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Ansiedade pré-competitiva em atletas de artes marciais

Ansiedad precompetitiva en atletas de artes marciales

 

*ASSEVIM, Instituto Passo 1. Uberaba, MG

**NEPAGE, Faculdade Atenas, Paracatu

FISIOEX, UNIPAC – Uberlândia, MG

(Brasil)

Mariana Rodrigues de Carvalho*

marythai375@hotmail.com

Thiago Montes Fidale**

thiagofidale@hotmail.com

 

 

 

 

Resumo

          A ansiedade é um estado psicológico que altera e tem influência direta na concentração e na performance exigida para a prática esportiva. É uma variável fundamental para um bom desempenho do atleta. Antes de qualquer competição, é normal que os esportistas fiquem ansiosos por motivos diversos. O estudo referente a esse artigo, busca discutir sobre as implicações da ansiedade pré-competitiva no resultado de competições de artes marciais e quais os treinamentos podem ser feitos para controlar a ansiedade e transformá-la em motivação. Será feita uma pesquisa bibliográfica sobre o assunto e uma pesquisa de campo através de entrevistas com lutadores de diversas modalidades, graus de experiência e idade diferentes.

          Unitermos: Ansiedade. Estresse. Psicologia do esporte. Desempenho. Treinamento.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 15, Nº 148, Septiembre de 2010. http://www.efdeportes.com/

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1.     Introdução

    Nos dias atuais, o estresse e a ansiedade tem sido a causa de muitos transtornos psicológicos e o esporte, em geral sinônimo de saúde, muitas vezes é usado para amenizar esses problemas e melhorar a qualidade de vida do ser humano. Porém, quando o atleta entra em uma competição, pode ter cargas maiores de estresse e ansiedade, principalmente pouco tempo antes de encarar o adversário, trazendo problemas somáticos e / ou psíquicos eventualmente graves.

    Os graus de ansiedade têm ampla relação com o desempenho esportivo e esse sentimento tem sido classificado como um estado emocional caracterizado por nervosismo, pensamento negativo e elevada ativação somática (Gould, Chapman, Weinberg, 1997; Harton, 2000). A ansiedade apresenta dois componentes que devem ser levados em consideração: o cognitivo e o somático, que não tem a mesma influência no rendimento do atleta.

    Os autores observam que o nível de ansiedade é mais alto nos atletas jovens. Por terem pouca experiência quando entram em competições, manifestam uma ansiedade competitiva mais alta que os esportistas com mais experiência. De modo geral, os autores sustentam a hipótese de que, na medida em que as pessoas não se sentem ameaçadas em sua autoestima, manifestam menos ansiedade.

    A teoria multidimensional de ansiedade foi proposta por Martens (1990) e outros autores como Chapman, Lane, Brierley e Terry (1997) ressaltaram que atletas que tem resultados expressivos em competições apresentam menores níveis de ansiedade e maior autoconfiança. No entanto, a interpretação individual desses níveis de ansiedade é avaliada como elemento fundamental para sua compreensão, segundo os autores Hanin (1997) e Harton (2000).

    Mas a ansiedade também pode ser positiva para a performance do atleta, segundo Hardy, Jones e Gould (1996), quando o competidor analisa essa ansiedade como benéfica e motivadora do seu desempenho. Hanin (1997) afirmou que o esportista que consegue interpretar positivamente seus níveis de ansiedade tem maiores possibilidades de alcançar uma melhor atuação, principalmente se confrontado com aquele atleta que tem essa percepção negativamente.

    Existem inúmeras referências teóricas que abordam a ansiedade pré-competitiva. Inclusive alguns autores já foram citados no decorrer dessa introdução. Mas poucos estudos analisaram esse tema focado nos esportes de luta, como as artes marciais. A pesquisa da qual se trata este artigo, se torna relevante pelo propósito de abordar o tema de forma geral e especificamente em atletas que praticam artes marciais. Foram utilizados estudos sobre psicologia do esporte como referência para verificar como funciona a ansiedade pré-competitiva. Foram buscadas ainda, pesquisas sobre treinamentos eficazes para controlar o excesso de estresse e ansiedade, para que de fato não atrapalhe o desempenho do atleta, fazendo com que obtenha resultados negativos.

    Reconhecendo todo o processo psicológico a que a maioria dos atletas é submetida antes de competir, podemos analisar com clareza os benefícios que a ansiedade pode trazer se for moderada e auxiliar na compreensão por parte do atleta, mostrando os malefícios que ela causa. Sendo assim, a partir do entendimento é possível conseguir um autocontrole através de treinamentos específicos, utilizando esse estado emocional para impulsionar o competidor. Para chegar às conclusões, o caráter da pesquisa será, em sua maior parte, bibliográfica. Como forma de complementação, será feito entrevistas com atletas que praticam artes marciais diversas e já competiram, pelo menos uma vez, em várias modalidades. Pretende-se com essas entrevistas, saber como cada um é afetado diretamente pela ansiedade e como procedem para controlá-la.

2.     A ansiedade

    Para a medicina, estresse ou ansiedade é uma ocorrência fisiológica global, do ponto de vista físico e emocional. Segundo Martens (1982), Weinberg e Gould (1997) e Gould (1988), é um estado emocional negativo, constituído por sentimento de nervosismo, preocupação, apreensão e tensão, associados com a ativação do Sistema Nervoso Autônomo. As primeiras pesquisas médicas sobre o assunto estudaram as alterações orgânicas produzidas diante de uma circunstância adversa, onde se encaixam as situações provocadas pelo esporte competitivo.

    O elemento cognitivo é associado a emoções negativas sobre o rendimento esperado, como preocupação, visualização de um possível fracasso e falta de confiança na capacidade de enfrentar o desafio proposto. Deve ser encarada como indicador da percepção que o atleta tem da competição. Segundo Martens (1983, p.38) a ansiedade cognitiva e a autoconfiança representam fins opostos de uma avaliação cognitiva, sendo a ansiedade cognitiva vista como falta de autoconfiança. Martens (1990) entende que o rendimento cai quando a ansiedade cognitiva aumenta, produzindo efeitos negativos nas atividades esportivas que requerem maior concentração, estratégia e agilidade psicomotora.

    O componente somático é caracterizado pelas manifestações fisiológicas, aguçadas em circunstâncias onde há tensão emocional, como aumento dos batimentos cardíacos e enjôos estomacais (Martens, Vealey, Burton, 1990). Envolve o organismo como um todo, colocando-o em estado de alerta e resultando no aumento dos níveis de adrenalina e cortisol. Um elevado nível de ativação através da ansiedade somática, segundo Martens (1990) é essencial para as atividades que requerem rapidez, resistência física e força, como as artes marciais.

    As mudanças físicas que acontecem em nosso organismo quando fugimos de um incêndio, passamos apuros no trânsito, tentam nos agredir e assim por diante, são as mesmas quando nos encontramos diante de um atleta adversário. Diante das exigências do mundo moderno, que incluem os desafios do esporte competitivo, principalmente quando se trata de ocupação profissional, percebemos todos os sintomas de nervosismo e ansiedade: coração palpitando, respiração ofegante, transpiração e estresse.

    Diante de situações competitivas acabamos tendo reações extraordinárias, que normalmente não teríamos em situações não-competitivas. Esse desempenho aprimorado se deve à ansiedade, que favorece a performance e adaptação até que o organismo atinja um ponto máximo de eficiência. Quando excede esse ponto de eficiência, apesar de a ansiedade continuar aumentando, o desempenho e a adaptação caem vertiginosamente, comprometendo a performance, levando a falência e o esgotamento da capacidade adaptativa.

    Gould (1982), analisou a ansiedade no contexto esportivo e concluiu que é um dos fatores mais importantes com que se confrontam investigadores no comando da psicologia esportiva. Os complexos objetivos dos esportistas profissionais, segundo Gould (1988) e Hardy (1996), implicam na vitória, muitas vezes estabelecida pelo ego e suas motivações podem se basear na realização de uma satisfação narcisista. Algumas vezes, a busca desses objetivos pode ser considerada como uma estrategia adaptativa para combater uma situação de ansiedade determinada por um ego carente de autoafirmação.

    Weimberg (1997) transcreve um quadro de Taylor onde se relaciona os esportes vinculados ao bem estar psicológico, sugerindo que, em geral, o esporte diminuiria a ansiedade, a tensão, além de melhorar a autoconfiança e a estabilidade emocional. Voltando a Weimberg, que faz referências a outros autores que avaliaram a redução da ansiedade, relacionando-a à intensidade e tipo dos exercícios, o tipo de exercício físico mais intenso, como as artes marciais, parece influir positivamente para redução do estado de ansiedade entre 2 e 24 horas depois do exercício.

    Este efeito pode se extender até 15 semanas depois dessa prática aeróbica e parece ser maior quando a prática do exercício estimula uma freqüência cardíaca até 70 % da freqüência máxima do esportista em questão, enquanto as sessões de intensidade mais baixa ou moderada não parecem contribuir na redução da ansiedade. Tais resultados indicariam que a atividade física praticada diariamente, não apenas poderia reduzir a ansiedade, assim como poderia prevenir o desenvolvimento da ansiedade crônica.

3.     O esporte competitivo

    O esporte competitivo pode ser considerado sinônimo de situações que culminem numa avaliação comparativa, pelos outros e por si mesmo. Essas comparações podem ser feitas entre os objetivos a alcançar, os desafios, rivalidades, expectativas e uma série de outros fatores associados a prestígio, dinheiro, auto-estima, admiração social e reconhecimento. Todos esses fatores geram nos atletas, estados afetivos e somáticos complexos e inerentes às características de cada competição e individualidade do competidor.

    São essas experiências esportivas, considerando a pessoalidade de cada esportista e a carga afetiva que coloca na competição, que provocam reações emocionais recentes ou antecipatórias, como por exemplo, a ansiedade, o estresse, medo, insegurança, depressão, angústia, etc. Sob esse ponto de vista, a psicologia do esporte, tem como objeto de estudo as particularidades psicológicas da atividade esportiva e do esportista em si. As pesquisas relacionadas ao esporte mostram que o estresse e a ansiedade têm um envolvimento polêmico com o rendimento esportivo. Por isso, é de suma importância que o atleta tenha domínio de seu estado psicológico antes, durante e depois da competição. Essa preparação psicológica deve ser feita com um profissional da área e consiste em equilibrar a mente para que a capacitação física aja diretamente no rendimento do competidor. Portanto, é indispensável que o atleta tenha acesso a um treinamento psicológico, para propiciar um melhor resultado.

    Antes de uma competição, geralmente no dia anterior, o competidor se preocupa ao pensar em como será sua performance durante a luta. Essa preocupação geralmente começa quando é considerada a hipótese de possíveis interferências, que antes não preocupavam. Isso faz com que as expectativas sejam desanimadoras. Todo esse processo é um exemplo de Ansiedade Pré-Competitiva (APC), considerada por Samulski (2002) apenas uma entre as inúmeras variáveis negativas no esporte de performance.

    Esse estado de perturbação e intensa carga psíquica ou estresse psíquico, pode ser desagradável ou negativo e acontece durante as 24 horas que antecedem uma competição. A ansiedade pré-competitiva não é sentida apenas no nível mental, mas pelo corpo inteiro que responde com tensão muscular, frio na barriga, desejo de urinar e boca seca. Todas essas reações sugerem que o atleta está fora de controle. Psicologicamente, o esportista nesse estado está tentando prever as oportunidades, riscos e conseqüências da luta.

    É comum que sinta medos e temores, que não só se manifestam em processos cognitivos, mas tem o poder de causar reações vegetativas, motoras e emocionais. Os pensamentos do atleta tornam-se autoderrotáveis e negativos e a maioria sente uma combinação destes sintomas no período pré-competitivo. Porém, o grau de influência destes sintomas no desempenho do esportista, depende da interação com a personalidade do mesmo e as circunstâncias da competição.

    A ansiedade pré-competitiva é decorrência de um desequilíbrio entre a percepção das habilidades e as demandas do ambiente esportivo. Quando estas demandas estão equilibradas com as capacidades, esta experiência de agitação é saudável e benéfica para o desempenho do atleta na competição. Neste estado de equilíbrio, todas as sensações fluem espontaneamente. No entanto, se as habilidades do competidor extrapolarem os desafios da luta, sua excitação decresce, resultando em ausência de motivação. Se o contrário incidir e os desafios excederem as capacidades, o atleta se tornará super estimulado, derivando em nervosismo e ansiedade. Enfim, a APC ocorre quando as habilidades e destrezas do esportista não são entendidas como equivalentes aos desafios do esporte.

    Pelo menos cinco fatores desenvolvem a APC:

  1. reclamações físicas: distúrbios digestivos, tremores e bocejos;

  2. medo do insucesso: medo de cometer erros;

  3. sentimento de incapacidade: despreparo, mau condicionamento, habilidades enfraquecidas e sentimento que alguma coisa está errada;

  4. perda do controle: má sorte, azar;

  5. remorso, culpa: refere-se à 'caça ao oponente', jogo sujo, trapaça.

    Mas nem sempre a ansiedade induz a desempenhos ruins. Na verdade, pode ser um sinal de que o esportista está preparado para competir, que está no nível mental da excitação positiva. É necessário ficar atento a algumas reações, para saber se o atleta está no nível de ansiedade negativa ou excitação positiva. Se o esportista tem pensamentos duvidosos sobre suas habilidades ou foca em sua mente fatores que estão além do seu controle, isso é sinal de que está passando do estado de excitação positiva para o de ansiedade negativa. Se ele está nervoso, mas ainda assim confia em suas habilidades, é sinal de que está preparado para enfrentar o oponente, sem influências psicológicas no seu desempenho. Todavia, preocupações sobre capacidades em níveis em que normalmente é capaz de competir com facilidade, ou inquietação sobre fatores acima daqueles que tem domínio, podem interferir na performance.

    A literatura afirma que com o aumento da idade, a tendência é reduzir o nível de ansiedade dos competidores. Cratty (1984) diz que a ansiedade é maior, principalmente na adolescência, vindo a diminuir na fase adulta. No adolescente a ansiedade é originada essencialmente pelo desajuste do seu papel de vida, que causa incertezas, dúvidas e por fim, o próprio sentimento de ansiedade. Quando adulto, o atleta adquiri independência emocional, social e econômica. Conforme Cratty (1983), isso faz com que consiga dosar seu nível de ansiedade, conseqüentemente, conseguindo um bom desempenho.

    Confirmando as afirmações de Cratty (1983 e 1984), foram entrevistados nove esportistas, entre alunos e professores de artes marciais, com idades variando entre 16 e 33 anos, praticantes de Muay Thai, Karatê, Kung Fu, Kickboxing e Taekwondo e com experiências distintas em campeonatos. Suas respostas à entrevista mostraram que a experiência e a idade são requisitos fundamentais para o controle emocional e conseqüentemente uma melhor performance.

    Ilton Donizeti, 31 anos, é professor de Muay Thai. Lutou 17 vezes, sendo 12 vitórias e 5 derrotas. Tem 15 anos de experiência, mas ainda fica tenso antes de entrar no ringue. Sente frio na barriga e tenta se controlar orando e batendo nas manoplas. Participou de uma competição no Rio de Janeiro onde considera ter perdido a luta por questões psicológicas como: falta de apetite, ansiedade e estresse causado pela viagem. No começo não conseguia dominar a ansiedade e quanto à torcida, consegue ignorá-la. Acredita que com disciplina e treinamento, o subconsciente acredita que está preparado e diminui a ansiedade.

    Reginaldo Damião, 33 anos, é faixa preta quatro dan de Karatê-do. Completou 18 anos de experiência. Têm mais de 100 títulos, entre regionais, estaduais, nacionais e internacionais. Afirma sentir ansiedade, nervosismo, tensão e adrenalina, considerando essas sensações importantes para motivar o atleta. Para se acalmar, ouve músicas e tenta não pensar na luta ou no adversário que irá enfrentar. Acredita que quando o adversário percebe a sua calma, fica preocupado com essa postura, acontecendo um tipo de transferência de ansiedade. No começo da carreira ficava extremamente nervoso, ansioso, preocupado, não dormia na noite anterior a luta e alguns resultados não eram bons por causa dessas preocupações. Com o tempo mudou seu comportamento, pensando mais antes de atacar e ficando mais seguro nas defesas.

    Lucas Borges, 17 anos, treina Kung Fu há quatro anos e 9 meses e Muay Thai há oito meses. Há quatro anos participa de campeonatos, já tendo lutado 20 vezes, sendo 17 vitórias e 3 derrotas. Diz que se sente ansioso, tenso e muito nervoso porque se trata de esporte com contato, que mexe com a adrenalina do corpo. Afirma que sente vontade de chorar e às vezes chora escondido. Acredita que a ansiedade conta muito na performance do atleta. Para se acalmar conta com a ajuda dos técnicos e tenta ser confiante. Diz ser muito exigente consigo, sempre querendo ganhar e não se conformando com as derrotas. Quando começou a participar de campeonatos ficava bem mais nervoso do que agora, que tem mais experiência. Acredita na evolução a cada luta. Hoje fica mais tranqüilo e concentrado.

    Vinícius Borges, 32 anos, é professor de Karatê Shotokan e Kung Fu. Participa de campeonatos há 17 anos e já fez em média 40 lutas, sendo 25 vitórias e 15 derrotas. Diz que se sente muito ansioso. Normalmente antes das lutas o coração acelera, tem ânsias e vontade de ir ao banheiro. Para se acalmar vai ao banheiro, respira fundo e pensa positivo, sabendo que seu adversário provavelmente estará tão nervoso quanto ele. Mantém o controle e não se apavora. Hoje em dia fica mais calmo, mas o nervosismo ainda continua principalmente em grandes eventos.

    Gustavo Simões, 28 anos, pratica Kickboxing e participou de campeonatos por 10 anos. Foram mais de 50 lutas, sendo 40 vitórias e 10 derrotas. Diz que ansiedade antes das competições é normal, principalmente quando é de grande porte, com atletas experientes e de renome. Quando a competição é na cidade onde o atleta reside, acredita que a cobrança seja maior. Nele a ansiedade se manifesta com um “frio na barriga”, pouco apetite e irritabilidade. Para se acalmar procura estar junto à equipe, faz um aquecimento leve e analisa com quem irá lutar. Afirma que a experiência traz uma tranqüilidade fundamental ao atleta, deixando-o mais apto a realizar, durante o combate, tudo aquilo que foi treinado. Inclusive o condicionamento físico parece responder melhor quando não se sente ansioso.

    Bárbara Luíza, 16 anos, praticou Karatê e participou durante 4 anos de campeonatos. É campeã brasileira, cinco vezes campeã mineira, ganhou uma copa do brasil e nove campeonatos uberlandeses. Foi derrotada 10 vezes. Afirma que ficava ansiosa antes das lutas, mas com o tempo aprendeu a controlar. Para se acalmar, tentava se entreter com a familia e amigos e tomava água. Percebeu que adrenalina faz parte, mas se ficar estressado é muito pior.

    Welington Antonio, 30 anos, é professor de Karatê e participa de campeonatos desde 1995. Já fez 60 lutas, com 35 vitórias e 25 derrotas. Diz que dentro da filosofia do Karatê, não existe a palavra derrota, o atleta é vitorioso perdendo ou ganhando um campeonato. Se sente ansioso quando participa de campeonatos, porque quer que comece logo. Para se acalmar, se concentra nos dilemas do Karatê, respeito, dedicação, harmonia e tranqüilidade. No inicio ficava mais ansioso, mas com o passar dos anos e a experiência que adquiriu, fica mais tranqüilo.

    Sheila dos Santos, 18 anos, pratica Muay Thai e Karatê. Há oito meses participa de campeonatos e foi vitoriosa quatro vezes. Foi derrotada uma vez. Se sente muito ansiosa e tensa, com arrepios no abdome. Para tentar se acalmar faz alongamentos básicos e tenta se concentrar na competição. Diz que a ansiedade é a mesma de quando começou, pois cada competição é única e mesmo já conhecendo seu adversário, não se pode imaginar o que ele está preparando e pensando. Outra solução que encontra para se acalmar é dar o melhor de si e não desistir até o arbitro mandar parar a luta.

    Paulo César, 20 anos é professor de Taekwondo e participa de campeonatos há seis anos. Já fez em média 80 lutas, com 70% de vitórias e 30% de derrotas. Nas primeiras competições, o nervosismo era constante. Seus principais sintomas eram o batimento cardíaco acelerado, suor nas mãos e se sentia meio estabanado. Para se acalmar, tenta se aquecer chutando e se movimentando. No começo, o nervosismo não o deixava se concentrar nas táticas passadas pelo técnico. O público e o adversário o deixavam muito nervoso. Hoje em dia é tudo normal, não se preocupa com nada, apenas com técnicas e chutes.

    Níveis altos de ansiedade podem bloquear ou atrapalhar a performance do atleta, segundo Moraes, Stefanello (1990), Brandão (1993) e Barreto (2003). A percepção externa da competição é distorcida por esse excesso, gerando reações adversas em períodos determinantes, principalmente em esportes de combate, como as artes marciais, no qual o tempo de reação do atleta e a tomada de decisão são decisivos no resultado.

    Não há dúvidas de que existe uma relação entre o resultado esportivo e a ansiedade, mas há discussões quanto a essa relação. Alguns esportistas consideram que as reações de estresse dificultam a performance, chegando a paralisá-los, enquanto outros acham que os motivam.

4.     O treinamento mental

    Para Weinberg, (1997) a psicologia do esporte auxilia no melhor entendimento dos exercícios esportivos praticados pelo ser humano, avaliando e conduzindo estas atividades por meio de métodos psicológicos. Todas as modalidades de mentalização, ensaio mental ou prática mental são, para Weinberg e Gould (1997), uma forma de simulação, criação ou recriação de uma experiência na mente, que pode ser a ocasião real de atuação no combate. O estabelecimento das metas esportivas é o objetivo das ações.

    Quanto mais sentidos forem envolvidos na mentalização, mais eficaz ela se tornará. Esses sentidos são: sinestésicos, auditivos, táteis e olfativos. Se agregada aos exercícios físicos, melhores são os efeitos. Quanto maior for a sua assiduidade, melhor o esportista aproveitará seus benefícios, principalmente o desenvolvimento das capacidades físicas e psicológicas incluindo a concentração, confiança e domínio sobre as respostas emocionais. Spielberger (1989), diz que os treinamentos de visualização e outras técnicas viso-motoras propiciam o autocontrole e autoconhecimento.

    Segundo Samulski (2002), há três maneiras de realizar o treinamento mental:

  1. Autoverbalização: consiste em repetir mentalmente o movimento em forma consciente.

  2. Auto-observação: o atleta assume o papel de espectador de si mesmo. Observa mentalmente sua performance, registrando, posteriormente, as emoções que esta pratica suscitou.

  3. Treinamento ideomotor: o atleta vivencia a sensação dos processos internos que ocorrem na execução do movimento.

    Conforme Weinberg e Gould (1997), o domínio da respiração é uma das maneiras mais simples e eficazes de controlar a ansiedade. Ela deve ser empregada especialmente em períodos de pressão, nos quais a respiração do esportista estará curta, acelerada e imprópria, deixando-o mais tenso e menos concentrado. Neste momento, uma inspiração profunda, lenta e completa, deriva em um grau de relaxamento. O método de relaxamento progressivo é o tensionamento e relaxamento, que avançam de um grupo muscular para o seguinte, até que todos se encontrem totalmente relaxados.

    As sessões de exercícios feitas no intuito de se acalmar antes da competição, como aprendizado embasado em conjeturas teóricas, servem para reforçar o autodomínio, o autoconhecimento e a superação dos desafios do combate. Essa prática durante os treinos auxilia na diminuição das reações ansiosas, frente os adversários. Além disso, nos últimos 10 anos, se destacou a importância do conceito de Coping, disseminado por Lazarus (1984), definido como “o conjunto dos esforços cognitivos e de conduta destinados a controlar, reduzir ou tolerar as exigências internas ou externas que ameaçam ou superam os recursos de um indivíduo”.

    O Coping relacionado ao esporte, diz respeito ao comprometimento em derrotar os empecilhos, a cobrança adaptativa do esportista perante seus objetivos e os estados fisiológicos e psicológicos desencadeados diante da obrigação de encarar algum desafio. Diversos estudos se interessam pelo Coping e pela atuação do competidor em relação às influências do meio, qualidade de exercício, auto-estima e a pretensão de se sentir preparado, pressionado ou cobrado para a luta.

    Esses estudos buscam distinguir os atletas com prática intensa e de bom nível, daqueles que praticam esporadicamente e tem um nível de preparo menor. Em outras palavras, diferencia os profissionais de outros praticantes de esportes. Portanto, para compreender o efeito da ansiedade devemos avaliar sua capacidade de enfrentamento, chamado de Coping, e não apenas sua intensidade ou se é cognitiva (afetiva) ou somática.

    Já o teórico Zaichkowsky (1993), acredita que este estado do organismo pode representar uma tripla ação: ativação fisiológica, resposta comportamental e resposta emocional. A fundamental diferença a ser analisada é em relação ao estado fisiológico de Ansiedade Momentânea, imprescindível para que a pessoa se adapte a uma determinada situação e a Ansiedade Traço da Personalidade, particularidade de indivíduos naturalmente nervosos.

5.     Considerações finais

    Através das teorias estudadas em relação à ansiedade pré-competitiva, pode-se perceber as diversas maneiras com que o atleta é afetado por esse sentimento. Cada competidor, levando em consideração suas particularidades, lida com a ansiedade de uma forma distinta. Para alguns ela pode interferir diretamente em um rendimento negativo diante da competição. Para outros é considerada como uma motivação a mais para a melhora do desempenho na luta.

    Além disso, é importante ressaltar as formas de treinamento mental para controlar esse nervosismo. A psicologia do esporte, como os exercícios de autoverbalização, treinamento ideomotor, auto-observação, respiração, visualização e outros, que no todo são conhecidos como Coping, podem ajudar o atleta a dominar a mente e a modificar os sentimentos negativos, de modo a torná-los positivos e motivadores.

    As entrevistas realizadas com diversos atletas de modalidades diferentes de artes marciais comprovaram que a idade e a experiência contam muito nesse processo de redução e controle da ansiedade. Nos adolescentes é mais comum o aparecimento de reações somáticas, como alteração dos batimentos cardíacos, enjôos estomacais e etc.

Referências

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