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Estado nutricional e hipertensão 

arterial entre adolescentes em Brasília

Estado nutricional e hipertensión arterial entre adolescentes en Brasilia

Nutritional status and high blood pressure among adolescents in Brasilia

 

*Nutricionista. Doutora em Ciências da Saúde

Departamento de Nutrição, Universidade de Brasília, UnB

**Nutricionista. Pós graduada em Vigilância Sanitária

(Brasil)

Muriel Bauermann Gubert*

Rejane de Souza Portela**

muriel@unb.br

 

 

 

 

Resumo

         Este estudo transversal tem o objetivo de avaliar o estado nutricional e a prevalência de hipertensão arterial em adolescentes. Foram avaliados 605 estudantes de uma escola pública com idade entre 10 e 16 anos. Os dados coletados foram peso, estatura e pressão arterial (PA), seguidos de avaliação dos hábitos alimentares mediante questionário auto preenchido pelos estudantes. A prevalência de casos de PA alterada foi de 10,8%, sendo 1,8% classificados com PA limítrofe e 8,3% como hipertensos. A PA foi maior entre os homens (p= 0,000) e entre os adolescentes com excesso de peso (p= 0,002). Foi observada também, relação entre estado nutricional e gênero (p= 0,042). Os resultados deste estudo foram semelhantes aos de estudos anteriores com população adolescente. Constatou-se que o estado nutricional está associado a alterações na PA em indivíduos jovens.

         Unitermos: Hipertensão arterial. Adolescentes. Hábitos alimentares.

 

Abstract

         This cross-sectional study aimed at evaluating the nutritional status and the prevalence of high blood pressure in adolescents. A total of 605 students of a public school of Brasilia aged between 10 and 16 years has been evaluated. The collected data were weight, height and blood pressure, followed by the analysis of a questionnaire about food consumption filled by the students themselves. The prevalence of altered blood pressure cases was 10,8%, of which 1,8% can be classified as slightly altered blood pressure and 8,3% as high blood pressure cases. Blood pressure was higher in men (p=0,000), and adolescents with overweight (p=0,002), A significant association between nutritional status and gender has also been observed (p=0,042). The results of the present study are similar to others with the same purpose and concluded that the nutritional status is associated with the elevation of the blood pressure in young people.

         Keywords: High blood pressure. Adolescents. Food consumption.

 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 15 - Nº 146 - Julio de 2010

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Introdução

    A hipertensão arterial (HA) é conhecida como uma doença crônica não transmissível que afeta milhões de pessoas em todo o mundo¹. Estudos epidemiológicos demonstram que a prevalência de HA tem aumentado em muitos países, tornando-se um problema de saúde pública². Sua origem é multicausal e multifatorial¹, sendo que muitos fatores associados à HA em adultos são os mesmos relacionados com o aumento da pressão arterial em crianças e adolescentes³.

    Sabe-se que a HA está diretamente relacionada com o aparecimento e agravo de doenças cardiovasculares (DCV), as quais respondem por aproximadamente 20% dos óbitos por causas conhecidas em indivíduos com idade a partir dos 20 anos4. Sendo assim, jovens que eventualmente venham a apresentar fatores de risco, tendem a apresentar maior predisposição ao aparecimento de DCV com o avanço da idade5.


    Estudos longitudinais procuram conhecer melhor o comportamento da pressão arterial e fatores de risco cardiovasculares, visando sua prevenção6,7. Atualmente, sabe-se que alterações na pressão arterial (PA) em crianças e adolescentes constituem um fator de predisposição à HA e outras alterações cardiovasculares na vida adulta8.

    Vários indicadores têm relação com alterações de pressão arterial em crianças e adolescentes, mas os que mais se destacam como fatores de risco nesta fase da vida são: níveis iniciais de pressão arterial elevados, histórico familiar da doença, sobrepeso, obesidade, sedentarismo e, entre adolescentes, inclui-se também como fator de risco o tabagismo e etilismo9. Dentre estes fatores, os mais significativos são o sobrepeso e a obesidade que, em muitos casos, estão diretamente relacionados aos hábitos alimentares10,11,12.

    Ações de promoção da saúde relacionadas com mudanças de estilo de vida podem ser a forma de prevenção mais efetiva da ocorrência de eventos cardiovasculares. Para isto, estudos relativos à detecção dos fatores de risco nas populações mais jovens têm suma importância no acompanhamento dos indivíduos que apresentam maior probabilidade de apresentar alterações na idade adulta9.

    Durante a adolescência ocorrem muitas mudanças físicas e psicossociais de forma acelerada, fato que facilita o desenvolvimento de fatores preditores para doenças cardiovasculares13,14, o que justifica uma especial atenção a esta fase da vida. Estudos realizados em cidades brasileiras mostram índices de PA elevada entre adolescentes9,11,12. O presente estudo tem por finalidade avaliar a prevalência de HA entre adolescentes e relacionar a sua ocorrência com hábitos alimentares e estado nutricional.

Metodologia

    Trata-se de estudo transversal, realizado em 2008 com estudantes do 6º ao 9º ano do ensino fundamental de uma escola pública de Brasília. A população foi definida como a totalidade de estudantes do ensino fundamental, sendo formada inicialmente por 700 adolescentes com idade entre 10 e 16 anos.

    Foi enviado aos responsáveis um termo de consentimento livre e esclarecido, para que assinassem caso concordassem com a participação do menor sob sua responsabilidade na pesquisa.

    Os fatores de exclusão foram: a não concordância dos pais com a participação do estudante no estudo, a falta às aulas nos dias de coleta de dados, alunos com algum membro imobilizado por gesso ou tala, alunos que estivessem fora da faixa etária estudada e aqueles que não informaram a data de nascimento, impossibilitando a classificação segundo IMC e PA. Desta forma, da população inicial houve uma perda de 95 estudantes, o que resultou em um número final de 605 adolescentes avaliados.

    Foram coletados peso, estatura e pressão arterial. A estatura foi medida com estadiômetro da marca Alturexata, com graduação de 0,1 cm. O peso foi medido com balança digital com capacidade para 150kg e graduação em 100g. Os estudantes foram classificados segundo o estado nutricional pelo IMC, utilizando as curvas da Organização Mundial de Saúde15.

    A pressão arterial foi aferida com esfigmomanômetro aneróide com braçadeira para adultos, das marcas Premium e Missouri. A classificação da PA foi feita com base nas V Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial, do Ministério da Saúde16. Para a coleta obteve-se auxílio de estudantes de Nutrição capacitados para a atividade. Os dados foram coletados em sete encontros com os estudantes, onde cerca de 100 estudantes eram avaliados por encontro.

    Foi realizada, também, avaliação dos hábitos alimentares mediante aplicação de um questionário, que era autopreenchido após a explicação da pesquisadora sobre cada questão. Os estudantes foram orientados a solicitar ajuda sempre que houvesse alguma dúvida. O questionário passou por teste piloto, sendo realizadas as modificações necessárias. As perguntas abordavam questões sobre consumo de frutas, verduras, doces, refrigerante, prática de atividade física e casos de hipertensão arterial na família, além de uma listagem de alimentos mais consumidos na merenda escolar.

    Os dados foram analisados pelo programa SPSS 11.5, com nível de significância estipulado de 5%.

Resultados e discussão

    A amostra foi composta por 605 indivíduos, sendo 305 (50,4%) do sexo masculino e 300 (49,6%) do sexo feminino. Apenas 28,8% da população estudada referiu ter conhecimento de casos de HA na família. Em relação ao estado nutricional, 44,1% da população estudada apresentava-se eutrófica, 29,6% com baixo peso e 26,3% com algum grau de excesso de peso (Tabela 1).

    A pressão arterial elevada foi observada em 10,8% dos estudantes quando analisadas limítrofe e hipertensão agregadas. Avaliando os resultados isoladamente, obteve-se 1,8% de indivíduos limítrofes e 8,3% hipertensos (Tabela 1). A prevalência de hipertensão arterial tem aumentado na população infanto-juvenil, como revelam outros estudos pontuais realizados no país9. Este estudo demonstrou alteração na PA de 10,8% da população avaliada, estando acima da média nacional de 6 a 8%, explicitada no III Consenso Brasileiro de Hipertensão Arterial17 e semelhante a valores encontrados por outros autores2,11,12,19,20. O resultado encontrado nesta pesquisa corrobora-se pela média mundial, que varia de 2 a 13%16.

Tabela 1. Características dos adolescentes estudantes do Colégio Militar de Brasília. Distrito Federal, 2008

  

n

%

Sexo

 

 

Masculino

305

50,4

Feminino

300

49,6

Estado Nutricional

 

 

Baixo peso

179

29,6

Eutrofia

267

44,1

Excesso de peso/obesidade

159

26,3

Hipertensão na Família

 

  

Sim

174

28,8

Não

419

69,3

Pressão Arterial

 

 

Normotenso

544

89,9

Limítrofe

11

1,8

Hipertenso

50

8,3

Total

605

100

    Não foram observadas associações estatisticamente significativas entre hipertensão e o consumo de refrigerantes (p= 0,593), frutas (p= 0,797), fast food (p= 0,635) ou com a prática de alguma atividade física fora do horário escolar (p= 0,734). Este resultado é semelhante ao encontrado em estudo sobre consumo alimentar de adolescentes, realizado no Rio de Janeiro21.

    Houve associação entre estado nutricional e sexo (Tabela 2). O mesmo foi demonstrado na Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) de 2002-200322, onde 17,9% dos casos de excesso de peso entre adolescente ocorrem no sexo masculino e 15,41% no feminino.

Tabela 2. Estado Nutricional e Sexo dos adolescentes estudantes do Colégio Militar de Brasília. Distrito Federal, 2008

 

Baixo peso

Eutrofia

Excesso de peso/obesidade

Total

 

n

%

n

%

n

%

n

%

Masculino

86

48,0

128

47,9

91

57,24

305

50,4

Feminino

93

52,0

139

52,1

68

42,76

300

49,6

Total

179

29,6

267

44,1

159

26,3

605

100

P=0,42

    Em relação à prevalência de PA elevada, houve maior prevalência entre meninos (p= 0,000) e entre os com sobrepeso/obesidade (p= 0,002) (Tabela 3). Essa associação entre aumento da PA com o sexo, sendo maior nos indivíduos do sexo masculino, é semelhante ao observado em outros estudos2,5,9,20. Estudo realizado no Rio de Janeiro mostrou que 10,9% dos meninos apresentaram pressão arterial elevada². Existem, porém, outros estudos que não evidenciaram tal relação11,12,18.

    A relação entre sobrepeso/obesidade e aumento da pressão arterial também está presente em outros estudos2,9,18,19, onde a prevalência de pressão arterial alterada estava presente em até 50% dos adolescentes com excesso de peso8.

Tabela 3. Relação entre pressão arterial elevada, sexo e estado nutricional Tabela dos adolescentes estudantes do Colégio Militar de Brasília. Distrito Federal, 2008

Pressão Arterial Alterada

n

%

 

Sexo

 

 

 

Masculino

47

77,04

 

Feminino

14

22,96

p<0,001

Estado nutricional

 

 

 

Baixo peso

16

26,23

 

Eutrofia

21

34,43

 

Excesso de peso/obesidade

24

39,34

P=0,002

Considerações finais

    A hipertensão arterial é a doença cardiovascular mais comum, considerada um dos maiores desafios da saúde pública. Como doença de alta morbimortalidade na fase adulta, podendo ter início na infância e adolescência, a HA tem sido muito estudada pela medicina e áreas da saúde em geral. Atualmente já é preconizada a atuação de equipe multidisciplinar no tratamento desta enfermidade16.

    Por trazerem informações sobre a evolução da prevalência e fatores de risco para HA, os estudos epidemiológicos acerca deste assunto têm grande relevância. O presente trabalho mostrou que a pressão arterial elevada estava foi muito prevalente entre os adolescentes estudados e que sua ocorrência esteve associada ao excesso de peso e gênero.

    Tendo em vista que a situação de HA durante a infância e adolescência pode prolongar-se ao longo da fase adulta e trazer maiores complicações, um acompanhamento médico e nutricional, além da adoção de hábitos de vida mais saudáveis tornam-se fatores muito importantes na prevenção do aumento da PA e de todas as complicações que esta pode acarretar.

Referências

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