desenvolvimento da força observado após o TC [1].

    Mas Dudley (1987) citado por NADER revelou diminuição do numero de fibras do tipo II e, por conseguinte diminuição da força e da potência após 10 semanas com treinamento concorrente [5].

    O recrutamento das fibras musculares durante o exercício de resistência é dependente da intensidade do exercício. O recrutamento preferencial das fibras lentas (I) ocorre durante a atividade moderada de resistência. Já o treinamento de resistência é caracterizado geralmente por contrações musculares pertos dos níveis máximos de da força. Esse aumenta a força da contração muscular realçando a coordenação do recrutamento da unidade motora. Parece possível que o TC possa vir a interferir com o desenvolvimento da força, danificando a habilidade do sistema neuro-muscular de fazer as adaptações na organização da unidade eficiente no recrutamento motor normalmente associado com o treinamento de força apenas. O treinamento de resistência mostrou que reduziu a habilidade do salto vertical Isto pode ser devido ao treinamento da resistência reduzir a potencialidade do sistema neuro-muscular para gerar de forma rápida a força.

    Outros estudos sugerem, que alterações no recrutamento da um podem ser responsáveis pela inibição no desenvolvimento da força observado durante o treinamento. A força e a resistência aeróbica realizadas no treino concorrente parecem mostrar uma adaptação diferente delas realizadas de forma isoladas [1]. Porém outros estudos não indicaram diferenças significativas no desenvolvimento neuro-muscular nos grupos TC e TF após o treinamento isso pode ser relacionado com o numero de sessões de treino e o grande período de intervalo entre as sessões descartando a possibilidade de overtraining, a qual veremos a seguir[4, 7].

Hipótese do overtraining

    Autores sugerem que o treinamento concorrente pode prejudicar o desenvolvimento da força, hipertrofia e potência muscular [1, 2, 8]. Isto ocorre devido a diferentes adaptações neurais. Outros estudos sugerem que a incompatibilidade é devido à menor hipertrofia alcançada com o treinamento concorrente, pois o tempo de recuperação insuficiente levaria a uma depleção crônica das reservas de glicogênio, a longo prazo levando ao overtraining, que acarreta redução da performance e perda de volume muscular [1,5,11].

    O overtraining ou fadiga crônica pode ser devido à depleção de substrato. A reserva de carboidrato muscular, no fígado e no líquido extracelular representa aproximadamente 2000 Kcal de energia armazenada. Quando os atletas treinam intensamente, e a alimentação não supre as demandas de energia, as reservas de carboidratos tornam-se depletadas. O efeito combinado dessa redução pode ser a fadiga crônica e declínios consideráveis do desempenho [11].

    A maioria dos estudos sobre treinamento concorrente envolvem 3 grupos. Esses estudos normalmente incluem um grupo que treina apenas força (TF), um segundo que faz treinamento de resistência aeróbica (TRA) e um terceiro que treina concorrentemente força e aeróbico (TC) [1,4,5,13]. Normalmente o grupo TC treina tanto força quanto o grupo TF, e tanto aeróbico quanto o grupo TRA. Portanto, frequentemente, a carga de trabalho do grupo TC acaba sendo o dobro da carga dos outros dois grupos. Isto sugere que os indivíduos do grupo TC acabam por sofrer overtraining em comparação com o grupo TF e TRA [1]. Alguns estudos não relataram o overtraining no TC inclusive com resultados semelhantes no aumento da força, no componente neromuscular e no endurance, isso sugere que diferentes protocolos de treinamento podem resultar em diferentes adaptações e sem o risco do overtraining.

    Overtraining é descrito como um desequilíbrio entre treinamento e recuperação. A carga excessiva decorrente do treinamento aeróbico seguido do treinamento de força, sem intervalo adequado pode acarretar a entrada em um platô de força e inclusive um decréscimo da mesma em razão do overtraining.

Hipótese do efeito agudo

    Estudos disponíveis na literatura demonstram que o exercício de endurance realizado previamente, afeta de modo adverso o desempenho no exercício de força subseqüente. A hipótese aguda sustenta que o incremento de força é comprometido em detrimento aos resíduos resultantes da fadiga tecidual durante o treinamento de resistência [2].

    Os mecanismos responsáveis pelo comprometimento da força e potência no treinamento concorrente ainda não foram totalmente identificados. Um possível candidato é a depleção de glicogênio muscular, pois esse é um importante substrato energético para o treino de força. Entretanto, evidências anteriores obtidas em pesquisas recentes, demonstram que indivíduos que realizaram consumo adequado de carboidrato antes do exercício e que também foram suplementados com carboidrato durante o exercício concorrente não conseguiram atenuar o efeito deletério do exercício de endurance sobre o posterior exercício de força [2]. Esses resultados, portanto, nos fizeram considerar a hipótese de que outro substrato energético poderia contribuir para a execução do treino concorrente (exercício aeróbio realizado antes do exercício de força), a creatina-fosfato (CP) [11].

    Tal ocorrência pode estar relacionada a mudanças metabólicas agudas induzidas pelo exercício de endurance. A maioria dos esforços para descrever as causas da fadiga enfoca os sistemas energéticos (ATP-CP, glicólise e oxidação), o acúmulo de subprodutos metabólicos, o sistema nervoso e a falha do mecanismo contrátil das fibras musculares [1,3,11].

    A depleção de glicogênio poderia estar relacionada com o comprometimento no desempenho de força, uma vez que se acredita que tal interferência esteja relacionada ao metabolismo energético [3, 11].

    Leveritt e colaboradores 2000, não acharam queda significativa na produção de força em universitários, com exercício de força sendo realizado oito e 32 horas após 50 min de atividade aeróbia em cicloergômetro com cargas variando de 70 a 110% da potência crítica [3].

    Estudos de biópsias de músculos da coxa revelaram que, durante contrações máximas repetidas, a fadiga coincide com a depleção de CP [3]. Gomes e Aoki 2005 verificaram se a suplementação de creatina exerce efeito ergogênico durante a execução do exercício concorrente. Dezesseis universitárias foram divididas em dois grupos. A suplementação foi realizada seguindo o modelo duplo-cego, 20g de placebo ou creatina durante cinco dias e posteriormente 3g por sete dias. Antes da suplementação, os sujeitos foram submetidos ao teste de 1-RM e ao teste de repetições máximas no leg press 45º (três séries de repetições máximas, realizadas a 80% do valor de 1-RM com intervalo de 150 segundos de pausa). Após o período de suplementação, os sujeitos realizaram o teste de corrida, no qual foram instruídas a percorrer a maior distância possível em 20 minutos. Imediatamente após o teste de corrida, os testes de 1-RM e de repetições máximas foram realizados novamente. Não foi observada diferença no desempenho do teste de 1-RM. Também não houve diferença no desempenho do teste de corrida. Após o teste de corrida, foi observado decréscimo no número de repetições máximas no grupo placebo. Esses resultados sugerem que o sistema ATP-CP contribui de maneira significativa para realização do exercício concorrente, no qual o subseqüente treino de força é realizado em alta intensidade. [11].

Conclusão

    O objetivo desta análise consistia em comparar concomitantemente os estudos, identificar limitações das investigações e discutir possíveis mecanismos envolvidos no treino concorrente (força e resistência aeróbia), juntamente executados. Em nosso entendimento a compreensão e a natureza dos apontamentos sobre a inibição da força em treinamento concorrente, ainda é limitada. Atualmente temos como propostas de identificação desta interferência três hipóteses: aguda, crônica e o overtraining. Esta indefinição ocorre devido a existência de inúmeras diferenças entre os resultados encontrados nos estudos, os diferentes protocolos existentes e utilizados em cada estudo, incluindo o volume, a duração, a freqüência, a intensidade, o nível de aptidão física inicial, a população e o método estatístico utilizado. Além disso, manipulando se apenas, algumas das variáveis, os pesquisadores poderão ser capazes de identificar diferentes estratégias que podem superar quaisquer efeitos negativo da formação concorrente. Atualmente, tanto, crônica quanto aguda hipótese, foram propostas para explicar o fenômeno da existência de inibição de força, durante treinamento concorrente. No entanto, existem limitadas evidências, para ambas as hipóteses. Enfim, promover novos métodos de investigação são também necessários para identificar outros possíveis mecanismos responsáveis pela já observada inibição no desenvolvimento de força após treinamento concorrente.

Referências

  1. LEVERITT M. ABERNETHY PJ. BARRY BK. LOGAN PA. Concurrent Strength and Endurance Training A Review. Sports medicine (Auckland, N.Z.), 28 (6), p.413-427, Dec 1999.

  2. BELL GJ. SYROTUYK D. MARTIN TP. BURNHAM R. QUINNEY HA. Effect of concurrent strength and endurance training on skeletal muscle properties and hormone concentrations in humans. European journal of applied physiology, 81 (5), p.418-427, Mar 2000.

  3. LEVERITT M. MAcLAUGHLIN H. ABERNETHY P. Changes in strength 8 and 32 h after endurance exercise. J Sports Sci 2000; 18:865-71.

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  8. UCHIDA, M.C.; CHARRO, M. A.; BACURAU, R. F. P.; NAVARRO, F.; PONTES JÙNIOR, F. L. Manual de musculação: uma abordagem teórico prática do treinamento de força . 4ª.ed- São Paulo: Phorte 2006.

  9. FLECK, SJ.; KRAEMER, WJ. Fundamentos do treinamento de força muscular. 3.ed. Porto Alegre: Artmed 2006.

  10. BAAR, K. Training for endurance and strength: lessons from cell signaling. Medicine & Science In Sports & Exercise. Vol. 38, N°. 11, p. 1939-1944, 2006.

  11. GOMES RV., AOKI MS. Suplementação de creatina anula o efeito adverso do exercício de endurance sobre o subseqüente desempenho de força. Rev Bras Med Esporte – Vol 11, Nº 2 – Mar/Abr, 2005.

  12. DOCHERTY, D. SPORER B. A proposed model for examining the interference phenomenon between concurrent aerobic and strength training. Sports Medicine- 2000 Dec; 30 (6): 385- 394.

  13. MILLET, G.P. JAQUEN, F. BORRANI and CANDAU, R. Effects of concurrent endurance and strenght training on running economy and VO2 Kinetics. Medicine e Science In Sports e Exercise, num 34, vol 8, pp, 1351-1359, 2002.

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