A formação crítica e científica no ensino universitário de educadores La formación critica y científica en la educación universitaria de educadores |
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Universidade Gama Filho (Brasil) |
Cristiana Laurindo Rudney da Silva |
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Resumo Esta pesquisa teve como objetivo principal analisar e discutir, com base na literatura especializada, o processo de formação crítica e científica necessários ao ensino universitário de educadores, frente ao tecnicismo inerente ao modelo econômico predominante atualmente no Brasil. Para tanto, foi realizado um estudo bibliográfico em documental, tanto em bases de dados eletrônicas, quanto na literatura especializada presentes em livros, dissertações, teses e artigos científicos. Os dados teóricos foram analisados através da análise de conteúdo. Deste modo, foi possível concluir que o ensino superior no Brasil, assim como na maioria das sociedades atuais, está relacionado ao modelo político e econômico hegemônico, favorecendo predominantemente a formação tecnicista em detrimento à formação crítica. Unitermos : Ensino superior. Formação. Educadores.
Resumen :Esta investigación tuve como objetivo principal analizar y discutir, con base en la literatura especializada, el proceso de formación crítica y científica necesario a la educación de profesores, frente al tecnicismo inherente al modelo económico actualmente predominante en el Brasil. Así, fue realizado un estudio bibliográfico en documental, tanto en bases de datos electrónicas, cuánto en la literatura especializada, tais como libros, disertaciones, teses y artículos científicos. Los datos teóricos fueran analizados con análisis del contenido. De esta manera, fue posible concluir que la educación superior en el Brasil, así como en la mayoría de las sociedades actuales, está relacionada con el modelo político y económico hegemónico, favoreciendo la formación tecnicista en detrimento a la formación crítica. Palabras clave : Educación Superior. Formación. Educadores.
Artigo resultante de parte de monografia apresentada ao curso de Especialização em Docência Superior, da Universidade Gama Filho
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 15, Nº 148, Septiembre de 2010. http://www.efdeportes.com/ |
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Introdução
A educação brasileira formal, desde seu surgimento no período colonial, tem ocorrido de forma discriminatória. Já nos século 18, as classes econômicas mais favorecidas recebiam uma educação voltada para o futuro, com um ensino de qualidade restrito a uma pequena parcela social, enquanto que as classes menos favorecidas ficavam relegadas a um ensino de qualidade pouco considerável. Ainda no início do século XX, o ensino público era destinado às classes sociais mais favorecidas que queriam ingressar no ensino superior (MACIEL, 2004).
Com base na literatura especializada, pode-se atualmente entender que a educação se configura como um dos fatores principais da sociedade contemporânea. Ela acompanha o modelo político e econômico atual que vem exigindo cada vez mais uma alta escolaridade. Isto ocorre devido às exigências do modelo capitalista e industrial que exige um alto grau de especialização dos indivíduos, tornando-os cada vez mais competitivos e tornando desta maneira a educação um fator principal na busca por uma carreira de sucesso (FONSECA, 1998; DE TOMMASI, WARDE e HADDAD, 1998). Esta realidade, não só nacional, mas mundial, pode ser verificada através da constatação de que uma pequena parcela da população tem acesso a este mercado de trabalho, enquanto que a classe menos favorecida é excluída, discriminada deste mercado de trabalho por não ter, além do mesmo acesso a educação, a igualdade de oportunidades (SINGER, 1996). Este fenômeno pode ser considerado como uma construção histórica e social que vem ocorrendo através dos tempos e que encontra seu apogeu no ensino superior atual.
O entendimento do significado dos constructos sócio-históricos relacionados ao ensino superior, exige a superação de conhecimento vulgar presente no cotidiano de todas as sociedades (CHAUÍ, 2001). Pode-se justificar esta superação, principalmente na atividade acadêmica de estudantes de graduação e de pós-graduação, pela necessidade de oferta de uma educação universitária de qualidade, consciente das opiniões baseadas em hábitos, preconceitos e tradições presentes no conhecimento vulgar. Desta maneira o conhecimento científico é indispensável para a formação acadêmica, pois neste contexto, não podem ocorrer “achismos”, já que a formação universitária baseia-se cientificamente em pesquisas, investigações metódicas e sistemáticas e exige que a teoria busque a verdade sobre a realidade, exigência esta necessária à atuação profissional crítica, consciente e cidadã.
Considerando então o exposto, este estudo tem como objetivo principal analisar e discutir, com base na literatura especializada, o processo de formação crítica e científica necessários ao ensino universitário de educadores, frente ao tecnicismo inerente ao modelo econômico predominante atualmente no Brasil.
Aspectos metodológicos
Segundo Silva (2006), deve-se assumir que a produção de conhecimentos científicos exige responsabilidade diante seus resultados, e assim, as opções teóricas e metodológicas devem ser devidamente apresentadas e justificadas, assumindo papel incontestável na busca científica. Para tanto, este estudo foi delineado como uma pesquisa bibliográfica e documental (LAVILLE; DIONE, 1999). Para Boaventura apud Macedo (2005), os procedimentos de revisão devem analisar a produção bibliográfica sobre os temas em estudo a partir de um tempo específico, permitindo assim uma visão geral, ou o que pode ser chamado de estado-da-arte. Segundo Gil apud Macedo, (2005), os estudos revisionais podem oferecer um entendimento do fenômeno a partir de autores que já o estudaram, assim como pode permitir que determinadas indagações não exijam necessariamente procedimentos empíricos.
Os dados teóricos, ou informações, foram obtidos através da utilização de dois instrumentos básicos: 1) Planilha de acesso às bases de dados; 2) Fichamento do referencial teórico, ambos construídos especificamente para este estudo. Após a identificação, da bibliografia preliminar, foi realizado a seleção e o armazenamento dos materiais obtidos. Os materiais eletrônicos foram armazenados com controle dos pesquisadores, enquanto que os materiais físicos foram parcialmente reprogramados para uso exclusivo na pesquisa e catalogados seguindo a ordem crescente em arquivo de acesso exclusivo da pesquisadora e do orientador.
A análise foi realizada basicamente através da análise de conteúdo, a qual buscou compreender e aprofundar as características dos conteúdos investigados, extraindo os momentos mais significativos, mediante procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens e de indicadores que permitiram inferir conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) dessas mensagens (Richardson, 1985; TriviÑos e molina Neto, 1999; Bardin, 2000). Após a sistematização dos materiais, as análises teóricas foram organizadas em dois itens: a) aspectos relacionados ao ensino superior brasileiro; b) a qualificação crítica e científica na formação docente.
Aspectos relacionados ao ensino superior brasileiro
Desde o antigo Egito a educação era voltada para as classes dominantes, que recebiam uma formação para o exercício do poder. Estes ensinamentos eram passados em forma de conselhos dirigidos do pai para o filho ou do escriba para o discípulo. Enquanto que a classe dominada ficava com o aprendizado do trabalho. Qualquer individuo não pertencente à classe dominante era totalmente excluído da arte da palavra sendo considerado um charlatão demagogo, um meduti. (MANACORDA, 1999).
Na educação grega ainda existiam formas de discriminação, porém mais amenas. A educação arcaica ensinava as classes dominantes a governar e a classe dominada recebia apenas o treinamento para o trabalho. Porém surge no período clássico na Grécia a educação através da música e da ginástica que, junto com a escola alfabética, passa a ser oferecida para todo o cidadão livre. Em Roma a educação era transmitida através da família, porém os testemunhos históricos fazem referencia somente a classes dominantes. A escola como instituição normalmente difundida em Roma, ocorre entre o fim do século IV e o inicio do século III a.C. (MANACORDA, 1999).
Na Idade Média a escola clássica vai aos poucos dando lugar à escola cristã, sendo construídos nesta época os primeiros centros de instrução regidos por religiosos, tais como: bispados paróquias e mosteiros. (MANACORDA, 1999). No Brasil as primeiras iniciativas educacionais também obedeciam a lógica cristã, sendo os religiosos da ordem de Inácio de Loyola os principais educadores. O instrumento utilizado neste modelo educacional era ratio studiorum que era um conjunto de normas e planos de estudos. Segundo Becker, et al, (2002, p.61), “a evolução do ensino médio no Brasil foi muito lenta e desordenada. Até 1759, funcionavam os estabelecimentos mantidos por religiosos, sobre tudo jesuítas...”.
O surgimento do ensino superior no mundo ocorreu no modelo europeu de produção de conhecimentos dos séculos XII e XIII, na Idade Média. No mundo ocidental, a primeira universidade foi a de Bologna, fundada no ano de 1359 na Itália (Becker, crema, ern, de lázari, silva, 2002). No país, segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação nacional (LDBEN) 9.394/96, o ensino superior é parte componente do sistema educacional nacional (BRASIL, 1996). Segundo Silva (2006), o ensino superior atualmente sofre forte avanço à descentralização dos poderes do Estado e uma predisposição às propostas liberais de educação, como a criação dos institutos superiores, organizações diferenciadas que podem assumir o papel do estado na educação, oferecendo fortes indícios de privatização, além de outros aspectos que comprometem a educação pública, gratuita e de qualidade no Brasil.
Com base em Silva (2006), pode-se destacar que as leis de diretrizes e bases da educação que fixam as orientações para o sistema educacional brasileiro, provocam a ocorrência de inúmeras facetas contidas nas citadas Leis, que delineiam um modelo de homem, de sociedade, de trabalho e de educação compatível ao período em que se encontra. Para se discutir a educação superior na atualidade torna-se necessário salientar quatro aspectos básicos: 1) forte crescimento nas últimas duas décadas das Instituições de Ensino Superior (IES) no Brasil; 2) aumento dos estudantes principalmente nas IES privadas; 3) aumento das possibilidades de diferentes tipos de ensino superior no Brasil, 4) formas de acesso aos cursos de nível superior no Brasil.
O primeiro aspecto refere-se ao crescimento no número de IES principalmente nas últimas duas décadas no Brasil. Assim, pode-se perceber que isto ocorreu especialmente após a Reforma Universitária da década de 60, que entre as ações desenvolvidas para o melhoramento do ensino superior, encontra-se a regulamentação do ensino superior no Brasil através de Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Porém apesar deste crescimento no número de IES, o que se pode verificar é que, houve um grande aumento no número de instituições de ensino superiores privadas (PAIVA, 1994).
A LDBEN 9.394/1996 classifica as instituições de ensino superior, quanto à organização acadêmica, sendo que as universidades se caracterizam por oferecer ensino, pesquisa e extensão, já as faculdades, institutos superiores ou escolas superiores caracterizam-se por poder fazer apenas ensino ou pesquisa (BRASIL, 1996). Assim, pode-se analisar que determinadas instituições procuram se aproximar da universidade que promove pesquisa, porém uma boa parte destas instituições acaba se limitando apenas ao ensino.
O segundo aspecto refere-se ao número de estudantes de nível superior que se expandiu consideravelmente nos últimos anos. No entanto essa expansão ocorreu principalmente nestas instituições privadas que foram mencionadas acima e que não estão tão preocupadas com a pesquisa. Isto acaba se tornando um problema, pois para que se possa ter alta qualificação para o ensino e a excelência do ensino, é necessário que a instituição de ensino superior tenha pesquisa, essencial à aprendizagem.
De acordo com Paiva (1994), a qualidade das universidades públicas brasileiras está concentrada em seus programas de pós-graduação e de pesquisa e em alguns cursos profissionais mais tradicionais. A pesquisa e a pós-graduação desempenham uma função vital de manter vivos os núcleos recebedores e geradores de conhecimento no país, algo que a iniciativa privada não faz da mesma forma, e que não poderia subsistir sem subsídios públicos. Esta expansão da oferta no ensino superior, ajustada ao sistema educacional brasileiro e às necessidades e demandas da sociedade, pode colaborar na correção das baixas taxas de escolarização superior do país. Porém, não se pode deixar de lado a constante preocupação com a qualidade do ensino nestas instituições privadas.
O terceiro aspecto diz respeito ao aumento nas possibilidades de diferentes tipos de cursos. De acordo com a legislação brasileira, após a conclusão do ensino médio o sistema educacional brasileiro apresenta diferentes opções para a continuidade dos estudos superiores como: cursos seqüenciais, com até dois anos de duração, e cursos de graduação, a maioria com quatro anos de duração, havendo, porém, cursos de formação tecnológica, com dois ou três anos de duração, e cursos com cinco ou seis anos, como os de engenharia e de medicina. Os cursos seqüenciais e cursos de graduação de formação tecnológica que buscam uma inserção mais rápida no mercado de trabalho. (BRASIL, 1996)
O quarto aspecto destacado refere-se à forma de acesso a esses cursos de nível superior, que podem ser na forma de vestibular, pelo Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), avaliação seriada no ensino médio, teste/prova/avaliação de conhecimentos, avaliação de dados pessoais e profissionais. Assim, deve-se apontar ainda, sobre a qualidade das instituições de ensino superior, segundo a LDBEN 9.394/1996, em seu parágrafo segundo, do artigo 54, que "as atribuições de autonomia universitária poderão ser estendidas a instituições que comprovem alta qualificação para o ensino ou para a pesquisa, com base em avaliação realizada pelo Poder Público" (BRASIL, 1996). Deste modo, destacar a alta qualificação para o ensino, significa pensar também na qualidade de gerenciamento da instituição, uma vez que, um dos motivos da diminuição da qualidade do ensino superior se dá pelo fato de professores/pesquisadores, técnicos administrativos e administradores não estarem em constante busca de qualificação profissional.
Portanto, para que esses profissionais se sintam motivados a se aperfeiçoem em suas carreiras é necessário de acordo com Grillo (1996), que se adotem alguns incentivos tais como oferecimento de “oportunidades para a freqüência a cursos e seminários, concedendo auxilio para pesquisa, premiando aqueles que se destacam proporcionado a divulgação dos trabalhos técnicos e científicos, organizando eventos que promovam intercambio com outras instituições, ou propiciando a prestação de consultoria para organizações públicas e privadas”. Estes incentivos devem ajudar a relação destas pessoas com a instituição de ensino, pois propicia qualificação profissional a essas pessoas e consequentemente aumenta o nível de motivação para o trabalho.
A qualificação crítica e científica na formação docência
Segundo Raposo, Caixeta e Ornelas (2007), o sendo comum é o mais básico dos conhecimentos humanos, e se distingui do conhecimento científico, pois é um conhecimento popular, arraigado ao cotidiano das pessoas. O senso comum é utilizado principalmente para resolver os problemas do dia-a-dia, a fim de tornar a vida mais fácil, não está interessando em comprovações ou verificações científicas. Já o conhecimento científico procura explicar a realidade, através da pesquisa e da investigação científica, utilizando métodos específicos e passíveis de descrição. Segundo Chauí (2001), o que distingue a atitude cientifica do senso comum, é que onde o senso comum considera apenas as coisas, os fatos e os acontecimentos a atitude científica vê problemas obstáculos, aparências que precisam ser explicadas e, em certos casos, afastadas.
Todavia, segundo Freire (1987), a educação atualmente faz com que o educando necessite da presença do professor, uma vez que em sua condição se acha ignorante e aceitam esta condição. Assim, levanta-se a necessidade de revisão da educação atual, de tal maneira que ambos, se façam educadores e educandos e se tornem assim sujeitos do processo. Esta interação entre ambos, que educador e educando acabam aprendendo e ensinando simultaneamente, utiliza-se a realidade empírica como ponto de partida, mas dinamizada pelo conhecimento científico. Para que isto ocorra é necessário que o educador ao invés de apenas transmitir conhecimento, ensine o aluno a pensar estimulando este aluno e desenvolvendo um pensamento crítico e reflexivo. Desta maneira o educador deve funcionar como um mediador um facilitador na busca do saber, e o aluno livre para buscar o conhecimento de forma consciente e crítica e não alienada como acontece na educação onde o professor é mero transmissor de conhecimento.
Assim, com o objetivo de discutir a formação docente pode-se partir do entendimento proposto por Cattani (2007), é possível sugerir que a formação docente precisa ser repensada, principalmente diante da situação atual a qual estabelece um mundo em acelerada transformação nas relações sociais e de trabalho. Este modelo de produção capitalista vigente tem exigido novos perfis profissionais e mão-de-obra cada vez mais qualificada. Entretanto, têm sido evidenciadas algumas perspectivas críticas a este modelo.
Diante destas novas necessidades de qualificação para o mercado de trabalho pode-se verificar que a educação torna-se elemento fundamental neste processo produtivo (SILVA, 2006). Essa perspectiva configura uma nova tendência para a educação, redimensionando o papel dos professores e exigindo uma formação profissional diferente da atual, pois com a introdução crescente do conhecimento cientifico e tecnológico aos processos produtivos e sociais, novas exigências estão sendo apresentadas à formação do trabalhador. Sendo assim, é necessário revisar urgentemente as formações realizadas pelas universidades, pois são muitas vezes conteudistas demais e desarticuladas com a realidade.
Deste modo, o papel do professor de nível superior torna-se relevante neste processo, pois, apesar da clara necessidade de formação técnica, exige-se ainda, uma atuação que promova o desenvolvimento autônomo e emancipador dos educandos. Assim, torna-se essencial que ocorra uma melhoria na formação docente, já que são responsáveis tanto pela formação técnica, quanto pela formação crítica, podendo atender as necessidades do sistema social e produtivo (JÚNIOR, SGUISSARDI e SILVA, 2010). Entretanto, é necessário que um alinhamento entre os objetivos a serem alcançados pela Universidade, suas propostas pedagógicas que tem como base os modelos teóricos de aprendizagem, sem, no entanto, desconsiderar as limitações atuais do modelo de produção de bens e serviços e do modelo político e social atuais, o que poderia proporcionar uma crítica ingênua necessária à formação de professores.
Considerando a atuação legal da formação dos cursos de licenciatura no país, (BRASIL, 2004), pode-se admitir que ao privilegiar a escola como meio de desenvolver atividades pedagógicas, significa assumi-la como instância erigida pela sociedade para a educação das gerações que se sucedem, sem no entanto, negar o papel significativo de que existem outras agências socializadoras do conhecimento como a comunidade, família e outros grupos sociais.
Assim, importa ressaltar que a institucionalização escolar tem importância histórica fundamental para a operacionalização de uma concepção pedagógica que por sua vez, é tradução de uma concepção filosófico-política de homem, escola e sociedade no sentido da construção da cidadania universal. Assim, estabelecer uma pedagogia crítica a fim de poder preparar o estudante como um indivíduo e agente crítico para seu contexto sócio-cultural, abrange aspectos não só de um ensino específico a conteúdos pedagógicos, mas aspectos contextuais que confrontam uma realidade interna e externa da escola. (FREIRE, 1987)
Com a preocupação em construir a consciência crítica e derrubar moldes tecnicistas oriundo de um sistema moderno e elitizado, a educação fundamentada na prática social e política objetiva tornar possível que o homem possa não só criticar, mas buscar soluções para sua realidade, tranformando a escola na principal responsável na construção desse conhecimento. Uma escola reflexiva constrói seu conhecimento de forma coletiva, contínua, tendo ela uma missão social, que não acaba apenas dentro de seus muros, mas transpassa esses muros para realidade exterior. Desta forma, o educando não levará somente seus instrumentos para a construção desse conhecimento crítico, mas buscará dentro da própria realidade e do cotidiano escolar, instrumentos para o processo de aprendizagem que tem principal característica ser continuo, em permanente transformação, como aponta Brzezinski (2001):
A instituição escolar, em sua ambigüidade intrínseca, vive um cotidiano repleto de contradições, conflitos e lutas internas pelo domínio do poder do saber. Hoje, na sociedade do conhecimento e também na escola, vive-se em tempos de incertezas e rápidas mudanças notadamente no que diz respeito ás informações.(pp.70).
Neste sentido, a escola assume uma responsabilidade exigida pela sociedade, visando suprir e solucionar essas questões que muitas vezes a própria sociedade não assume. Assim a organização escolar assume o comprometimento de capacitação profissional em um meio que também é responsável pela construção identitária individual e coletiva do aluno. Brzezinski (2001) aponta a dialética que estabelece a relação entre ação e reflexão orientada para uma prática social e política no desenvolvimento e construção do ensino dentro das escolas através do que conceituamos de práxis valorizando a cultura interna e externa das instituições escolares.
Segundo Brzezinski (2001), deve-se salientar a semelhança de concepções de práxis entre Kammis e Lefebvre, pois segundo esse último, a práxis abrange a totalidade de prática humana, incluindo tanto a atividade humana que é transformadora da natureza e da sociedade, quanto à formação da subjetividade humana, e sendo assim, o entendimento do que seja a práxis, pressupõe a reabilitação do sensível e a restituição do prático sensível, ou seja, a própria atividade humana transformadora. Vinculado a essa prática de ensino, o professor se depara com questões que não são relacionadas somente ao conteúdo especifico que ele leciona. Mas a questões que transpassam esse limite disciplinar e que transbordam para esferas que lidam com questões sociais e culturais do meio escolar. Interferindo diretamente na forma que o professor mediara o conhecimento ao aluno.
Estévez (2003) descreve que as necessidades humanas não só constituem um reflexo das características do meio social, mas também uma medida da atividade transformadora da personalidade sobre o próprio meio social, afirmando que “(...) O processo educativo no centro de ensino está determinado por um marco espaço-temporal limitado, por isso todas as formas de contato com o estudante devem estar orientadas à formação de suas necessidades espirituais tanto em seu tempo escolar como em seu tempo livre.” (p. 97).
Mclaren (1997) aponta que em suas pesquisas sobre a experiência docente levantam-se diversas dificuldades no processo de aprendizagem que ultrapassam as questões pedagógicas, principalmente problemas relativos a questões sociais, étnicas, culturais e econômicas. Mclaren (1997) relata que as dificuldades relacionadas a problemas de uma escola de periferia, em que o processo de mediação era quase impossível devido aos constantes conflitos entre alunos que traziam consigo a marginalização de um contexto minoritário desfavorecido sócio e economicamente, no caso um subúrbio canadense.
Deve-se destacar que a realidade enfrentada por Mclaren (1997), é distante da realidade enfrentada no contexto brasileiro. Porém, muitos problemas tem origens relacionadas ao comportamento do aluno, diante não apenas da falta ou da ausência de disciplina, mas de problemas que todo contexto escolar sofre. Nesse sentido, a prática pedagógica é compreendida a partir das ações reflexivas, o que conceituamos de práxis. No entanto essa ação envolta de uma prática reflexiva abrange muito mais que o sentido de apenas pensar e refletir.
Todas as atitudes desde as mais simples até às mais complexas são acompanhadas da reflexão. Porém, essa atitude habitual do ser humano, não o torna necessariamente um profissional reflexivo/crítico, neste caso o professor. A partir desse conceito, Perrenoud (2002) destaca a necessidade de distanciamento exigido para uma reflexão em uma ação futura, sobre problemas que se repetem e que a ação imediata não há resultado. Nesse caso, deve-se referir à reflexão sobre a ação, em que se toma a própria ação como objeto de reflexão, comparando outras ações, questionando-se criticamente através de uma auto-análise, para saber como prosseguir em suas ações futuras. No entanto essa reflexão sobre ação transforma-se continuamente, Perrenoud (2002) coloca:
A reflexão sobre a ação renova-se constantemente. Nada é tão efêmero quanto às interações e os incidentes críticos em uma sala de aula. Todos os dias, novos elementos assumem o papel protagonistas. Dessa forma, na maior parte das vezes, a reflexão sobre a ação é interrompida após ter sido iniciada, devido ao fluxo dos acontecimentos, os quais levam a outras decisões e reflexões – e estas por sua vez, também substituídas por fatos mais atuais. (pp.37).
Portanto, pode-se compreender que a ação reflexiva contínua possibilita construir novos saberes e experiências acumuladas para seu próprio repertório e referência reflexiva para ações futuras. Através dos questionamentos e auto-observação, o professor poderá melhor compreender a sua função através tanto de seus fracassos como sucessos em sala de aula. Esta construção profissional, baseada no ato crítico reflexivo, também se constrói não só da experiência individual, mas da experiência coletiva. Por isso a necessidade de destacar a relevância destas discussões na formação do professor devendo-se assumir a responsabilidade de suprir necessidades teóricas e empíricas, buscando a qualificação discente como um professor mediador não só de conteúdos, mas também da realidade social e cultural que permeia essa troca de saberes, pois, o professor tem a responsabilidade em transmitir conhecimentos que formam o pensamento de uma sociedade.
Considerações finais
A partir do objetivo proposto para este estudo bibliográfico, identificou-se que as discussões realizadas sobre o ensino superior brasileiro permitem concluir que a transformação nas relações sociais e de trabalho exige da educação uma formação profissional muito mais dinâmica e próxima da realidade, diferente da atualmente oferecida no Brasil. Esta mudança faz-se relevante na formação de educadores com capacidade de refletir e analisar os fenômenos sociais e intervir quando necessário de forma crítica sobre seu contexto educacional. Neste contexto, a formação de professore no ensino superior deveria favorecer tanto a formação técnica quanto a formação crítica, inclusive com a necessidade de garantias legal e socialmente instituídas. Contudo, o afastamento dos conteúdos críticos da formação docente, ainda é uma realidade, segundo a literatura investigada, na maioria das áreas atualmente existentes, predominando uma forte formação técnica e científica em detrimento às demais necessidades epistêmicas.
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