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A coesão grupal: a possibilidade de construção por meio

de atividades não competitivas e cooperativas 

nas aulas de Educação Física

La cohesión grupal: la posibilidad de su construcción por medio de actividades 

no competitivas y cooperativas en las clases de Educación Física

 

*Estudante do curso de Licenciatura em Educação Física

**Professor do curso de Licenciatura em Educação Física

Universidade de Caxias do Sul

(Brasil)

Gislaine Zanoto Rech*

gizrech@hotmail.com

Gerard Mauricio Martins Fonseca**

gerardmfonseca@hotmail.com

 

 

 

 

Resumo

          O presente trabalho teve como objetivo verificar a influência de um programa de atividades não competitivas e de características cooperativas na melhora do relacionamento grupal de estudantes de escola pública do ensino fundamental. Metodologicamente utilizou-se o teste sociométrico como instrumento de coleta e o mapa sociométrico como estratégia para análise dos resultados. Após a aplicação do programa de atividades, verificou-se que não houve uma melhora considerável na coesão grupal, excetuando-se a liderança do grupo. O trabalho concluiu que programas deste tipo necessitam um tempo maior para poder apresentar resultados significativos.

          Unitermos: Coesão grupal. Atividades cooperativas. Educação Física.

 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 15 - Nº 145 - Junio de 2010

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Introdução

    A importância da educação física nas séries iniciais já está devidamente comprovada, tendo em vista que este componente curricular compreende além dos benefícios acerca do repertório motor, o desenvolvimento integral das crianças nos âmbitos, cognitivo, afetivo e social. É durante a aula de educação física que a criança brinca e está sujeita a uma enorme gama de movimentos, contato com os colegas, melhoria de laços de afetividade e relação social. Segundo Etchepare e et.al. (2003) o processo de aprendizagem deveria ocorrer de forma que o aluno pudesse compreender sua realidade e fosse capaz de refleti-la. Não se pode separar corpo e mente, deve-se pensar o ser humano como o todo, sendo assim a educação física na escola, tem um papel muito importante para o aluno na busca da compreensão do que está acontecendo em sua volta e consigo mesmo.

    De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (Brasil, 2000) o trabalho da educação física nas séries iniciais do ensino fundamental é importante, pois possibilita aos alunos terem, desde cedo, a oportunidade de desenvolver habilidades corporais e de participar de atividades culturais, como jogos, esportes, lutas, ginásticas e danças, enriquecendo seu repertório motor, vivenciando momentos de lazer, expressão de sentimentos, afetos e emoções. Quando se fala em educação física escolar e práticas esportivas, a idéia de aprendizagem e desempenho de movimentos corporais vem logo a mente, porém não é somente nestes pontos que ela interfere. Ela influencia também no comportamento social das crianças, no seu relacionamento, ou seja, nos aspectos sócio-afetivos.

    Na educação física escolar, principalmente pela sua característica atual de ênfase no ensino de práticas esportivas de maneira tradicional (DARIDO, 2003), a competição acaba sendo priorizada, refletindo desta forma a realidade que nos cerca. Nos dias de hoje a competição está cada vez mais em evidencia, tanto em áreas de trabalho como em aspectos pessoais. Na atualidade competimos contra nós mesmos. A mentalidade da humanidade está sendo submetida à falta de tolerância, solidariedade, respeito mútuo, trabalho coletivo e cooperação. Este caráter competitivo vem criando uma geração de pessoas, principalmente os mais jovens, pautada na individualidade, onde a primeira preocupação é consigo mesmo. No âmbito da educação física isso fica explícito no que diz respeito ao atributo de alguma habilidade física, onde os jovens mais habilidosos acabam pensando somente em seu desempenho e procurando cada vez mais a vitória, na tentativa de demonstração, aos que não são tão hábeis, de sua capacidade de força e competência, criando assim uma maneira geradora de competição e exclusão.

    A competição é definida segundo Coakley apud Weiberg e Gould (1994), como um processo social que ocorre quando certas pessoas são recompensadas pelo seu desempenho, que é comparado com o desempenho de outras pessoas que estejam realizando a mesma atividade. Na educação física escolar não é diferente, principalmente quando há ênfase na prática esportiva competitiva, onde o espírito de vencer é enorme, ganhar do colega, ser melhor do que os demais caracterizam as aulas. Na prática esportiva formal, os jogos enfatizam a vitória e a derrota, salientando aspectos de competitividade e destacando as diferenças entre os que podem e os que não podem. A educação física tradicional, ainda muito presente na realidade educacional brasileira, reflete a prática esportiva vigente na sociedade. Mantém-se desta forma a maneira de alguns jogarem para derrotar os outros e não por gostarem do jogo e pelo prazer de jogar, havendo a exclusão de alguns e barreiras entre as pessoas através das diferenças. Desenvolvendo-se neste caso em alguns indivíduos um sentimento de desistência frente às dificuldades, pois perdem a confiança em si mesmo quando são rejeitados ou perdem. Cria-se assim, um quadro de exclusão e individualismo nas aulas e também de certa forma refletindo na vida adulta.

    Deve-se buscar alternativas de mudança a esta realidade tão competitiva, o aumento da conscientização do trabalho em equipe vem transformando muitos grupos nos dias de hoje. O “eu” começa a dar lugar ao “nós”. Um bom exemplo para a diminuição da competitividade durante as aulas de Educação Física são as atividades com caráter cooperativo e não-competitivo, onde o esforço de todos é necessário para se atingirem metas e objetivos em comum.

    Brotto (2001) cita que nos jogos cooperativos e atividades não-competitivas os participantes não jogam uns contra os outros, mas uns com os outros, possuindo estrutura alternativa, que compartilham, unem pessoas, despertam a coragem para assumir riscos tendo pouca preocupação com o fracasso e o sucesso em si mesmos, o jogo somente é possível de ocorrer, pela presença do outro. Não jogamos sozinhos necessitamos de alguém para partilhar este processo.

    Segundo Coakley apud Weinberg e Gould (2001) a cooperação tem sido definida como um processo social onde as recompensas são dadas, a partir das realizações coletivas, para um grupo de pessoas que trabalham juntas em prol de um determinado objetivo.

    Na educação física escolar, as recompensas obtidas através dos jogos cooperativos e não-competitivos serão compartilhadas por todos do grupo e não somente por alguns, com isso o indivíduo é capaz de se integrar ao meio social, desenvolvendo o conhecimento mútuo e a participação grupal, adquirindo hábitos de relações interpessoais.

    As atividades cooperativas e não-competitivas produzem mais comunicação, confiança, amizade e até mesmo melhoram o desempenho, tendo em vista a inclusão de todos, onde se reforça a possibilidade da coesão grupal.

    Lewin apud Simões (1998) define a coesão grupal como um conjunto de forças atuantes sobre os indivíduos que fazem parte de um grupo para que continuem fazendo parte deste. Weiberg e Gould (2001) citam que a coesão é frequentemente relacionada a atração interpessoal, tendo em vista o grau em que membros gostam e apreciam a companhia uns dos outros, estando positivamente relacionada ao apoio social, metas do grupo, estabilidade e satisfação. Para que haja a coesão grupal é necessária uma boa relação social entre os indivíduos, o que segundo Marques e et.al. (2007) através da coesão grupal é estabelecido um clima de confiança, um terreno firme para a realização dos objetivos do grupo. A atividade de característica cooperativa e não-competitiva fortalece a coesão grupal, que por sua vez desenvolve cada vez mais este espírito de forma conjunta. Em jovens em idade escolar, a possibilidade de estimular o trabalho conjunto e por sua vez melhorar as relações interpessoais pode ser atingida de maneira mais fácil do que em adultos. Eles são mais abertos as novas experiências e aprendizagens.

    Porém, modificar a forma das aulas de educação física em sua estrutura básica, evidenciando a aprendizagem de atividades cooperativas e não-competitivas, talvez seja o maior desafio dos professores. Defendemos que a educação física tem, pelas suas características, a maior oportunidade de desenvolver estes aspectos, se for direcionada para isto. O ato de jogar é inerente da espécie humana e muito presente na infância. Cabe ao professor educar para o jogo.

    Estudos realizados por Schwartz et. al. (2002) comprovam que o jogo tem papel fundamental no desenvolvimento cognitivo e interpessoal da criança. Em relação a jogos com caráter cooperativo e não-competitivo estimula-se união, respeito, colaboração mútua, trabalho em grupo, ausência de brigas, violência e preconceito.

    Desta forma, as aulas de Educação Física são um ambiente propício para a melhoria das relações sociais, tendo em vista que uma série de fatores estão relacionados, como o jogo, a afetividade, o espírito de equipe, a coesão grupal entre outros. Torna-se necessário atividades de caráter não-competitivo para a resolução do isolamento, persistência em manter sempre os mesmos grupos sociais e interagindo e podendo relacionar-se com todos de maneira sociável e ao mesmo tempo amenizando-se a competição e a individualidade. Comprovar o grau de eficácia das atividades de cunho cooperativo e não-competitivo nas aulas de educação física e sua influência na melhora do relacionamento interpessoal é o que desencadeou a realização deste estudo.

    Desta forma, surgiu a seguinte questão problematizadora:

  • Qual a influência de um programa de atividades motoras cooperativas e não-competitivas para a melhoria da relação social em escolares?

    Para resolver esta questão, busca-se atingir os seguintes objetivos para a pesquisa:

  • Verificar o grau de relacionamento de escolares das séries iniciais e sua conseqüente melhora após um programa de atividades cooperativas e não-competitivas.

  • Construir e aplicar um programa de atividades cooperativas e não-competitivas para crianças de séries iniciais, que atenda aos seus interesses.

Metodologia

    O presente trabalho caracterizou-se por uma pesquisa quase-experimental, com característica longitudinal, e abordagem qualitativa na medida em que avaliou a influência de um programa de atividades esportivas cooperativas e não-competitivas no relacionamento do grupo. A pesquisa quase-experimental de acordo com Thomas, Nelson e Silverman (2007) tem por objetivo a tentativa de estabelecimento entre as relações de causa e efeito. A característica longitudinal é dada através da coleta de dados em dois ou mais momentos, havendo um acompanhamento do desenrolar do fenômeno considerado.

    O aspecto quase-experimental deste estudo se deu devido ao fato de que não foi possível controlar todas as variáveis que pudessem intervir no estudo, principalmente no que diz respeito às relações sociais, fora da aula de educação física e também fora do âmbito escolar.

Amostragem

    Os participantes desta pesquisa foram os alunos do 4º ano, de uma escola estadual, de ensino fundamental, do município de Campestre da Serra, no Rio Grande do Sul.

    A opção pela escolha desta escola se deu a partir da clientela que compõe esta turma e por ser a única escola localizada na zona urbana da cidade, apresentando uma amostragem significativa desta população.

    Todos os avaliados foram convidados a participar do estudo, espontaneamente, sendo que os pais ou responsáveis assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido, onde constou o objetivo da pesquisa e a descrição das atividades que seriam realizadas pelas crianças e a possibilidade de risco, com autonomia para a desistência da participação e sem qualquer tipo de pagamento.

Instrumentos de coleta de informações

    Utilizou-se o teste sociométrico para a coleta das informações, que segundo Cavasini e Osse (1984) consiste em uma medida de comportamento social, sendo utilizada para dar um nível mais objetivo de relacionamento de um determinado grupo. Possui uma metodologia de pesquisa de estruturas sociais, obtida através da medida das rejeições e atrações existentes entre os membros de um mesmo grupo, determinando a situação de cada indivíduo dentro do mesmo. O teste sociométrico realizou-se em dois momentos da investigação, no início, antes da aplicação do programa de atividades cooperativas e não-competitivas e no final da referida intervenção.

Procedimentos

    Em uma primeira etapa, aplicou-se o teste sociométrico e construiu-se o mapa sociométrico, buscando identificar as relações interpessoais entre os participantes. O teste foi aplicado uma semana antes de se iniciar o programa, tempo necessário, para o planejamento dos encontros, de acordo com os resultados encontrados.

    O teste sociométrico consistiu basicamente de 04 questões; a primeira procurou identificar o melhor amigo dentro do grupo, a segunda questão referiu-se ao aluno que possui melhor desempenho durante as aulas de educação física, a terceira, buscou saber qual o colega com que o aluno mais gosta de brincar ou jogar, nas atividades físicas e por fim a última questão objetivou saber quem o aluno escolheria para ser o líder da turma. Para cada pergunta foram dadas três respostas, ou seja, o nome de três colegas, por ordem de preferência do aluno, sendo que poderia ser repetido o nome dos colegas e também o seu nome como resposta.

    A segunda etapa consistiu na aplicação de um programa de atividades motoras com cunho cooperativo e não-competitivo, totalizando 20 encontros. A pesquisa realizou-se, durante os períodos de educação física, tendo duração média de 45 minutos cada, já previstos na base curricular da escola, em horário regular.

    As atividades foram variadas, contemplando diferentes conteúdos, mas possuidores da mesma essência que é a não competitividade e a cooperação, sendo necessário ajuda mútua, companheirismo, colaboração e participação dos colegas para a obtenção do objetivo das atividades. A aula era composta por três partes.

    Inicialmente, retomava-se o conteúdo do dia anterior e era aplicado um aquecimento composto essencialmente de atividades lúdicas. Na parte principal, foram desenvolvidas atividades de jogos cooperativos e não-competitivos, evidenciando-se a relação entre os colegas, a construção de soluções conjuntas para os problemas colocados pelas atividades. O momento mais importante foi o mais específico do programa de intervenção, onde se buscou reorientar a formação da relação existente entre os sujeitos investigados.

    Ao final fazia-se a reflexão perante o andamento, comportamento e atividades ocorridas, bem como sugestões vindas dos alunos para a melhoria das sessões. Procurou-se fazer com que os alunos entendessem a essência das atividades sem competitividade, relacionando com exemplos e questionando-os.

    Após os 20 encontros, aplicou-se o teste sociométrico novamente, a fim de analisar os resultados obtidos com o programa de atividades motoras cooperativas e não-competitivas, e se houve ou não influência desse programa na melhoria da relação social entre os participantes.

Análise das informações

    Os resultados foram analisados através dos dois testes sociométricos, por meio do mapa sociométrico. As relações interpessoais encontradas por meio do teste sociométrico determinam os resultados obtidos, que serão analisados na seqüência do trabalho.

    A análise dos resultados obtidos reflete as relações construídas pelas crianças ao longo do tempo de convivência escolar, bem como a influência de um programa de atividades cooperativas e não competitivas na coesão do grupo, ou seja, sua relação mais homogênea, para Becker e Samulski (2002) um grupo terá mais chances de alcançar seus objetivos, se for um grupo coeso. Um número de pessoas integradas e voltadas para uma meta em comum é a unidade moral, espiritual e psicológica de um grupo, motivado para o alcance de objetivos comuns.

Questão 01. Quem é o seu melhor amigo (a) dentro da turma?

    Analisando os testes sociométricos da questão 01 nos dois momentos, percebe-se uma forte divisão entre o grupo feminino, com as meninas sendo avaliadas com os números de 01 até 12 e o masculino, avaliados de 13 até 22. Neste aspecto, o programa de atividades cooperativas e não competitivas não avançou suficientemente para quebrar as resistências.

    As relações dentro de cada grupo, porém, apresentaram pequenas modificações, principalmente entre os menos citados no primeiro momento em comparação com o segundo momento.

    Nos mapas sociométricos, a escolha das preferências de cada aluno é representada através de:

Mapa sociométrico 1

Mapa sociométrico 2

    Como a questão 01 é baseada na afetividade do grupo, possivelmente nesta faixa etária as crianças de gêneros diferentes enxergam o aspecto afetivo, a amizade, de uma maneira bastante física, principalmente em relação ao contato e proximidade corporal. Desta maneira, as modificações no quadro de relações dentro do grupo de uma maneira geral, foi um tanto quanto difícil. Historicamente as crianças já apresentavam uma divisão, pela característica das aulas, essencialmente tradicionais e por isto, possivelmente o programa com seu tempo de aplicação tenha sido muito curto.

    De acordo com Gallardo (2005) as crianças de 1ª a 4º série se encontram no período da latência. Sendo este, um período marcado para a aquisição de habilidades, valores e papéis culturalmente aceitos, buscando através destas ações, impedir a manifestação do impulso sexual. Nesta faixa etária, surge a separação de meninos e meninas e também a grande rivalidade entre eles.

    Segundo Bee (1996), os grupos e as amizades dos meninos parecem centrar-se mais na competição e dominância do que o das meninas. Já por parte das meninas, observa-se que possuem amizades com maior concordância, aquiescência e auto-revelação do que acontece geralmente com os meninos.

Questão 02. Quem é o (a) melhor aluno (a) da turma nas aulas de educação física?

    A questão 02 é relacionada à habilidade, ou seja, a competência motora dos alunos, objetivando verificar quais as opções dos avaliados pelos colegas considerados melhores, neste caso da educação física, os mais habilidosos.

    Da mesma forma que na questão anterior, de uma maneira geral não houve modificações em relação aos resultados apresentados em ambos os testes, antes da apresentação do programa e após o desenvolvimento do trabalho. Houve uma pequena modificação nas preferências entre os dois momentos do teste. Porém, cabe salientar, que a divisão intra-gêneros continuou, após o desenvolvimento do programa, como é possível observar nos mapas sociométricos, a seguir:

Mapa sociométrico 1

Mapa sociométrico 2

    Cabe assinalar mais uma vez que as crianças nº 01 até o número 12 são meninas e as crianças 13 até 22 são meninos.

    As atividades não foram competitivas, ou seja, não refletiam no melhor aluno da turma, pois o aspecto da melhor habilidade não foi enfatizado durante as aulas. O programa implantado não se propunha identificar o mais habilidoso ou habilidosa dentro do grupo, mas sim que as diferenças fossem amenizadas e que o aspecto da competição, oriunda muitas vezes dos mais habilidosos fosse deixado de lado e procurasse a inclusão de todos.

    De maneira geral pode-se afirmar que a imagem da competência esportiva, através de uma melhor habilidade, que foi construída ao longo da relação entre as crianças, determinou a escolha dentro dos grupos. Nos dois momentos avaliados, houve pouca modificação nesta percepção das crianças avaliadas. Os avaliados escolhidos como mais habilidosos, as crianças nº 01, 12, 17 e 18 continuaram mantendo o “status” de melhores da turma.

    Okano et al (2001) citam que existe a grande divisão de escolhas e preferências em ambos os gêneros, preferindo eles, tarefas motoras que exijam potência muscular e elas mais voltadas para atividades de equilíbrio e flexibilidade, pois muitas vezes, os meninos são tidos como mais fortes, mais rápidos, mais habilidosos, já as meninas consideradas mais frágeis e dóceis, mas menos capazes de desenvolverem certas habilidades requeridas para a prática dos esportes.

    Segundo Gallahue e Donnelly (2007), os interesses de meninos e meninas no início dos anos escolares são semelhantes, mas rapidamente começam a divergir. Ambos gostam de atividades de auto-teste, como uma maneira de experimentar e testar suas habilidades desenvolvidas. A interação dentro de um grande grupo e o conceito de trabalho em equipe melhora durante este período. Pela característica das aulas antes da implantação do programa de atividades serem mais voltadas para a competição, houve certa resistência à nova proposta, baseada em atividades que priorizaram a cooperação e ajuda mútua.

    Para Meinel (1984), existem outros componentes do comportamento motor que influenciam os escolares, são eles: a acessibilidade a solicitações de rendimento esportivo e o desejo de rendimento. Observa-se que existe um interesse prazeroso na solução de tarefas de movimento esportivo. Por um lado, algumas crianças já mostram com satisfação uma prontidão de rendimento, por outro, observa-se crianças que não se saem tão bem em atividades desportivas.

    Neste aspecto também, o programa não avançou na construção de uma nova percepção do que seria o melhor aluno, ou o melhor colega.

Questão 03. Com quem você mais gosta de jogar/brincar nas aulas de educação física?

    A questão 03 está relacionada ao aluno com quem os avaliados mais gostavam de jogar ou brincar nas aulas. Ela objetivou identificar a prevalência na opção por esta ação de brincar ou jogar, pela amizade ou pela habilidade. Os dois mapas caracterizaram-se pela divisão já existente, entre o grupo das meninas e o grupo dos meninos. Houve um pequeno aumento entre as ligações existentes entre os grupos. Num comparativo do segundo teste com as perguntas 01 relacionada à amizade e a pergunta 02 relacionada ao desempenho habilidoso, nota-se que de uma maneira geral, a opção dos avaliados ficou mais relacionada a amizade, para ambos os gêneros.

    Piaget apud Barbosa (1997) cita que as crianças na idade dos 7 aos 12 anos, estão no período operatório-concreto, marcado pelo início da cooperação e do raciocínio lógico. A linguagem da criança se mostra socializada, favorecendo as relações interpessoais.

Mapa sociométrico 1

Mapa sociométrico 2

Questão 4. Quem você escolheria para representante da turma?

    A questão nº 04 está relacionada com o perfil e características de liderança dos avaliados. É possível analisar que, diferentemente das outras questões, houve uma interação maior entre os gêneros. No mapa realizado com os resultados da avaliação antes da aplicação do programa e na comparação com os resultados apresentados no mapa após as aulas de atividades cooperativas e não competitivas, fica claro esta pequena modificação.

    No primeiro momento, houveram 05 votos ligando os grupos e no segundo momento 09 votos. Há que se destacar o aumento significativo na opção das meninas pelos meninos, que no primeiro momento elegeram apenas 02 colegas do outro sexo e após a aplicação do programa escolheram 06. Ressalte-se a avaliada nº 12, que no primeiro momento não escolheu nenhum menino e no segundo suas opções foram somente para os meninos. Pelos resultados dos mapas, nos dois momentos, pode-se observar que a aluna nº 12 possui uma forte liderança entre as meninas.

    Como já foi assinalado anteriormente, o programa de atividades cooperativas e não competitivas pode não ter surtido o efeito esperado no aspecto afetivo, pois foi um programa dirigido, a proposta das aulas era muito diferente das quais as crianças estavam acostumadas e, além disto, a professora era outra. Porém a proposta de fazer com que eles não competissem, partilhassem as diferenças, se ajudassem mutuamente, entre outros pontos relacionados com o desenvolvimento da coesão grupal, despertou possivelmente nas crianças, um respeito maior e uma admiração mais acentuada, um conhecimento mais profundo de um para o outro. Esta relação de participação mais conjunta nas atividades, conhecendo-se mais, seja dos meninos para as meninas e vice-versa, resultou assim na modificação da distribuição das opções do grande grupo a respeito de suas lideranças e conseqüentemente fortaleceram a coesão grupal.

    Este aspecto da liderança, da admiração, da organização, da capacidade de iniciativa e a possibilidade de meninos e meninas jogarem e participarem juntos das atividades, fez com que eles enxergassem uns nos outros, a questão da liderança, a vontade de fazer, de tomar iniciativa, criatividade, enfim, todos os componentes presentes nas atividades propostas, acabou refletindo na transformação do mapa sociométrico, no que diz respeito a escolha das lideranças da turma.

    De acordo com Goulart (2006), num sentido geral e abrangente, o papel do líder é influenciar pessoas a seguirem determinadas direções ou a realizar determinadas tarefas. Pode-se dizer que o líder, adquire liderança orientando e influenciando os demais membros do grupo. O indivíduo que é considerado um líder é possuidor de potencialidade como habilidades e traços físicos, habilidades cognitivas, e aspectos de personalidade.

Mapa sociométrico 1

Mapa sociométrico 2

    Diante dos resultados apresentados através dos mapas sociométricos nos dois momentos da referida intervenção, pode-se notar de uma maneira geral que o menino número 17 e a menina número 12, se destacam em todas as áreas, totalizando ele 39 votos e ela 37 votos nos dois testes realizados. Houve grande progresso dos meninos número 13, 18 e 19. Já por parte das meninas, se destacam progressivamente a número 01, 04 e 11. Analisando as individualidades percebe-se que não houve grandes modificações nos alunos mais distantes do grupo, sendo do sexo masculino os números 14, 16, 20 e 21 e do sexo feminino 02, 05, 06 e 07 que continuaram isolados nos dois testes sociométricos.

    Houve menor número de votos para si próprio, em comparação com os demais itens avaliados. Isto mostra que as atividades propostas despertaram na criança um olhar mais acurado nas qualidades dos colegas, menos egocêntrico, como companheirismo, liderança, simpatia.

Considerações finais

    Em relação à interferência na melhoria da coesão grupal entre os participantes do grupo, pode-se afirmar que o programa baseado em atividades cooperativas e não competitivas, com duração limitada, não atingiu os objetivos propostos inicialmente neste trabalho.

    A partir da análise dos resultados, a conclusão que se chega está baseada no levantamento de outras hipóteses.

    Primeiramente o programa de atividades proposto pode ter apresentado possíveis falhas, por não ser construído ao longo do ano, ou seja, teve período de duração insuficiente na execução das atividades cooperativas e não-competitivas. Acredita-se que ele foi curto para modificar as relações interpessoais. A turma era composta por grupos de afinidade, que desde o ingresso a escola (pré-escola) permaneciam juntos, o que impediu a intervenção em apenas 20 sessões de aula.

    Há que se considerar, da mesma forma, que a proposta implantada para o desenvolvimento desta pesquisa foi diferente do que as crianças estavam habituadas, tendo um histórico de suas aulas de educação física muito tradicional, com jogos esportivos e competitivos para a sua faixa etária. Existia o grande espírito da competitividade, procurando sempre a vitória.

    Conclui-se que neste tipo de intervenção a criação de um vínculo parece ser fundamental para a implantação de novas propostas de aprendizagem. Neste sentido, a troca de professora, ou seja, a troca da “referência” da turma durante o período da implantação da nova proposta para as aulas de educação física pode ter prejudicado o desenvolvimento do trabalho, para que atingisse seu objetivo. Este fato desencadeou uma agitação e um comportamento diferente, dos alunos, em relação às aulas anteriores. Observou-se inicialmente uma resistência à proposta por parte das crianças, por ser diferente das atividades que elas estavam habituadas, e/ou sempre terem sidos motivados para “vencer”.

    Conclui-se que as aulas propostas pelo programa de atividades cooperativas e não competitivas evidenciaram a coesão entre os meninos e meninas, mas mesmo assim o resultado positivo na coesão do grupo neste aspecto não foi alcançado. O programa pode não ter atingido as modificações no sentido da afetividade, pois já que a habilidade não era preconizada, mas sim atingiu modificações na liderança, onde puderam perceber nos colegas a capacidade que possuem para liderar.

    Cria-se assim novas possibilidades de realização de trabalhos, com base nas hipóteses por este realizadas, bem como os resultados, procurando com a melhoria do programa e do tempo de execução, a obtenção de um maior êxito, bem como a diminuição da competitividade entre o grupo a ser trabalhado, e a possibilidade de um maior equilíbrio nas relações interpessoais do grupo, formando-se um grupo mais coeso.

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