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Jogos e brincadeiras populares com o Grupo de Capoeira Cara

de Lata: temas transversais na busca pela pluralidade cultural

Juegos populares y actividades con el Grupo de Capoeira Cara de Lata: temas transversales en la búsqueda de la pluralidad cultural

 

* Licenciada em Letras pelas Faculdades Integradas Campograndenses (FEUC/RJ)

Pós-graduando em Língua Portuguesa pelas FEUC/RJ

Discente da graduação em Educação Física da Universidade Castelo Branco (UCB/RJ)

**Discentes da graduação em Educação Física da UCB/RJ

***Co-orientador. Mestrando em Educação pelo

Programa de Pós-graduação em Educação (Proped) da

Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)

Licenciado em Educação Física pela UCB/RJ

Monitor da UCB/RJ

Agência de fomento: FAPERJ

****Orientador. Mestre em Ciência da Motricidade Humana pela UCB/RJ

Licenciado em Educação Física pela UCB/RJ

Docente da UCB/RJ

(Brasil)

Debora Acciolly* | Amanda Feital**

deboraaccioly@hotmail.com | amanda.feital@hotmail.com

Rejane Almeida**

nani_4645@hotmail.com

André Souza**

dezao_dezao@hotmail.com

Alexandre Tadeu**

vss.amorim@hotmail.com

Rafael Valladão***

rafael-valladao@hotmail.com

Sérgio Tavares****

sergiof.tavares@hotmail.com

 

 

 

 

Resumo

          Neste artigo trata-se da temática da Pluralidade Cultural através dos jogos e brincadeiras populares tendo como público alvo um grupo de quinze crianças entre oito e doze anos, praticantes de capoeira e moradores da comunidade da Vila Vintém, Zona Oeste do Rio de Janeiro. Aborda-se também a importância do professor trabalhar esse tema transversal desde a infância para aumentar as chances de formar um indivíduo apto a respeitar e valorizar a diversidade cultural que compõe nosso país.

          Unitermos: Pluralidade cultural. Jogos e brincadeira populares. Capoeira.

 

Abstract

          In this article it is the subject of Cultural Plurality and play through the games popular with target audience is a group of fifteen children between eight and twelve years, capoeira practitioners and community residents of the Vila Vintém in the western zone of Rio de Janeiro. It also discusses the importance of teacher work this crosscutting theme since childhood to increase the chances of forming an individual capable of respecting and valuing cultural diversity that makes up our country.

          Keywords: Cultural plurality. Popular games and play. Capoeira.

 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 15 - Nº 146 - Julio de 2010

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Introdução

    Já há algum tempo, no âmbito da educação de modo geral tem-se discutido muito a questão dos temas transversais e da importância de fazer com que representem muito mais que uma teoria, isto é, que possam de fato fazer parte da prática pedagógica de todos os professores independente da disciplina lecionada. No contexto da Educação Física, não é diferente, porém, observa-se que muitos professores ainda sentem certa dificuldade em transpor a teoria para prática, nesse sentindo esse trabalho busca exemplificar como é possível concretizar a proposta dos PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais) quer no âmbito escolar ou em projetos sociais.

    A fim de delimitar o tema dessa pesquisa optar-se-á por apenas um dos temas transversais, a pluralidade cultural que será discutida levando-se em consideração o universo infantil de um grupo de quinze crianças de oito a doze anos, moradores da comunidade da Vila Vintém, Zona Oeste do Rio de Janeiro e pertencentes ao grupo de capoeira Cara de lata, liderado pelo mestre Sapucaia. Ao optar por esse tópico tem-se em vista as diversas formas de convivência humana, que muitas vezes ocorrem de maneira violenta, o que aponta a necessidade de rever o desenvolvimento da aprendizagem da vida em conjunto.

    O tema escolhido está relacionado à intensa diversidade cultural que compõe nosso País e de toda carga de preconceito e discriminação que ainda assombra nossa sociedade e que de acordo com Medina (2007) é vestígio de todo um processo de colonização baseado em um sistema de exploração, por essa razão, ao tratar de educação é importante fazer com que a criança perceba e entenda a pluralidade cultural através de diferentes vivências. A questão é, tendo em vista a ludicidade que compõe o universo infantil, numa sociedade cada vez mais influenciada pelo apelo da indústria cultural, como lembra Ramos (2005) será que as crianças ainda têm oportunidade de explorar a diversidade cultural através dos jogos e brincadeiras?

    Esta pesquisa justifica-se pela relevância de oportunizar as crianças experiências de convívio com a pluralidade cultural para que tenham mais chances de se tornarem adultos capazes de respeitar a diversidade de culturas que compõem o Brasil, um país multifacetado. Não se trata, contudo, apenas da questão do respeito à diversidade, mas da construção do conhecimento identidade nacional de maneira lúdica, como deve ser as atividades voltadas para crianças, levando-as desde já a construir uma consciência crítica sobre as várias culturas que formam nossa sociedade percebendo-se inclusive como produtora de cultura (Lara et al, 2005).

    Esse trabalho encontra-se organizado em um primeiro tópico que trata do tema da pesquisa e de outros dois itens que englobam respectivamente a questão da pluralidade cultural dos jogos e brincadeiras e a relação com a criança, o segundo tópico consiste na metodologia aplicada, e no terceiro tópico aborda-se a análise dos dados obtidos com pesquisa de campo, descritiva que juntamente com o referencial teórico adotado dará sustentação ao texto.

Concepção de Pluralidade Cultural

    Os PCNs (BRASIL, 2000) afirmam que a pluralidade cultural, um dos temas transversais, refere-se ao conhecimento e a valorização das diferenças étnicas e culturais que caracterizam cada grupo no território nacional, às desigualdades socioeconômicas e à crítica às relações sociais que evidenciam discriminação.

    Esse tema propõe uma concepção cujos objetivos são o respeito pela diversidade étnica e cultural, o entendimento das desigualdades socioeconômicas e a necessidade de modificação do quadro de discriminação e preconceito, oferecendo aos alunos condições de conhecer nosso país como ele realmente é multifacetado.

    Cabe ainda ressaltar a relevância de conhecer a distinção entre diferenças culturais e diferenças sociais, a primeira é fruto das peculiaridades que caracterizam cada grupo; a segunda é produzida na relação de dominação e exploração socioeconômica e política. Essa relação de dominação e exploração, ou seja, relação de poder, faz com que a desigualdade social aliada à discriminação resulte no que se convencionou chamar “exclusão social” ou como classifica Medina (2007, p.84) “fenômeno da marginalidade.

    A Pluralidade Cultural enquanto tema transversal propõe então, a atuação sobre um dos mecanismos de discriminação e exclusão que impedem a garantia do direito à cidadania para todos.

    O primeiro passo, portanto, é reconhecer criticamente a complexidade que envolve a problemática social, cultural e étnica. Nesse sentido a escola tem uma importância fundamental, pois é nesse espaço que convivem estudantes de diferentes origens, religiões, costumes e visões de mundo; é onde se ensinam as regras para o convívio no espaço publico; onde as crianças aprendem conhecimentos sistematizados sobre o país e o mundo, o que favorece discussões sobre as questões sociais.

    Essa proposta demanda uma melhor formação docente, um compromisso político-pedagógico em prol da formação e/ou desenvolvimento do professor e por ser a Pluralidade Cultural uma proposta que trata de um tema amplo ela conta com a contribuição de diferentes conhecimentos para poder atuar no âmbito escolar. Nesse sentido, os conhecimentos éticos são fundamentais para a superação do preconceito e da discriminação, além dos conhecimentos jurídicos, históricos e geográficos, sociológicos, antropológicos, populacionais, psicológicos, psicopedagógicos e as diferentes linguagens e representações.

    Esse tema transversal postula que:

    (...) pluralidade vive-se, ensina-se e aprende-se. É trabalho de constatação, no qual o envolvimento de todos se dá pelo respeito e pela própria constatação de que sem o outro, nada se sabe sobre ele, a não ser o que a própria imaginação fornece (BRASIL, 2000, p. 141).

    Fica clara então, a importância da escola no desenvolvimento dessa proposta, assim como o papel do professor na formação do aluno, um papel que vai além do desenvolvimento cognitivo, mas um desenvolvimento para o exercício da cidadania.

    Esse exercício implica em mudança de hábitos, comportamento, valores e pensamentos, o professor deve através desse tema transversal levar o aluno a valorizar as diferenças com expressão da diversidade, isso é fundamental para a formação da identidade nacional. Para tal é preciso que as relações sociais e interpessoais sejam baseadas na ética, ou seja, acima de tudo é preciso haver respeito.

    Segundo autores como Araújo (2003) a instrução e a formação ética dos futuros cidadãos são os dois objetivos centrais da Educação. E o Ministério da Educação e Cultura, através de suas diretrizes e legislações próprias reconhecem a importância dessa formação e estabelece os “temas transversais” (ética, pluralidade cultural, meio ambiente, saúde, educação sexual e consumo e trabalho) sendo a ética o eixo norteador.

    De acordo com os PCNs (BRASIL, 2000) a educação para a cidadania subjaz uma reflexão dos alunos acerca das questões sociais, buscando um tratamento didático que contemple sua complexidade e dinâmica, dando lhe a mesma importância das áreas convencionais, o que não significa que o professor deva dar aulas de temas transversais, e sim incluí-los no processo de aprendizagem com a mesma relevância.

    Ligando a área da Educação Física aos temas transversais, segundo o Coletivo de Autores (1992), essa reflexão é necessária se o objetivo do professor for possibilitar ao aluno da escola pública o entendimento da realidade social na qual está inserido interpretando-a a partir de seus interesses de classe social. “Nesse sentido o corpo o próprio homem e como tal não pode ser somente um objeto, mas sim o sujeito, o produtor e o criador da história” (MEDINA, 2007, p. 24).

    Talvez ainda seja difícil para o professor de Educação Física aplicar os temas transversais em suas aulas, mas já existem autores que comprovam a viabilidade dessa aplicação, basta que como educadores estejamos abertos a reflexão e sejamos coerentes com o paradigma de Educação Física atual a fim de afastarmo-nos de práticas tradicionais que visam o aprendizado automatizado e não reflexivo.

Os jogos, as brincadeiras e a educação

    Ao pesquisar a questão dos jogos e brincadeiras é possível encontrar autores que definem esses termos em caráter diferencial, nesse trabalho essa distinção não é relevante, pois está-se considerando aqui, a brincadeira seja em seu aspecto livre ou sob a configuração de jogo (com regras) como meio de manifestação da pluralidade cultural no universo infantil.

    As crianças de hoje, sobretudo, as dos grandes centros urbanos já não são mais como as de antigamente, que brincavam descalças nas ruas até o anoitecer, hoje, seu modo de brincar vem sendo alterado por fatores como a violência, e a influência da indústria cultural. Como afirma Esteban Levin (2005), em entrevista a Revista Nova Escola:

    (...) cada vez mais as crianças estão tendo preocupações que deveriam ser dos mais velhos, como ter sucesso e bom desempenho. Pessoalmente, acredito que a infância não acabou, mas está mudando radicalmente. As crianças de hoje não são as mesmas estudadas por Jean Piaget ou qualquer outro teórico da educação ou da pediatria
(p. 25).

    Assim também, Ramos (2005) postula que a criança vem sofrendo influências dos meios de comunicação na sua formação cultural introjetando valores restritos de uma cultura erótica e tecnológica, esse fator acarreta a perda de referências educativas do jogo e da brincadeira condenando-as a uma condição de alienação e consumismo. Em uma sociedade globalizada essa questão da indústria cultural e bem evidente e na infância ela se dá de maneira ainda mais marcante, visto que as crianças estão se iniciando no processo de socialização e são mais suscetíveis ao seu apelo.

    Nesse sentido, o papel do professor, principalmente o de Educação Física é de suma importância, pois é ele o profissional mais preparado para trabalhar com os jogos e brincadeiras de maneira coerente com a faixa etária, o gênero e a sociedade das crianças, explorando os aspectos psicomotores, sociais e culturais assim como a questão da pluralidade cultural.

    Os jogos populares, de movimento, cirandas, amarelinhas e muitos outros, são importantes fontes de pesquisa. Essas manifestações populares devem ser valorizadas pelo professor e estar presentes no repertório dos alunos, pois são partes da riqueza cultural dos povos, constituindo importante material para a aprendizagem (FISCHMANN, 2002, Artes).

    Os profissionais de Educação Física podem desenvolver com facilidade, desde que tenham comprometimento e conhecimento do assunto, um trabalho que busque através de situações lúdicas gerar não apenas o conhecimento de culturas mais também a valorização da diversidade que compõe a identidade nacional, seja em projetos sociais ou no âmbito escolar. Trata-se de um trabalho com atividades diversificadas, prazerosas que podem ser em grupo ou individual, planejadas ou resultado de escolha livre, cabe ao professor observar a diversidade cultural e lançar mão de diferentes estratégias para seus objetivos, atendo a questão de que as diferenças podem favorecer o crescimento individual de cada aluno. Segundo Vygotsky:

    Todos conhecemos o grande papel que nos jogos da criança desempenha a imitação, com muita frequência estes jogos são apenas um eco do que as crianças viram e escutaram aos adultos, não obstante estes elementos da sua experiência anterior nunca se reproduzem no jogo de forma absolutamente igual e como acontecem na realidade. O jogo da criança não é uma recordação simples do vivido, mas sim a transformação criadora das impressões para a formação de uma nova realidade que responda às exigências e inclinações da própria criança (1999, p.12).

    Essa colocação mostra a importância de o professor proporcionar ao aluno experiências variadas e com diferentes abordagens, chamando sempre atenção para a pluralidade cultural para que eles tenham mais chances de compreender e transformar o preconceito em valorização e respeito ao que é diferente.

A criança e a Pluralidade Cultural

    Na infância a criança dá início a formação do que será a sua personalidade, isto porque ela está aberta a influência dos diversos grupos dos quais participa, por exemplo, a escola, a igreja e principalmente a família, instituições das quais ela incorpora hábitos e maneiras de pensar e agir. Nesse sentido, a escola tem um papel importante pois pode proporcionar a criança um espaço no qual ela seja levada a pensar e agir de maneira reflexiva, sendo muitas vezes necessário que o professor a ponha em choque com as convicções deturpadas que ela traz por influência familiar, como por exemplo o preconceito, muito comum nas aulas de Educação Física.

    No âmbito educacional, a escola destaca-se como um espaço de intensa manifestação da diversidade cultural que caracteriza muito bem o nosso país, porém, isso nem sempre é bem explorado, muitas vezes os professores não conseguem transpor a Pluralidade Cultural da teoria para sua prática pedagógica, perpetuando um modelo de Educação Física ultrapassado e desproporcional a concepção de cultura corporal abordada nos PCNs. A esse respeito, Ruy e Ramos (2007) realizaram uma pesquisa com professores de Educação Física e verificaram além dessa dificuldade em transpor a teoria para prática, professores que concebiam os Temas Transversais como conteúdos a serem ensinados de maneira isolada e teórica, portanto de difícil aplicação na prática da Educação Física, o que não corresponde a proposta dos PCNs (BRASIL, 2000) :

    Não constituem novas áreas, mas antes um conjunto de temas que aparecem transversalizados nas áreas definidas, isto é, permeando a concepção, os objetivos, os conteúdos e as orientações didáticas de cada área, no decorrer de toda a escolaridade obrigatória. A transversalidade pressupõe um tratamento integrado das áreas e um compromisso das relações interpessoais e sociais escolares com as questões que estão envolvidas nos temas, afim de que haja uma coerência entre os valores experimentados na vivência que a escola propicia aos alunos e o contato intelectual com tais valores (p.64).

    A pesquisa acima mencionada foi realizada há apenas três anos atrás, pode-se, portanto, ser considerada relativamente recente, sobretudo por se tratar da área educacional, onde as mudanças ocorrem em geral de maneira lenta e por isso, é plausível ainda hoje usá-la para reafirma o que foi dito anteriormente mostrando a necessidade de uma mudança na concepção dos professores dessa área em prol de uma educação de qualidade que atenda as necessidades de nossa sociedade.

    Considerando-se a criança como um ser predominante lúdico, nesse artigo defende-se a utilização dos jogos e brincadeiras populares como uma boa alternativa para trabalhar a questão dos temas transversais, neste caso a pluralidade cultural, visto que essa escolha favorece o conhecimento e o respeito das diversas formas culturais e das pessoas que as incorporam, afinal, como afirmam os PCNs (BRASIL, 2000) esses elementos de transversalidade possibilitam não apenas o reconhecimento de culturas, mas também a valorização destas através de situações lúdicas e prazerosas.

    Diante dessas considerações supõe-se que quanto maior a exposição das crianças à situações lúdicas e prazerosas que proporcionem o convívio com diferentes culturas e a reflexão crítica sobre tais diferenças com repúdio a todo e qualquer tipo de preconceito ou discriminação maior será as chances de se formar um cidadão aberto as novas formas de cultura, apto a desfrutá-las e respeitá-las. Tomando-se como prática da cidadania, segundo Rubio e Daolio (1997), algo que perpassa pela apropriação da consciência e do corpo como condição essencial para a saída de um estado de alienação e o estabelecimento de uma relação com o social de forma crítica, plena e construtiva.

Metodologia

    Para a realização da pesquisa descritiva com delineamento de estudo de campo e observação participativa ocorreu um levantamento de dados que se consistiu de um diagnóstico do conhecimento dos participantes com relação aos jogos e brincadeiras populares. Nesse primeiro encontro, os pesquisadores observaram o trabalho desenvolvido pelo mestre Sapucaia, professor de capoeira na Vila Olímpica Mestre André (Vila Vintém, RJ) e responsável pelo grupo de capoeira Cara de Lata, grupo com o qual foi realizada a pesquisa; num segundo encontro com o grupo, realizou-se a aplicação do questionário diagnóstico.

    Numa segunda etapa, após a análise dos dados obtidos, foi proposto aos alunos a prática de jogos e brincadeiras populares, tais como amarelinha, pau na lata, pula corda, pula elástico, rua e calçada (variação de vivo ou morto), polícia e ladrão entre outras e ainda, a confecção de brinquedos com material de sucata (vai e vem, sapato de lata, telefone de lata, pião, etc), Essa intervenção ocorreu em dois encontros e objetivou não apenas a prática, mas também o conhecimento sobre a origem dessas atividades e a possibilidade de diversão com brinquedos não subordinados a influência da indústria cultural.

    A terceira etapa foi feita em um encontro e consistiu na aplicação de um novo questionário a fim de verificar possíveis interferências do trabalho desenvolvido pelos pesquisadores e após a obtenção dos dados, foram gerados gráficos para melhor exposição dos resultados da pesquisa que serão discutidos no tópico a seguir.

    Os instrumentos utilizados nas duas etapas da pesquisa foram questionários elaborados pelos próprios autores desse trabalho e validados por docentes do curso de Educação Física da Universidade Castelo Branco.

Primeiro questionário

    O primeiro questionário é constituído de quatro questões:

1.     Quais brinquedos você tem em casa?

2.     Você costuma brincar ao computador?

3.     Liste os jogos e/ou brincadeiras que você conhece.

4.     Seus pais te ensinaram alguma brincadeira ou jogo?

    Para cada questão foi dada uma pontuação como mostra a tabela abaixo:

Critérios

Pontuações

até 2 brinquedos

1

3 a 4 brinquedos

2

5 ou mais

4

lan house

1

Casa

2

rua

4

até 2 brincadeiras

1

3 a 4 brincadeiras

2

5 ou mais

4

sim

2

não

0

Tabela 1. Critérios de avaliação e pontuação dos pesquisados

    Após feita a contagem dos pontos tirou-se uma média dividindo-se o total de pontos por quatro e o valor obtido foi classificado dentro das categorias conforme mostra a tabela abaixo:

Categorias

Média de pontos

Pouco plural

até 1,99

Razoavelmente plural

2 a 2,99

Plural

3 ou mais

Tabela 2. Categorias de acordo com a média de pontos obtidos

    Convém ressaltar que as três categorias criadas (pouco plural, razoavelmente plural e plural) concernem apenas ao conhecimento sobre os jogos e brincadeiras populares, não sendo, portanto, considerados os de outra categoria como, por exemplo, os tecnológicos.

Segundo questionário

    Esse segundo instrumento contém um total de três questões, duas novas e uma (a segunda) idêntica a questão três do primeiro questionário, dessa forma tem-se as seguintes questões:

1.     Enumere os brinquedos abaixo em ordem crescente de acordo com o que você considera mais divertido.

2.     Liste os jogos e/ou brincadeiras que você conhece.

3.     Imagine que você está com seus colegas e só você pode decidir como vocês irão se divertir. Pense e escreva qual seria a sua sugestão.

    Cabe mencionar, que na questão 1 (um), os entrevistados tinham dez itens, sendo uma metade de brinquedos subordinados à influência da indústria cultural (carrinho de controle remoto, boneco (a), mini game, vídeo game e computador) e a outra não subordinada (pipa, peteca, bola de gude, vai e vem e corda).

    Quanto aos critérios adotados para a pontuação pode-se verificar na tabela abaixo:

Critérios

Pontuações

até 2 brinquedos

0

3 a 4 brinquedos

1

5 brinquedos

2

até 2 brincadeiras

1

3 a 4 brincadeiras

2

5 ou mais brincadeiras

4

jogos eletrônicos

0

1 jogo ou brincadeira

1

Tabela 3. Critérios de avaliação e pontuação dos pesquisados

    Assim como na pesquisa diagnóstica a partir da contagem dos pontos tirou-se uma média dividindo o total de pontos obtidos por três para a classificação dentro das categorias de acordo com a tabela a seguir:

Categorias

Média

Pouco plural

até 1,49

Razoavelmente plural

1,5 a 2

Plural

2,1 até 2,33

Tabela 4. Categorias de acordo com a média de pontos obtidos

Análise dos dados da pesquisa

    No primeiro questionário, a primeira pergunta tinha como objetivo verificar a influência da indústria cultural na maneira de brincar das crianças no que se refere aos brinquedos. Por essa razão não foram pontuados os brinquedos tecnológicos. Nessa questão observou-se a seguinte informação: mais da metade dos entrevistados possuíam até dois brinquedos (53%), enquanto apenas 7% relataram ter mais de cinco brinquedos, um dado até esperado tendo em vista o baixo poder aquisitivo da comunidade da Vila Vintém.

    Na segunda questão, o objetivo era verificar uma possível relação entre o nível de pluralidade cultural (com relação aos jogos e brincadeiras infantis) e o local onde as crianças brincavam, supondo-se que as crianças que brincam na rua têm maior probabilidade de conhecer mais jogos e brincadeiras. Contudo, essa hipótese não foi plenamente confirmada, visto que 67% das crianças relataram brincar na rua, mas nem por isso, demonstraram um considerável conhecimento sobre o assunto.

    Nota-se na terceira questão o que já foi mencionado acima, ou seja, boa parte das crianças (47%) mencionou até duas brincadeiras, outros 40% de três a quatro brincadeiras e apenas 13% demonstrou conhecer mais de cinco.

    Cabe ressaltar que muitos dos alunos relataram como brincadeira as diversas variantes do pique (pique-ajuda, pique-tá, pique-alto, pique-corrente etc.), o que supõe ser a principal atividade recreativa praticada na rua, mas que não foi considerado como brincadeiras diferentes, e sim variantes de uma mesma atividade, portanto, não pontuadas pela pesquisa.

    Na quarta questão, pretendia-se verificar a relação entre o conhecimento passado de pais para filhos e os jogos e brincadeiras praticados pelos entrevistados. E observou-se um total de 73% de entrevistados que relataram não ter aprendido nenhum tipo de jogos e/ou brincadeiras com os pais. Levando-se em conta o fato de que essas atividades são patrimônios culturais, de uma determinada comunidade, aprendidas e ensinadas de geração para geração, logo, confirma-se a hipótese de que se os mais velhos não ensinam, as crianças apresentam um repertório cada vez menor, o que justificaria os percentuais obtidos na questão dois, na qual 67% dos alunos relataram brincar na rua sem, no entanto, possuir um grande repertório de jogos e brincadeiras; justificaria ainda, o grande quantitativo de variantes de piques relatados pelas crianças na questão três, tendo em vista que o ato de correr é um tipo de comportamento típico da criança devido a sua grande concentração de energia.

    Após o resultado final dessa pesquisa e de acordo com os critérios de classificação pode-se observar o percentual obtido para cada categoria:

Gráfico 1. Percentual obtido para cada categoria

    No pós-teste, na primeira questão o objetivo era verificar possíveis alterações na concepção dos entrevistados no que concerne ao que eles consideravam como brinquedos divertidos. Obteve-se como resultado que do total de crianças entrevistadas 67% enumeraram entre os cinco brinquedos mais divertidos, até dois brinquedos considerados como não influenciados pela indústria cultural; 20%, de três a quatro brinquedos e 13%, cinco brinquedos. Considerando que havia nessa questão dez opções de brinquedos pode-se concluir que essas crianças sofrem sim influência da indústria cultural apesar do baixo poder aquisitivo da comunidade.

    Na segunda questão, que corresponde à questão três do questionário de diagnóstico, pode-se comparar os percentuais obtidos e verificar que houve uma alteração significativa no repertório de conhecimento sobre as brincadeiras praticadas pelos entrevistados, de forma que o percentual de 13% dos que demonstraram saber mais de cinco brincadeiras, no primeiro teste, aumentou para 73%, o que supõe ser uma influência da intervenção sofrida por esse grupo.

    Na questão três é possível verificar que diante da possibilidade de decidir como se divertir com os colegas, 93% das crianças optaram por jogos e brincadeiras populares em detrimento às opções industrializadas como computador ou vídeo game.

    Com todos os dados tabulados de acordo com os critérios estabelecidos no pós- teste, respeitadas as categorias anteriormente criadas, verifica-se no gráfico a seguir o percentual de crianças por categoria:

Gráfico 2. Percentual de crianças por categoria

Observação participativa dos pesquisadores

    Durante os encontros com o grupo Cara de Lata e o mestre Sapucaia, os autores dessa pesquisa vivenciaram de perto uma rica experiência com a cultura afro-brasileira. O mestre Sapucaia mostrou-se um verdadeiro mestre na arte da capoeira como forma de manifestação da cultura corporal. O trabalho por ele desenvolvido não se restringe a prática da capoeira por si só, mas a uma constante busca pela inclusão social e pela formação da cidadania, além do jogo, ele proporciona aos alunos debates, reflexões, danças como maculelê, samba de roda, boi bumba, dramatizações populares como a puxada de rede, a confecção e utilização dos instrumentos musicais e ainda o conhecimento histórico e artesanal em seu ateliê de arte africana e é por toda essa sua rica história que esse mestre em cidadania é constantemente convidado pela Universidade Castelo Branco, em Realengo, para enriquecer a formação cultural e acadêmica dos discentes dessa instituição.

    Esse é um exemplo de trabalho social merecedor de mais apreço e investimento do governo e de toda a sociedade. Em uma comunidade de baixo poder aquisitivo como a Vila Vintém, onde as pessoas vivenciam cotidianamente, desde a infância, a face cruel da violência e do tráfico de drogas, trabalhos como esses que aliam a prática do esporte, da dança, da Arte e dos jogos e brincadeiras podem fazer a diferença na vida da comunidade.

Considerações finais

    Tomando-se por base a pesquisa realizada para o desenvolvimento desse trabalho além dos referencias teóricos aqui adotados chega-se a esse ponto com evidências que permitem reafirmar o que já havia sido dito com relação à importância de oportunizar às crianças, ao longo de seu desenvolvimento, experiências que lhes permitam algo além do lúdico e prazeroso, isto é, que as conduzam ao respeito e a valorização das diferenças socioculturais de forma que tenham mais chances de se tornarem adultos conscientemente críticos e capazes de valorizar a identidade nacional como ela é, plural.

    Essa pesquisa serve como um alerta aos professores de Educação Física para que estejam atentos a importância de inserir os temas transversais não só a pluralidade cultural, na dinâmica das suas práticas pedagógicas transpondo a teoria abordada nos Parâmetros Curriculares Nacionais para a prática, buscando fazer do seu trabalho algo mais que um ensino de técnicas, isto é, criar situações que levem as crianças a formarem-se como cidadãos. Nesse trabalho destacou-se os jogos e brincadeiras como elementos de transversalidade, na busca da pluralidade cultural, mas há possibilidade de utilização de outros elementos e isso deve ser explorado através de experiências diversificadas.

    Com uma pequena intervenção foi possível verificar o quanto o profissional de Educação Física pode influenciar no comportamento das crianças, visto que a pesquisa foi baseada na atuação de universitários desse curso. Cabe ressaltar que tal intervenção realizou-se em um curto período, por isso, a alteração no comportamento dos participantes foi pequena, porém já aponta a possibilidade de se obter bons resultados por meio de um trabalho contínuo em projetos sociais e/ou nas próprias aulas de Educação Física, desde que os profissionais da área tenham o compromisso de desenvolver uma prática pautada na concepção abordada nos PCNs para os quais o corpo não é concebido apenas no seu aspecto biofisiológico, mas como um meio de manifestação da cultura corporal.

Referências bibliográficas

  • ARAÚJO, U. F. Apresentação à edição brasileira. In: BUSQUET, M.D. et. al.. Temas transversais em educação: base para uma formação integral. Trad. Cláudia Shilling. 6. ed. São Paulo: Ática, 2003a. Apresentação, p. 9-17.

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  • FISCHMANN, R. (Coord.) Pluralidades nas escolas (Pluralidade para formação de professores). Osasco: Plural/ Fundação Bradesco, 2002. (CD- ROM).

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  • LEVIN, Esteban. O corpo ajuda o aluno a aprender. In: Revista Nova Escola, São Paulo. Vol. 01, n 179, p. 25, jan/fev. 2005.

  • MEDINA, J. P. Sabirá. O brasileiro e seu corpo. 11 ed. São Paulo: Papirus, 2007.

  • RAMOS, J. R da S. Dinâmicas brincadeiras e jogos educativos. 2 ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2005.

  • RUBIO, Kátia, DAOLIO, Josimar. A incorporação da alteridade como caminho para construção da cidadania. In: Congresso Brasileiro de Ciências do Esporte, p.109-103, Goiana, 1997

  • RUY, Clarina R. e RAMOS, Glauco N. S. A prática pedagógica dos professores de Educação Física e suas relações com os Temas Transversais. In. III Colóquio de Pesquisa Qualitativa em Motricidade Humana: o lazer em uma perspectiva latino-americana, 2007, São Carlos. Anais... São Carlos: SPQMH – DEFMH/UFSCar, 2007.

  • VYGOTSKY, L. S. Imaginación y creación en la edad infantil. La Habana: Editorial Pueblo y Educación, 1999.

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