Psicomotricidade aquática e o desenvolvimento psicomotor de crianças com síndrome de Down: relato de dois casos La Psicomotricidad acuática y el desarrollo psicomotor de niños con síndrome de Down: relato de dos casos Psychomotricity aquatic and the psycomotor development as of children Down's syndrome: case reports |
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*Graduada em Fisioterapia UNESP/FCT - Presidente Prudente **Docente do Departamento de Fisioterapia UNESP/FCT - Presidente Prudente (Brasil) |
Carolina de Almeida Borges da Silva* Tânia Cristina Bofi** |
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Resumo O objetivo principal do trabalho foi avaliar a influência da psicomotricidade aquática no desenvolvimento psicomotor de crianças com SD. Participaram do estudo duas crianças de ambos os sexos de nove anos de idade com Síndrome de Down, atendidas no Laboratório de Atividades Lúdico-Recreativas-LAR da FCT/UNESP. Como instrumento de avaliação utilizou-se a Escala de Desenvolvimento Motor (EDM), proposta por Rosa Neto (2001), que avalia as seguintes áreas do desenvolvimento psicomotor: motricidade fina e global; equilíbrio; organização espacial e temporal/linguagem e esquema corporal/rapidez. A escala é composta por uma bateria de testes em que a criança é orientada a realizar algumas tarefas, variando de acordo com sua idade cronológica. Considerando-se os resultados encontrados na primeira avaliação, foi traçado o programa de intervenção, composto por jogos e brincadeiras, sendo usados como materiais: bolinhas, espaguetes, entre outros. A pesquisa foi realizada duas vezes por semana, totalizando 30 sessões. Os resultados demonstraram que as duas crianças obtiveram melhora na organização espacial, com evolução de 12 meses, e em outras áreas individualmente. Nas áreas em que não houve evolução na idade motora, as crianças realizaram as tarefas com melhor desempenho. Através da análise dos resultados, concluiu-se que a intervenção aquática contribuiu para o desenvolvimento psicomotor das crianças envolvidas. Unitermos: Ambiente aquático. Desenvolvimento. Síndrome de Down.
Abstract The main objective of this study was to evaluate the influence of psychomotricity aquatic in psychomotor development of children with Down’s Syndrome. Study participants were two children of both sexes from nine years old with DS, met at the Laboratory of Activities Playful-Recreational - LAR of FCT / UNESP. As an instrument of evaluation was used the Scale of Motor Development (SMD), proposed by Rosa Neto (2001), which assesses the following areas of psychomotor development: global and fine motricity, balance, spatial and temporal organization / language and body schema / speed. The scale is composed of a battery of tests in which the children was oriented to perform some tasks, varying according to their chronological age. Considering the results in the first evaluation, was drawn the intervention program, consisting of games and tricks, and used as materials: balls, spaghetti, among others. The project was carried out twice a week, totaling 30 sessions. The results showed that both children improved their spatial organization, an increase of 12 months and in other areas individually. In areas where there was no change in motor age, the children performed the tasks with better performance. Through analysis of the results, it was concluded that the water intervention contributed to the psychomotor development of children involved.Keywords: Aquatic environment. Development. Down Syndrome.
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 15 - Nº 146 - Julio de 2010 |
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Introdução
A Síndrome de Down (SD) é uma condição genética reconhecida há mais de um século por John Langdon Down, médico inglês que, pela primeira vez, identificou, em 1866, as características de uma criança com a síndrome: um atraso no desenvolvimento das funções motoras do corpo e das funções mentais. Também conhecida por trissomia do 21, é uma alteração genética caracterizada por um cromossomo extra do par 21 acrescido ao par normal, e resulta em alterações físicas e mentais do indivíduo, além do atraso já mencionado. Esta síndrome é considerada uma das mais freqüentes anomalias numéricas dos cromossomos autossômicos e representa a mais antiga causa genética de retardo mental. Pode variar quanto à intensidade e manifestação de fenótipos característicos à síndrome, podendo inclusive, não haver manifestação do mesmo, ou seja, o indivíduo ser portador de trissomia parcial e não manifestar suas principais características físicas.(1,2,3,4)
Além do atraso no desenvolvimento, outros problemas de saúde podem ocorrer na SD: cardiopatia congênita (40%); hipotonia (100%); problemas de audição (50 a 70%); de visão (15 a 50%); alterações na coluna cervical (1 a 10%); distúrbios da tireóide (15%); problemas neurológicos (5 a 10%); obesidade e envelhecimento precoce.(1)
A incidência da SD em recém-nascidos vivos está em torno de 1:600 a 1:800 nascimentos, ou 1,25 a 1,6/1.000.(5)
Alguns dos principais testes de diagnóstico são a amniocentese e a cordocentese. A amniocentese consiste na aspiração transabdominal de uma pequena quantidade de fluído amniótico da bolsa amniótica, que envolve o feto, sendo realizada após 14 semanas de gravidez. É tipicamente aconselhada aos pais perante a probabilidade de deformações genéticas durante a gravidez. A cordocentese é uma punção do próprio cordão para obtenção de elementos para diagnóstico. Porém, somente o exame do Cariótipo é que realmente comprova o cromossoma extra com um número total de 47, como resultante de uma trissomia do cromossomo 21.(5,6,7)
A idade avançada da mãe é um dos fatores causais mais importantes da SD, e a idade paterna (45 a 50 anos ou mais) também pode ser considerada, em menor proporção. (8)
Os indivíduos com SD apresentam certos traços típicos, como: cabelo liso e fino, pregas epicântricas, nariz pequeno e um pouco ‘‘achatado’’, rosto redondo, língua protrusa e hipotônica, dentes pequenos, orelhas pequenas, baixa estatura, pescoço curto e grosso, flacidez muscular, mãos pequenas com dedos curtos, prega palmar única, clinodactilia do 5º dedo das mãos, dedos dos pés curtos, distância aumentada entre o 1º e 2º dedos dos pés, desenvolvimento intelectual mais lento do que as outras crianças.(9,10,11,12)
A SD tem como característica a hipotonia, que interfere nas aquisições do desenvolvimento motor da criança, nas suas habilidades, na interação com o ambiente, retarda ou bloqueia sua exploração, diminuindo ou produzindo déficit de sensações e vivências, dificultando o desenvolvimento cognitivo.(13)
A característica mais freqüente na SD é o atraso mental. O desenvolvimento cerebral é deficiente, assim, ao nascer as crianças apresentam microcefalia. Exames neuropatológicos demonstram que o cerebelo é menor que o normal, sendo este o provável responsável pela hipotonia - um dos sinais mais presentes na SD - pois ele tem como função o controle do equilíbrio e do tônus. Além disso, são documentadas deficiências específicas em áreas que envolvem habilidades auditivas, visuais, de memória e de linguagem. (10,14)
O sistema nervoso da criança com SD apresenta anormalidades estruturais e funcionais. Os estudos de Lúria e Tskvetkova (1964), mais antigos, concluíram existir uma lesão difusa acompanhada de um funcionamento elétrico peculiar no desenvolvimento cognitivo da SD, acarretando em um rebaixamento nas habilidades de análise, síntese e a fala comprometida. Salienta, ainda, dificuldades em selecionar e direcionar um estímulo pela fadiga das conexões. Essas anomalias resultam em disfunções neurológicas, variando quanto à manifestação e intensidade.(15,16)
O desenvolvimento intelectual, que também está inserido no desenvolvimento psicomotor, é o processo pelo qual as estruturas da inteligência se constroem progressivamente, através da contínua interação entre o sujeito e o meio externo. A literatura apresenta informações sobre o desempenho cognitivo de crianças com SD e conclui que, do ponto de vista cognitivo, observa-se um maior comprometimento destas crianças na área da linguagem.(3,10)
Não há dúvidas de que a intervenção precoce tem grande importância na melhora do desenvolvimento de crianças com SD. A estimulação precoce melhora o desempenho neuromotor, a hipotonia muscular e a linguagem.(11)
A psicomotricidade através da reeducação psicomotora visa exercícios que tornam a criança plenamente consciente das atividades que realiza no espaço e no tempo. Tem uma finalidade educativa, pois vai tornar essa criança capaz de gestos coordenados, com habilidade de se locomover no espaço à sua volta de modo harmonioso e ainda a ajuda a conhecer pela visão, audição e tato o mundo que a rodeia.(12)
É essencial que na fase em que há maior independência motora, a criança tenha espaço para correr e brincar e possa exercitar sua motricidade global. A brincadeira deve estar presente em qualquer proposta de trabalho infantil, pois é a partir dela que a criança explora e internaliza conceitos, sempre aliados inicialmente à movimentação do corpo. O trabalho psicomotor deve enfatizar o equilíbrio, a coordenação de movimentos, a estruturação do esquema corporal, a orientação espacial, o ritmo, a sensibilidade, os hábitos posturais e os exercícios respiratórios.(17)
Outra forma de terapia que pode ser utilizada é o meio aquático. A psicomotricidade aquática deve proporcionar o inter-relacionamento entre o prazer e a técnica, através de procedimentos pedagógicos criativos, principalmente sob a forma de jogos, que facultem comportamentos inteligentes de interação entre o indivíduo com o meio líquido visando o seu desenvolvimento, assim, além de atuar nos domínios descritos, também propicia a integração social, afetividade, lazer, recreações, prazer, entre outros aspectos importantes para a formação global de um indivíduo.(19,20)
São vários os benefícios da utilização do ambiente aquático para o tratamento de pacientes com disfunções neurológicas, e todos esses benefícios envolvem a propriedade da água de flutuação. O suporte de flutuação da água oferece alívio do peso, permitindo aos pacientes com fraqueza assumir posturas eretas em um momento mais precoce no seu processo de reabilitação. Essa sustentação torna-se cada vez mais eficaz com profundidade crescente da água.(18)
Na água, ocorre toda uma reaprendizagem postural e motora, sobretudo para as pessoas com algum tipo de deficiência, que em meio aquático têm a possibilidade de trabalhar em três dimensões, além de gozar da condição de igualdade e da sensação de liberdade, permitindo, assim, a otimização de habilidades motoras, diferente do que ocorre em terra.(18)
Este trabalho teve como propósito avaliar o desenvolvimento psicomotor de crianças com SD submetidas à psicomotricidade aquática, utilizando a Escala de Desenvolvimento Motor – EDM.
Metodologia
Participaram do estudo 2 crianças de ambos os gêneros com Síndrome de Down, com idade média de 09 anos de idade. Para participar deste estudo, os responsáveis pelas crianças assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual Paulista, Campus de Presidente Prudente (FCT/Unesp).
Para avaliação do desenvolvimento psicomotor das crianças pré e pós-programa aquático, utilizou-se a Escala de Desenvolvimento Motor (EDM), proposta por Rosa Neto em 2002. A EDM consiste em uma bateria de testes padronizados que avaliam as seguintes áreas do desenvolvimento: motricidade fina; motricidade global; equilíbrio; esquema corporal/rapidez; organização espacial; organização temporal/linguagem e lateralidade.
Os testes foram iniciados a partir da idade cronológica da criança, se a mesma obtivesse êxito em uma prova, o resultado era positivo e registrava-se ‘‘1’’ na folha de resultados; se a prova exigisse habilidade com o lado direito e esquerdo do corpo, era registrado ‘‘1’’ quando houvesse êxito com os dois membros, se a prova tivesse resultado positivo apenas com um dos membros, registrava-se ‘‘1/2’’; se a prova tivesse resultado negativo, se registrava ‘‘0’’ e regredia-se à idade anterior, até que a criança acertasse para partir para o teste da próxima área.
O principal resultado a ser observado é a Idade Motora Geral, pois é através dela que se obtém o atraso motor da criança.
As crianças foram classificadas em uma escala que vai de Muito Inferior a Muito Superior, de acordo com o Quociente Motor Geral (QMG), que é a relação entre a idade motora geral e a idade cronológica da criança.
As crianças foram avaliadas em dois momentos: antes e após 30 sessões do Programa de Psicomotricidade Aquática.
De acordo com os resultados da primeira avaliação do desenvolvimento motor dos sujeitos da pesquisa, foi elaborado um Programa de Atividades Aquáticas em grupo. As atividades do Programa (Figuras 1, 2 e 3) foram baseadas nas dificuldades encontradas na avaliação inicial, realizando exercícios que puderam contribuir para o desenvolvimento das crianças, utilizando jogos e brincadeiras de competição dentro da água. Os materiais utilizados para as atividades foram espaguetes, bolinhas coloridas e brinquedos específicos para o meio aquático. O programa foi realizado duas vezes por semana, com duração de 50 minutos cada sessão, totalizando 30 sessões. As atividades foram desenvolvidas na piscina do Centro de Estudos e Atendimento em Fisioterapia e Reabilitação da FCT/UNESP de Presidente Prudente – SP.
Figura 1- Criança puxando bolinhas espalhadas na piscina com o espaguete
Foto de Borges, C. A
Figura 2. Criança passando por baixo de um circuito
Foto de Borges, C. A
Figura 3. Criança passando por baixo do circuito e pegando uma bolinha no final para colocar em uma caixa
Foto de Borges, C. A
Figura 4. Criança buscando bolinhas sentada à cavalo no espaguete
Foto de Borges, C. A
Obs: Os responsáveis assinaram o Termo de Consentimento de Imagem
Resultados
Os resultados foram analisados de forma quantitativa, comparando os dados obtidos das avaliações inicial e final do desenvolvimento motor de cada criança, sendo caracterizadas individualmente.
As crianças obtiveram resultados positivos nas avaliações da escala EDM. Em algumas áreas, tiveram um aumento de 12 meses nos testes, e nas áreas em que não houve evolução na idade motora, realizaram com melhor desempenho as tarefas propostas pela escala. Entretanto, não utilizamos nenhum instrumento para mensurar os ganhos qualitativos.
A criança 1, do sexo feminino, de 9 anos de idade, obteve resultados positivos comparando-se as avaliações pré e pós - intervenção. Sua idade motora aumentou nas áreas motricidade fina e organização espacial, e manteve-se constante na motricidade global, equilíbrio, esquema corporal/rapidez e organização temporal/linguagem, porém ela realizou as atividades propostas pela escala com melhor desempenho após a intervenção.
A tabela 1 ilustra o avanço da idade motora da criança 1 nas duas avaliações, antes e após as 30 sessões de intervenção. Evoluiu em 12 meses na idade motora na motricidade fina e na organização espacial.
A criança 1 avançou 4 meses na idade motora e 5 meses na idade cronológica, e, apesar de um aumento maior na idade cronológica em relação a motora, o avanço motor é considerado um aspecto positivo.
A criança 2, do sexo masculino, de 9 anos de idade, obteve melhora comparando-se as avaliações pré e pós - intervenção. Sua idade motora aumentou nas áreas motricidade global e organização espacial, e manteve-se constante na motricidade fina, equilíbrio, esquema corporal/rapidez e organização temporal/linguagem, porém realizou as atividades propostas pela escala com melhor desempenho após a intervenção.
A tabela 2 ilustra o avanço da idade motora da criança 2 nas duas avaliações, antes e após as 30 sessões de intervenção. A criança evoluiu em 12 meses na idade motora na motricidade global e na organização espacial.
A criança 2 avançou na idade cronológica 5 meses, e na idade motora 4 meses, e, assim como a criança 1, apesar de um aumento maior na idade cronológica em relação à motora, o avanço motor é considerado um aspecto positivo.
IM1: idade motora na Motricidade Fina; IM2: idade motora na Motricidade Global; IM3: idade motora no Equilíbrio; IM4: idade motora no Esquema Corporal/Rapidez; IM5: idade motora na Organização Espacial; IM6: idade motora na Organização Temporal/Linguagem. (Dados para tabelas 1 e 2)
Tabela 1. Comparação entra as idades motoras (em meses) na primeira e segunda avaliações da criança 1
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IM1 |
IM2 |
IM3 |
IM4 |
IM5 |
IM6 |
1ª Avaliação |
36 |
60 |
60 |
72 |
72 |
84 |
2ª Avaliação |
48 |
60 |
60 |
72 |
84 |
84 |
Tabela 2. Comparação entra as idades motoras (em meses) na primeira e segunda avaliações da criança 2
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IM1 |
IM2 |
IM3 |
IM4 |
IM5 |
IM6 |
1ª Avaliação |
60 |
24 |
48 |
60 |
60 |
24 |
2ª Avaliação |
60 |
36 |
48 |
60 |
72 |
24 |
Discussão
O objetivo do presente estudo foi avaliar a influência do programa aquático no desenvolvimento psicomotor de crianças com SD. Esses objetivos foram alcançados, uma vez que conseguiu-se observar uma melhora no desenvolvimento psicomotor das duas crianças participantes após a realização do programa aquático.
Como instrumento de medida foi utilizado a Escala de Desenvolvimento Motor (EDM) para avaliar o desenvolvimento psicomotor das crianças. Esta escala foi um instrumento eficiente para detectar e confirmar a presença do atraso no desenvolvimento, além de comprovar a evolução das crianças após o tratamento. Além disso, é uma escala prática, precisa e de fácil interpretação.
Com o uso da escala foi observado que as crianças participantes apresentaram déficits psicomotores significativos em todas as áreas avaliadas, que corrobora com Mancini et.al (2003) e Schwartzman (2003) que afirmaram o atraso do desenvolvimento na SD.
Após a realização do programa aquático, foi constatado que ambas as crianças evoluíram na organização espacial, o que pode ser comprovado pelos resultados das avaliações pós-intervenção. Lefèvre (1981) aponta que a reeducação psicomotora torna a criança capaz de gestos coordenados, com habilidade de se locomover no espaço à sua volta de modo harmonioso e ainda a ajuda a conhecer pela visão, audição e tato o mundo que a rodeia, o que influencia em uma melhora na organização espacial. As atividades propostas no programa estimulavam as crianças a explorar o ambiente aquático, utilizando-se de vários objetos, circuitos a serem percorridos, já que as brincadeiras eram organizadas de forma a levar as crianças a trabalhar em determinados espaços, delimitados por espaguetes, bolinhas coloridas, degrau colorido no fundo da piscina, sempre competindo entre si. Segundo Oliveira (2002), é através do espaço e das relações espaciais que nos situamos no meio em que vivemos, em que estabelecemos relações entre as coisas, em que fazemos observações, comparando-as, combinando-as, vendo as semelhanças e diferenças entre elas.
Além disso, uma das crianças obteve também uma melhora na motricidade global, que está relacionada à organização espacial. O treino de atividades que trabalharam com o movimento do corpo na exploração do ambiente melhorou tanto a capacidade da criança de controlar os movimentos do próprio corpo como a de organizar-se no ambiente.
No equilíbrio, esquema corporal/rapidez, organização temporal/linguagem, áreas em que não houve uma melhora quantitativa, houve melhora qualitativa, considerando que as crianças desenvolveram as tarefas propostas pela EDM na segunda avaliação com melhor desempenho do que na primeira. Porém, vale ressaltar que a EDM não avalia a qualidade do movimento, a melhora qualitativa foi observada pela avaliadora.
O déficit no equilíbrio e a falta de evolução nessa área podem ser explicados pelo fato de que, segundo Perey e Markovic (1993), as crianças com SD possuem o cerebelo menor do que o normal, e essa é uma estrutura responsável pelo equilíbrio. Além disso, o programa aquático não enfatizou somente essa área, e o tempo do programa não foi suficiente para alcançar um acréscimo na idade motora nessa área.
Para Oliveira (2002), a defasagem na organização temporal dificulta a percepção da criança para intervalos de tempo, a sucessão de eventos, dificuldade na organização do tempo. Os resultados demonstraram o atraso das duas crianças na área de organização temporal/linguagem. A EDM, proposta por Rosa Neto em 2001 avalia a área da linguagem dos 2 aos 5 anos, e a organização temporal a partir dos 6 anos. A criança 1 conseguiu realizar os testes da linguagem, mas possui uma grande dificuldade na estrutura temporal, o que pôde ser verificado na execução do programa, tendo dificuldades para realizar brincadeiras que exigiam rapidez, além de conversas, que não conseguia diferenciar ontem, hoje, amanhã. A criança 2 possui uma defasagem grande na linguagem, sendo considerada muito atrasada nesse quesito. Mancini, Silva, Gonçalves, Martins (2003) e Stratford (1997), relatam que o desempenho cognitivo de crianças com SD é defasado, observando-se um maior comprometimento destas crianças na área da linguagem, já que esta ultima está diretamente ligada ao desenvolvimento cognitivo.
Outro fator a ser considerado é que as duas crianças têm dificuldades diversas, pois elas vivem em ambientes diferentes, os estímulos dados a cada uma são diferentes. Segundo Rosa Neto, os fatores ambientais interferem no desenvolvimento das crianças, pois os estímulos dados a cada uma são diferentes.
A pesquisa trabalhou também com a lateralidade, fazendo com que as crianças aprendessem a distinguir a direita e esquerda, o que pode colaborar para o esquema corporal, fazendo com que a criança reconheça melhor seu corpo e o do outro. Isso possibilita à criança uma melhor construção da personalidade, já que a imagem do corpo é considerada por Rosa Neto o núcleo central da personalidade. Além disso, alguns autores atribuem ao esquema corporal um papel essencial na manutenção da regulação postural. (apud Neto, 2001)
Estudos realizados por Filho (2003), constataram que após um programa de intervenção aquática, crianças com SD se tornaram mais independentes e criativas, comparadas ao início do tratamento. E isso também foi relatado pelos pais no presente estudo, pois as crianças ficaram mais independentes na realização de determinadas atividades. Além disso, Filho também revela a importância de utilizar diferentes materiais de diversas texturas, formas, tamanhos, cores, possibilitando à criança manipular, experienciar e vivenciar todo esse contexto que a rodeia.
Segundo Bueno (1998), a psicomotridade objetiva ajudar a criança com Síndrome de Down a explorar melhor o seu meio e captar mais adequada e rapidamente seus estímulos, o que pôde ser comprovado pela evolução nas áreas motricidade global e organização espacial das crianças.
Além disso, as atividades trabalhadas na piscina promoveram uma melhor socialização, já que as sessões ocorriam com as duas crianças juntas, com atividades e jogos de competição. As crianças tiveram uma boa relação entre si, assim como com a terapeuta. Boeheme afirma que a atividade aquática promove liberdade dos movimentos e aumenta a sociabilização, uma vez que representa ser um ambiente agradável e rico em estímulos, onde são realizadas atividades lúdicas que envolvem objetivos terapêuticos, de forma individual ou em grupo.
Conclusão
A partir do exposto e da realização do trabalho, concluí-se que a atividade aquática interferiu de modo positivo no desenvolvimento psicomotor das duas crianças. As crianças evoluíram em algumas áreas, e mesmo as que não tiveram um avanço na idade motora, obtiveram um melhor desempenho na realização das tarefas propostas pela escala comparando-se as avaliações pré e pós-intervenção. O programa não fez com que houvesse evolução em todas as áreas devido ao curto tempo de intervenção, já que é comprovado o atraso no desenvolvimento, além de uma defasagem em determinadas áreas, que impedem o avanço rápido das idades motoras. Além disso, o programa promoveu maior sociabilidade entre as crianças, o que também colabora no desenvolvimento. A escala utilizada como método de avaliação foi eficaz, pois realiza uma boa avaliação das diversas áreas do desenvolvimento psicomotor (motricidade fina, motricidade global, equilíbrio, esquema corporal/rapidez, organização espacial e organização temporal/linguagem).
Futuras pesquisas devem ser realizadas com número maior de participantes e maior tempo de tratamento, para se comprovar resultados mais efetivos no desenvolvimento de crianças com SD utilizando a psicomotricidade aquática.
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