Diálogos com a ginástica Diálogos con la gimnasia |
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(Brasil) |
Ms. Priscila Gonçalves Soares |
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Resumo O presente trabalho foi desenvolvido após estudo realizados na área da Ginástica para Todos na perspectiva de melhor compreender esta prática e suas possibilidades. desta forma, pretendo refletir sobre a ginástica e suas significações lúdicas, esportivizada, performática, competitiva, formativa e espetacular; apontando a Ginástica para todos como alternativa para o lazer e diversão bem como oportunidade de se repensar o homem como ser histórico, social e cultural. Unitermos: Ginástica. Educação Física. Ginástica para Todos.
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 15, Nº 150, Noviembre de 2010. http://www.efdeportes.com/ |
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Introdução
Pensar a prática da ginástica no dias de hoje nos remete à práticas competitivas e excludentes, práticas com fins estéticos, na busca pela saúde e qualidade de vida. Por isso, precisamos ampliar nosso olhar para esta prática corporal na perspectiva de conhecermos outras atividades que possam proporcionar o lazer e o divertimento em uma perspectiva lúdica, inclusiva e alegre.
Antes de sua sistematização no século XIX, a ginástica, englobava práticas como: jogos populares e da nobreza, acrobacias, saltos, corridas, exercícios militares de preparação para a guerra, esgrima, equitação, danças e canto. A ginástica como “arte de exercitar o corpo nú”; nú na possibilidade de ser livre, lúdico, prazeroso e despido de práticas direcionadas. (Soares, 1998)
Em prol de finalidades como desenvolver a saúde, regenerar a raça, força para a guerra e para a indústria, moralizar, civilizar e padronizar. A ginástica foi sendo sistematizada em um movimento denominado de Movimento Ginástico Europeu, onde a ginástica acabou cedendo o lugar do lúdico para o cientifico “formatado”.
Segundo Soares (1998) a ginástica cientifica inaugura, portanto, o processo de “aprisionamento das formas/linguagens das práticas corporais” pelos círculos científicos europeus.
Esta ginástica cientifica rompe com as formas que antes eram atreladas às atividades circenses e encantavam a população no momento de apresentação dos espetáculos.
Os espetáculos de ilusionistas, acrobatas, contorcionistas, homens de físico hercúleo, anões, domadores, moças lindas e de corpo provocante exposto sob malhas de ginástica tinham como único objetivo divertir e despertar emoções. Não se visava representar nada, nem remeter o espectador a uma verdade mais profunda e oculta sob as aparências. Simplesmente cultuava-se o riso, a surpresa e a ilusão. (DUARTE, 1995, p.167)
É interessante ainda pensar nas relações entre os exercícios corporais realizados nos espetáculos circenses e aqueles mais tarde praticados pela população nas sessões de ginástica.
As artes circenses e a ginástica foram concebidas no século XIX como práticas corporais distintas, apesar de sua semelhança técnica. Soares (1998) nos mostra que a ginástica teve como fontes inspiradoras os movimentos de acrobatas e funâmbulos. Todavia, a partir da influência do discurso científico sobre o corpo e o exercício, tais movimentos passaram a ser criticados como nocivos à saúde e à moral.
A ginástica, então, passa a ser apresentada como produto acabado e comprovadamente científico. Radicaliza, no universo das práticas corporais existentes, a visão de ciência como atividade humana capaz de controlar, experimentar, comparar e generalizar as ações de indivíduos, grupos e classes. [...] A ginástica cientifica se apresenta como contraponto aos usos do corpo como entretenimento, como simples espetáculo, pois, trazia como princípio a utilidade de gestos e a economia de energia. (SOARES, 1998, p. 23)
Em minha dissertação de mestrado identifiquei, na cidade de Juiz de Fora que as companhias circenses que passaram pela cidade tinham em seus espetáculos números com trapezistas e ginastas. Eles eram elogiados por sua coragem e habilidade em realizar exercícios de difícil execução e de perigo. Os exercícios corporais chegaram primeiro aos olhos dos juizforanos. Mais tarde, remodelados pela ciência, tiveram lugar em suas práticas corporais.
A ginástica também aparece na cidade atrelada aos anúncios dos circos que comumente se apresentavam como companhias eqüestres, ginásticas e acrobáticas. Trata-se aqui dos exercícios ginásticos apresentados pelos artistas com fins de espetáculo e exibição. (SOARES, 2010)
Objetivo
Diante do exposto pretendo refletir sobre refletir sobre a ginástica e suas significações lúdicas, esportivizada, performática, competitiva, formativa e espetacular; apontando a Ginástica para todos como alternativa para o lazer e diversão bem como oportunidade de se repensar o homem como ser histórico, social e cultural.
Desenvolvimento
A defesa em favor da prática dos exercícios ginásticos exercida a partir dos argumentos médicos, especialmente as representações atreladas aos discursos da Higiene, também aparecem na cidade. De acordo com Carmen Lúcia Soares (2001, p.52), a ginástica nesta perspectiva era defendida a partir das finalidades de “regenerar a raça promover a saúde, desenvolver a vontade, a coragem, a força, a energia de viver e, finalmente, desenvolver a moral”.
Infelizmente essa imagem da ginástica cientifica ainda permea nossa sociedade, a ginástica ainda aparece vinculada a conquista da saúde, focando o homem como um ser meramente biológico, sem história e sem cultura.
Desta forma, sem se preocupar com o ser histórico, social e produtor e reprodutor de cultura, ginástica tem se focado em reforçar estereótipos de corpos belos, másculos.
Penso que a relação entre indivíduos e a ginástica a não deve ser apenas esta focada no ser biológico, precisamos estar atentos à participar e socialização de crianças, jovens, adultos e idosos (seres sócio, históricos e culturais) na perspectiva do lazer, do entretenimento, da diversão, da educação, entendendo o homem dentro de suas múltiplas capacidades.
Infelizmente em relação à ginástica, o que se apresenta em nossa sociedade são as ginásticas competitivas, esportivizadas e veiculadas pela mídia; principalmente a ginástica rítmica, ginástica artística, ginástica aeróbica, ginástica de trampolim, entre outras.
Dentro desta perspectiva precisamos pensar a Ginástica para Todos como uma possibilidade de orientação para o rompimento desta hegemonia competitiva, e respeitando o espaço da cultura corporal em uma prática corporal que é marcada pela união de todas as ginásticas, ginástica em suas bases, ginástica simples que permite a participação de todos sem limites de idade e principalmente, respeita as vivências e experiências de seus participantes atrelado ao respeitando da cultura, do ser histórico e social, estimulando o prazer e a diversão.
A Ginástica para Todos pode ser realizada utilizando ou não materiais (oficiais ou improvisados), devendo ser orientada para o lazer e não para a competição, podendo ser elaborada para uma apresentação/demonstração onde o foco principal não é o produto final e sim o processo de transformação pelo qual os participantes vivenciaram até a conclusão do trabalho/ apresentação.
Os objetivos desta ginástica devem ser orientados para além de favorecer a saúde, a socialização e estimular a prática de atividade física, deve contribuir para incitar a criatividade, a desconstrução e resignificação de gestos motores padronizados, contribuindo para o bem estar físico, psicológico de seus praticantes.
Esta prática gímnica faz parte da FIG (Federação Internacional de Ginástica), e nesta instituição é caracterizada como uma atividade orientada para o lazer, trabalhando no campo da ginástica com e sem aparelhos, que envolve danças, jogos, conforme as preferências nacionais e culturais.
A Ginástica para Todos por ser orientada para a não competição, se situa em um lugar diferente daqueles ocupado pelas ginásticas competitivas, esta propicia o autoconhecimento e a reflexão sobre o corpo.
Esta forma de ginástica abre um novo horizonte nas possibilidades de práticas corporais por ser inclusiva permitindo um grande número de participantes independente de idade, gênero, raça, cor, credo, aptidão física, técnica, material e vestuário.
Por dialogar com outras praticas corporais a Ginástica para Todos não deve perder o seu foco que são as manifestações gímnicas: exercícios acrobáticos, elementos corporais, exercícios naturais e construídos, praticados sem ou com ou/e em aparelhos. (Ayoub, 2004)
A idéia de construção de um espetáculo também esta inserida no contexto da Ginástica para Todos assim, as apresentações/demonstrações nos festivais, encontros, fóruns, comemorações e festas devem refletir a proposta de trabalho que é realizada dentro do grupo de Ginástica para Todos.
É pensando no espetáculo e nesta possibilidade de ludicidade que a Ginástica para Todos nos permite trabalhar na perspectiva do lazer que possui um duplo aspecto educativo, ou seja, é veiculo privilegiado de educação, e que para as práticas de lazer faz-se necessário o aprendizado, o estimulo e a iniciação aos conteúdos culturais, que possibilitam a passagem de níveis menos elaborados, para mais elaborados, procurando superar o conformismo pela criticidade e criatividade. (MARCELINO, 2000)
Assim, a Ginástica para Todos atende não só as perspectivas educacionais voltadas para o lazer, divertimento e ludicidade, como estimula a criatividade e a criticidade de um ser humano que é biológico, social, cultural e histórico.
A Ginástica pata Todos também pode ser inserida no ambiente escolar como parte integrante dos conteúdos da cultura corporal atrelada à disciplina de Educação Física.
Por cultura corporal entendo a educação física em um aspecto mais amplo onde o indivíduo não é apenas biológico, ele é um ser histórico, sócio e cultural. Produtor e reprodutor de cultura, significados e significações que se imbricam de forma dialética.
Assim a disciplina de Educação Física na escola deve ser entendida como:
“(...) matéria escolar que trata, pedagógicamente, temas da cultura corporal, ou seja, os jogos, a ginástica, as lutas, as acrobacias, a mímica, o esporte e outros” (Coletivo de Autores, 1992, p.18). A expressão corporal é tomada como linguagem, conhecimento universal, um patrimônio cultural humano que deve ser transmitido aos alunos e por eles assimilados a fim de que possam compreender a realidade dentro de uma visão de totalidade, como algo dinâmico e carente de transformações (Daólio, 2007, p. 29)
Atualmente, a ginástica como conteúdo das aulas de Educação Física Escolar é pouco disseminada, e nas poucas vezes em que ocorrem aulas de ginástica são na perspectivada competitiva, performática e esportivizada como a ginástica artística e a ginástica rítmica.
A meu ver, essa perspectiva excludente e competitiva destas modalidades gímnicas não devem ser as únicas vertentes da ginástica no interior da escola. É preciso repensar a ginástica escolar levando os alunos à reflexão, possibilitando a criação e estimulando a criatividade para que eles possam atribuir sentido à esta prática; acredito que a Ginástica para Todos pode ser reconhecida como mais apropriado para reinserirmos a ginástica na escola.
Vivenciar a Ginástica para Todos na escola significa estudar, vivenciar, conhecer e reconhecer, perceber e confrontar, interpretar e problematizar, compartilhar e apreender as inúmeras interpretações da ginástica instigando a buscar novos significados e possibilidades de expressão gímnica, de forma lúdica, criativa e participativa.
Para os professores que ainda se sentem inseguros no trabalho com a Ginástica para Todos Ayoub (2004) e Nista Piccolo (1995) corroboram ao apresentar a Ginástica para todos como forma de estimular os alunos onde estes tomam contato com o tema que será desenvolvido na aula, explorando, criando e realizando diferentes possibilidades de ação; o professor apenas estimula e observa os alunos.
As mesmas autoras reforçam a importância do professor neste processo oferecendo propostas que podem acontecer por meio de pistas no intuito de que os alunos solucionem os problemas apresentados e criem alternativas individuais e/ou em grupo, sempre na perspectiva lúdica. È importante que o professor sempre incentive e valorize a experiência e os interesses pessoais, colocando – os a serviço do grupo.
Para o trabalho com o conteúdo de Ginástica para Todos o incentivo á criatividade deve ser constante, uma alternativa é a utilização diversificada de materiais e aparelhos, tradicionais, esportivos, não tradicionais, além de estimular a descoberta de novas possibilidades de ação.
Ayoub (2004) diz que ao se aprofundar a compreensão dos princípios que orientam essas propostas, identificou que as mesmas se aproximam da concepção de “aulas abertas à experiencia” no ensino da Educação Física desenvolvida por Hildebrant e Langing (1986) na qual a experiência é tratada como uma categoria pedagógica do processo educativo.
Considero importante ressaltar que as aulas “abertas à experiência” precisam ser sim, pensadas e repensadas, planejadas, organizadas e referenciadas. É importante que o professor valorize as experiências e interesses de seus alunos, e proporcione situações para o desenvolvimento de sua capacidade de decisão e co – responsabilidade dos processos educativos.
Ao considerarmos possibilidade de demonstração da Ginástica para Todos, devemos estar atentos pois ela se vincula a um processo de produção e não apenas um “produto”.
No processo de produção devem ser privilegiadas as experiências e interesses dos alunos, o trabalho coletivo, cooperativo e solidário, para que possam participar do processo de composição coreográfica e compor em co – autoria com outros sujeitos, buscando novas interpretações, novas leituras, novos significações antes desconhecidas.
Vejo a Ginástica para Todos como uma possibilidade repensarmos a ginástica e a própria disciplina de Educação Física que:
(...) a partir da revisão do conceito de corpo considerando a dimensão cultural simbólica defendida por Gertz, pode ampliar seus horizontes, abandonando a idéia de área que estuda o movimento humano, o corpo físico ou esporte na sua dimensão técnica, para vir a ser uma área que considera a ser humano eminentemente cultural, contínuo construtor de sua cultura relacionada aos aspectos corporais. Assim, a educação física pode, se fato, ser considerada a área que estuda e atua sobre a cultura corporal de movimento. (Daólio, 2007, p.9)
Conclusão
Neste sentido, pensar o corpo como produtor e consumidor de cultura num processo dialético de ser premissa da disciplina de Educação Física no interior da escola, pensando a sociedade, seu corpos, suas formas, produções e reproduções; a Ginástica para Todos vem para nos auxiliar neste processo.
Referências
AYOUB, Eliana. Ginástica Geral e Educação Física Escolar. Campinas: Unicamp, 2004
DAÓLIO, Jocimar. Educação Física e o conceito de cultura. Campinas: Autores Associados, 2007.
DUARTE, Regina Horta. Noites circenses: espetáculos de circo e teatro em Minas Gerais no século XIX. Campinas: Unicamp, 1995
SOARES, Carmen Lúcia. Imagens da educação no corpo: estudo a partir da ginástica francesa no século XIX. Campinas: Autores Associados, 1998.
SOARES, Priscila Gonçalves. Práticas corporais e diversão em Juiz de Fora: o discurso do Jornal o Pharol (1876 – 1915). Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, UFJF, 2010.
MARCELLINO, Nelson C. O lazer na atualidade brasileira: perspectivas na formação/atuação profissional. Licere. Belo Horizonte, v. 3, n. 1, p125-133, 2000.
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