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Respostas fisiológicas em diferentes 

percentuais da velocidade crítica na caminhada

Respuestas fisiológicas en diferentes porcentajes de velocidad crítica en la caminata

 

Laboratório de Pesquisa do Exercício, LAPEX

Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre

(Brasil)

Marcos Franken

Fernando de Aguiar Lemos

Giovani dos Santos Cunha

marcos_franken@yahoo.com.br

 

 

 

 

Resumo

          O objetivo deste estudo foi comparar o consumo de oxigênio (VO2), a frequência cardíaca (FC) e o esforço percebido (EP) nos percentuais da velocidade crítica (VC) em teste incremental na caminhada. Seis indivíduos realizaram teste incremental em diferentes percentuais da VC: cinco velocidades de seis minutos, nos percentuais de 75, 80, 85, 90 e 100% da VC. As variáveis de VO2, de FC e de EP não apresentaram diferença significativa entre os percentuais da VC. Porém, o EP nos percentuais acima dos 80% da VC apresentou diferença significativa quando comparado com os percentuais abaixo dos 80% da VC. Com relação ao comportamento do VO2 nos percentuais acima dos 85% da VC teve diferença significativa quando comparado a o percentual de 75% da VC.

          Unitermos: Caminhada. Velocidade crítica. Esforço percebido.

 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 15 - Nº 145 - Junio de 2010

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Introdução

    Programas de treinamento em caminhada visando melhorias no condicionamento físico pressupõem a utilização de parâmetros de avaliação e controle para a quantificação das cargas e monitoramento do treinamento do indivíduo ao longo de uma temporada. Dessa forma, é possível verificar as necessidades de cada indivíduo e oferecer uma prescrição eficiente das intensidades de treinamento. Dentre as variáveis que são comumente utilizadas para a prescrição da intensidade do exercício em modalidades esportivas cíclicas com predominância do metabolismo aeróbico, temos o lactato sanguineo ([LA]), a frequência cardíaca (FC), a velocidade crítica (VC), o consumo de oxigênio (VO2) e o esforço percebido (EP) (Garcin & Billat, 2001; Green et al., 2005).

    A VC pode ser definida como a mais alta intensidade que pode ser sustentada por um longo período sem alcançar o máximo consumo de oxigênio (VO2max), em carga constante, ou seja, situa-se no limite inferior da zona de intensidades severas (Dekerle et al., 2008). Além disso, a VC é um parâmetro não-invasivo de avaliação que apresenta vantagens como a facilidade de aplicação na avaliação de um grande número de indivíduos, podendo ser realizada mesmo durante as sessões de treino e, principalmente, sem a necessidade da utilização de equipamentos de alto custo ou coleta de amostras sanguineas (Hill et al., 1995). Entretanto, há incertezas quanto a sua utilização para a prescrição das diferentes intensidades de treinamento na caminhada.


    Além da VC, as escalas de esforço percebido (EP) têm apresentado relação direta simples com a intensidade do exercício (Borg, 1982). Estudos recentes indicam que o EP tem um papel importante no controle da tolerância ao exercício (Suzuki et al., 2007) e é entendida como uma representação complexa, central e integrada (Cafarelli, 1982) das mais variadas funções corporais alteradas de forma aguda pela atividade muscular (ST Clair Gibson et al., 2003) e experiências acumuladas com o exercício (Albertus et al., 2005).

    De acordo com o aumento da velocidade (V) na caminhada, ocorre um aumento da intensidade de esforço e uma mudança no padrão de locomoção com a tentativa de minimizar a demanda metabólica, sendo denominada fase de transição caminhada-corrida (Hanna et al., 2000; Brisswalter & Mottet, 1996). Segundo o American College of Sports Medicine (2000), essa fase de transição se situa entre 6 e 8 Km.h-1, ou seja, andar e correr são mais eficientes em velocidades, respectivamente, abaixo de 6km.h-1 e acima de 8km.h-1. Segundo Hanna et al. (2000), ainda não estão claros quais os mecanismos que o indivíduo utiliza para controle e/ou otimização da demanda energética, nas intensidades de esforço de transição entre a caminhada e a corrida.

    Assim, o entendimento das respostas fisiológicas na caminhada as demandas de velocidades situadas na faixa de transição ou acima parecem não estão esclarecidas. Uma comparação entre diferentes percentuais da VC, FP, FC, VO2 e o EP parece não ter sido investigada, ainda que esta se mostre como um parâmetro de fácil aplicação e útil para a prescrição e monitoramento das intensidades de treinamento em caminhada. Sendo assim, o objetivo geral deste estudo foi comparar o comportamento do VO2, da FC e do EP nos percentuais da VC em teste incremental na caminhada.

Metodologia

Participantes

    Participaram deste estudo seis indivíduos, com idade entre 23 e 39 anos, massa corporal de 71,6 ± 8,3 Kg e estatura de 177,3 ± 5,8 cm, homens fisicamente ativos. Os participantes foram previamente informados sobre os procedimentos metodológicos, assinando um termo de consentimento livre e esclarecido concordando com a participação no estudo. Foi recomendado aos sujeitos que reduzissem os níveis de atividade física por um período mínimo de 24 horas antes de todas as avaliações.

Familiarização à Escala de 15 pontos de Borg

    Os indivíduos passaram por três a cinco sessões de familiarização com a escala de 15 pontos de Borg (Borg, 2000). A escala era apresentada aos participantes ao longo das sessões de treino, em exercícios de diferentes intensidades, quando os indivíduos atribuíam um valor numérico na escala correspondente ao seu EP no instante solicitado. Como a escala possui atributos verbais ao lado dos números, facilitou a escolha, pois a relação entre os atributos verbais e os valores numéricos aprimora o hábito do indivíduo em usar a escala.

Procedimentos experimentais

    As coletas de dados foram realizadas na pista de atletismo de 400 m e na esteira com temperatura entre 21° e 23°C. O aquecimento foi realizado livremente. Os indivíduos realizaram (1) repetições máximas nos tempos de seis e nove minutos, em ordem aleatória e separadas por, no mínimo, 24 horas de intervalo entre elas, e (2) um teste incremental para verificação da FC, do EP e do VO2 em esforços de seis minutos realizados sob diferentes percentuais da VC, no mínimo, 24 horas após a segunda repetição máxima.

Determinação da velocidade crítica

    Para a determinação da VC foram registradas as distâncias realizadas nos tempos de seis e nove minutos (Enright et al., 2003) sob máxima intensidade. Os dados de distância e tempo foram plotados em um modelo de regressão linear, o que resultou numa reta cuja equação definiu o coeficiente angular cujo significado é a VC individual (Wakayoshi et al., 1992ª).

Teste incremental

    O protocolo do teste incremental em percentuais da VC constou de cinco estágios de seis minutos, onde foi verificado o comportamento do VO2, da FC e do EP na esteira (Inbramed 10200 ATL).

    Os percentuais da VC foram realizados em ordem incremental: 75, 80, 85, 90 e 100 %. Ao final de cada minuto ao longo do teste incremental, foi verificado o índice de esforço percebido de forma geral pela visualização da escala de 15 pontos de Borg e a FC que foi monitorada com um frequêncímetro (Polar modelo S810, Polar Electro Oy, Finlândia). O VO2 foi determinado pela análise das respostas ventilatórias, por meio de um analisador de gases, modelo MGC, da Medical Graphics Corporation (St.Paul, EUA). A frequência de amostragem foi breath-by-breath. Utilizou-se um bocal e um oclusor nasal, limitando a respiração do indivíduo apenas pela boca.

Análise estatística

    Foram calculadas medianas e/ou médias, desvios e erros-padrão das variáveis de EP, VO2, VC, V e FC. A normalidade na distribuição dos dados das variáveis numéricas foi verificada com a aplicação do teste de Shapiro-Wilk e a esfericidade dos dados foi verificada com o teste de Mauchly. Entre os valores de V, da FC, do VO2 e do EP nos percentuais da VC foi aplicada uma ANOVA para medidas repetidas. Quando necessário, foi aplicada uma correção Epsilon de Greenhouse-Geisser. Os efeitos principais foram verificados por um teste post-hoc de Bonferroni. Os cálculos foram realizados no programa SPSS v 12.0 (SPSS Brasil, São Paulo, Brasil), para a < 0,05.

Resultados e discussão

    A Tabela 1 apresenta os valores médios de velocidade máxima nos tempos de seis minutos (V6), nove minutos (V9) e a VC.

Tabela 1. Desempenho de seis minutos (V6) e nove minutos (V9) e velocidade crítica (VC) dos indivíduos (n = 3), média e desvio-padrão (dp)

 

V6

(Km.h-1)

V9

(Km.h-1)

VC

(Km.h-1)

Média

8,07

8,56

9,53

dp

0,51

0,24

0,56

    Na Tabela 2 são apresentadas as variáveis de percentual da VC e EP no nado crawl, considerando média ± desvio-padrão (dp), mediana e incidência do valor da mediana de EP para cada percentual da VC.

Tabela 2. Análise descritiva das variáveis de percentuais da VC e EP no teste incremental de caminhada, 

para média ± desvio-padrão (dp), mediana (mínimo-máximo) e incidência do valor de EP

% VC

Mediana EP (mínimo-máximo) e incidência

75

12 (11-12) 66%

80

13 (12-13) 66%

85

14 (14-15) 70%

90

16 (15-16) 65%

100

18 (18-19) 65%

    Na Tabela 3 são apresentadas as variáveis de V, FC, VO2 e EP, considerando média ± desvio-padrão (dp) e comparações para cada percentual da VC.

Tabela 3. Comparação dos valores de V (velocidade), FC (frequência cardíaca em batimentos por minuto), 

VO2 (consumo de oxigênio) e EP (esforço percebido) nos diferentes percentuais da VC (velocidade crítica); n = 3

 

75% VC

80% VC

85% VC

90% VC

100% VC

V (Km.h-1)

7,14±0,42b,c,d,e

7,62±0,45c,d,e

8,09±0,48d,e

8,57±0,50e

9,53±0,56

VO2 (ml.kg-1.min-1)

18,05±0,87d,e

21,48±1,17

27,97±1,70

30,43±0,52

39,22±0,76

FC (bpm)

119,77±19,09e

131,88±21,75

150,22±28,25d

162,44±28,70

177,55±23,82

EP

11,33±0,44c,d,e

12,88±0,19d,e

14,38±0,41e

15,83±0,16e

18,44±0,19

b p < 0,05 comparado com a repetição a 80% da VC; c p < 0,05 comparado com a repetição a 85% da VC. 

d p < 0,05 comparado com a repetição a 90 % da VC; e p < 0,05 comparado com a repetição a 100 % da VC.

    Com relação aos valores de V ocorreu diferença significativa nos percentuais de 75, 80, 85, 90 e 100 % da VC (p<0,05) (Tabela 3). Já as demais variáveis de FP, VO2, FC e EP não apresentaram diferença significativa entre os percentuais da VC. Porém, o EP nos percentuais acima dos 80% da VC apresentou diferença significativa quando comparado com os percentuais abaixo dos 80% da VC. Com relação ao comportamento do VO2 nos percentuais acima dos 85% da VC teve diferença significativa quando comparado a o percentual de 75% da VC (p<0,05).

    Com o intuito de investigar as respostas fisiológicas nos percentuais da VC em teste incremental na caminhada, o objetivo geral deste estudo foi comparar os valores de VO2, da FC e do EP nos diferentes percentuais da VC em teste incremental na caminhada buscando evidências para o entendimento das respostas de variáveis energéticas em resposta a diferentes intensidades na caminhada.

    Analisando o comportamento do EP nos percentuais da VC, foram maiores nos percentuais acima dos 80% da VC apenas quando comparado com os percentuais abaixo dos 80% da VC. Esse aumento do EP nos percentuais acima dos 80% da VC pode ser explicado pelo mecanismo da capacidade de trabalho anaeróbio (CTA) que seria um modulador sensorial e perceptivo dos limites de tolerância do exercício (Suzuki et al., 2007). Portanto, o comportamento do EP na condição acima da VC no presente estudo, poderia ser a relação diferenciada entre utilização e reposição da CTA, sendo uma conseqüência dos distúrbios periféricos associados à depleção de fosfagênios e acidose metabólica, concomitante a mobilização crescente da atividade neuromotora eferente (Cafarelli, 1982).

    Com relação ao comportamento do VO2 e da FC nos percentuais acima dos 85% da VC foi maior quando comparado a o percentual de 75% da VC (p<0,05). O aumento da demanda metabólica nos percentuais acima dos 85% da VC, pode ser explicado pela ausência de utilização dos mecanismos minimizadores de energia (Mercier et al., 1994).

Conclusão

    Pôde-se observar que os valores de EP foram maiores nos percentuais acima dos 80% da VC quando comparados com os percentuais abaixo dos 80% da VC. A utilização da VC para o controle do treinamento na caminhada pode ser utilizada de uma maneira eficaz. Porém, são necessários estudos que investiguem as respostas fisiológicas as demandas de intensidade na caminhada em populações mais especiais.

Referências bibliográficas

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