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Estudo do excesso de peso das mochilas de crianças em idade escolar

Estudio del exceso de peso en las mochilas de los niños en edad escolar

 

*Acadêmicos de Fisioterapia da Universidade Federal

dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, UFVJM

**Professora Doutora do Departamento de Nutrição da UFVJM

(Brasil)

Hércules Ribeiro Leite*

Débora Alves de Ávila Bueno* | Rômulo Dias Novaes*

Eliziária Santos Cardoso* | Polyanna Gomes Cota*

Ana Carolina Batista* | Tânia Riul*

herculesfisio@hotmail.com

 

 

 

 

Resumo

          O objetivo desse estudo foi avaliar o excesso de peso nas mochilas de crianças da primeira à quarta série de uma escola da rede pública de ensino do município de Diamantina/MG. Foram incluídas aleatoriamente para avaliação 40 alunos da primeira à quarta série da Escola Estadual Matta Machado. A média de idade dos alunos foi de 8,25 anos ± 1,32 anos. De todas as mochilas mensuradas (n=40), 52,2% (n=21) apresentaram excesso de peso, com média de 0,424 Kg +/- 0,663 Kg. O excesso de peso foi prevalente na primeira e segunda série 60% (n=6). 67,5% (27) dos sujeitos faziam trajeto de casa para a escola a pé, com grande variedade de localização de suas residências. Os resultados do presente estudo permitiram concluir que havia excesso de peso nas mochilas dos alunos de primeira à quarta série da escola estudada com predomínio para as séries iniciais.

          Unitermos: Crianças. Mochilas escolares.

 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 15 - Nº 145 - Junio de 2010

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Introdução

    O uso de mochilas representa um produto de consumo comum em nosso sistema escolar moderno (MACKENZIE e cols., 2003). Estudos indicam que a incidência do uso de mochilas pelas crianças em idade escolar seja de pelo menos 90% (BRACKLEY e STEVENSON, 2004). Entretanto, seu uso está quase sempre associado a algum efeito adverso relacionado à saúde. Todos os anos crianças em idade escolar fazem mais de 10.000 visitas aos consultórios médicos nos EUA, devido a problemas associados ao uso das mochilas (FORJUOH e cols., 2003).

    Tem crescido a preocupação entre os educadores, profissionais de saúde, pais e outros que dores nas costas estão se tornando um sério problema de saúde em crianças em idade escolar devido ao crescente uso de mochilas com excesso de peso (WALL e cols., 2003). O efeito combinado de mochilas pesadas, posição de carga no corpo, tamanho e forma da carga, distribuição da mesma, tempo gasto em carregá-las, características físicas e condições físicas dos indivíduos foram hipotetizadas como fatores associados às disfunções causadas pelas mochilas (CHANSIRINUKOR e cols., 2001).

    Dores nas costas em crianças parecem ser mais comuns do que se pensava anteriormente. Estudos têm indicado que 10% a 30% de crianças saudáveis experienciam dores nas costas, especialmente dor lombar. Aproximadamente 2% dessas crianças relatam sintomas severos suficientes para procurarem os consultórios médicos (WEIR, 2002). Além disso, a prevalência de dor lombar em crianças tem sido relatada com sendo tão elevada quanto em 65% dos casos (BRACKLEY e STEVENSON, 2004).

    Segundo Forjuoh e cols. (2003) as mochilas carregadas pelos estudantes podem estar associadas à severas conseqüências na saúde, incluindo dores nas costas, alterações na marcha e má postura. Tais mochilas escolares somadas ao alto peso aumentariam a pressão nas articulações e ligamentos em crescimento, e assim inicialmente potencializariam um processo de estresse na coluna. Entretanto, ainda não é sabido se as mochilas poderiam causar prejuízos permanentes. Porém, estima-se que os custos em relação aos cuidados com a saúde associados aos problemas da coluna poderiam ser enormes.

    O peso carregado pelos estudantes varia em relação à região demográfica e dia da semana. Porém a média das cargas varia consideravelmente entre os estudos, sendo que a maioria deles indicam que a carga carregada pelas crianças é maior do que os limites considerados. Além disso, tem sido recomendado uma carga limite de 10% a 15% do peso corporal das crianças por muitas associações de profissionais da saúde (BRACKLEY e STEVENSON, 2004).

    A organização mundial da saúde (OMS) preconizou que as crianças do ensino fundamental devem carregar apenas 10% do seu peso corporal. Caso este limite não seja respeitado, os estudantes poderiam sofrer conseqüências a médio e em longo prazo, pois é nesta fase da idade escolar que seu desenvolvimento encontra-se em evolução. Segundo Chansirinukor e cols., (2001) adolescentes e crianças experienciam um período de acelerado crescimento e desenvolvimento das estruturas esqueléticas, bem como dos tecidos moles que as circundam. Sendo assim, forças externas tais como as impostas pelas mochilas poderiam influenciar no crescimento, desenvolvimento e manutenção do alinhamento postural humano, bem como deixar crianças e adolescentes susceptíveis à lesões.

    Em alguns municípios, como em São Paulo, essa preocupação chegou à Câmara Municipal, que decretou uma lei que “As escolas municipais diligenciarão para que seus alunos não transportem, em material escolar, carga superior a 10% (dez por cento) do seu próprio peso” (SÃO PAULO, 2002, p. 1)

    O presente estudo voltou-se para a verificação da existência de excesso de peso nas mochilas dos alunos de primeira à quarta série da Escola Estadual Matta Machado, em Diamantina, MG., 2004.

Sujeitos e métodos

    Foram selecionados aleatoriamente dez alunos de cada turma, da 1º à 4º série da Escola Estadual Matta Machado no município de Diamantina, MG.

    A coleta de dados foi realizada em dois dias consecutivos. No primeiro dia da pesquisa teve como objetivo o contato inicial com as turmas que participariam do estudo e a explicação da pesquisa aos alunos. Aqueles que quiseram participar da pesquisa levaram para casa duas vias do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido que deveriam ser preenchidos pelos pais ou responsáveis. Participaram do estudo apenas aqueles alunos que levaram à escola o termo devidamente assinado no dia seguinte.

    Aos alunos selecionados, foram dadas instruções para que colocassem todo o material escolar dentro de suas respectivas mochilas e retirassem seus calçados e agasalhos, permanecendo apenas com o uniforme escolar.

    As mensurações foram realizadas com cada aluno posicionado de forma ereta, face voltada para o horizonte, braços estendidos e ao lado do corpo e pés juntos sobre a balança. No primeiro momento, mensurou-se o peso corporal dos alunos e em seguida o peso das mochilas.

    A partir do peso corporal do aluno e de sua respectiva mochila, obtidos nas mensurações, seguiu-se o cálculo do excesso de peso. Do peso corporal do aluno calculou-se 10%. Em seguida, subtraiu-se o valor obtido anteriormente (10% do peso corporal do aluno, P1[10%]) do peso da mochila (PM) obtendo-se o valor, quando existente, do excesso de peso (EP) nas mochilas. EP=PM-P1(10%).

Resultados

    A média de idade foi de 8,25 anos +/- 1,316 anos, compreendida entre 6,0 anos (mínimo) e 10,0 (máximo). Dentre as quarenta (40) mochilas mensuradas, observou-se que 52,2% (21) apresentaram excesso de peso, sendo que mochilas que não apresentaram excesso de peso somaram-se 47,5% (19).

    No gráfico 1 foi demonstrada uma comparação entre a séries escolares estudadas, abordando a diferença da ocorrência de excesso de peso nas mochilas. Na primeira e segunda séries, em cada uma, foram encontradas 60% (6) das mochilas com excesso de peso. Na terceira série, foram encontradas 50% (5) das mochilas excesso de peso. Na quarta série encontrou-se 40% (4).

Gráfico 1. Comparação da quantidade de mochilas (n=40), que apresentaram excesso de peso entre as crianças da 1ª à 4ª série

    O meio de locomoção que os sujeitos estudados utilizavam para deslocarem-se de suas respectivas moradias até a escola e vice-versa, também foi quantificado. 67,5% (27) dos sujeitos faziam este trajeto a pé; 5% (2) realizavam-no a pé e de carro; 5% (2) percorriam-no a pé ou de carro e 22,5% (9) o faziam de carro. (gráfico 3)

Gráfico 2. Relação dos meios de locomoção utilizados pelas crianças (n=40) da 1ª à 4 série

    Foi observado que a variação do excesso de peso, encontrado nas mochilas mensuradas, estava compreendido entre 0,1 Kg (mínimo) e 2,9 Kg (máximo), com média de 0,424 Kg +/- 0,663 Kg.

    Foi realizada uma comparação entre as séries escolares estudadas, do mínimo e máximo de excesso de peso em Kg (quilograma). Na primeira série esse valor ficou compreendido entre 0,25 Kg (mínimo) e 2,9 Kg (máximo), enquanto na segunda série ficou entre 0,1 Kg (mínimo) e 1,75 Kg (máximo). Na terceira série encontrou-se 0,2 Kg (mínimo) e 1,35 Kg (máximo) e na quarta série os valores de 0,3 Kg (mínimo) e 2,2 Kg (máximo) (gráfico 3).

Gráfico 3. Comparação entre o valor mínimo e máximo de excesso de peso nas mochilas (n=40) da 1ª à 4ª série

Discussão

    O excesso de peso nas mochilas encontrado nesse estudo foi obtido através de cálculo de 10% do peso corporal dos sujeitos investigados. Segundo a OMS, o valor obtido desse cálculo seria o máximo que poderia ser suportado por crianças sem que essas sofram malefícios que seriam causados pelo peso das mochilas como, por exemplo, alterações na postura corporal. Leis municipais, como no município de São Paulo, já regulamentaram essa percentagem máxima para as mochilas das crianças.

    Verificou-se que o aumento nas séries escolares estava relacionado a uma diminuição no excesso de peso das mochilas. Sugere-se que crianças que se encontram na terceira ou quarta séries, geralmente, possuem um peso corporal maior que as crianças da primeira e segunda série. Além disso, de acordo com Forjuoh e cols., (2003) observa-se que o peso das mochilas eleva-se com o aumento das séries escolares. Desse modo, a avaliação desses dois fatores, peso corporal e peso das mochilas, poderiam estar relacionados com essa diminuição no excesso de peso das mochilas observado no presente estudo. Este maior peso corporal em crianças mais velhas (terceira e quarta série) capacitou-as a carregar um peso na mochila também maior, fato esse comprovado pelo calculo dos 10%. Já no caso de crianças com peso corporal pequeno, como observado nas crianças da primeira e segunda série, o pouco peso que estas suportavam nas mochilas pôde ser considerado um valor expressivo que refletiu o excesso de carga.

    Dados coletados nesse trabalho, como a forma de locomoção, e localização da residência das crianças, foram utilizados para averiguar, respectivamente, se elas estavam carregando a mochila e o tempo em que estas suportavam o peso da mesma. Através dos dados acima citados, em geral, o trajeto residência à escola e vice-versa, era realizado pelas crianças a pé, sendo que quanto maior trajeto percorrido maior o tempo de permanência da sobrecarga. Dentre os efeitos resultantes de um maior tempo de exposição a sobrecarga, incluem-se mudanças no sistema locomotor e a determinação do surgimento de diversas dores (NOGUEIRA e cols., 2004). Como citado por Mackenzie e cols., (2003) o uso de mochilas pesadas determina a ocorrência de mudanças posturais na coluna, elevando-se assim a preocupação entre a população que problemas como hipercifose e escoliose poderiam ser causados ou agravados pelo uso das mochilas. E ainda, as demandas metabólicas impostas pelo peso das mochilas poderiam ser significativas principalmente em crianças sedentárias e com sobrepeso.

    Estudos que investigam a postura corporal bem como a coluna vertebral têm mostrado uma clara associação entre a carga das mochilas e a resposta corporal. Crianças, especialmente as mais jovens, adquirem mecanismos compensatórios em relação à postura corporal com cargas acima de 10 a 15% do seu peso corporal correspondente. Sugere-se que cargas menores que 10% a 15% do peso corporal são requeridas para a manutenção ideal do alinhamento da postura corporal. Porém pesquisas adicionais são necessárias para confirmar esses achados, principalmente no que se refere à relação de dor lombar e excesso de peso das mochilas (WEIR, 2002).

    Em adição aos problemas musculoesqueléticos e posturais, mochilas pesadas sobre a coluna vertebral também afetariam a mecânica pulmonar e seus volumes, onde as cargas superiores a 20% do peso corporal mostraram diminuir os volumes pulmonares em 43 crianças em idade escolar (WEIR, 2002).

    Embora as mochilas pesadas não estejam claramente associadas às causas de dores nas costas das crianças, as evidências sugerem que a redução da carga para 10% do peso corporal manteria a postural normal, bem como a função pulmonar em crianças (WEIR, 2002). Desse modo, seria de suma importância a prevenção de futuros sintomas associados ao uso das mochilas, tendo como ponto de partida a redução das cargas.

    Diante dos diversos problemas gerados pelo uso inadequado de mochilas (excesso na carga e manejo), é importante salientar o papel dos pais na aquisição do tipo de mochila apropriado para as crianças, bem como a orientação para manejo correto das mesmas. Essa preocupação com as mochilas das crianças deve-se estender as escolas, promovendo horários adequados e fornecendo armários para guardar os materiais de forma a reduzir a carga nas mochilas. Cabe ao governo, nas várias esferas, a regulamentação de leis que instituam um limite de carga de 10% do peso corporal da criança assim como a fiscalização do cumprimento dessas por parte da escola. Em alguns municípios, como o caso da cidade de São Paulo, essa lei já está em vigor e regulamenta que “A não-observância do que dispõe esta lei acarretará as penalidades cabíveis nos termos da legislação vigente” (SÃO PAULO, 2002. p. 1). Uma última consideração que deve ser feita é o fato dos fabricantes das mochilas não enfatizarem o fator ergonômico, o qual deve estar presente no processo de fabricação.

Conclusão

    Os resultados do presente estudo permitiram concluir que havia excesso de peso nas mochilas dos alunos de primeira a quarta série da Escola Estadual Matta Machado.

Referências bibliográficas

  • BRACKLEY, H. M.; STEVENSON, J. M. Are children’s backpack weight limits enough? A critical review of the relevant literature. Spine, v. 29, n. 19, p. 2184-2190, 2004.

  • CHANSIRINUKOR, W e cols. Effects os backpacks on students: measurement of cervical and shoulder posture. Aust J Physiother, vol. 47, n. 2, p. 110-6, 2001.

  • FORJUOH, S e cols. Percentage of body weight carried by students in their school backpacks. Am Phy Med Rehabil, vol. 82, n. 4, p. 261, 2003.

  • FORJUOH, S e cols. Parental Knowledge of school backpack weight and contents. Arch Dis Child, v. 88, p. 18-19, 2003.

  • MACKENZIE, W. G e cols. Backpacks in Children. Clinical Orthopaedics and related research, n. 409, p. 78-84, 2003.

  • NOGUEIRA, D e cols. Análise da marcha humana mediante sobrecarga com mochila. Disponível em: http://www.fisionet.com.br/artigos_id.asp?id=1115. acesso em: 25 mar. 2004. 22:34.

  • SÃO PAULO9 (Município). Projeto de Lei nº 102/2002, de4 03 de dezembro de 2002. Disponível em: http://www.leismunicipais.com.br/cgi-local/buscleisnuu.pl?cidade=/São%Paulo&estado=SP&tipo=ork&codoff=19W76020. Acesso em: 8 jun. 2004. 16:44.

  • SHEIR-NEISS, G. I e cols. The association of backpack use and back pain in adolescents. Spine, vol. 28, n. 9, p. 922-30, maio. 2003.

  • WALL, E. J e cols. Backpacks and Back pain: Where’s the epidemic? Jounal of Pediatric Ortopaedcs, v. 23, p. 437-439, 2003.

  • WEIR, E. Avoiding the back-to-school backache. CMAJ, v. 167, n. 6, 2002.

Rua do Fogo, Praça da Luz, nº 241, apt. 202. CEP 39100000 – Diamantina, MG /Hércules Ribeiro Leite

Débora Alves de Ávila Bueno

Rômulo Dias Novaes

Eliziária Santos Cardoso

Polyanna Gomes Cota

Ana Carolina Batista

Tânia R. Riul

Sub-Tema:

Fisioterapia

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