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Experiência e prática docente: diálogos pertinentes

Experiencia y práctica docente: diálogos pertinentes

 

Especialista em Educação Física Escolar

Professor da Rede Municipal de Ensino em Goiânia

(Brasil)

Guenther Carlos Feitos de Almeida

guenther.carlos@gmail.com

 

 

 

 

Resumo

          A vida docente e a produção de seus saberes são um importante tema para compreendermos sua prática pedagógica, tão atacada e responsabilizada pela qualidade do ensino. Os saberes docentes em especial os da experiência tem se mostrado um dos focos da discussão sobre a formação de professores, muitas vezes limitadores, mas outras vezes entendidos como necessidade para a autoria docente. Quais seriam então os componentes dos saberes da experiência e qual seriam suas relações com o dia-a-dia do professor? Qual o lugar destes saberes na formação de uma nova prática docente? Buscamos nos principais literaturas as origens dos saberes da experiência, a possível forma como eles são construídos, visando a possível relação destes com a autoria docente. Após isto discutimos qual o papel dos saberes da experiência na contribuição para a superação da dicotomia teoria e prática e como ele pode ser o motor para a propulsão do professor reflexivo autor da sua prática docente.

          Unitermos: Saberes da experiência. Trabalho docente. Prática pedagógica.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 15, Nº 150, Noviembre de 2010. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    A qualidade do ensino está em constante questionamento, principalmente na escola pública brasileira, veículos midiáticos anunciam a falência da escola, da docência, do ensino, ao mesmo tempo em que raramente assistimos a valorização dos exemplos que funcionam.

    A relação problemática entre políticas públicas de financiamento do ensino e qualificação dos professores, o dia-a-dia de tempo apertado para os docentes, a possível distância entre os diversos saberes docentes e a ação de ressignificação que os professores fazem (ou deveriam fazer), a forma com que as universidades e as pesquisas analisam o professor e seus saberes, e a forma como eles se produzem e são, todas estas questões dão base para a discussão da autoria docente tendo como princípio os saberes da experiência.

    Os saberes da experiência são aqueles provenientes da história de vida pessoal de cada professor e também são saberes produzidos pelos professores no cotidiano de sua prática (TARDIF 2007, PIMENTA 1999, BORGES 2004).

    A partir desta problemática buscamos as possíveis origens dos saberes da experiência, e suas possíveis relações com a formação docente, a prática pedagógica dos professores e sua atuação na escola, tentando buscar formas de qualificar a prática docente.

    O nosso estudo foi baseado em referências bibliográficas que trouxeram suas contribuições para o tema, e a partir de Tardif (2007), Pimenta (1999), Borges (1998 e 2004), elegemos as categorias de análise que se materializaram como os tópicos do presente artigo: Os saberes da experiência em relação, os saberes provenientes do período anterior à docência, os saberes produzidos durante a atividade docente, os saberes provenientes da experiência e produção coletiva, as possibilidades de superação da dicotomia teoria e prática por meio dos saberes da experiência.

    Sabendo que este pode ser um estudo que não consiga esgotar todos estes problemas bem como, as possíveis soluções devido ao limite de um artigo, encaminharemos discussões e pontos que nos ajudaram a buscar respostas.

Os saberes da experiência

    A prática pedagógica cotidiana do professor exige algumas ações que muitas vezes não são aprendidas pelos professores na sua formação, seja ela inicial ou continuada e nem nos currículos impostos pela instituição escolar.

    A estes saberes que são produzidos e apropriados ao longo de sua história de vida, no “chão” da escola, em sua prática pedagógica diária, nas relações entre professores, entre estes e os alunos, entre os docentes, a escola e sua organização e entre os professores e os seus próprios saberes, são classificados por diversos autores (BORGES, 1998; TARDIF, 2007; PIMENTA, 2002) como os saberes da experiência, ou seja, aqueles saberes que são advindos da intervenção pedagógica do professor na escola, em suas turmas, na organização do trabalho pedagógico, em sua própria história ao longo de sua vida. É o que explica Tardif estes saberes “[...] não provém das instituições de formação nem dos currículos. [...] não se encontram sistematizados em doutrinas ou teorias” (2002, p. 48,49). O professor diante deste saber é ao mesmo tempo produtor e sujeito.

    Apesar de ser consenso, que estes saberes são legitimamente produção dos professores, alguns autores se dividem quanto a natureza dos mesmos.

    Para Pimenta (2002, p.20) os saberes da experiência são aqueles advindos da história de vida, das relações que os docentes, ou estão em formação para exercer este ofício, obtiveram ao longo de suas vidas no contato com a escola. Para esta autora noções de como ser docente, o que é ser um bom ou um mau professor, a desvalorização social dos professores, os bons conteúdos, as boas turmas, as mudanças que ocorreram ao longo da história a respeito do professor e seus saberes, vem desta experiência com a discência.

    Então, esta gama de noções já forma um prévio entendimento do que pode vir a ser a ação docente, o ser professor. Pimenta (2002) diz que seus alunos de didática na graduação já possuem estas noções do ser professor, principalmente por estas noções prévias das experiências como alunos.

    Os saberes da experiência não se resumem somente às experiências prévias dos professores como alunos. Estes são classificados por Borges (1998, p.54) não só por estas experiências, mas, também nas experiências do fazer cotidiano do professor, os saberes imediatos relacionados ao campo profissional, nas relações que o professor estabelece com realidade objetiva.

    Estes adquirem validade e objetividade, pois são relacionados com a prática cotidiana do professor, com os saberes de seus pares, e principalmente, pois estão em contato com a realidade escolar.

    Estes saberes são produzidos na prática pedagógica cotidiana, como cita Therrien (apud BORGES, 1998, p.51) que “em função de um contato muito elementar com os saberes da formação profissional, tais professoras buscavam na prática outras fontes de referência para a sua ação docente”. Borges (1998, p.51) chama este saber de “um saber social que informa a prática”, sendo a ressignificação, a partir da prática, dos saberes da formação.

    Esta ação de intervenção em seus saberes que o professor exerce, tem como referência de validação, a análise da sua prática pedagógica e o desenvolvimento de habilidades para a intervenção de pesquisa sobre a mesma.

    Os saberes da experiência quando colocados em diálogo com outros professores a respeito dos problemas, da prática pedagógica e da ação docente, amplia a discussão desta categoria de saber docente, conferindo a estes uma objetivação parcial, através de sua relação crítica com os outros saberes (curriculares, disciplinares, e da formação), pois a prática cotidiana permite uma outra leitura, uma retradução dos saberes em função das condições de sua prática docente.

    Os saberes da experiência como diz Tardif (2002, p.50) “[...] fornecem aos professores certezas relativas a seu contexto de trabalho na escola de modo a facilitar sua integração”.

    A divulgação e a troca de experiência faz com que os professores acumulem um grande número de saberes, que poderão formar uma nova intervenção profissional, esta tendo principalmente, os professores como sujeitos ativos no processo de construção dos saberes.

A experiência na pré-docência

    A experiência docente não pode ser limitada ao momento em que o futuro professor inicia um curso de formação inicial, como afima Tardif (2007, p.71) “A socialização é um processo de formação do indivíduo que se estende por toda a história de vida e comporta rupturas e continuidades.” Borges (2004), Pimenta (1999) e Tardif (2007) identificam uma quantidade de saberes que influenciam a prática docente, e que são anteriores a esta, saberes provenientes da suas histórias de vida, da cultura familiar, saberes provenientes de outros tipos de Educação, saberes provenientes da observação dos professores com os quais manteve contato durante toda sua vida escolar, e saberes da experiência socialmente construída.

    Valores, conceitos e pré-conceitos formados durante as vivências com a família, constituem no professor importante arcabouço de métodos, formas de se relacionar com os alunos, as formas de tratamento, as expressões respeitosas ou desrespeitosas, as formas de coerção e punição utilizadas em sala de aula, são provavelmente em grande parte formados antes das experiências na universidade.

    A família, a organização e crença religiosa, a classe social de origem, influenciam tanto no motivo de escolha da docência, como referência de princípios no trabalho docente. Assim como Borges em estudo com professores de diversas disciplinas afirma que:

    Outros professores também relataram experiências familiares importantes que tiveram uma influência na escolha profissional e que, também, serviram de referência em termos de valores e princípios de trabalho, que regem suas relações com os alunos e com seus pares. (2004, p.200)

    Juntamente com os saberes acima citados, encontramos também os saberes provenientes da experiência como discentes, apreendidos através da observação dos seus antigos professores e da vivência que os atuais professores obtiveram em seu passado enquanto aluno. Nóvoa (apud Borges 2004, p. 202) diz que estas experiências prévias são indicadores da importante influência que este tipo de saberes, têm no desenvolvimento profissional.

    Almeida (2007, p.42) em pesquisa com professores de Educação Física constatou que, estes levam para sua prática pedagógica vários traços de sua experiência como alunos, como, opção por uma determinada metodologia de aula, preferência por um determinado conteúdo, formas de tratamento e relacionamento com os alunos, e por essa vivência justificam suas práticas atuais. Pimenta (1999, p. 20) diz ainda que os alunos que iniciam um curso de formação inicial têm clareza de quais professores ao longo de sua vida escolar eram bons em didática e os que não eram tão bons. Borges (2004, p. 200) diz que os professores tomam estes exemplos com a finalidade de reforçá-los ou os terem como exemplo a não ser seguido.

    Ainda mais, os professores formulam saberes antes de se tornarem docentes através das experiências socialmente construídas sobre o ser professor:

    Também sabem sobre o ser professor por meio da experiência socialmente acumulada,as mudanças históricas da profissão, o exercício profissional em diferentes escolas, a não valorização social e financeira dos professores as dificuldades de estar diante de turmas de crianças e jovens turbulentos,em escolas precárias; sabem um pouco sobre as representações e estereótipos que a sociedade tem dos professores, através dos meios de comunicação. (PIMENTA 1999, p. 20)

    Os conceitos historicamente construídos sobre a docência, o que as mídias dizem das escolas e dos professores, a crise na autoridade e autonomia docente, as notícias sobre a violência na sala de aula contra os professores, também são fontes que contribuem para a construção de saberes aos professores.

A experiência na docência

    A atuação profissional constitui, talvez, a mais importante fonte de aquisição de saberes. São nos diversos momentos na escola nas mais diversas situações que os professores constroem seus saberes. Borges afirma que:

    O contato com alunos, professores, com os demais agente escolares, enfim a vida profissional, propriamente dita, proporciona muitas aprendizagens, entre elas a aquisição de saberes sobre como agir em diversas situações, trabalhar determinados conteúdos, explorar o livro didático, abordar um conteúdo, extrair do programa os conteúdos relativos à aprendizagem dos alunos, etc. (2004, p. 203)

    Almeida (2007), Borges (2004) e Tardif (2007), concordam quando afirmam que os saberes da experiência na docência são colocados pelos professores em uma hierarquia relativa de maior estima, de acordo com sua utilização no trabalho.

    Quanto menos utilizável no trabalho é um saber, menos valor profissional parece ter. Nessa ótica os saberes oriundos da experiência de trabalho cotidiana parecem constituir o alicerce da prática e da competência profissionais (...) (TARDIF, 2007, p. 21)

    Na docência o professor tem a oportunidade de ressignificar todos os outros saberes, não só os da experiência, mas também os saberes da formação inicial e continuada, os saberes curriculares e os saberes disciplinares, conferindo-lhes aplicação, legitimidade, sua identidade, ou ainda refutando, marginalizando-os na tentativa de construir sua própria prática pedagógica.

    A valorização exacerbada da experiência por parte dos docentes pode causar uma marginalização de outros saberes. Na tentativa de ressignificar os saberes oriundos de outras fontes, alguns professores, por acharem que não são necessários a sua prática pedagógica, discriminam e desvalorizam os saberes da formação ou dos currículos e disciplinas, supervalorizando suas próprias experiências. São nos momentos de aula, na necessidade da sala de aula que os professores hierarquizam seus saberes.

    É em meio a esta contradição de valorização e desvalorização que os saberes da experiência na docência se justificam como importantes. As situações cotidianas, no exercício da função, nas situações concretas, segundo Tardif (2007,p. 53) o lidar com as situações cotidianas é uma atitude que forma o manejo com situações da prática real, é a partir daí que os professores formam sua personalidade e seu saber-ser e saber-fazer pessoais e profissionais.

    O processo de produção dos saberes da experiência na docência através desta ressignificação, anteriormente dita, acaba por incorporar às praticas cotidianas e ao discurso dos docentes os demais saberes, através de uma análise de forma crítica, julgando e avaliando os demais saberes, produzindo “[...] saberes retraduzidos e submetidos ao processo de validação construído pela prática cotidiana.” (Tardif, 2007, p.53).

A experiência coletiva

    Podemos dizer que poucas são as situações em que o docente atua sozinho, esta situação faz com que os professores estabeleçam relações de diálogo e interação com seus pares.

    As experiências coletivas também são fontes de construção de saberes. As relações que os professores estabelecem cotidianamente com outros professores, as trocas de experiências, não só na própria escola como também em cursos, palestras, congressos, a interação entre professores mais experientes e professores mais jovens, são alguns exemplos de situações que podem resultar nesta produção coletiva de saberes.

    Tardif (2007, p.52) afirma que é dessa forma, a partir destas relações com os seus pares, com o coletivo, por meio “do confronto entre os saberes produzidos pela experiência coletiva dos professores, que os saberes experienciais adquirem certa objetividade [...]”. Dessa forma as certezas que são produzidas no dia-a-dia, subjetivamente, devem ser objetivadas sistematizadas, organizadas, para como diz este autor “[...] se transformarem em um discurso da experiência capaz de informar ou formar outros docentes e fornecer uma resposta aos seus problemas [...]” (p.52).

    O saber da experiência na docência mostra-se também um saber coletivo dos professores e para os mesmos em sua atividade docente, os professores assumem um papel de auto-formação, a medida que estes entendem-se como sujeitos reflexivos de sua própria prática pedagógica .

    Esta compreensão leva-nos a perceber que os professores, podem estar além da visão de executores de programas e currículos, ou simplesmente de fornecedores de problemas de pesquisa aos intelectuais pesquisadores, ou seja simples objetos de pesquisa para outros. Podem também ser produtor de conhecimento, e saberes válidos e coerentes com a realidade educativa.

A superação da dicotomia teoria-prática, rumo à práxis pedagógica

    A discussão sobre teoria e prática e seus pontos de vista, talvez tenha se tornado “clássica” e de senso comum. Constantemente ouvimos nas escolas, nos bancos da universidade, e em muitos outros lugares, as célebres frases, “[...] na prática é outra coisa [...]”, ou ainda, "[...] A teoria é muito boa, mas na prática a teoria é outra [...]”.

    A busca pela compreensão destas expressões e muitas vezes do preconceito de alguns docentes em relação os saberes ditos teóricos, passa pelo entendimento de como a teoria, muitas vezes personificada pela universidade, pode ter sido feito um objeto de poder. Não é nossa intenção esgotar esta relação de poder existente nesta dicotomia teoria-prática, porém algumas considerações fazem-se necessárias.

    A sociedade a qual estamos inseridos, e na qual a escola, a universidade, o saber, também estão, dita capitalista é responsável e tem como um de seus princípios a divisão, seja do trabalho, seja da economia, ou também de outros setores. Gadotti (1989, p.118) nos alerta à esta percepção:”[...] é o sistema capitalista1, que gera a injustiça e a divisão da sociedade entre aqueles que acumulam as riquezas e aqueles que as constroem.”

    Portanto, uma divisão intelectual do conhecimento, os que produzem o conhecimento e os que aplicam este conhecimento, mostra-se como palco para a divisão dos que possuem o saber, e por isso, estão na posição de poder de produzi-los e aos outros lhes resta a aplicação destes saberes.

    A manutenção desta relação dividida e discriminatória, interessa aos detentores do poder pelos motivos de manutenção desta ordem, deste sistema e conseqüentemente contribui para a continuidade deste modelo de sociedade. É na divisão do trabalho e no princípio da racionalidade técnica que reside a origem desta diferenciação, desta dicotomia.

    Esta separação se manifesta muitas vezes pelos currículos ensinados nas universidades, disciplinas que são apresentadas e não estabelecem um diálogo próximo da realidade pedagógica, ou então nas pesquisas e estudos realizados por pesquisadores, que normalmente tomam o professor e sua prática pedagógica como somente objetos de estudo sem considerar que os professores são sujeitos históricos, produtores de saberes.

    Dessa maneira, o fato do trabalho docente estar permeado de saberes, saberes dos currículos, saberes teóricos formulados na universidade, entre outros, e o professor estar alheio ao processo de produção, mostra-se claramente esta face divisória da sociedade na qual vivemos, como nos diz Tardif (2007, p.236) “Compreender por que isso acontece é uma questão de poder e não de saber, [...]”. É na busca por essa democratização do poder, algo ainda a se buscar, que se baseia a discussão desta dicotomia, é na possibilidade dos professores serem produtores de seus próprios saberes que reside a possibilidade de mudança.

    A possível superação de parte destes problemas poderia estar centrada na reorganização curricular das licenciaturas, aproximando as disciplinas da prática pedagógica cotidiana, e considerando o professor como sujeito do processo também, como sujeito que produz saber e não só aplica os que lhe ensinaram. A realização de pesquisas com os professores, também precisa mudar seus paradigmas, faz-se necessário realizar pesquisas com os professores e não somente sobre os professores, ou suas práticas.

    Aos professores cabe assumir o controle da sua prática pedagógica, da construção de sua identidade e sua formação como docente. Assumir seu papel de ser pensante que não discrimine os demais saberes, mas que seja capaz de reconstruir seus saberes de acordo com sua prática pedagógica, refletir e analisar criticamente seu saberes, compreender que a luta pela valorização dos saberes docentes, principalmente, os da experiência é uma luta política como diz Tardif (2000 apud CAPARROZ, 2007, p. 27) “[...] a desvalorização dos professores pelas autoridades educacionais, escolares e universitárias não é um problema epistemológico ou cognitivo, mas político.”

    A teoria na prática tem que ser diferente, a teoria na prática tem que ser repensada, analisada e reorganizada, dessa forma ela tem a possibilidade de assumir sua relevância no processo pedagógico. “Ainda bem que a teoria na prática é outra, pois permite que o “prático” seja autor de sua prática e não mero reprodutor do que foi pensado por outros. A prática precisa ser pensante (ou reflexiva)!” (CAPARROZ, 2007, p. 27)

Considerações provisórias

    A busca pela valorização docente e de seus saberes, tem sido um alvo bastante procurado no contexto atual de sucateamento, tanto da escola quanto da formação docente. Fortalecer e qualificar a educação e os educadores nos parece ser um dos motores que poderão impulsionar uma mudança nesta sociedade.

    Portanto, buscamos através deste estudo elucidar e analisar um dos aspectos dos saberes docentes, os saberes da experiência, entendendo que este é um possível caminho para o alcance da autoria da sua prática pedagógica, autônoma, crítica e consciente.

    Para que os professores possam alcançar a condição de autores da sua prática pedagógica, alguns elementos que nos foram mostrados se tornam importantes.

    Ensinar com autoria exige respeito aos saberes da experiência, pois é na experiência que acontece ressignificação e a reorganização dos saberes. Respeito por parte das instituições de pesquisa, pela universidade e pelas autoridades educacionais, aos saberes produzidos pelos docentes, porque são eles que estão “com a mão na massa”, no chão da escola, no cotidiano escolar e através desta ação também produzem saberes, mesmo sendo estes desvalorizados.

    Ensinar com autoria exige respeito por parte dos professores aos demais saberes que são produzidos nos currículos e nas instituições de formação de professores, pois é através da análise crítica, consciente e comprometida com o processo de ensino e aprendizagem que se constrói a autoria, como já dissemos, é pela ressignificação que este processo acontece, e não pela discriminação ou desprezo dos demais saberes. A unidade docente deve acontecer do professor da educação infantil até os docentes das universidades (TARDIF 2007, p. 244).

    Ensinar com autoria exige tempo, o professor necessita tempo para organização e produção coletiva, necessita tempo para sistematização de seus saberes, necessita tempo para reflexão na ação, sobre a ação e reflexão sobre a reflexão na ação, (PIMENTA, 1999, p. 28). Tempo que extrapole o tempo de atuação em sala de aula, que extrapole os momentos individuais de organização do trabalho pedagógico, tempo regulamentado e garantido para a reflexão coletiva, para o estudo coletivo.

    Ensinar com autoria exige espaço, os professores precisam de espaços para a troca de experiências, o diálogo e a interação entre os professores mais jovens e os mais experientes, grupos de trabalho para discussão e compartilhar experiência, revistas para divulgação publicação de suas produções, congressos onde os professores também sejam os palestrantes, e que não só sejam espectadores da sua vida profissional.

    Ensinar com autoria exige compromisso com seu aprimoramento técnico e com sua posição política. O professor deve ser “amigo” do conhecimento e do estudo e não só um “colega” distante que o visita esporadicamente, é através do domínio dos saberes para a prática pedagógica que se justifica a atividade docente. A prática docente também deve ser sempre ligada ao compromisso político, a atividade docente deve sempre apontar para o projeto de homem, mundo e sociedade defendido pelo professor, uma ação adequada a estas finalidades.

    Dessa forma, podemos ter uma pequena amostra de como a atividade docente é complexa e dinâmica, e exige bastante estudo, sucessivas aproximações, e em estudos mais profundos.

    A busca pela modificação da realidade objetiva, da legislação, dos conceitos e pré-conceitos, da relação do professor com seus pares e com os saberes, é o nosso anelo e nosso compromisso político.

    O aprofundamento nas questões organizacionais da escola e da organização do trabalho pedagógico, para um novo olhar para os saberes docentes, torna-se talvez um interessante ponto de futuros estudos, e uma bandeira na luta pela valorização e qualificação docente.

Nota

  1. 1. O termo aqui usado pelo autor “sistema capitalista”, é diferente do utilizado em nosso texto, porém exprime a idéia de métodos, normas e regras que regem a sociedade capitalista, portanto esta sociedade demonstra conceitos e a estrutura deste sistema.

Referências bibliográficas

  • ALMEIDA, Guenther Carlos Feitosa de. Escola e Saberes Docentes: apontamentos sobre a prática pedagógica em Educação Física. 2007, Monografia (Licenciatura em Educação Física) - Universidade Federal de Goiás, Goiás, 2007.

  • BORGES, Cecília Maria Ferreira. O Professor de Educação física e a Construção do Saber. Campinas, SP: Papirus, 1998.

  • ______. O professor da Educação Básica e seus saberes profissionais. 1ª edição, Araraquara-SP, JM Editora, 2004, PP. 161-217.

  • BRACHT, Valter e CAPARROZ, Francisco Eduardo. O tempo e o lugar de uma didática da educação física. In: Revista de Ciências do Esporte. Campinas, v.28, n. 2, Janeiro, 2007, p. 21-37.

  • CHAGAS, Regiane de Ávila. A Educação Física na Universidade Federal de Goiás: a relação entre os saberes cotidianos e os saberes curriculares no processo de formação inicial. 2005. pp. 67. Monografia (Licenciatura em Educação Física) - Universidade Federal de Goiás, Goiás, 2005.

  • PIMENTA, Selma Garrido, (org.). Formação de Professores: identidade e saberes da docência. In. Saberes Pedagógicos e Atividade Docente. São Paulo: Cortez, 2002, pp. 15-34.

  • TARDIF, Maurice. Saberes Docentes e Formação Profissional. 8a edição Petrópolis, RJ: Vozes, 2007.

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