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Concepções discentes sobre Educação Física escolar e saúde

Concepciones de los estudiantes sobre Educación Física escolar y salud

 

Licenciada em Educação Física pela

Universidade do Oeste de Santa Catarina, UNOESC/SMO

Especialista em Educação Física Escolar pela

Universidade Federal de Santa Maria, UFSM

Mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação, CE/UFSM

Andréia Paula Basei

andreiabasei@yahoo.com.br

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          O presente estudo aborda a relação existente entre as práticas educativas e conteúdos que são desenvolvidos nas aulas de Educação Física e as concepções criadas pelos alunos com relação a esta disciplina no contexto escolar, assim como as possíveis relações com a promoção da saúde através destas práticas. Os resultados obtidos nos permitem concluir que em termos conceituais, atualmente a disciplina de Educação Física ainda carece de uma compreensão mais abrangente sobre seus objetivos, conteúdos e metodologias. O que leva a desvalorização da Educação Física no âmbito escolar, isto é, a falta de identidade da disciplina. Apontamos para a necessidade de que os professores transformem suas aulas, por meio de uma revisão e reformulação que in­corpore a reflexão sobre conceitos, conteúdos, metodologias e objeti­vos da disciplina, a fim de valorizar a sua importância dentro do ambiente escolar construindo um sentido e significado para os alunos.

          Unitermos: Práticas educativas. Educação Física escolar. Saúde. Concepções discentes.

 

Abstract

          The present study approaches the existent relationship among the educational practices and contents that are developed in the classes of Physical education and the conceptions created by the students regarding this discipline in the school context, as well as the possible relationships with the promotion of the health through these practices. The obtained results us they allow to end that in conceptual terms, now the discipline of Physical education still lacks an including understanding on their objectives, contents and methodologies. What takes the depreciation of the Physical education in the school extent, that is, the lack of identity of the discipline. We pointed for the need that the teachers transform their classes, through a revision and reformulating that it incorporates the reflection on concepts, contents, methodologies and objectives of the discipline, in order to value his/her importance inside of the school atmosphere building a sense and meaning for the students.

          Keywords: Educational practices. Physical Education school. Health. The students conceptions.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 15, Nº 148, Septiembre de 2010. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

“A Educação Física precisa dizer a que veio, o que ensina […]”

OLIVEIRA, 2002 apud REZER, 2006, p. 35

    Ao analisar alguns aspectos históricos da Educação Física no cenário nacional, percebe-se que sempre existiu a relação com a área de saúde, ora relações mais próximas, ora mais distantes, mas presentes. Isso, porém não significa a existência de um consenso no âmbito escolar, pois a saúde nem sempre é entendida como possível questão para legitimação da Educação Física na escola. Os debates têm evoluído juntamente com a construção e desenvolvimento de propostas pedagógicas que estão fundamentadas na promoção da saúde e criação de um estilo de vida saudável para os alunos, dentro e fora do contexto escolar.

    Diante dessas premissas, conforme apontado por Guedes (1999) a função proposta aos professores de educação física é a de incorporarem nova postura frente à estrutura educacional. Para isso é necessário a adoção de metas voltadas à educação para a saúde, mediante seleção, organização e desenvolvimento de experiências que possam propiciar aos educandos não apenas situações que os tornem crianças e jovens ativos fisicamente, mas, sobretudo, que os conduzam a optarem por um estilo de vida saudável ao longo de toda a vida.

    Considerando esses aspectos, pode-se perceber que a legitimidade da área tenta ser garantida no ambiente escolar por diferentes meios, diferentes contribuições para o processo de ensino e aprendizagem. Destaca-se dentre estes, também a necessidade do desenvolvimento de competências com alunos. Competências estas, que os permitem agir no contexto onde estão inseridos de forma crítica, reflexiva e autônoma com relação a qualquer aspecto do seu mundo de vida.

    Considerando a questão da saúde como foco principal de análise neste trabalho, percebe-se que é apontada por alguns pesquisadores como objetivo central das aulas, isto é, os conteúdos desenvolvidos nas aulas necessitam direcionar-se para a promoção da saúde dos alunos na criação de hábitos saudáveis, de um estilo de vida que permita a sua qualificação.

    Os conteúdos de ensino, assim, como apontado por Libâneo (1994, p. 39) "[...] são realidades exteriores ao aluno que devem ser assimilados e não simplesmente reinventados, eles não são fechados e refratários às realidades sociais", pois "não basta que os conteúdos sejam apenas ensinados, ainda que bem ensinados é preciso que se liguem de forma indissociável a sua significação humana e social".

    Sendo assim, o presente trabalho aborda a relação existente entre as práticas educativas e conteúdos que são desenvolvidos nas aulas de Educação Física e as concepções criadas pelos alunos com relação a esta disciplina no contexto escolar, assim como as possíveis relações com a promoção da saúde através destas práticas. Já que, para se desenvolver uma aprendizagem significativa para os alunos, além de ter conteúdos definidos e apropriados, é imprescindível que se tenha uma concepção do que é a disciplina e o que ela ensina. Para tanto, buscou-se identificar a compreensão dos alunos matriculados nas séries finais do ensino fundamental sobre educação física escolar e saúde apontando os desafios e possibilidades para as práticas pedagógicas da Educação Física contribuírem com a aprendizagem dos alunos.

    Um dos fatores que justifica a realização deste estudo é que, durante as práticas pedagógicas do contexto pesquisado era perceptível nos alunos as relações entre as concepções pesquisadas, uma vez que a palavra saúde surgia com recorrência entre professores e alunos. Outro fato é que a compreensão sobre esses problemas é necessária se existe a pretensão de possibilitar ao aluno da escola pública entender a realidade social interpretando-a e explicando-a por meio de uma análise crítica que ajude o aluno a ultrapassar a experiência, os estereótipos, as pressões difusas da ideologia dominante, nas palavras de Libâneo (1994) promover a ruptura entre concepções e vivências.

Enfoques metodológicos

    Este estudo caracteriza-se como uma pesquisa qualitativa com enfoque fenomenológico, que de acordo com Minayo (1998, p. 21), “[...] trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos”. Sendo assim, nos interessava compreender as características do fenômeno em estudo, buscando para isso os seus significados partindo das vivências e experiências subjetivas dos alunos participantes da pesquisa.

    Os participantes da pesquisa foram 52 alunos de ambos os sexos, matriculados nas séries finais do ensino fundamental (5ª a 8ª séries) de uma escola situada na zona rural pertencente a rede pública municipal de ensino de Barra Bonita, Santa Catarina.

    Como instrumento para coleta das informações foi utilizado uma entrevista estruturada respondida pelos participantes da pesquisa. A interpretação das informações foi realizada a partir da análise de conteúdo. Conforme Bardin (apud TRIVIÑOS, 1987, p. 160), esta é conveniente para o estudo das motivações, atitudes, crenças, valores e tendências e, é definido como:

    [...] um conjunto de técnicas de análise das comunicações, visando por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, obter indicadores quantitativos ou não, que permitam a inferência de conhecimentos relativos as condições de produção/recepção das mensagens.

    Para isso, seguimos as etapas assinaladas pelo autor em nosso estudo, sendo elas: a pré-analise, composta pela organização do material, ou seja, as respostas dos sujeitos ao questionário; a descrição analítica orientada pelo referencial teórico que adotamos para a classificação e categorização das respostas dos acadêmicos, com seus encontros e desencontros e; a interpretação referencial com nossas reflexões e conclusões a partir dos dados empíricos coletados e do referencial teórico adotado.

    Foram elaboradas duas categorias temáticas de análise para interpretação e discussão das informações, sendo elas: a) Educação Física escolar: entre o vivenciado e o desejado pelos alunos e; b) Saúde: concepções e necessidades.

Apresentação e discussão das informações

Educação Física escolar: entre o vivenciado e o desejado pelos alunos

    Esta categoria temática para um melhor entendimento e exposição das percepções e crenças dos alunos, foi subdivida em: a) Concepção de Educação Física; b) Aprendizagem nas aulas vivenciadas e; c) Novos conteúdos para aprendizagem.

a.     Concepção de Educação Física

    As falas dos alunos entrevistados, de uma forma geral, demonstram que a concepção da Educação Física não está clara e definida pelos alunos, uma vez que, observa-se posicionamentos diversos, por vezes controversos e que se confundem com conteúdos e objetivos da disciplina da escola. Desta forma, partimos do entendimento de que, a Educação Física é uma prática pedagógica que, no âmbito escolar, tematiza formas de atividades expressivas corporais como: jogo, esporte, dança, ginástica, formas estas que configuram uma área do conhecimento que podemos chamar de cultura corporal (SOARES et al., 1992, p. 50).

    Sendo assim, verificou-se que 53% dos alunos conceituam a disciplina como “Praticar esportes”, como “[...] uma aula de atividades esportivas” e como “[...] uma aula onde aprendemos a praticar esportes como um profissional”.

    Essas concepções, demonstram que existe uma falta de compreensão mais aprofundada sobre o objeto de ensino, os conteúdos e a função da disciplina no âmbito escolar por parte dos alunos.

    Considerando as respostas dos demais alunos do grupo pesquisado, percebemos que as concepções não divergem muito deste primeiro aspecto, o que se percebe é que surgem alguns novos elementos para definir a Educação Física. Um dos elementos mais relevantes apontados é o entendimento da aula relacionado a diversão, isto é, 13% dos alunos consideram a aula de Educação Física como um momento de diversão, onde a aula, é “[...] um lugar onde você fica para se divertir e brincar”, um momento em que “[...] você aprende várias coisas legais e divertidas” e, “[...] é alguma coisa para a gente ser feliz se exercitando”.

    Percebe-se que, a relação estabelecida pelos alunos é que as aulas, e mesmo a disciplina está ligada ao brincar descompromissado, um momento de lazer, de diversão. Compreende-se a importância de relacionar as práticas da Educação Física a ludicidade, o que não coaduna com a concepção de Educação Física é que estas atividades tenham um fim em si mesmas deixando de lado os objetivos e funções do processo de ensino, seja de promoção de saúde, socialização, emancipação, entre tantos outros destacados nas diferentes abordagens de ensino.

    Outro aspecto percebido nas falas e que ajuda na compreensão da concepção das aulas pelos alunos relaciona-se a um espaço para se fazer e cultivar amizades e aprender a respeitar os outros. Com este aspecto, 7% dos alunos relacionam sua concepção de aula de Educação Física, afirmando que “[...] é uma aula para viver em harmonia com os outros”, “[...] curtir com a vida, fazer coisas novas e cultivar conversas com amigos”, “[...] é uma matéria que as pessoas aprendem ter respeito com os adversários” e trata-se de um espaço para “[...] compreender as pessoas, ser amigos e ter respeito uns com os outros”.

    Os alunos fazem referência também que a Educação Física é “uma disciplina”, “uma matéria legal” e “é uma disciplina que nós aprendemos muitas coisas”. Essa concepção é apresentada por 13% dos alunos entrevistados.

    O caráter compensatório da disciplina de Educação Física sobre o trabalho das outras disciplinas também parece ser ressaltado pelos alunos quando afirmam que a aula “é ter diferentes atividades”, “são aulas que você aprende atividades diferentes”. Sobre este aspecto, identificou-se 7% das respostas dadas pelos alunos.

    Observou-se também, ainda que timidamente, 2% das respostas relacionadas a saúde. Conforme a fala de um aluno, a aula é um espaço “[...] onde você aprende cuidar da saúde”.

    E, 5% dos alunos não responderam ou não souberam definir aula de Educação Física. As constatações feitas a partir da análise das entrevistas realizadas mostram que a disciplina de Educação Física ainda aparece numa posição de marginalização diante das demais disciplinas escolares com relação ao entendimento dos alunos sobre sua função e objetivos. Esta questão vai ao encontro dos apontamentos de Freire e Scaglia (2004, p. 40) quando afirmam que,

    “[...] um dos problemas mais graves que se perpetuam na Educação Física é a insuficiente definição dos conhecimentos que devem ser desenvolvidos por ela junto aos alunos. Os professores sentem muita dificuldade em responder perguntas como: ‘o que a educação física ensina na primeira séria (ou na segunda...)’”.

    Essa é uma das questões fundamentais para ser superada no contexto escolar e ‘dar’ a Educação Física a significativa importância que deve ter na escola, para isso, a educação física “precisa dizer a que veio, o que ensina. Enquanto ‘engasgar’ cada vez que for questionada sobre o que pode ensinar, será uma disciplina marginal” (OLIVEIRA, 2002 apud REZER, 2006, p. 35).

b.     Aprendizagem nas aulas vivenciadas

    Com relação ao que os alunos aprendem nas aulas de Educação Física, verificamos que a grande maioria menciona a aprendizagem dos esportes tradicionais, dentre os mais citados o “futsal, futebol e voleibol”, sendo 43% das respostas obtidas. Isso relaciona-se com a própria concepção da disciplina pelos alunos, onde essas práticas aparecem em destaque.

    Sobre a questão, Silveira [200-], ressalta que o problema não é a Educação Física se pautar basicamente no esporte, mas a forma como as aulas têm sido conduzidas. É notório que muitas delas são ministradas dentro do contexto mecanicista, com os alunos realizando as atividades sem sabe­rem a necessidade e importância das mesmas, considerando-as apenas uma forma de recreação. Conforme o autor ainda, sendo o esporte a preferência dos alunos e, por vezes do professor também, é necessário que este desenvolva outros conteúdos a partir dele, trabalhe habilidades e competências, dando sentido e significado as ações realizadas pelos alunos.

    Com menor expressividade aparecem nas respostas a aprendizagem de “exercícios e atividades físicas e alongamentos”, estando presente em 10% das respostas dos alunos. E, neste mesmo grau de expressividade é citado “respeito, responsabilidade e amizade” por 12% dos alunos. Isso demonstra que, se por um lado os alunos entendem que é possível aprender outros valores nas aulas, relacionados ao convívio social e ao próprio corpo, por outro, continua a deixar a disciplina sem esclarecer quais são os seus conteúdos de ensino.

    Sobre essa questão, um dado relativamente preocupante é que 35% dos alunos não souberam indicar o que aprendem com as aulas, especificar conteúdos que lhes são significativos, apenas afirmando que aprendem “muitas coisas”. Isso demonstra que as aulas não apresentam conteúdos significativos, ou não proporciona uma aprendizagem significativa aos alunos, permanecendo na sua posição de marginalização no contexto escolar.

    Sobre a questão, buscamos fundamentação em Salvador (1994) ao falar em aprendizagem significativa equivale, antes de tudo, a pôr em relevo o processo de construção de significados como elemento central do processo ensino/aprendizagem. O aluno aprende um conteúdo qualquer – um conceito, uma explicação de um fenômeno físico ou social, um procedimento para resolver determinado tipo de problema, uma norma de comportamento, um valor a respeitar, etc. – quando é capaz de atribuir-lhe um significado. De fato, no sentido estrito, o aluno pode também aprender estes conteúdos sem lhes atribuir qualquer significado; é o que acontece quando aprende de uma forma puramente memorística e é capaz de repeti-los ou de utilizá-los mecanicamente sem entender em absoluto o que está dizendo ou o que está fazendo. De acordo com os alunos, este parece ser o sentido que melhor caracteriza as práticas da educação física, apenas como repetição mecânica de gestos e movimentos.

c.     Novos conteúdos para aprendizagem

    Mediante interpretação dos resultados verificamos que quando indagados sobre sugestões para as aulas de Educação Física, novos conteúdos que gostariam de experiênciar nas aulas os alunos as falas continuam limitadas aos esportes tradicionais, sendo que se destaca o “handebol” como desejo de 38% dos alunos. Este, considerado um esporte tradicional e bastante conhecido pode ser justificado como o desejo dos alunos porque as aulas vivenciadas não incorporavam a prática desta modalidade, embora constatamos que existia estrutura física e material para o desenvolvimento de tal atividade.

    Em segundo lugar aparece outro esporte, o “basquete”, com 29% das respostas dos alunos, o qual também não era abordado nas aulas devido a ausência das tabelas e cestas para a prática da modalidade.

    Aprofundar os conhecimentos práticas com relação ao “futebol”, modalidade mais praticada e desenvolvida na escola, ainda é apontado por 17% dos alunos como necessidade para as aulas.

    Para finalizar, um dado preocupante e que pode ser justificado pela falta de conhecimento sobre os objetivos e conteúdos da disciplina, bem como o fato de não serem proporcionadas atividades diferenciadas nas aulas, é que 30% dos alunos afirmam que gostaria de “aprender coisas novas”, ou “coisas que ainda não sabem”, sem, no entanto, apontar quais são estas coisas.

    Sendo assim, verificamos que, como já tem apontado outros estudos, os principais conteúdos ministrados nas aulas são os quatro esportes coletivos tradicionais. Esse fato se dá, segundo estudos realizados por Kunz (1991), porque a prática escolar de Educação Física, identifica-se com os desportos extra-escolar, pois, verifica-se que a grande parte dos conteúdos abordados, são os esportes.

Saúde: concepções e necessidades

    Ao apresentarmos e discutirmos as questões relacionadas a saúde pesquisadas junto aos alunos, destacamos duas subcategorias: a) Conceito de saúde para os alunos e; b) Necessidades para ter saúde.

a.     Conceito de saúde para os alunos

    Inicialmente, acreditamos na necessidade de esclarecer qual é o ponto de partida para a análise das informações obtidas com os alunos, isto é, o que entendemos por saúde, a partir de que visão buscamos compreender e explicar as respostas dadas pelos alunos.

    Nesse sentido, Minayo (1992, p.10) apresenta uma definição de saúde como: “o resultado das condições de alimentação, renda, meio ambiente, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso aos serviços de saúde. É, antes de tudo, o resultado das formas de organização social da produção, as quais podem gerar grandes desigualdades nos níveis de vida”.

    As entrevistas realizadas com os alunos demonstram que, igualmente quando questionados com relação a concepção de Educação Física, os mesmos não possuem clara uma definição de saúde, embora alguns apontem aspectos que podem ser considerados relevantes para essa compreensão e manifestam durante as práticas a relação entre essas concepções. Isso é perceptível se considerarmos que 35% dos alunos responderam que saúde para eles é “ser saudável”. Ainda com relação a falta de clareza sobre esse conceito, constatamos que 19% das respostas estava relacionada a um conceito de saúde como “não ter doenças”.

    Essas concepções demonstram que, como apontado por Guedes (1999), a nível conceitual, com frequência o termo saúde tem sido caracterizado dentro de uma concepção vaga e difusa, o que incentiva interpretações arbitrárias e, por vezes, carente de uma visão didática-pedagógica mais consistente.

    Por outro lado, alguns alunos apontam aspectos considerados relevantes quando se trata da concepção de saúde. Estes aspectos estão relacionados as questões de prática de atividades físicas, uma vez que, 11% dos alunos de referem a “praticar esportes” como elemento fundamental no conceito de saúde. Considerando estas respostas, é possível notar que a compreensão dos alunos é de que para ter saúde é preciso fazer algo, ou seja, a pessoa não nasce e permanece com saúde a vida toda, ou não nasce e permanece sem ela a vida toda. Fato este, que vai ao encontro das afirmações de Guedes (1999) ao falar que para ser saudável torna-se necessário adquirir e construir esse estado de “forma individualizada constantemente ao longo de toda a vida, apontando para o fato de que saúde é educável e, portanto deve ser tratada não apenas com base em referenciais de natureza biológica e higienista, mas sobretudo em um contexto didático-pedagógico”.

    Com relação aos aspectos de relacionamentos e controle do estresse, apontados por Nahas (2006) como aspectos importantes com relação a saúde, foram identificadas 11% das respostas dadas pelos alunos, isto é, mencionando a necessidade “paz, alegria, feliz, fazer o que gosta, estar com os amigos”. Nesse mesmo sentido, verificamos que 18% dos alunos entrevistados relacionam saúde a necessidade de “estar de bem com a vida”, o que vai ao encontro aos aspectos acima mencionados.

    Por fim, tivemos 6% das respostas relacionadas com a necessidade de uma “boa alimentação”, onde o aspecto nutrição é destacado. Conforme Gomes (1988) a alimentação sempre foi uma das principais preocupações do ser humano, e infelizmente ela é usada como os primitivos só para evitar a desagradável sensação de fome ou por gula, sem preocupar-se com uma alimentação balanceada que influencia diretamente na saúde.

    A arbitrariedade que se observa com relação as concepções dos alunos sobre a questão parece refletir a forma como a disciplina é tratada na escola, isto é, como uma prática descompromissada de objetivos e funções educacionais com relação ao movimento e as possibilidades que pode oferecer para a qualidade de vida e saúde dos educandos. Sendo assim, os conceitos elaborados quanto ao que vem a ser saúde devem ser objeto de cuidadosa reflexão, para que se possa perceber e atuar de forma coerente no sentido de contribuir efetivamente na formação dos educandos (GUEDES, 1999).

b.     Necessidades para ter saúde

    Considerando que a saúde não é uma condição estática, existente somente devido a ausência de doenças, mas um processo de aprendizagem, tomada de decisão e ação para otimização do bem-estar próprio (DEVIDE, 2003), buscamos investigar junto aos alunos o que eles acreditam ser necessário para ter saúde e o que eles de fato fazem para isso.

    Nas respostas obtidas, os alunos mencionam geralmente dois aspectos. Dentre os aspectos em destaque, verificou-se que o fator alimentação é o que aparece com maior frequência, sendo que em 63% das respostas ele é apontado. As respostas aparecem associadas a “alimentação saudável”, “comer frutas, legumes, verduras e cereais”, “tomar bastante líquido” e “não comer muito chocolate e alimentos com colesterol”.

    O segundo aspecto em destaque é a prática de atividades físicas, sendo que 52% das respostas obtidas fazem referência a importância dada/compreendida pelos alunos. Essa questão é apontada nas falas dos alunos como “praticar esportes” e “fazer exercícios”. De acordo com as respostas obtidas, percebe-se a existência de uma relação causa-efeito, entre a disciplina de educação física e saúde, o que deve ser cuidadosamente refletido e esclarecido. Sendo assim, se torna “imprescindível que as crianças e os jovens tenham acesso a informações que lhes permitam estruturar conceitos mais claros quanto ao porquê e como praticar atividade física, e não praticar atividade física pelo simples fato de praticar” (GUEDES, 1999, grifo do autor).

    Apenas um grupo minoritário apontou elementos para minimizar a relação de causalidade destacada acima, onde foram apontados outros aspectos necessários para se ter saúde, sendo 5% relacionados a higiene, isto é, “cortar cabelos e unhas”, “lavar os alimentos” e “não andar descalço”. Com relação ao aspecto de convivência e relacionamentos, também 5% dos alunos apontam como necessidade “estar com os amigos e família” e “viver alegre, brincar”.

    E, por fim, verificamos em 9% das respostas obtidas que os alunos consideram o envolvimento com vícios e drogas um fator que afeta a saúde. Isso pode ser percebido nas respostas onde apontam “não fumar e beber”, “não ter vícios” e “nunca se envolver com drogas”.

    Considerando as respostas dos alunos e o fato de associarem diferentes aspectos, de uma forma geral, é possível notar que a compreensão deles, embora necessite de esclarecimento e aprofundamento de alguns aspectos, indica que as necessidades com relação a saúde se relacionam a uma multiplicidade de aspectos do comportamento humano ligados a um estado de completo bem-estar físico, mental e social.

    Por outro lado, ao perguntarmos o que eles de fato fazem para ter saúde, aparecem dois fatores associados nas respostas, com exceção de poucos casos, sendo eles a prática de esportes e exercícios físicos e ter uma alimentação saudável e diversificada. Estes aspectos vão ao encontro do que eles acreditam ser necessário para ter saúde, concepções que estão bastante relacionadas ao senso comum e precisam ser aprofundadas, já que, nem todo exercício ou prática de esporte pode contribuir com a saúde, como aponta Soares (1994) “o exercício físico não é saudável em si, é apenas um elemento, num conjunto de situações, que pode contribuir para o bem-estar geral e, neste sentido, aprimorar a saúde, que não é um dado natural”.

    Nesse mesmo sentido, a alimentação que eles consideram ser saudável e suficiente pode ainda carecer de componentes essenciais para a saúde. E, conforme os objetivos da disciplina e concepções do professor, a aula de Educação Física pode ser um espaço para tais esclarecimentos.

Considerações finais

“A apropriação ativa e consciente do conhecimento

é uma das formas de emancipação humana”

SOARES et al, 1992

    Os resultados obtidos com esta investigação nos permitem concluir que em termos conceituais, atualmente a disciplina de Educação Física ainda carece de uma compreensão mais abrangente sobre seus objetivos, conteúdos e metodologias. O que leva a desvalorização da Educação Física no âmbito escolar, isto é, a falta de identidade da disciplina. Contudo, é possível apontar que essa concepção tem evoluído, ainda que timidamente, incorporando objetivos de socialização, emancipação e desenvolvimento integral do aluno, ultrapassando os limites de desenvolvimento motor somente.

    Todavia, essas concepções precisam ser trabalhadas e refletidas com os alunos de forma mais aprofundada, pois dizem respeito ao senso comum, e a escola, enquanto instituição mediadora e produtora do conhecimento necessita que o conhecimento científico chegue até os alunos e seja incorporado por eles em suas práticas diárias.

    É preciso, desta forma, que os professores transformem suas aulas, por meio de uma revisão e reformulação que in­corpore a reflexão sobre conceitos, conteúdos, metodologias e objeti­vos da disciplina, a fim de valorizar a importância da disciplina dentro do ambiente escolar e ter um significado para os alunos. Do contrário, se não apresentada uma proposta consistente a Educação Física vai continuar sendo confundida com a prática de esportes tradicionais e os alunos vão continuar gostando e jogando futebol, por exemplo, simplesmente porque não conhecem ou não são estimulados a praticar outras atividades, e não pelo fato de serem resistentes as novas propostas que possam surgir. E a promoção da saúde, como objetivo da disciplina, continuará com ações isoladas e entendimentos superficiais como a ausência de doenças.

    Portanto, concordamos com Xavier Neto et al (2005) ao afirmarem que, a Educação Física buscando se legitimar como uma disciplina escolar, que tem algo a oferecer à formação do educando, como a promoção da saúde enquanto um conteúdo que poderá compor uma proposta pedagógica para a Educação Física escolar não pode ocorrer acriticamente, desvinculada da realidade.

Referências

  • DEVIDE, F. P. Educação Física escolar como via de educação para a saúde. In: BAGRICHEVSKI, M; PALMA, A.; ESTEVÃO A. (Orgs.) A saúde em debate na educação física. Blumenau, SC: Edibes, 2003.

  • SILVEIRA, J. A Educação Física Escolar nas escolas públicas e os seus conteúdos: uma análise sobre a postura dos educadores acerca de seu campo de trabalho. [200-] Disponível em: http://www.cds.ufsc.br. Acesso em: 10 de jun. 2010.

  • GUEDES, D. P. Educação para a saúde mediante programas de educação física escolar. Revista Motriz, v. 5, n. 1, jun. 1999.

  • KUNZ, E. Educação Física: ensino e mudanças. Ijuí: Unijuí, 1991.

  • LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São Paulo: Ed Cortez, 1994.

  • MINAYO, Maria Cecilia Souza. O Desafio do Conhecimento – Pesquisa Qualitativa em Saúde. 5. ed., São Paulo-Rio de Janeiro: Hucitec-Abrasco, 1998.

  • REZER, R. O fenômeno esportivo: ensaios críticos-reflexivos. Chapecó: Argos, 2006.

  • SALVADOR, C. C. Aprendizagem escolar e construção do conhecimento. Porto Alegre: Artmed, 1994.

  • SOARES, C. L. et al. Metodologia do ensino da Educação Física. São Paulo: Cortez, 1992.

  • SOARES, C. L. Educação Física: raízes européias no Brasil. Campinas: Autores Associados, 1994.

  • TRIVIÑOS, Augusto Nibaldo Silva. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 1987.

  • XAVIER NETO, Lauro Pires et. al. Saiba mais sobre educação física. 2.ed. Rio de Janeiro: Âmbito Cultural, 2005.

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