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A prática da capoeira no período da ditadura 

militar brasileira: uma breve revisão histórica

La práctica de la capoeira durante la dictadura militar brasileña: una breve revisión histórica

 

Curso de Mestrado em Educação Física ESEF/UFPel

(Brasil)

Marcel Anghinoni Cardoso

mcanghinoni@yahoo.com.br

 

 

 

 

Resumo

          Este estudo visa constar e discutir os fatos mais marcantes ocorridos na prática capoeira durante o período da Ditadura Militar Brasileira (1964-1985). Para este estudo, foi feita uma breve revisão de literatura, que buscou averiguar o contexto histórico vivido pelo Brasil, pela Educação Física no Brasil e pela prática da Capoeira no Brasil durante o período militar correspondente, a partir de obras que trouxessem considerações do período histórico em questão.

          Unitermos: Capoeira. Ditadura militar. História.

 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 15 - Nº 145 - Junio de 2010

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1.     Considerações iniciais

     A trajetória histórica da capoeira é marcada por contradições e falta de consenso entre os que dela se ocupam. Isso pode ser entendido pelo fato de efetuar sua manutenção e reconstrução da memória por meio da oralidade e ritualidade e possuir escassos registros documentais, que tiveram início apenas no início do século XIX (MOREIRA & MOREIRA, 2007).

    A partir da época em que os registros acerca dessa prática se fizeram presentes junto à população, um pouco da história da capoeira pode ser compartilhada e estudada de forma mais cuidadosa e criteriosa, o que pode trazer a tona diversos aspectos relativos a prática da capoeira no Brasil.

    Os aspectos mais marcantes dessa modalidade podem ser separados em diversos “pedaços históricos”, desde a era imperial até os dias de hoje (FRIGERIO, 1983). Como exemplo disso, pode-se citar a perseguição que a capoeira sofreu durante o período imperial, não sendo caracterizada como crime, mas sendo repudiada pelas classes mais altas da sociedade, que entendiam a capoeira como uma “doença moral” (REIS, 1997).

    Mais adiante, a partir de 1890, a capoeira passa a ser entendida como crime e sua prática é duramente reprimida até a chegada da Era Vargas, em 1930, onde ela passa a ser vista com bons olhos por militares e intelectuais. Segundo eles, a capoeira poderia se caracterizar como uma excelente ginástica que deveria ser ministrada e praticada por diferentes alas sociais, desde os militares até os escolares da época (REIS, 1997).

    Partindo desse breve aparato histórico, este trabalho visará descrever como a capoeira foi vista e praticada dentro do Brasil durante o período da ditadura militar, período esse marcado por autoritarismo, supressão dos direitos constitucionais, perseguição policial e militar, prisão e tortura dos opositores e pela censura prévia aos meios de comunicação (MATOS & NUNES, 1994).

2.     A ditadura militar brasileira

    Para entender a capoeira no contexto histórico da ditadura militar, é de grande importância descrever um pouco este período de uma maneira mais genérica, salientando suas peculiaridades e acontecimentos mais importantes para, a partir disso, escrever sobre a prática da capoeira e seus acontecimentos mais marcantes dentro deste período.

    A ditadura militar brasileira (1964 a 1985) foi um período histórico bastante conturbado na trajetória política brasileira. Para Matos e Nunes (1994), o período ditatorial no Brasil caracterizou-se como uma fase marcada pela supressão de diversos direitos inerentes a manutenção da democracia, como a censura, as perseguições militares a estudantes, filósofos e políticos anteriores ao regime aliada a prisão e tortura de pessoas que se manifestassem contra essa prática política.

    A supressão de direitos veio aos poucos, com medidas chamadas atos institucionais, que agiam como bloqueadores da democracia a medida que iam se impondo perante a sociedade brasileira (MATOS & NUNES, 1994). Ao total, foram cinco atos institucionais durante o regime, que acarretaram em uma total extinção da democracia dentro do Brasil.

    Após diversos protestos, passeatas e manifestações, muitas vezes terminadas a custa da vida de muitos militantes, o Brasil, a partir de 1980, entrou um lento período de redemocratização, concluído em 1985, com a eleição de Tancredo Neves, fato que caracterizou o fim do regime no país.

3.     A Educação Física no período ditatorial

    Entender a escola e, principalmente, a Educação Física no período ditatorial parece ser de grande importância no contexto deste estudo, à medida que a administração dos meios esportivos e da Educação Física são de grande importância para entender como a capoeira se insere e se afirma como prática no período ditatorial.

    Segundo (PINTO e VAGO, 2000), o período ditatorial brasileiro, principalmente no período correspondente ao governo do General de Exército Emílio Garrastazu Médici, foi de grande intervenção do governo na Educação Física e no esporte. Segundo o mesmo autor, o governo buscou a inserção da Educação Física e do desporto na escola, além da formação de um grupo de trabalho para estudar o s problemas destes dois setores.

    A partir deste estudo, foi criado o Departamento de Educação Física e Desporto, que passou a atuar como um órgão central de direção superior, subordinado diretamente ao Ministério de Educação e Cultura, então sob o comando de Jarbas Passarinho (PINTO e VAGO, 2000).

    Com o desenvolvimento deste planejamento, a grande missão encontrada foi à modernização da estrutura administrativa e a elevação do desporto brasileiro aos olhos de outros países (PINTO e VAGO, 2000).

    Tendo em vista esse breve aparato sobre a intervenção do governo militar frente a Educação Física, veremos agora o que de fato foi marcante dentro do contexto histórico da capoeira durante o período militar.

4.     A capoeira e sua construção como modalidade no período ditatorial

    Fatos importantes aconteciam no Brasil durante o período ditatorial brasileiro e, concomitantemente a isso, a capoeira mantinha um processo de ascensão originado desde a década de 30. Na década de 70, dois fatos muito marcantes se fazem presente na construção da relação entre os praticantes de capoeira e o governo. Tal fato ocorre mais precisamente em 1972, quando a capoeira é reconhecida oficialmente como desporto pelo Ministério da Educação e Cultura, incluindo-se em um processo de institucionalização e burocratização que visa promover a homogeneização desta prática a nível nacional (REIS, 1997). Tal fato histórico foi muito marcante, à medida que por volta do final da década de 70 e início da década de 80, houve um grande crescimento no número de instituições de ensino da capoeira, fato este que contribuiu muito para a pulverização da capoeira em escolas, universidades e creches (MOREIRA & MOREIRA, 2007).

    Em 1968 e 1969, realizaram-se na cidade do Rio de Janeiro dois simpósios nacionais sobre capoeira, patrocinados pela comissão de desportos do Ministério da Aeronáutica, reunindo vários mestres em um evento de cunho nacional. Nesse momento, torna-se evidente o grande crescimento da capoeira, que viria três anos mais tarde com seu reconhecimento como desporto (REIS, 1997).

    Dois anos apões a oficialização, é criada em São Paulo a primeira federação de capoeira do Brasil, procurando difundir a capoeira como arte marcial brasileira. Tal fato é questionado por alguns segmentos, entendendo que o processo de “marcialização” da capoeira infringia princípios básicos desta prática, como a idéia de um confronto indireto (REIS, 1997).

    Após o reconhecimento da capoeira como desporto nacional, ocorrem fatos importantes e que, de certa forma, acabam por distorcer a pragmática histórica da capoeira. Um deles é a publicação do livro Capoeira sem Mestre, que propunha uma espécie de ensino da de forma alheia a sua tradição, excluindo a figura do mestre. Mais tarde, em 1979, é encaminhado um projeto de lei na câmara que propunha a mudança do nome capoeira para “luta nacional”. Para Reis (1997), esses processos acabariam por metamorfosear a capoeira, desmitificando-a pela força da lei.

    O reconhecimento da capoeira como desporto também trouxe mudanças interessantes no que diz respeito à difusão de sua prática no Brasil. Em 1975, é realizado, em São Paulo, o primeiro torneio nacional. Para a realização deste, é construído um regulamento técnico estabelecendo regras para o mais novo esporte brasileiro, alem de uma nomenclatura unificada para os golpes aliada a uma intervenção pedagógica nacional, que de acordo com Reis (1997), servia como uma ação do Estado para aumentar a dimensão da capoeira.

    Essas medidas governamentais acarretaram em uma grande difusão da capoeira pelo Brasil, aliada ao crescimento desta modalidade dentro do Brasil desde sua institucionalização até os dias atuais, com a criação de academias para a prática da capoeira que se perpetuam como grandes centros da prática e difusão desta modalidade, acelerando o processo de homogeneização da capoeira, proposto pelo governo militar quando reconhece a capoeira como esporte no Brasil

5.     Considerações finais

    O período da ditadura militar foi um período marcante na história do Brasil e, concomitantemente, na história da Educação Física, do desporto e, como exposto neste estudo, da capoeira, já que tal período comportou a institucionalização da capoeira como desporto bem como a difusão desta prática dentro de nosso país.

    A partir disto, conclui-se que o período ditatorial foi uma fase marcante positivamente em vários aspectos da capoeira, como na afirmação dela como prática, como a criação de academias e de competições desta modalidade, mas também um pouco negativa, em vista da certa desmistificação da capoeira enquanto ritual histórico-social.

Referências bibliográficas

  • FRIGERIO, Alejandro, Capoeira: de arte negra a esporte branco, extraído de http://www.anpocs.org.br/portal/publicacoes/rbcs_00_10/rbcs10_05.htm

  • MATOS, Clarence José, NUNES, César A. História do Brasil, Editora Nova Cultural, 1994

  • MOREIRA, Ramon, MOREIRA, Najara, Capoeira: sua origem e sua inserção no contexto escolar. EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 12, N° 114, Noviembre de 2007. http://www.efdeportes.com/efd114/capoeira-sua-origem-e-sua-insercao-no-contexto-escolar.htm

  • PINTO, Joélcio Fernandes, VAGO, Tarcísio Mauro, Representações de Esporte e Educação Física na Ditadura Militar: Uma Leitura a Partir da Revista de História em Quadrinhos Dedinho (1969-1974), extraído de http://www.cbce.org.br/cd/resumos/234.pdf

  • REIS, Letícia Vidor de Sousa, O mundo de pernas para o ar: a capoeira no Brasil, São Paulo: Publisher, Brasil, 1997.

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