Estudos Culturais e currículo multicultural: contribuições para reflexão do currículo na escola Estudios Culturales y currículo multicultural: aportes para la reflexión del currículo en la escuela |
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Professora Efetiva do Município de São Paulo de Educação Física Especialista em Pedagogia do Movimento pela UNICAMP Membro efetivo do Grupo de Pesquisa em Educação Física Escolar da FEUSP. USP |
Natalia Gonçalves (Brasil) |
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Resumo Os Estudos Culturais é um campo interdisciplinar onde o eixo principal de pesquisa são as relações entre a cultura contemporânea e a sociedade. Os estudos sobre currículo nos remete a idéia de que o currículo nunca é neutro e sempre se presta a formar determinados tipos de pessoas. O presente artigo visa contribuir de forma significativa, através dos Estudos Culturais com a reflexão a respeito do currículo na escola. Unitermos: Educação. Currículo. Estudos Culturais.
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EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 15, Nº 147, Agosto de 2010 |
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Introdução
De acordo com os Estudos Culturais, o currículo é um artefato que expressa significados e é construído social e culturalmente a partir de relações de poder. SILVA (2004) evidencia que o currículo está relacionado diretamente com o conhecimento que se “pretende” ensinar a um grupo, e sendo assim, é parte integrante de uma estrutura simbólica que contribui para a construção de significados, ou seja, ao produzir significados se torna, provavelmente, o principal instrumento para que se dê a construção da identidade da Educação Física Escolar.
Para ESCOSTEGUY (2006, p. 137) Estudos Culturais é “um campo de estudo onde diversas disciplinas se interseccionam no estudo de aspectos culturais da sociedade contemporânea”, ou seja, não é uma única disciplina e sim um campo interdisciplinar, onde o eixo principal de pesquisa são as relações entre a cultura contemporânea e a sociedade, sendo assim, eles tratam principalmente dos produtos da cultura popular. O ponto principal de partida são as estruturas de poder, desestabilizando-as e deslocando o sentido de tradição elitista para as praticas cotidianas. No mesmo texto, ESCOSTEGUY (2006, p. 146), argumenta que “os Estudos Culturais compreendem os produtos culturais como agentes da reprodução social, acentuando sua natureza complexa, dinâmica e ativa na construção da hegemonia”, portanto, não existe um “confronto” entre as diferentes culturas e sim um “intercambio” entre elas.
Como já foi dito, os Estudos Culturais não é uma disciplina, mas sim um campo de estudos onde a insatisfação com algumas disciplinas geraram estudos de vários aspectos culturais da sociedade contemporânea. Stuart Hall teve uma importante participação na formação dos Estudos Culturais incentivando desenvolvimento de estudos etnográficos, analises dos meios massivos e a investigação de práticas de resistência dentro de subculturas. A trajetória deste campo de estudos está calcada em alguns movimentos sociais de reivindicação que surgiram no final dos anos 50.
Trabalhado etnograficamente, o interesse dos Estudos Culturais incide nos valores e sentidos vividos por grupos marginalizados e oprimidos da época, pela cultura popular ou baixa cultura. Sendo assim, o estudo etnográfico reforça a importância dos modos pelos quais os atores sociais definem as condições em que vivem e lutam por ela.
Os Estudos Culturais Compreendem os produtos culturais como agentes da reprodução social, acentuando sua natureza complexa, dinâmica e ativa na construção da hegemonia, porém, discordam da afirmativa de que os meios de comunicação são simples instrumentos de manipulação e controle.
Um dos objetivos dos Estudos Culturais é o de apresentar uma proposta acadêmica de critica cultural, rompendo com a antropologia e numa concepção mais política e engajada (GUSMÃO, 2008). Assim, os Estudos Culturais se aproveitam de quaisquer campos que forem necessários para produzir conhecimento exigido por um projeto particular, algumas das principais categorias da pesquisa atual dizem respeito a(o): Gênero e sexualidade, nacionalidade e identidade nacional, colonialismo e pó-colonialismo, raça e etnia, cultura popular e seus públicos, ciência e ecologia, política de identidade, pedagogia, instituições culturais, política da disciplinaridade, discurso e textualidade, história e cultura global numa era pós-moderna. Há de se enfatizar que essa lista não pode e nem deve limitar os tópicos dos quais os Estudos Culturais possam estudar no futuro.
Enfim, podemos definir os Estudos Culturais como “um meio de examinar práticas culturais do ponto de vista de seu envolvimento com, e no interior de, relações de poder” (NELSON et all, 1995). Neste meio rejeita-se definições como alta cultura e afirmam que todas as formas de produção cultural precisam ser estudadas, sendo que os Estudos Culturais se comprometem com o estudo de todas as manifestações de artes, crenças e instituições de uma sociedade.
Uma das preocupações fundamentais dos Estudos Culturais é a noção de transformação social e cultural e como estudá-la, essas forças tem produzido importantes deslocamentos e lutas sociais, políticas e culturais (NELSON et al, 1995).
Através dos Estudos Culturais, compreende-se que o processo de colonização e as relações de poder são as causas do monoculturalismo do currículo, assim um currículo aberto a novas culturas e novos saberes deve criar condições para que a escola discuta a história, a epistemologia e as relações de poder que envolvem diferentes tipos de conhecimento (PERRELI, 2008).
O Currículo
Algumas escolas possuem a tendência de homogeneizar e normalizar as relações através de seus padrões de funcionamento. A preocupação com a forma de acolher as minorias e a diversidade está presente no texto de SACRISTAN (1995) que defende um currículo multicultural onde a escolha do que se é ensinado dentro das instituições de ensino passem pela aprovação de toda a comunidade envolvida no processo. Esses conhecimentos devem privilegiar os conhecimentos de todos, inclusive das minorias para que seus interesses sejam representados. A escola como projeto aberto deverá privilegiar o dialogo e a comunicação entre vários grupos sociais.
Afirmando que o currículo “é sempre o resultado de uma seleção: de um universo mais amplo de conhecimentos e saberes, seleciona-se aquela parte que vai constituir, precisamente, o currículo” SILVA (2004, p.15), continua sua assertiva afirmando que as teorias do currículo, após decidirem quais conhecimentos devem ser selecionados, procuram justificar porque “esses”, e não “aqueles”, foram os escolhidos.
Há quem afirme que o currículo é “neutro”, porém, como nos alerta SOUZA (2008), essa afirmativa deixou de ser validada a partir de estudos e discussões densas e críticas a respeito deste tema. Estudos comprovam que toda ação pedagógica tem uma intenção, e sendo assim, a escolha dos conteúdos que dele farão parte não deixa de ser uma escolha política, está marcada pela luta de interesses, o que contribui para a formação das representações que os alunos tem a respeito da escola e conseqüentemente podemos afirmar, da Educação Física Escolar.
Segundo SACRISTÁN (2000, p.16), “as funções que o currículo cumpre como expressão do projeto de cultura e socialização são realizadas através de seus conteúdos, de seu formato e das práticas que cria em torno de si”. Se pensarmos o currículo desta forma, entenderemos que não podemos ficar restritos ao produto final e sem interligar todos os objetivos que fazem parte de sua construção. A partir deste pensamento, podemos fazer uma relação com a afirmação de que o saber é cultural, e se constitui pela interação com outras pessoas pertencentes a nossa cultura, assim, ele se transforma a partir da troca de experiências e da reflexão coletiva.
De acordo com SILVA (2004, p.22), “o currículo é um lugar, um espaço, um território fértil para as lutas ideológicas”, e partindo desta afirmação, inferimos que se há estagnação do currículo, conseqüentemente não existe essa luta, ou seja, perpetuamos as práticas hegemônicas e abrimos mão de validar as vozes dos subjugados. O autor continua sua reflexão afirmando que o currículo é um “documento de identidade”, sendo assim, se compactuarmos com a concepção de um Currículo Multicultural, onde os diversos sujeitos do processo são respeitados e valorizados, compactuaremos com uma concepção onde tudo o que compõe esse currículo deveria estar “recheado” dos saberes daquela comunidade na qual a escola está inserida.
Considerações finais
Não podemos negar que esse processo é relativamente árido e depende de vários fatores. A ruptura da hegemonia que afirma serem alguns conhecimentos produzidos pela humanidade mais valiosos que outros não ocorre do dia para a noite. A inserção de manifestações culturais próprias das camadas mais populares no currículo depende de vários fatores, inclusive da validação dos saberes dessas pessoas. Como afirmam MOREIRA e CANDAU (2003), diante dessa nova configuração de “escola”, podemos constatar vários tipos de desconforto, conflitos gerados tanto pelos educadores quanto pelos alunos.
No mesmo texto a autora cita o “arco-íris cultural” como contradição ao “daltonismo cultural”, ressaltando que hoje se faz necessário “uma perspectiva que leve em conta a riqueza decorrente da existência de diferentes culturas no espaço escolar.” (p.161)
Defendendo uma pedagogia critica como forma de luta cultural, GIROUX & McLAREN (1995), apontam seus argumentos para uma direção na qual essa forma cultural onde os principais atores não são apenas aqueles que trabalham nas escolas, mas sim, todos aqueles trabalhadores que atuam na esfera cultural. Sendo assim, os autores defendem que é responsabilidade de todos esses trabalhadores, contribuir para a multiplicação dos locais de luta democrática onde o principal objetivo seja a melhora da vida no planeta, através de práticas pedagógicas que visem uma política democrática e transformativa.
Assim, se torna importante a construção de um espaço pedagógico híbrido onde os estudantes tenham oportunidade de validar seus conhecimentos e suas produções, suas identidades individuais para que encontrem significado na expressão coletiva e na solidariedade com outros trabalhadores culturais.
Referências bibliográficas
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GIROUX, H. A. e McLaren, P. L. Por uma pedagogia crítica da representação In: SILVA, T. T e MOREIRA, A. F. B. (Orgs.) Territórios contestados: o currículo e os novos mapas políticos e culturais. Petrópolis: Vozes, 1995.
GUSMÃO, N. M. M. Antropologia, Estudos Culturais e Educação: desafios da modernidade. Proposições. Vol. 19, n°3, p. 47-82. 2008.
MENDES, C. L. Currículo cultural e as ressignificações do público e do privado. In: REUNIÃO ANUAL DA ANPED, 23. Programa e resumos. Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação, 2000. p.149-150.
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NELSON, C.; TREICHLER, P. A. e GROSSBERG, L. Estudos Culturais: uma introdução. In: SILVA, T. T. (Org.) Alienígenas na sala de aula: uma introdução aos Estudos Culturais em Educação. Petrópolis: Vozes, 1995.
PERRELI, M. A. S. “Conhecimento Tradicional” e Currículo Multicultural: Notas com Base em uma Experiência com Estudantes Indígenas Kaiowá/Guarani,, Ciência & Educação, v. 14, n. 3, p. 381-96, 2008.
RUBIO, K. NUNES, M. L. F. Os currículos da Educação Física e a constituição da identidade de seus sujeitos. Currículo sem Fronteiras, v.8, n.2, pp.55-77, Jul/Dez 2008 .
SACRISTÁN, J. G. Currículo e diversidade cultural. In: SILVA, T. T e MOREIRA, A. F. B. (Orgs.) Territórios contestados: o currículo e os novos mapas políticos e culturais. Petrópolis: Vozes, 1995.
_______________. O currículo: uma reflexão sobre a prática. 3ªed. Porto Alegre: ArtMed, 2000.
________________. O significado e a função da educação na sociedade e na cultura globalizadas. In GARCIA, Regina, L. MOREIRA, Antonio, F, B. (orgs). Currículo na contemporaneidade: incertezas e desafios. São Paulo: Cortez, 2003.
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_____________________. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.
_____________________. Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais/Thomaz Tadeu da Silva (org). Stuart Hall, Kathryn Woodward. 8 ed.- Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.
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