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A Educação Física como componente curricular: 

trajetória histórica e possibilidades atuais no Ensino Médio

La Educación Física como materia curricular: recorrido histórico y posibilidades actuales en la Escuela Media

 

Mestrando em Educação, UFRN

Membro do GEPEC-Grupo de Pesquisa Corpo

e Cultura de Movimento, DEF/UFRN

Moysés de Souza Filho

moyses.filho@ifrn.edu.br

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          Este artigo é fruto dos trabalhos de pesquisa bibliográfica sobre a trajetória da Educação Física como componente curricular no cenário escolar brasileiro. Analisa a inconstância da Educação Física enquanto objeto de ação pedagógica e de ensino aprendizagem, discute o contexto crítico da Educação Física escolar pós movimento teórico revolucionário brasileiro e apresenta as novas perspectivas para o ensino médio com base nas Orientações Curriculares para o Ensino Médio, além de sugerir o desenvolvimento de experiências que possam construir uma identidade pedagógica da Educação Física e registrar a sua organização didático pedagógica para fins científicos. É necessário, pois, contextualizar as práticas corporais com a natureza e a cultura e estar em constante interação com as mudanças sociais e com a evolução da ciência e da tecnologia.

          Unitermos: Educação Física. Componente curricular. Ensino Médio.

 

Resumen

          Este artículo es el resultado del trabajo de investigación bibliográfica sobre la historia de la Educación Física como un materia curricular en la escuela brasileña. Examina la volatilidad de la Educación Física como disciplina pedagógica y de enseñanza y aprendizaje, analiza el contexto crítico de la Educación Física escolar después del movimiento teórico revolucionario brasileño y presenta nuevas perspectivas para la escuela media sobre la base de los Lineamientos Curriculares para la Escuela Media, además de sugerir el desarrollo de experiencias que puedan construir una identidad pedagógica de la Educación Física y registrar su organización didáctico pedagógica con fines científicos. Por lo tanto, es necesario contextualizar las prácticas corporales con la naturaleza y la cultura y estar en constante interacción con los cambios sociales y con la evolución de la ciencia y la tecnología.

          Palabras clave: Educación Física. Componente Curricular. Escuela Media.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 15, Nº 150, Noviembre de 2010. http://www.efdeportes.com/

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1.     Introdução

    A condição da Educação Física como componente curricular na história da educação brasileira, sempre esteve ligada às tentativas históricas de consolidação de um modelo de política educacional ideal para o país. Essas tentativas, sempre encontraram barreiras estruturais e impasses culturais decorrentes da conjuntura política e do momento histórico que atravessava a nação e nesse contexto, a Educação Física recebia no tratamento das diretrizes da legislação as orientações para a sua natureza curricular, sendo esta por sua vez, adequado a ideologia dominante. Souza Júnior, ao discorrer sobre a História da Educação Física escolar no Brasil, nos apresenta um breve histórico da inserção da Educação Física como componente curricular na escola brasileira. De acordo com o autor, “a Educação Física é evidenciada sob a forma de ginástica no ano de 1837 vindo a se tornar obrigatória em 1851 nas escolas primárias do Município da Corte (Rio de Janeiro)” (2009, p.20). Em 1882, sob a orientação de Rui Barbosa nas discussões sobre a reforma do ensino, aparece recomendada pelo parlamentar na condição de matéria de estudo em horas distintas das do recreio e depois das aulas. Em 1928, surge a proposta de aulas diárias em caráter obrigatório para todos os alunos, numa proposta de Fernando de Azevedo. Em 1937, torna-se objeto de lei constitucional como componente curricular. Atrelava o reconhecimento e funcionamento escolar à condição da existência da Educação Física, do ensino cívico e dos trabalhos manuais de caráter obrigatório nas escolas primárias e secundárias como constava no artigo 131 da constituição. Entre as décadas de 1940 e 1960, no período político brasileiro que oscilava entre o nacionalismo e a influencia desenvolvimentista do capital estrangeiro, a Educação Física ficou sujeita, mais uma vez, a obrigatoriedade de acordo com a LDB 4.024 de 20 de dezembro de 1961 nos cursos primários e médios até a idade de 18 anos. Na esteira da história, várias alterações nos textos legais são acrescentadas como na LDB 5.692 que obrigava a inclusão da Educação Física nos currículos plenos das escolas. No período de maior conflito político ideológico vivido pelo país, a Educação Física nas escolas foi objeto de controvérsias quanto ao seu formato de ensino que ora atendia as imposições de ordem militar, ora atendia aos preceitos do desportivismo contribuindo esse contexto, para que a disciplina perdesse a sua identidade, se é que ela ficou clara em alguma época da história da Educação no Brasil, o que provocou com a abertura política dos anos de 1980 e o surgimento de teorias educacionais que apontavam para outros paradigmas educacionais, questionamentos e proposições acerca da função sócio educacional da Educação Física no contexto escolar. A LDB 9.394/96 no artigo 26, § 3º, condiciona a existência da Educação Física como componente curricular obrigatório integrada à proposta pedagógica da escola entre outras providencias entretanto, como Souza Júnior (2009, p.28) ressalta em suas conclusões:

    Os conflitos não se acabaram e não se acabarão. Muitos continuam, alguns com vieses mais recentes, como são os casos da presença, facultatividade ou mesmo ausência da Educação Física e da diversidade e até antagonismos de propostas pedagógicas atuais e outros que acompanham toda a trajetória de luta, de conquista de reconhecimento, perfazendo a historia deste componente curricular.

    Ao longo da história, os registros acerca da Educação Física como componente curricular ficaram evidenciados na forma da legislação, porém a escola, os professores e alunos nunca compreenderam muito bem essa estória da Educação Física como componente curricular. O que isso significa? Educação Física não é só brincadeira, jogo e esporte? Como fazer para integrar a disciplina ao currículo escolar? O currículo é outra questão que nunca foi determinada pela gestão do conhecimento produzido no contexto escolar, ele sempre foi fruto de determinações tecnocráticas das secretárias de governo. Nesse sentido, acreditamos que tanto o currículo escolar quanto a Educação Física precisam se encontrar e construir uma relação didático pedagógica necessária para que o processo de ensino aprendizagem se torne significante para ambos. Essa crença se consolidou durante o tempo em que venho atuando no espaço escolar com os vários níveis de ensino e, principalmente hoje com o ensino médio, tenho percebido e vivido as situações pelas quais a escola, os alunos e os professores se relacionam com a Educação Física. Não se trata apenas de incluir as aulas no horário normal de aula ou de ministrar aula na sala de aula, mas antes, trata-se de construir uma ação pedagógica com os alunos que possa atender as necessidades de suas praticas corporais e dos conhecimentos sobre o corpo e conduzi-los à autonomia para a cultura de movimento no contexto social.

2.     O Contexto crítico da Educação Física escolar

    Ao final da década de 2000, serão completados trinta anos do surgimento do Movimento Crítico Renovador da Educação Física no Brasil. Esse movimento teve como características o questionamento das bases conceituais filosóficas, epistemológicas e pedagógicas que norteavam as ações dos profissionais da área. A produção teórica que ocupou o espaço da discussão dos meios e fins da Educação Física, denunciou que a disciplina se tornara alienada dos seus próprios valores, que estava a serviço do fortalecimento do sistema político dominante e que, portanto, não se contextualizava com as necessidades de formação do homem na perspectiva da totalidade. Nesse sentido, a Educação Física era determinada por um conjunto de influências ideológicas externas advindas de instituições que determinavam a sua estrutura como prática social e/ou enquanto área do conhecimento. Dentre essas instituições, se encontravam a instituição médica, a instituição militar e a instituição esportiva. Caparroz (2007, p.28) considera que:

    Esse movimento acabava por percorrer a história da área, observando sua entrada na escola, mas muito mais para retificá-la, ou seja, reinterpretá-la de forma a confirmar certos pressupostos que tais análises apontavam, ou então para negá-la.

    O autor afirma ainda que, os intelectuais da área enfatizavam que somente as influências externas macroestruturais sociais, políticas e econômicas, influenciaram o perfil da Educação Física no transcorrer de sua história e que, de agora em diante, tudo que tinha sido considerado como cultura da Educação Física na escola deveria ser negada e reconstruída em outras bases culturais e pedagógicas. As questões de ordem interna e os conflitos de ordem estrutural que influenciavam o seu perfil cultural, tais como: a formação profissional, a evolução dos conhecimentos pertinentes à área, o tratamento pedagógico da escola para a Educação Física como componente curricular, a postura crítica dos profissionais da área, a cultura de relacionamento com as práticas corporais, as condições de trabalho, as relações entre professores e alunos, os investimentos públicos entre outros aspectos não foram levados em consideração quando da formulação da crítica à Educação Física, segundo o autor. O problema que se apresentava a partir de então se concentrava na seguinte perspectiva: O que e como fazer para que a Educação Física se contextualizasse com as mudanças sociais e culturais da nova conjuntura democrática da sociedade brasileira decorrente da abertura política? A solução para essa questão, assim como outras, ainda pairam atualmente, no imaginário de muitos profissionais da área. Desse modo, as produções que criticaram a Educação Física, também lançaram algumas proposições para a mudança do perfil da prática pedagógica da Educação Física. Entretanto, a viabilização dos modelos teóricos propostos encontrava algumas dificuldades de concretização no espaço escolar. As proposições de cunho Desenvolvimentista, Sócio construtivista, Humanista, Emancipatória para citar algumas das tendências pedagógicas, enfocavam elementos teóricos da prática pedagógica sem, no entanto, conseguir atingir o âmago da questão pedagógica da Educação Física no ambiente escolar. Quem viveu o período das décadas de 1970 e de 1980 como profissional ou como aluno do ensino básico ou ainda como aluno de um curso superior de Educação Física, pôde constatar que algumas condições materiais objetivas interferiram no processo de transformação da qualidade pedagógica da Educação Física, tanto quanto as condições subjetivas. Entre estas, o processo de formação profissional voltado para a reprodução de conhecimentos da área, o pragmatismo pedagógico, a dominância do esporte como conteúdo das aulas, o atraso pedagógico da Educação Física em relação às teorias educacionais, a falta de estrutura física das escolas e o avanço das academias de ginástica como novo espaço de trabalho entre outras condições sócio econômicas e culturais determinantes. Além do que, se os alunos, os professores, os orientadores educacionais, os supervisores e os diretores tivessem sido ouvidos quando da formulação da crítica sobre o que acontecia na escola e considerando a visão daqueles que nesses contexto estavam, sobre o que poderia ou deveria ser feito para melhorar as condições de desenvolvimento da Educação Física, talvez a elaboração crítica partindo da realidade do chão da escola e fosse sustentada por uma teoria subjacente a essa realidade e não na forma de prescrição teórica, poderia ter encontrado um respaldo positivo no circuito dos profissionais que atuavam nas escolas. A idealização de uma Educação Física na escola por outras vertentes ideológicas provocou uma estagnação no desenvolvimento desta como componente curricular, pois enquanto os discursos se inflamavam, as questões pedagógicas da escola se ressentiam de discussão e de intervenções significativas. Esse quadro contribuiu para que a demanda esportiva ocupasse, de certo modo, o espaço da Educação Física como componente curricular da escola. Segundo Caparroz (2008, p.82):

    Isso parece não ter permitido a apropriação crítica das contribuições/determinações, tanto a nível macro, como micro (da própria escola, dos intelectuais de formação profissional de Educação Física etc), que foram decisivas para a conformação da Educação Física como componente curricular ao longo da história. Logo, a identidade histórica era desfeita, criando cisões e indefinições durante todo o período dos anos de 1980 no Brasil.

    “No ambiente escolar, a Educação Física se integra ao plano curricular a partir do final do século XIX, e desde então se discute sobre a relevância pedagógica da Educação Física” (MENDES, 2010 p.199). Nessa discussão a autora ressalta “a importância da participação dos professores de Educação Física nas tarefas pedagógicas realizadas por todos os professores das escolas” (IDEM, p.200).

3.     Perspectivas atuais

    Compreende-se a importância do professor de Educação Física no processo de organizar didaticamente a sua prática pedagógica assim como os demais professores, como um passo imprescindível para o reconhecimento político pedagógico da Educação Física escolar. Nesse contexto, os professores e professoras precisam compreender com relação à Educação Física que a sua configuração curricular, o seu modelo de prática pedagógica, os seus métodos de ensino, os seus fundamentos e critérios de avaliação que formam a sua estrutura de disciplina escolar, precisam se contextualizar com as demandas sócio educacionais atuais a fim de consolidar-se com um componente curricular que se integra às necessidades de formação cultural dos educandos em todos os níveis de ensino. Desse modo, as possibilidades pedagógicas da Educação Física para consolidar-se como um componente curricular na atual proposta para o Ensino Médio são viáveis, desde que ocorram as transformações nas escolas no que diz respeito a forma de pensar o seu currículo, os seus objetivos educacionais, a sua metodologia de ensino, os seus pressupostos avaliativos, a sua integração cultural com a pesquisa educacional contextualizadas com as concepções, princípios e diretrizes do projeto político pedagógico institucional e com a percepção, vontade e trabalho do professor. De acordo com o documento do Ensino Médio Inovador:

    A identidade do ensino médio se define na superação do dualismo entre propedêutico e profissionalizante. Importa, ainda, que se configure um modelo que ganhe identidade unitária para esta etapa da educação básica e que assuma formas diversas e contextualizadas, tendo em vista a realidade brasileira. Busca-se uma escola que não se limite ao interesse imediato, pragmático e utilitário (BRASIL, 2009 p. 04).

    Nesse particular, a Educação Física precisa se associar às mudanças propostas para o ensino médio de modo que a vertente esportiva dominante seja compreendida como mais uma possibilidade da ação pedagógica e, os conhecimentos sobre o corpo possam ser evidenciados nas práticas corporais.

    Mas, o que pode tornar a Educação Física um componente curricular relevante no ensino médio? Quais as características pedagógicas que tornam a Educação Física um componente curricular?

    Segundo Mattos e Neira (2000, p.25):

    [...] para inserir a Educação Física dentro do currículo escolar e colocá-la no mesmo grau de importância das outras áreas do conhecimento é através da fundamentação teórica, da vinculação das aulas com os objetivos do trabalho, da não improvisação e, principalmente, da elaboração de um plano que atenda às necessidades, interesses e motivação dos alunos.

    A condição de realização dos aspectos acima citados, podem se constituir na base organizacional para as experiências pedagógicas nas escolas que, em sendo realizadas, podem ampliar as concepções do trabalho educacional além de ampliar as discussões em torno da dimensão pedagógica da Educação Física como componente curricular.

    Várias questões estruturais relacionadas às aulas de Educação Física nas escolas precisam ser repensadas a nível da organização curricular para que a Educação Física possa desenvolver suas ações pedagógicas no mesmo tempo e espaço que as outras disciplinas.

    Uma das questões que se apresentam é a sua inclusão no horário normal da escola, pois nada justifica que as aulas de Educação Física sejam realizadas em horário inverso à presença do aluno no ambiente escolar. Outro ponto para que se discuta no aspecto da organização didática, diz respeito ao planejamento das aulas e a metodologia aplicada no desenvolvimento das mesmas.

    É necessário compreender que, como uma disciplina curricular a Educação Física permite uma variedade de abordagens de conteúdos que vão além da repetição exaustiva da prática esportiva, além do que o tratamento pedagógico dado ao esporte está desvinculado de seus valores históricos, sociais, científicos, tecnológicos e culturais construídos ao longo do tempo.

    Portanto, nas escolas de ensino médio, é de fundamental importância a postura dos professores e professoras em assumir a disciplina como um componente curricular que precisa ter os conhecimentos sobre o corpo sistematizados através dos conteúdos tradicionais da Educação Física como o jogo, o esporte, as danças, as lutas e a ginástica e dos conteúdos transversais relacionados ao contexto interdisciplinar e às diversidades culturais e pelo contexto cultural do corpo na sociedade contemporânea.

    De acordo com Barni e Schneider (2004, p.08):

    Podemos observar que novas propostas de prática pedagógica para Educação Física já se fazem presente no cenário nacional, porém de forma ainda restrita. Para que a Educação Física no Ensino Médio se torne reconhecida como um componente curricular relevante à formação integral do aluno, é necessário que o profissional da Educação Física tenha o domínio do conhecimento científico nas suas ações pedagógicas para substanciar junto aos demais saberes escolares o valor da prática da Educação Física para a construção de novos cidadãos.

    Para a condição acima citada vir a se tornar uma realidade pedagógica, é necessário que a Educação Física no ensino médio se contextualize com os conhecimentos científicos e se integre à proposta político pedagógica da instituição escolar a fim de consolidar a sua ação educacional como um componente curricular.

    Desse modo, o desenvolvimento de experiências pedagógicas da Educação Fisica no Ensino Médio é um dos fatores importantes para que a disciplina tenha substancia pedagógica e possa oferecer outras possibilidades além da perspectiva do esporte instrumental na esfera escolar. Segundo Kunz, (2003, p.22):

    Para que as mudanças concepcionais possam realmente começar a se manifestar, são necessárias também, muitas experiências práticas (além do desenvolvimento, ampliação e aprofundamento de pressupostos teóricos) em diferentes contextos de ensino.

    Nesse sentido, é fundamental que o foco do processo pedagógico seja sustentado por pressupostos teóricos que fundamentem a ação do professor.

    De acordo com Reis, (2008, p. 04):

    Verificam-se hoje quatro vertentes principais, as quais utilizam metodologias significativas para o desenvolvimento da Educação Física no ambiente escolar, chamadas de metodologia do ensino, aberta, crítico-superadora, construtivista e críticoemancipadora, as quais juntas proporcionam ferramentas importantes para a prática da Educação Física na escola.

    A questão que se apresenta é como a escola e os professores se sensibilizam com relação a esses pressupostos e como os aplicam em suas práticas pedagógicas, pois sem a concretização da prática pedagógica as teorias perdem sua razão epistemológica.

    No contexto da análise epistemológica da Educação Física, a relação teoria e prática precisa superar os dualismos e avançar para a práxis pedagógica no âmbito escolar em todos os níveis de ensino. Betti (2005, P.183), propôs uma Teoria da Educação Física concebida como um campo dinâmico de pesquisa e reflexão. Nela, o autor confirma os impasses entre a concepção teórica e ação prática e com base nesse estudo o autor afirma que:

    A teoria assim proposta poderia sistematizar e criticar conhecimentos científicos e filosóficos, receber e enviar demandas à prática social, e às Ciências e à Filosofia. A prática passaria a configurar-se como possibilidade de mediação entre a matriz científica e a matriz pedagógica que se apresentam no debate sobre a identidade epistemológica da Educação Física, entre a teoria e a prática, entre o fazer corporal e o saber sobre esse fazer.

    O campo dinâmico de pesquisa e reflexão proposto por Betti, teria como função essencial a crítica e a sistematização acerca dos conhecimentos sobre o corpo e os fundamentos científicos e culturais da Educação Física transformando-a em uma área de conhecimento e conseqüentemente, ultrapassando a concepção de uma disciplina isolada das demandas da prática social, da ciência e da filosofia. Essa condição praxiológica poderia contribuir para a consolidação da Educação Física como componente curricular principalmente no ensino médio, ciclo de aprofundamento do conhecimento em Educação Física.

4.     Considerações finais

    De acordo com as Orientações Curriculares para o Ensino Médio em suas orientações para a Educação Física como componente curricular, é preciso compreender os aspectos históricos que permeiam o imaginário cultural da escola sobre a Educação Física além de compreender que:

    A identidade da Educação Física, assim como a identidade de qualquer disciplina, é construída a partir de processos de negociação e disputa de valores, concepções e perspectivas. Como toda disciplina do currículo, a definição do papel da Educação Física dá-se a partir das negociações e das disputas que ocorrem entre seus profissionais, mas também por aquelas travadas por outros atores da escola (BRASIL, 2006, p.217).

    No contexto do Ensino Médio Inovador, no qual, as tendências pedagógicas convergem para projetos integradores interdisciplinares, abre-se um espaço institucional para que a Educação Física possa sair do isolamento pedagógico histórico e consolidar-se como um componente curricular integrado ao processo de formação cultural dos alunos através de abordagens pedagógicas desenvolvidas na sistematização do conhecimento, na organização curricular integrada e no envolvimento dos professores em assumir o desafio de trabalhar a Educação Física como área de conhecimento.

    Temos consciência que essas ações no contexto da Educação Física no Ensino Médio se constituem em desafios a serem vencidos. A conquista deve ser feita de lutas coletivas nas instituições públicas e privadas do ensino médio. O engajamento dos professores e professoras do Ensino Médio nas proposições acima citadas demanda tempo e depende da organização do projeto político pedagógico institucional e da organização didática da Educação Física da escola.

    Esses desafios se consolidaram no ambiente escolar e na percepção dos professores e professoras de Educação Física devido aos limites da produção teórica da Educação Física que “não produziu investigações mais densas e consistentes sobre a constituição, desenvolvimento e função da Educação Física no interior da instituição escolar.” Caparroz (2007, p. 161). Entretanto, não podemos considerar que o não desenvolvimento da Educação Física escolar, principalmente no Ensino Médio, se deu apenas pelo distanciamento teórico da prática pedagógica nas escolas.

    Há que se considerar também que, as escolas de ensino médio passaram a direcionar os seus objetivos educacionais com vistas ao vestibular como é o caso das instituições de ensino médio privado que vêem a Educação Física como uma disciplina que ‘atrapalha’ a vida escolar do pré vestibulando e, de forma anacrônica, utiliza o esporte como uma propaganda de suas potencialidades educacionais. Nesse contexto de dificuldades estruturais, a construção da identidade da Educação Física escolar ocorrerá, também, com as ações pedagógicas que valorizem as praticas corporais assim como a construção do conhecimento subjacente a sua linguagem. As práticas corporais como uma linguagem cultural dos jovens na sociedade contemporânea, se manifestam em vários espaços sociais e podem, assim como devem, ser discutidas, analisadas, criticadas e terem a sua compreensão ampliada no espaço escolar pela ação pedagógica da Educação Física no ensino médio.

    As Orientações Curriculares para o Ensino Médio consideram que:

    Esses diversos usos feitos pelos alunos (muitas vezes a despeito da figura do professor) também estão carregados de valores, sentimentos, subjetividade. O entendimento que os alunos têm de si mesmos; do seu corpo e do corpo dos outros; de seus valores e posicionamentos éticos e estéticos; de seus projetos de vida pessoal e do lugar que a escola ocupa nesses projetos: todas essas questões constroem o papel da Educação Física e dos lugares que pode ocupar na vida dos alunos (BRASIL, 2006, p.218).

    Desse modo, sugere-se para que se consolide como componente curricular, a Educação Física no ensino médio terá que se estruturar de forma integrada ao currículo escolar e ao projeto político pedagógico institucional e assim, ampliar as possibilidades de desenvolver a sua prática pedagógica com os elementos que se relacionem com o complexo cultural de vivências dos alunos, além de buscar superar as dicotomias entre a teoria e a prática consolidando-se com uma práxis cientifica.

    Outras sugestões apontam para o desenvolvimento de experiências que possam construir uma identidade pedagógica da Educação Física além de registrar a sua organização didático pedagógica para fins científicos. É necessário, pois, contextualizar as práticas corporais com a natureza e a cultura e estar em constante interação com as mudanças sociais e com a evolução da ciência e da tecnologia. Temos consciência que essa discussão não se encerra aqui e que há muito que ser feito, tanto pela instituição escolar quanto pelo professor e pelos alunos, na proposição da Educação Física como componente curricular na estrutura do novo Ensino Médio no Brasil.

Referencias.

  • BARNI, Mara Juttel e SCHNEIDER, Ernani José. EDUCAÇÃO FÍSICA NO ENSINO MÉDIO: Relevante ou Irrelevante? Instituto Catarinense de Pós-Graduação – www.icpg.com.br; 2004.

  • BETTI, Mauro. Educação física como prática científica e prática pedagógica: reflexões à luz da filosofia da ciência. Rev. bras. Educ. Fís. Esp., São Paulo, v.19, n.3, p.183-97, jul./set. 2005.

  • Brasil–OCEM. (Orientações curriculares para o ensino médio; volume 1) Linguagens, códigos e suas tecnologias / Secretaria de Educação Básica. – Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2006. 239 p.

  • BRASIL. Programa Ensino Médio Inovador- Documento Orientador. Brasil; MEC, SEEB, 2009.

  • CAPARROZ, Francisco Eduardo. Entre a educação física na escola e a educação física da escola: a educação física como componente curricular. 3ª Ed. – Campinas, SP: Autores Associados, 2007.

  • MATTOS, Mauro G. & NEIRA, Marcos G. Educação Física na adolescência: construindo o conhecimento na escola. São Paulo: Phorte Editora, 2000.

  • MENDES, Maria Izabel de Souza Mendes e col. Reflexões sobre o fazer pedagógico da Educação Física. Motriz, Rio Claro, v.16 n.1 p.199-206, jan./mar. 2010.

  • KUNZ, E. (Org.). Didática da Educação Física 1. Ijuí: Unijuí, 2003

  • REIS, Pedro Ferreira. Desafios da Educação Física escolar no ensino médio frente à sociedade contemporânea. 2008; Foz do Iguaçu, PR.

  • SOUZA JUNIOR, Marcilio. A história da Educação Física escolar no Brasil. Refletindo sua inserção como componente curricular. Livro didático 3. Organizadora: Terezinha Petrúcia da Nóbrega. – Natal, RN; Paidéia, 2009.

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