O progresso tecnológico e os desafios para a organização didático pedagógica do ensino do esporte na Educação Física escolar El progreso tecnológico y los desafíos para la organización didáctico pedagógica de la enseñanza del deporte en la Educación Física escolar |
|||
Universidade Estadual de Feira de Santana Doutor em Educação Grupo Lepel/UEFS |
Welington Araújo Silva (Brasil) |
|
|
Resumo O presente trabalho trata das articulações teórico-metodológica do ensino da educação física e as tecnologias, questão emergente no campo do currículo da educação física escolar. Tem como objeto de estudo a base técnica de organização didática e a tecnologia da informação e comunicação, mais especificamente o processo de produção, armazenamento e circulação das informações ligadas ao mundo dos esportes, especialmente àquelas veiculadas pelo jornal impresso. Toma como problema central a investigação sobre a possibilidade do desenvolvimento de um trabalho pedagógico histórico-crítico de característica politécnica no interior da escola capitalista em face do processo de reestruturação e destruição das forças produtivas. Partimos do pressuposto de que somente um processo de historicização do desenvolvimento tecnológico imbricado dialeticamente à competência técnica e o compromisso político com o desenvolvimento do projeto histórico socialista pode potencializar um trabalho pedagógico que contribua com a formação humana omnilateral. Assim, o objetivo deste trabalho é introduzir uma proposta pedagógica de cunho histórico-crítico que potencialize a formação do aluno e aluna que estão na escola para além dos aspectos críticos e criativos presentes na produção do conhecimento da educação física relacionada às mídias, pois esses elementos se encontram na base da constatação dos fenômenos que nos cercam e que, embora importantes, devem ser tomados como parte do processo, pois os filósofos já interpretaram o mundo de diferentes maneiras e a questão vital hoje é a transformação das relações humanas teleologicamente apontadas para um novo horizonte civilizatório, onde a base técnica e os processos tecnológicos dos mais diversos meios estejam voltados para o enriquecimento do gênero humano e não para o desenvolvimento do capital. Unitermos: Educação Física. Trabalho pedagógico. Tecnologia
|
|||
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 15 - Nº 145 - Junio de 2010 |
1 / 1
Introdução
Os desafios postos para a educação de uma forma geral e para a educação física escolar em particular, frente ao processo de reestruturação produtiva pelo qual passa a sociedade capitalista mundial e suas conseqüências na organização escolar e no mundo do trabalho na ordem do capital são muitos, exigindo um esforço de reflexão profunda em todos os que se preocupam com a formação do gênero humano que interessa a construção de uma nova ordem social: a sociedade socialista.
Uma das arenas possíveis de disputa de projetos históricos diferentes é a escola e todo o conjunto, complexo e contraditório, de elementos que dela fazem parte. Entre esses elementos, a questão da organização didática é de fundamental importância, já que é através das relações pedagógicas que poderemos materializar, com todas as limitações próprias da dinâmica de uma escola capitalista, possíveis práticas de caráter histórico-crítico.
Não obstante, é necessário pontuar que a educação na sociedade capitalista volta-se para o desenvolvimento de competências que sirvam ao sistema produtivo, ao mercado de trabalho, algo já exposto de forma esclarecedora por Smith (1983) e que denota o caráter de luta de classes no âmbito educacional.
Partindo desta compreensão, da relação historicamente constituída de um pensamento educacional de classe que objetiva simplesmente a reprodução do capital, o objetivo central que vamos perseguir no nosso trabalho é a formulação introdutória de uma proposta pedagógica embrionária que esteja sintonizada com o processo de emancipação humana, buscando a luz de uma perspectiva politécnica do trabalho pedagógico a superação da dimensão educativa unilateral.
Nesses termos, iniciaremos o nosso percurso refletindo sobre um importante tripé: capital, trabalho e educação. Refletiremos sobre a tecnologia como potencialidade politécnica, apresentaremos um rápido inventário sobre o discurso que aborda a tecnologia (mídia) no âmbito da educação física e, por fim, defenderemos uma proposta pedagógica que perspective uma educação física para além do capital.
Capital-trabalho-educação
Segundo Bottomore (2001, p. 371), “As atividades humanas foram sempre mediadas pelas tecnologias, e isso acontece cada vez mais na vida doméstica e na cultura” exigindo reflexões profundas sobre a influência do desenvolvimento dos processos produtivos na formação humana.
Se, no cenário que emergia a sociedade burguesa no final do século XVIII e início do século XIX a contradição se expressava de forma latente entre o ideal iluminista da razão como fator de emancipação humana e as perversas relações entre capital e trabalho, nada nos autoriza, hoje, a entender que essas contradições foram extintas. Pelo contrário. O que se vê é o recrudescimento das mesmas, exigindo dos educadores e educadoras a politização do debate entre a tecnologia (por ser esse um elemento cada vez mais presente nas relações sociais) e o processo de formação humana.
No âmbito do Estado da Bahia, os indicadores sociais de 1999 apresentavam 80,45% dos baianos abaixo da linha de pobreza, ganhando menos de R$ 132/mês e 60,24% abaixo da linha de indigência, ganhando menos de R$ 65/mês. Em Feira de Santana, o maior interior do Estado, com uma população ultrapassando 500.000 habitantes, 64,51% da população se encontra em estado de pobreza.
Não se trata apenas de apresentar números, mas de reconhecer que pensar a relação capital-trabalho-educação e a utilização das tecnologias – sejam elas novas ou velhas – em seus processos didáticos fora dessas referências concretas, é desembocar em uma reflexão idealista, fortalecedora do capital, este mesmo capital que para se reproduzir e se perpetuar, precisa revolucionar constantemente os seus processos tecnológicos.
Esse movimento levanta uma questão que precisa ser enfrentada por todos os professores e professoras da educação e da educação física especificamente que desejam pensar sobre uma educação histórico-crítica e que não façam nenhuma concessão ao capital: qual o projeto de educação e de sociedade que queremos para o século XXI?
A tecnologia como politecnia
Para responder a questão relacionada à possibilidade de articulação didática histórico-crítica com a educação politécnica devemos partir das condições historicamente postas, e essas condições mostram que o trabalho, sob o auspício do capital, “se constitui em negatividade, alienação de vida. Nas relações capitalistas trabalhamos para viver, para produzir um meio de vida, mas nosso trabalho não é vida em si, porquanto se trata de uma atividade imposta por uma necessidade externa – a necessidade do capital”. (FRIGOTTO, 1989, p. 25).
É necessário reconhecer, também, que sob o domínio do capital, toda e qualquer proposta educacional na linha histórico-crítica se torna limitada, posto que este unilateraliza o processo de formação, capacitando o trabalhador, dentre outros elementos, para produzir mais valia, utilizar a sua força de trabalho para a reprodução do capital.
Não obstante, é necessário enfrentar essa realidade, apontando possibilidades didáticas do trabalho pedagógico de forma que o mesmo, teleologicamente, aponte para o desenvolvimento da sociedade socialista, expressão política da dinâmica mais geral das relações societárias que não pode prescindir de uma perspectiva educacional politécnica/histórico-crítica.
Segundo Frigotto (1989, p. 25)
O conceito e a proposta de politecnia em Marx e Engels e, posteriormente em Lênin e Gramsci, estão ligados a um projeto de um “novo homem”, onde o trabalho, imperativo do modo humano de existência, se constitui no princípio educativo e catártico em sua construção e na construção da sociedade socialista e comunista.
A escola que aí estar e que se constitui como um elemento da superestrutura do sistema capitalista em relação dialética com sua base estrutural, locus de disputa pela hegemonia é um dos espaços possíveis de educação da classe trabalhadora, portanto, uma educação de classe, que deve ter muito claro o projeto histórico que se quer desenvolver, a saber, o projeto histórico socialista.
Essa perspectiva pedagógica da formação humana tem como base concreta a própria característica da sociedade em que estamos vivendo, onde os 20% mais pobres detêm 2,5% da renda nacional e os 20% mais ricos detêm 64,2% desta mesma renda. Esse fosso entre pobres e ricos, a continuarmos com o projeto histórico capitalista tende a crescer, com conseqüências sociais que já estamos presenciando: violência das mais diversas, suicídios, infanticídios, trabalho escravo, precarização do trabalho formal, desemprego estrutural entre outros elementos que demonstram a saturação das forças produtivas no seio do sistema metabólico do capital.
A tecnologia no discurso pedagógico da Educação Física: um rápido inventário
Nos últimos anos, a educação física incorporou diversas reflexões sobre diferentes artefatos tecnológicos. O argumento principal que aparece nas linhas ou entrelinhas dessas produções é que não dar mais para desconhecer as influências das mensagens veiculadas pelas diversas mídias, seja por que essas estão muito presentes no cotidiano dos alunos e alunas, seja porque estes devem desenvolver competências e habilidades críticas que potencializem processos de ressignificações destas mensagens.
Outros elementos que podem ser evidenciados nas diferentes produções que têm artefatos tecnológicos diversos como objeto de estudo da relação entre comunicação e educação/educação física podem ser assim elencadas:
apresenta a escola como se a mesma gozasse de autonomia sobre ela mesma e sobre as outras práticas sociais;
em alguns momentos, a justificativa para que o professor se utilize das tecnologias de informação e comunicação se fundamenta na subjetividade do educando, que no seu cotidiano, já se familiariza com estas, que por conter elementos sedutores, obriga ao professor uma dinamicidade também sedutora, pois, se assim não for, o risco da aula se tornar entediante, obsoleta é bastante alto;
nas reflexões sobre comunicação e educação/educação física, mesmo àquelas que se encontram no plano mais progressista e que advogam uma construção de um educando crítico, reflexivo, criativo frente às mensagens midiáticas não há uma defesa explícita sobre que projeto histórico deve ser perseguido na organização do trato com o conhecimento trabalhado;
em última instância, a crítica que enfatiza a necessidade de mudança na organização didática pedagógica via utilização das tic’s desconsidera o processo de reestruturação do capital como fundamento desta necessidade;
as proposições de educação para a mídia não mencionam elementos de articulações com as questões nucleares do currículo escolar, dando a aparência de uma falta de articulação com o projeto pedagógico da escola.
Em defesa de uma proposta politécnica/histórico-crítica para o ensino da Educação Física
Dito isso, cabe agora um esforço teórico no sentido de buscar nos aproximar de uma perspectiva pedagógica histórico-crítica que tenha no desenvolvimento de um trabalho com um artefato tecnológico midiático a materialização da educação politécnica. Tomemos como exemplo, o ensino do esporte que assume nas aulas de educação física um conteúdo central.
Entendemos que é na organização didática de cunho histórico-crítico que reside à possibilidade de desenvolvimento das condições de eliminação do fenômeno da alienação via práxis revolucionária. Digo possibilidade por reconhecer que enquanto indivíduos somos frutos de múltiplas determinações e não podemos pensar que apenas com um trabalho pedagógico na perspectiva crítica iremos nos libertar de outros elementos mediadores que se fazem presentes no nosso cotidiano e que reforçam o processo de alienação, pois estes não começam e nem terminam nas relações pedagógicas, pois dizem respeito a relações muito mais amplas que os homens estabelecem na produção da sua existência.
O conhecimento torna-se assim, luta entre as classes e deve ser estruturado de forma que a classe trabalhadora se aproprie dos conteúdos socialmente significativos, pois “(...) o dominado não se liberta se ele não vier a dominar aquilo que os dominantes dominam. Então, dominar o que os dominantes dominam é condição de libertação” (SAVIANI, 2003a, p. 55). Isso não significa dizer que a educação é determinante no processo de transformação social. Assim entendendo, estaríamos contrariando a práxis revolucionária, pois esta se sabe condicionada.
Imbuído dessa compreensão, a didática histórico-crítica de desenvolvimento do ensino do esporte deve ser desenvolvida obedecendo cinco importantes passos: 1) partir do social (o que nós, professores e alunos já sabemos sobre o conteúdo); 2) problematização (explicitando o que já sabemos sobre o conteúdo que estar sendo trabalhado); 3) instrumentalização (apropriação “dos instrumentos teóricos e práticos necessários ao equacionamento dos problemas detectados na prática social” (SANTOS, 2005, p. 12); 4) catarse (expressão elaborada da nova forma de compreender a prática social) e 5) retorno à prática social (compreensão da prática social inicial qualitativamente superior).
No caso específico da nossa proposta que, como dissemos no início, ainda é embrionária, esse processo se desenvolverá atendendo alguns elementos da práxis pedagógica tomando como referência os elementos expostos acima:
a) Objetivos: Identificar o conceito sobre esporte; conhecer a forma de abordagem da dimensão esportiva através do encarte A Tarde Esporte Clube; demonstrar possibilidades do desenvolvimento de outras formas de abordar o fenômeno esportivo; desenvolver um modelo alternativo de socialização do saber esportivo; avaliar o grau de compreensão da dimensão esportiva; b) Conteúdo: Esporte; c) Dimensão: histórica e social; d) Ações: Exposição oral, análise bibliográfica e exposição; e) Recursos: sala de aula, jornal, tesoura, pincel atômico e fragmentos de reportagens esportivas.
Considerações finais
Finalizo, tornando minha as considerações de Santos (2005, p. 62-63) que nos pergunta e enfatiza; “Como pensar a realidade e suas mediações se não dispomos de elementos intelectuais para isso? Como se apropriar do mundo que é atividade elaborada pelo pensamento e pela prática social produtiva se não dispomos das ferramentas, do alfabeto com o qual esse mundo foi codificado?”.
Referências
BOTTOMORE, Tom. Dicionário do pensamento marxista. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.
FRIGOTTO, Gaudêncio. Trabalho-educação e tecnologia: treinamento polivalente ou formação politécnica? In: Revista educação e realidade. V. 14, n. 01, jan/jun, 1989. Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
SANTOS, César Sátiro dos. Ensino de ciências: abordagem histórico-crítica. Campinas, SP; Autores Associados, 2005.
SAVIANI, Dermeval. Tendências e correntes da educação brasileira. In: MENDES, Durmeval Trigueiro (org.). Filosofia da educação. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1983.
SAVIANI, Dermeval (2002), “O choque teórico da politecnia”. In: Trabalho, Educação e Saúde, Vol. 1, N. 1, março de 2002, p.131-152.
SILVA, Welington Araújo. O esporte enquanto elemento educacional. EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Nº 79. http://www.efdeportes.com /efd79/esporte.htm.
SMITH, Adam. Inquérito sobre a natureza e as causas da riqueza das nações. Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1983. v. 2.
VASQUEZ, Adolfo. Filosofia da Práxis. Rio de janeiro, Paz e Terra, 1977. 4 ed.
Outros artigos em Portugués
Búsqueda personalizada
|
|
revista
digital · Año 15 · N° 145 | Buenos Aires,
Junio de 2010 |