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Saúde na escola: o desafio do profissional de Educação Física 

perante a incidência das doenças crônicas em crianças e adolescentes

Salud en la escuela: el desafío del profesional de Educación Física frente 

a la incidencia de enfermedades crónicas en niños y jóvenes

 

Graduação em Educação Física pela Universidade Federal de Santa Maria

Mestrado em Educação Física pela Universidade Federal do Paraná

Professora da Universidade do Oeste de Santa Catarina

Campus de Xanxerê (SC)

Luciéle Guerra Minuzzi

lu.minuzzi@hotmail.com

(Brasil)

 

 

 

Resumo

          As doenças cardiovasculares (DCVs) configuram hoje a principal causa de morte nos países em desenvolvimento. Os fatores de risco para as DCVs são determinados em grande parte pelos comportamentos aprendidos na infância e que persistem na idade adulta, tais como hábitos alimentares e tabagismo. O número de crianças obesas tem aumentado assustadoramente, casos de diabetes tipo 2, antigamente rara em crianças, e uso de cigarros começam a despontar em todo o mundo. Evidências mostram que a atividade física resulta em alguns benefícios para a saúde de crianças e adolescentes. De conta disso, programas na escola e na comunidade que promovam a atividade física regular entre os jovens podem estar entre as estratégias mais eficazes para reduzir a carga de doenças crônicas associadas ao estilo de vida sedentário. O profissional de Educação Física deve incentivar os jovens para que eles continuem a exercer a atividade física na idade adulta e obter seus benefícios ao longo da vida.

          Unitermos: Crianças. Doenças crônicas. Promoção de Saúde

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 141 - Febrero de 2010

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Introdução

    As doenças cardiovasculares (DCVs) configuram hoje a principal causa de morte nos países em desenvolvimento. Elas foram responsáveis por 17,5 milhões de mortes em 2005, representando 30% das mortes globais. No Brasil, as DCVs provocaram 140 mil mortes em 2002. (WHO, 2007). Embora as doenças cardiovasculares ocorram normalmente na meia idade ou mais tarde, os fatores de risco são determinados em grande parte pelos comportamentos aprendidos na infância e que persistem na idade adulta, tais como hábitos alimentares e tabagismo.

    Em todo o mundo, estes riscos estão começando a aparecer mais cedo. A atividade física diminui acentuadamente na adolescência, particularmente em meninas. A obesidade tem aumentado substancialmente, não só na Europa e América do Norte, mas também em populações tradicionalmente magras, como os chineses e japoneses. A diabetes tipo 2 era anteriormente rara em crianças, mas está aumentando em adolescentes da América do Norte, Japão e da Tailândia (WHO, 2004).

    A presença de alterações metabólicas (resistência à insulina, dislipidemia, hipertensão, alterações trombogênicas, hiperuricemia) na infância e adolescência pode contribuir para o desenvolvimento de lesões precoces de aterosclerose já nas primeiras décadas de vida. Análises de crianças que morreram em acidentes têm encontrado estrias e placas fibrosas nas artérias coronárias. Estas lesões precoces de aterosclerose foram mais freqüentemente encontradas em crianças cujos fatores de risco incluíram tabagismo, lipídios plasmáticos elevados, pressão arterial alta e obesidade (WHO, 2004).

    Segundo dados apresentados pela Organização Mundial da Saúde (OMS, 2005) 14% dos estudantes de 13 a 15 anos usualmente fumam cigarros. Em todo mundo, cerca de 22 milhões de crianças com menos de cinco anos de idade estão acima do peso. No Reino Unido, a prevalência de crianças acima do peso com idades entre dois e dez anos subiu de 23% para 28% entre 1995 e 2003. Em áreas urbanas da China, o excesso de peso e a obesidade em crianças de dois a seis anos de idade aumentaram substancialmente de 1989 para 1997. Relatos de diabetes do tipo 2 em crianças e adolescentes – dos quais não se haviam ouvido falar até então – começam a despontar em todo o mundo.

    Estudos longitudinais clássicos mostram uma forte associação entre o excesso de peso nas primeiras décadas de vida e a alta taxa de morbimortalidade na vida adulta por DCVs. Must e colaboradores (1992), analisaram adolescentes do estudo de Harvard Growth, que foram acompanhados durante 55 anos, e verificaram que 52% dos indivíduos que apresentavam excesso de peso quando adolescentes permaneceram neste estado nutricional 55 anos após e o risco relativo para todas as causas de doenças coronarianas foi aproximadamente duas vezes maior nestes indivíduos.

    Além do risco aumentado da criança e do adolescente obeso permanecer neste estado quando adultos se comparados aos indivíduos eutróficos, estudos longitudinais sugerem que o tempo de duração da obesidade está diretamente associado à morbi-mortalidade por DCVs. Srinivasan et al. (1996), verificaram em um estudo longitudinal que dos 191 adolescentes obesos, 110 (58%) permaneceram neste estado na fase adulta (12 a 14 anos mais tarde) e tiveram uma prevalência de HAS 8,5 vezes maior e valores de LDL-C e de triglicérides de 3,1 e 8,3 vezes maior, respectivamente, em relação aos que não apresentaram sobrepeso.

    O estudo de Bogalusa, realizado com 9.167 indivíduos de 5 a 17 anos de idade, entre 1973 e 1994, com o objetivo de avaliar fatores de risco para DCVs nas primeiras décadas de vida, constatou que, entre os que apresentavam obesidade (n = 813), 58% tinham pelo menos um fator de risco (dislipidemia, hiperinsulinemia ou hipertensão arterial). As crianças e adolescentes obesos apresentavam também 2,4 vezes e 7,1 vezes maior chance de ter níveis de colesterol total e triglicérides, respectivamente, mais elevados do que os eutróficos (Freedman, 1999).

    Programas para avaliar fatores de risco em crianças e adolescentes, na sua maioria, limitam-se a países desenvolvidos, mas é uma ação urgente exigida a nível mundial. Famílias, escolas, comunidades, profissionais de saúde, funcionários de saúde pública, e políticos, necessitam promover estilos de vida saudáveis em crianças e jovens. A menos que a propagação dos fatores de risco é estagnada, o mundo enfrenta uma epidemia de DCVs.

    Os governos têm um papel crucial a desempenhar na melhora da saúde e do bem-estar das populações, e no sentido de propiciar proteção especial para os grupos vulneráveis. Isso é especialmente verdadeiro em relação às crianças, que não têm como escolher por si mesmas o ambiente em que vivem, sua alimentação ou sua exposição passiva à fumaça do tabaco. Elas também têm uma habilidade limitada para entender as conseqüências a longo prazo de seus hábitos (OMS, 2005).

    Adotando uma atitude pessimista, algumas pessoas acreditam que não há nada mesmo que se possa fazer. Na realidade, as principais causas das doenças crônicas são conhecidas, e se esses fatores de risco fossem eliminados, pelo menos 80% de todas as doenças do coração, dos derrames e dos casos de diabetes do tipo 2 poderiam ser evitados; acima de 40% dos cânceres poderiam ser prevenidos. (OMS, 2005).

Atividade física na infância e na escola

    Atividade física regular está associada a uma melhoria da saúde e à redução do risco de todas as causas de mortalidade e do desenvolvimento de muitas doenças crônicas em adultos. No entanto, muitos adultos são sedentários ou menos ativos fisicamente que o recomendado. Crianças e adolescentes são mais ativos fisicamente do que os adultos, mas a participação na atividade física diminui na adolescência. Programas nas escolas têm o potencial de ajudar as crianças e adolescentes estabelecerem padrões de atividade física saudável por toda a vida (CDC, 1997).

    Evidências mostram que a atividade física resulta em alguns benefícios para a saúde de crianças e adolescentes. Por exemplo, a atividade física regular melhora a resistência aeróbia e força muscular. Entre jovens saudáveis, atividade física e aptidão física podem afetar favoravelmente fatores de risco para doenças cardiovasculares (por exemplo, índice de massa corporal, perfil lipídico sangüíneo e, pressão arterial de repouso). A atividade física regular entre crianças e adolescentes com fatores de risco de doenças crônicas é importante pois ela diminui a pressão arterial em adolescentes com hipertensão limítrofe, aumenta a aptidão física em crianças obesas e diminui o grau de excesso de peso entre crianças obesas. A atividade física entre os adolescentes é consistentemente relacionada a níveis mais elevados de auto-estima e auto-imagem e a baixos níveis de ansiedade e estresse. Embora a relação entre atividade física durante a juventude e o desenvolvimento de osteoporose mais tarde na vida é incerto, existem evidências que exercícios com pesos aumentam a densidade da massa óssea entre os jovens. (CDC, 1997).

    O Consenso da Conferência Internacional sobre Orientações de Atividade Física para Adolescentes recomenda que:

    "Todos os adolescentes [...] ser fisicamente ativo diariamente, ou quase todos os dias, como parte de jogos, esportes, trabalho, transporte, recreação, educação física, ou exercício planejado, no âmbito da família, escola, e atividades comunitárias" e que "os adolescentes participem em três ou mais sessões por semana de atividades que duram 20 minutos ou mais e que exigem níveis de esforço moderado a vigoroso". (CDC, 1997).

    A prática regular da atividade física na adolescência origina vários benefícios à saúde, seja por uma influência direta sobre a morbidade na própria adolescência, seja por influenciar o nível de atividade física na idade adulta. Avaliando o nível de atividade física de crianças e adolescentes de 10 a 15 anos de idade de regiões de baixo e alto nível socioeconômico, Matsudo e colaboradores (1998) demonstraram que mais de 90% do grupo estudado não estava envolvido regularmente com atividade física moderada e vigorosa. Num estudo realizado na cidade de Pelotas (RS), Hallal e colaboradores (2006) encontraram após analisar 4.452 adolescentes de 10-12 anos de idade, uma prevalência de sedentarismo de 58,2%.

    A promoção de atividade física para pessoas jovens, envolve uma série de aspectos (CDC, 1997):

  • Estabelecer políticas que promovam atividades físicas agradáveis e de prática duradoura entre os jovens, incluindo ambientes físicos e sociais que permitam incentivar a atividade física segura.

  • Implementar de programas de educação física e instrução que enfatizem a participação na atividade física e que ajudem os alunos a desenvolver os conhecimentos, atitudes e habilidades motoras, habilidades comportamentais e confiança necessários para adotar e manter estilos de vida fisicamente ativos.

  • Agregar a educação para a saúde, implementando programas de educação sanitária e de instrução que ajudem os alunos a desenvolver os conhecimentos, atitudes e habilidades comportamentais, e confiança necessária para adotar e manter estilos de vida fisicamente ativos.

  • Proporcionar programas de atividade física extracurricular que satisfaçam as necessidades e interesses de todos os alunos, incluindo a participação dos pais e responsáveis no incentivo à participação dos filhos da atividade física extracurricular e na comunidade.

  • Advogar para instrução e elaboração de programas de atividade física para os jovens, providenciando uma variedade de programas comunitários esportivos e recreativos que sejam atraentes para todos os jovens.

  • Avaliar regularmente o ensino da atividade física escolar e na comunidade, programas e instalações complementando o sucesso do trabalho.

Promoção de saúde na escola

    A atividade física e os comportamentos alimentares que afetam o peso são influenciados por muitos setores da sociedade, incluindo as famílias, organizações comunitárias, profissionais de saúde, instituições religiosas, empresas, agências governamentais, os meios de comunicação e as escolas. O envolvimento de todos estes setores, serão necessários para reverter a epidemia.

    As escolas certamente não podem resolver a epidemia da obesidade por conta própria, mas é improvável que esta seja interrompida sem uma política forte ou programas de ações baseados na escola. As escolas desempenham um papel especialmente importante, considerando dados do Censo Escolar de 2002 (INEP, 2002), os quais revelam que existem 54,9 milhões de estudantes na Educação básica. Não obstante, pesquisas têm demonstrado que programas escolares bem executados podem efetivamente promover a atividade física, a alimentação saudável, e as reduções no tempo assistindo televisão. (WECHSLER et al., 2004).

    O tema da promoção da saúde na escola tornou-se um eixo importante de trabalho em nível nacional, após a criação das Escolas Promotoras de Saúde e do Projeto Promoção da Saúde, deixando clara a visão de que a escola é um espaço de ensino-aprendizagem, convivência e crescimento importante, no qual se adquirem valores fundamentais. A escola é o lugar ideal para se desenvolverem programas da Promoção e Educação em Saúde de amplo alcance e repercussão, já que exerce uma grande influência sobre seus alunos nas etapas formativas e mais importantes de suas vidas. (GONÇALVES et al., 2008).

    Em relação à saúde do aluno:

    O papel da escola centra-se na preocupação com a construção da consciência crítica de seus alunos e, conseqüentemente, com a conquista da cidadania. Nesta perspectiva, as práticas educativas no espaço escolar devem integrar estratégias pedagógicas que propiciem discussão, problematização, reflexão das conseqüências das escolhas no plano individual e social e decisão para agir. (CATRIB et al., 2003 apud GONÇALVES et al., 2008).

O profissional de educação física como um promotor de saúde

    Grande parte de escolares vive em ambientes nocivos para sua saúde, em ambientes expostos a múltiplos fatores de risco, as crianças e os adolescentes tendem a desenvolver práticas e atitudes de risco para a sua saúde, como tabagismo, sedentarismo, hábitos alimentares inadequados e experimentação de álcool e outras drogas. (CERQUEIRA, 2006). Por outro lado, as novas evidências vêm comprovando cada vez mais, a importância e contribuição da atividade física para a melhoria da qualidade de vida de uma população. Isso se confirma, através de relações entre sedentarismo, como fator de risco, e estilo de vida ativo, como fator de proteção a doenças hipocinéticas e crônico-degenerativas, que são atualmente grande fonte de preocupação mundial no que se refere à Saúde Pública. (ACSM, 2003).

    A integração do profissional de Educação Física na equipe de saúde tem várias prerrogativas, talvez a mais importante está no reconhecimento da literatura que as possibilidades de utilização do exercício físico como processo de recuperação ou compensação existem em mais de 70 enfermidades. (LOPÉZ; SAFONS, 2000)

    O Manifesto Mundial da Educação Física e dos Esportes (TUBINO, 2000), nos remete a Educação Física como Educação para saúde:

    A Educação Física, para que exerça sua função de Educação para a Saúde e possa atuar preventivamente na redução de enfermidades relacionadas com a obesidade, as enfermidades cardíacas, a hipertensão, algumas formas de câncer e depressões, contribuindo para a qualidade de vida de seus beneficiários, deve desenvolver nas pessoas hábitos de prática regular  de atividades físicas. 

    O Conselho Nacional de Educação Física em resolução que dispõe sobre a Intervenção do Profissional de Educação Física e respectivas competências deixa claro o propósito de prestar serviços que favoreçam o desenvolvimento da educação e da saúde. A promoção de saúde e prevenção de doenças nos programas de educação física na escola, que almejam a melhoria da saúde das crianças e adolescentes deve ter prioridades. Dentro dos aspectos prioritários está a perda de peso e o engajamento em programas diários de atividade física de intensidade leve a moderada, com duração superior a 30 minutos e a participação das crianças em atividades vigorosas pelo menos 3 vezes por semana com duração superior a 20 minutos para melhorias da aptidão cardiorrespiratória. O professor deve estimular a prática de atividades físicas para aumento e manutenção da força muscular, endurance e flexibilidade e, de maior importância, incentivar a proporção de estudantes que praticam as aulas de educação física escolar (CDC, 1997).

    Contudo, programas na escola e na comunidade que promovam a atividade física regular entre os jovens podem estar entre as estratégias mais eficazes para reduzir a carga de doenças crônicas associadas ao estilo de vida sedentário. O profissional de Educação Física deve incentivar os jovens para que eles continuem a exercer a atividade física na idade adulta e obter seus benefícios ao longo da vida.

Referências

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revista digital · Año 14 · N° 141 | Buenos Aires, Febrero de 2010  
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