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Percepção do pedagogo sobre a importância do 

desenvolvimento psicomotor na primeira infância

 

*Pedagoga Especialista em Psicomotricidade

*Professora Mestra da Faculdade de Educação Física e Ciências do Desporto

da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul

(Brasil)

Gabriele Neis*

gabrieleneis@yahoo.com.br

Prof. Ms. Daniela Boccardi Goerl**

daniela.goerl@pucrs.br

 

 

 

Resumo

          A primeira infância tem se destacado em diversas áreas cada vez mais quanto a sua relevância e ao que deve ser oportunizado nesta fase. No meio educacional, este período entre 0 e 6 anos também merece uma atenção especial, considerando que ela é um meio de socializar e dar oportunidades. Dessa forma, o referente artigo traz uma reflexão sobre a atuação do pedagogo em relação ao desenvolvimento psicomotor na primeira infância e o quanto este profissional pode contribuir para uma efetiva prática motora das crianças. Além de abordar sobre a formação do professor e seu comprometimento com a primeira infância, no intuito de oferecer vivências diferenciadas e significativas à mesma, contrastando duas realidades que emergem da escola pública e privada. Nesse sentido, o objetivo geral deste estudo é verificar a percepção do pedagogo sobre a importância do desenvolvimento psicomotor na primeira infância. E como objetivos específicos relacionar o papel do pedagogo com a prática motora na primeira infância, abordar a proposta da escola para as crianças que compõem a primeira infância e se a mesma apresenta uma preocupação com o desenvolvimento motor nesta fase e refletir sobre o comprometimento e a atuação do pedagogo. Para tanto, foi realizada uma pesquisa de caráter descritiva exploratória. Participaram da pesquisa cinco pedagogos provenientes de escolas infantis municipais e privadas do município de Cachoeirinha e Porto Alegre. Foi utilizado um questionário com perguntas referentes a ação pedagógica do pedagogo. A análise e discussão dos dados foram realizadas através das respostas obtidas no instrumento acima descrito onde fica clara a necessidade e intervenção do pedagogo quanto à oferta de vivências corporais às crianças. O professor é a base que sustenta estas práticas, portanto, cabe a ele incluí-las no seu planejamento e desenvolvê-las conforme sua realidade.

          Unitermos: Pedagogo. Primeira Infância. Desenvolvimento psicomotor

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 140 - Enero de 2010

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Introdução

    A Primeira Infância, fase do desenvolvimento que compreende entre 0 e 6 anos de idade, tem sido cada vez mais discutida e abordada por especialistas de diferentes áreas como psicólogos, sociólogos, e entre outros que entraram num amplo consenso quanto ao desenvolvimento da primeira infância. Defendem essa fase, como primordial, na qual a criança construirá uma base que a beneficiará por toda a vida (UNESCO, 2007).

    O desenvolvimento neste período depende das oportunidades que lhes forem oferecidas, aonde o indivíduo vai se constituindo como ser humano, portanto, é imprescindível valorizar todos os estímulos possíveis, inclusive o motor para que as crianças construam tais habilidades desde os primeiros meses de vida e que serão fundamentais para um crescimento saudável.

    Essa visão é percebida quando Gallahue (2003) afirma que o “desenvolvimento motor é a contínua alteração no comportamento ao longo do ciclo da vida, realizado pela interação entre as necessidades da tarefa, a biologia do indivíduo e as condições do ambiente”. O ato motor já se faz presente na criança desde o instante em que ela nasce e à medida que ela vai crescendo, vai desenvolvendo cada vez mais tais movimentos. Assim, devem-se oferecer atividades de estimulação para os bebês o mais cedo possível, preferencialmente desde o nascimento para que os mesmos cresçam conhecendo e explorando seu corpo, adquirindo controle sobre ele e interagindo com o mundo a sua volta. “As experiências de crianças em seus primeiros anos de vida lançam as fundações para a aprendizagem subseqüente” (UNESCO, 2007, p. 12).

    As crianças têm sede de descobrir, explorar, conhecer e vivenciar o novo. O corpo está diretamente relacionado a estas vivências, onde é capaz de expressar sentimentos, emoções, experimentando sempre novas maneiras de utilizar o mesmo.

    Neste sentido, o pedagogo tem um papel complementar no que diz respeito ao aspecto motor de seus alunos, pois ele deve e pode fazer um trabalho que vise à linguagem corporal, ou seja, o corpo como forma de movimento e expressão. No entanto, para que este trabalho seja significativo, o pedagogo precisa conhecer o seu grupo, estar ciente das necessidades de cada um para então elaborar um programa que contemple a todos de forma efetiva, prazerosa e envolvente. Gallahue & Ozmun (2003, p. 238) reforçam:

    Os responsáveis pelas crianças devem compreender as características desenvolvimentistas dos pré-escolares, suas limitações e seus potenciais. Apenas assim poderemos estruturar experiências desenvolvimentistas que, de fato, possam refletir as necessidades e os interesses das crianças, respeitando o nível de habilidade delas.

    Sabendo de tal relevância na vida da criança é que se faz o seguinte questionamento: Qual a percepção do pedagogo sobre a importância do desenvolvimento psicomotor na primeira infância?

    O direcionamento para esta temática está relacionado à vivência diária da autora como pedagoga e nas dificuldades que muitas vezes surgem ao querer oferecer práticas relacionadas ao desenvolvimento motor das crianças. No dia a dia, surgem dúvidas sobre o que é possível fazer e se está de acordo com a idade e necessidade das mesmas.

    Sabendo da importância do estímulo motor na primeira infância e da realidade que atinge a maioria das escolas, principalmente na rede infantil, busca-se conhecer mais sobre o corpo e suas possibilidades de ação. Como não é possível interferir no processo de todas as escolas, faz-se necessário um estudo reflexivo que aborde essa temática e que evidencie a necessidade do pedagogo auxiliar a criança em seu desenvolvimento motor.

    Partindo desta realidade, o objetivo geral deste estudo é verificar a percepção do pedagogo sobre a importância do desenvolvimento psicomotor na primeira infância, tendo como objetivos específicos

  1. relacionar o papel do pedagogo com a prática motora na primeira infância, 

  2. abordar a proposta da escola para as crianças que compõem a primeira infância e se a mesma apresenta uma preocupação com o desenvolvimento motor nesta fase; 

  3. refletir sobre o comprometimento e a atuação do pedagogo.

Primeira Infância

    A primeira infância corresponde dos 0 aos 6 anos de idade e este é um período crucial na vida da criança, pois tudo que está relacionado ao seu desenvolvimento físico, emocional e social se inicia nesta fase. Uma idade que ainda necessita ser discutida e valorizada pela sociedade e de quem trabalha com ela. Sendo que neste período:

    A autonomia, a socialização, a capacidade de construir o mundo, explorando-o, são ao mesmo tempo aspectos de uma nova imagem da primeiríssima infância e objetivos educativos, necessidades a serem respeitadas e satisfeitas, e competências a serem favorecidas e incentivadas (BONDIOLI e MANTOVANI, 1998, p. 29).

    Certamente todas as vivências positivas que a criança obtiver nos primeiros anos da infância, posteriormente se refletirão na vida adulta. Psicólogos têm afirmado que nosso sucesso ou fracasso enquanto adultos está ligado às nossas experiências que tivemos nesta idade e quanto mais correspondermos com as necessidades básicas das crianças na idade dos 0 aos 6 anos, maiores são as chances de se tornarem indivíduos seguros e confiantes consigo mesmos.

    O bebê nasce desprovido de condições individuais de sobrevivência. Ele necessita de alguém que o cuide, o alimente e o proteja, satisfazendo não só as necessidades vitais como, principalmente, as afetivas, dando a ele condições de constituir seus primeiros significados sobre o meio (CAMARGO, 2005).

    A forma como vemos as crianças nos dias atuais se difere de antigamente e hoje é possível considerá-la como transformadora de suas ações. Não basta só conhecê-la, mas sim compreender o que se passa, as modificações, o que emerge deste mundo tão fascinante e envolvente, provido da infância.

    A compreensão desta tem passado por inúmeras transformações, principalmente a partir do século passado. O avanço de determinadas áreas como a medicina, a biologia e a psicologia, bem como a vasta produção das ciências sociais (sociologia, antropologia, pedagogia, etc.) “produziram importantes modificações na forma de pensar e agir em relação à criança pequena” (CRAIDY e KAERCHER, 2001, p. 27).

    O professor e outros adultos que convivem com a criança certamente serão os mediadores de suas relações que beneficiarão ou não o seu crescimento sadio. O adulto tem um papel comprometedor e precisa ter clareza sobre como intervir no seu processo de desenvolvimento de modo a contribuir com o mesmo. De nada adianta aplicar programas e tarefas se estas não tiverem em sintonia com a criança. A motivação, as fases do desenvolvimento e o engajamento do adulto precisam estar integrados, tornando o programa eficaz, privilegiando a criança como um ser ativo em nosso mundo. Um agente transformador da nossa sociedade.

    Portanto, valorizar a primeira infância e todos que fazem parte dela é o primeiro passo a ser tomado. No momento em que se reconhece a importância desta idade, se é capaz de desenvolver programas de acordo com a mesma, tendo a criança como centro de interesse, sendo tudo voltado a ela, abrangendo o seu desenvolvimento de forma global e unificando todas as áreas desde o social até o motor.

    Os profissionais que atuam com crianças de 0 a 6 anos necessitam desenvolver práticas educativas que considerem todas as dimensões e competências humanas potencializadas nas crianças. Essas práticas necessitam levar em conta o contexto social e cultural em que as crianças e suas famílias estão inseridas (Revista Criança, 2006).

    É um momento na vida da criança que demanda ainda um ambiente seguro, acolhedor e afetivo, onde possa desenvolver-se plenamente e de forma promissora. A escola tem sido um desses principais ambientes, pois nos dias atuais em que as famílias têm cada vez mais atribuições no campo profissional, a criança acaba dependendo deste espaço como forma quase única de ser educada e preparada para a vida.

    Justamente por haver esta mudança na vida familiar no sentido de ter cada vez menos tempo para a criança é que a escola acaba assumindo a função do educar e cuidar, que estão intimamente relacionados no contexto da educação infantil. A responsabilidade passa a ser muito mais dos profissionais que nela atuam do que propriamente da família na qual está inserida. No entanto, existe uma preocupação ainda maior que está relacionada aos vínculos que estabelecemos com a criança desde bebê.

    Kulisz (2004) salienta que o professor ao demonstrar que gosta da docência, através de suas ações educativas busca construir um ambiente aconchegante, afetivo, atencioso e compreensivo para com a criança. Possibilitando que a mesma se movimente, expressando e relacionando-se conforme suas necessidades. O aluno sente-se desafiado a superar-se em suas atividades, reconhecendo em si um sujeito único, social, inteligente e criativo.

    Outro fator que não pode ser desconsiderado diz respeito aos demais indivíduos que se relacionam com a criança, tanto adultos quanto os próprios colegas, pois é através do outro que ela aprenderá a interpretar o mundo em que vive tanto a parte física, como social e cultural na qual está inserida. Legando as instituições de ensino que lidam com crianças de 0 a 6 anos e, especialmente de 0 a 3 anos uma enorme responsabilidade. Os encaminhamentos propostos devem levar em conta as necessidades específicas deste sujeito, “percebendo que seu acolhimento constitui parte substantiva das ações a serem encaminhadas e que nelas se inclui o desenvolvimento das práticas pedagógicas” (CAMARGO, 2005, p. 12).

    É inquestionável a relação entre criança e educação e que esta interligação torna indispensável e indissociável o aprendizado que é conferido a ela, unificando todas as áreas de conhecimento, conferindo-lhe tudo que realmente for significativo, ampliando suas relações consigo e o mundo. “O professor deverá ser o incentivador no processo educativo da criança, pois o período em que estará com ela é de suma importância para o desenvolvimento de sua mente e do seu corpo” (Miranda, 2008, p. 13).

    A primeira infância dentro do contexto escolar está implicada no olhar diferenciado e único que lhe é conferido e este tem sido um grande instrumento no sentido de atender as particularidades do aluno que tão logo surgem nos primeiros anos da infância.

Formação do pedagogo

    Durante muitos anos as Faculdades de Educação e Pedagogia desenvolviam os mesmos conteúdos durante seus cursos de formação que serviam tanto aos futuros professores, como diretores, orientadores e supervisores, sem distinção entre eles. “Sem explorar e ensinar corretamente as didáticas específicas é como se as faculdades vendassem o futuro professor e o soltassem no mundo” (Weisz, 2007, p. 36).

    As especificidades de cada área passaram a ser contempladas recentemente nos cursos de formação inicial, gerando segurança e uma capacidade maior no professor em lidar com os seus alunos e os desafios que lhe são impostos diariamente. No entanto, este é um processo longo, o que leva muitos professores a se apoiarem diretamente na coordenação pedagógica que deve orientar e dar suporte aos mesmos (Gentile, 2007)

    Tendo em vista esta mudança nos cursos de formação e na variedade de disciplinas que são pinceladas de forma muito ampla incluindo, o aspecto motor da criança, é que o pedagogo no exercício da sua profissão e preocupado em atender o seu aluno, acaba tendo um papel fundamental e muitas vezes exclusivo na vida da criança. Sendo assim, ele com sua formação “ampla”, é quem oferece atividades que estimulem a parte motora da criança, do contrário, muitas delas não teriam estas vivências no cotidiano escolar. Tudo ficaria resumido a práticas “soltas”, ou seja, a criança brinca sem que o professor tenha um objetivo a ser atingido para com ela.

    Conforme Negrine (2002, p. 23):

    Na Educação Infantil, os professores que são preparados para atuar neste âmbito precisam realizar tarefas e funções múltiplas. Em outras palavras, cabe a eles proporcionar experiências variadas às crianças: informativas, recreativas, motoras, musicais, plásticas, etc. A lógica é formar um professor unidocente que dê conta de tudo e de todos.

    Desta forma, o pedagogo pode sim desenvolver nas crianças as habilidades motoras, além das demais práticas que costumam ser desenvolvidas. Elas precisam correr, pular, saltar, rolar, subir, descer, engatinhar, tocar e ser tocada. E acima de tudo, conhecer o próprio corpo e as possibilidades de vivências que ele oferece. “Ao movimentarem-se as crianças expressam sentimentos, emoções e pensamentos, ampliando as possibilidades do uso significado de gestos e posturas corporais” (BRASIL, 1998, p. 15).

    Portanto, quanto mais o professor incentivar o movimento, maior será o aprendizado de cada um sobre si mesmo e o desenvolvimento da capacidade de expressão. Além disso, os espaços devem ser desafiadores, contendo diversos obstáculos e materiais e ao mesmo tempo, devem oferecer segurança à criança, para que se sinta encorajada a explorá-los. E isto deve ser feito desde a mais tenra idade.

    Segundo uma publicação feita na Revista Nova Escola (SANTOMAURO e ANDRADE, 2008, p. 52).

    O bebê desde cedo precisa participar de atividades que ampliem o repertório corporal para que percorra um caminho de gradativo controle dos movimentos até conseguir se levantar e andar. Aos poucos, ele passa a ter consciência dos limites do corpo e da consequência de seus movimentos.

    Uma grande parte das propostas pedagógicas deveria estar alicerçadas em práticas corporais que muitos professores na verdade não têm. Uma formação corporal onde esta se faz presente tendo que ser incluída no currículo da Pedagogia. O conhecimento se dá partindo das experiências vivenciadas, juntando a formação teórica, pedagógica e via corporal (MALUF, 2003).

    A intervenção do pedagogo no processo educacional e aqui especificamente na atividade motriz da criança está no seu esforço, nas intenções e propostas remetidas a ela, mesmo não tendo um aprofundamento maior sobre o tema. O professor é antes de tudo o facilitador, o mediador e provocador de suas ações.

Comprometimento e atuação do pedagogo

    Ao mencionarmos o termo comprometimento, logo vem em mente outro significado que é compromisso. Estas duas palavras certamente estão incluídas no vocabulário dos profissionais da educação preocupados que lidam diariamente com crianças pequenas, ou mais especificamente, na Educação Infantil.

    Segundo Camargo (2005, p. 14):

    A qualidade do trabalho que pode vir a ser encaminhado nesse segmento de ensino estará sujeita à qualificação do educador que a ele se dedique, o que inclui a sua leitura atenta sobre o seu espaço de atuação profissional, bem como o seu investimento no estudo e na busca de fundamentação teórica sobre a infância, o cuidado, o ensino e a aprendizagem.

    O profissional comprometido busca antes de qualquer coisa, conhecer quem é a criança que o cerca, quais as vivências que ela traz consigo, o contexto onde está inserida e acima de tudo refletir a partir da sua formação e do seu entendimento em relação à infância. Muito do que se faz está relacionado às suas próprias experiências que certamente refletem no seu desempenho em sala de aula.

    Conforme aborda Kulisz (2004) ser docente é um esforço pessoal, um trabalho livre e criativo, com o objetivo da construção de uma identidade, que é também uma identidade profissional, originada na vocação e no desempenho de seu próprio saber da experiência.

    Entre os educadores é possível encontrar dois tipos de profissionais aqueles que planejam, pesquisam, buscam constantemente se qualificar e são capazes de avaliar a própria prática, reconhecendo as falhas e partindo delas na tentativa de melhorar, como também profissionais descomprometidos, negligentes e que desvalorizam a profissão exercida.

    No contexto infantil a atuação do professor num primeiro momento está vinculada no envolvimento afetivo com a criança pequena, onde esta precisa se sentir confiante e acolhida. Partindo deste vínculo é que posteriormente as propostas pedagógicas transcorrerão normalmente sem imposições. A criança sem se dar conta participa de todos os momentos da rotina e logo percebe estar inserida no grupo. O olhar diferenciado e a confiança transmitida pelo educador são essenciais para o desenvolvimento e segurança da criança.

    Segundo Bassedas, et al (1999) a base que sustenta as aprendizagens na escola infantil é a relação que se cria entre a criança e a professora.

    Assim, a atuação do professor está no comprometimento com a criança em todos os seus aspectos para que ela cresça feliz consigo e os demais indivíduos. Para isto o relacionamento entre ambos deve se estabelecer de forma positiva onde um depende do outro e um aprende com o outro, pois a aprendizagem é uma troca que transforma e acrescenta suas vidas.

Metodologia

Delineamento da pesquisa

    Esta é uma pesquisa de caráter descritiva exploratória, direta, de campo. Segundo Andrade (2003, p. 124), na pesquisa descritiva “os fatos são observados, registrados, analisados, classificados e interpretados, sem que o pesquisador interfira neles. Isto significa que os fenômenos do mundo físico e humano são estudados, mas não manipulados pelo pesquisador”. Boaventura (2007) considera que “as pesquisas descritivas identificam as características de determinada população ou fenômeno”. Mattos, Rossetto Jr. e Blecher (2004) complementam que se trata de observar, analisar e correlacionar fatos e descrever características, propriedades e/ou relacionar as informações obtidas.

    Segundo Mattos, Rossetto Jr. e Blecher (2004) pesquisa direta de campo é aquela que busca dados em sua fonte de origem, onde as condições de controle de variáveis modificam com o ambiente e interferem na resposta.

Delimitação do universo

    A população deste trabalho foi composta por pedagogos com formação em Educação Infantil e que atuam na rede municipal e privada de Educação Infantil abrangendo os municípios de Cachoeirinha e Porto Alegre. Os mesmos foram escolhidos de forma aleatória e conforme a disponibilidade de cada um.

    A amostra compreendeu 05 (cinco) pedagogos com formação em Educação Infantil com idades entre 27 e 45 anos.

    Os participantes receberam e assinaram um Termo de Consentimento Livre e esclarecido de autorização para a utilização dos dados coletados.

Instrumentos avaliativos

    Para a coleta de dados, foi utilizado um questionário individual com perguntas abertas. Segundo Lakatos e Marconi (2001) deve ser constituído por uma série de perguntas que devem ser respondidas por escrito e sem a presença do pesquisador.

    O questionário passou por um processo de validação e apreciação por dois professores mestres ambos docentes da Faculdade de Educação Física e Ciências do Desporto da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.

    As perguntas do questionário referem-se às praticas educativas; o papel do professor; a proposta da escola quanto ao desenvolvimento motor e a infância nos dias atuais.

Procedimento de coleta de dados

    O procedimento para a coleta das informações deste trabalho foi realizado em uma etapa, caracterizada pela distribuição do questionário para os professores, onde os mesmos demonstraram seus conhecimentos sobre a relevância do pedagogo no desenvolvimento psicomotor na primeira infância.

Organização e análise dos dados

    Conforme Lakatos e Marconi (2001 apud MATTOS, ROSSETTO JR. e BLECHER, 2004, p. 32): “a interpretação é o momento de expor o verdadeiro significado do material apresentado, fazendo relações com os objetivos propostos e o tema da pesquisa”.

    Os dados obtidos foram analisados, comparados e especificados conforme a análise de conteúdo proposto por BARDIN (2004). Esta composta por três fases, sendo a primeira a pré-análise que se trata em organizar a coleta. A segunda, exploração do material, onde se aplicará o mesmo aos indivíduos. Por último, o tratamento dos resultados obtidos e interpretação, onde os dados coletados serão reconhecidos e validados.

Análise e discussão dos dados

    A partir dos dados coletados nos questionários aplicados aos cinco pedagogos da rede infantil do município de Porto Alegre e Cachoeirinha, buscou-se comprovar a realidade com as quais muitas delas estão inseridas e relacioná-las com o objetivo proposto nesta pesquisa.

    O perfil dos participantes se destaca por todas serem mulheres e compreenderem a idade entre 27 e 45 anos de idade, todas com formação em Pedagogia, Educação Infantil e algumas com especialização na área. As participantes serão mencionadas através de números, preservando a identidade e o sigilo das respostas obtidas nos questionários.

    Para a análise dos dados, foram elaboradas categorias que remetem as práticas educativas, o papel do professor, a proposta da escola quanto ao desenvolvimento motor e a infância nos dias atuais, conforme o quadro abaixo.

Categorias

Escola Municipal

Escola Privada

Práticas educativas

Atividades variadas:

música, artes plásticas, jogos, brincadeiras corporais.

Atividades variadas: artes, natação, educação física, hora do conto.

Papel do professor

Orientar e organizar as atividades.

Envolvimento afetivo e comprometido com a criança.

Proposta da escola quanto ao desenvolvimento motor

As atividades partem do interesse do professor atuante e há uma carência de materiais e espaços.

Existem profissionais qualificados, materiais diversificados e adequados para esta prática.

A infância nos dias atuais

Vem melhorando, mas ainda há muito no que avançar. Ainda existem profissionais descomprometidos.

Está cada vez mais valorizada.

Quadro 1 – Categorias de Análise.

Fonte: a autora (2009).

    Inicialmente sobre a categoria 1 referente à oferta de práticas educativas às crianças todos os professores afirmaram que as desenvolvem diariamente nas escolas em que atuam. Estas ações foram exemplificadas através de atividades variadas que possibilitam e contemplam as (...) várias áreas do conhecimento, proporcionando assim o desenvolvimento psicomotor, lingüístico e psicossocial da criança (...) como mencionou a participante 1. As atividades são oferecidas em forma de jogos, brincadeiras corporais, experiências musicais, dinâmicas de arte-educação, envolvendo ainda a afetividade e passeios onde tudo é fundamentado através da ludicidade e da brincadeira.

    Craidy e Kaercher (2001) consideram que todos os momentos e práticas deverão permitir experiências múltiplas, estimulando à criatividade, a experimentação, a imaginação, que desenvolvam as distintas linguagens expressivas e possibilitem a interação com o outro.

    Quanto ao papel que os professores exercem ao desenvolverem estas práticas nas crianças a participante 2 diz que sim, seu papel é significativo pois cabe ao educador (...) orientar e organizar as ações realizadas durante as atividades. Já a participante 1 destaca que (...) essas práticas não se tratam apenas de que a criança seja feliz e esteja sendo cuidada no ambiente escolar, mas sim de respeitar o potencial de desenvolvimento durante estes anos que são tão cruciais. A consciência do papel do professor está evidente em todos os participantes.

    “É o adulto, na figura do professor, quem na instituição infantil ajuda as crianças a identificar suas necessidades, priorizando-as e atendendo-as” (CARVALHO, 2003, p.14).

    O papel do professor neste processo é de fundamental importância, estabelecendo vínculos afetivos, incentivando a aquisição de habilidades e ampliando gradativamente as possibilidades de comunicação e interação social das crianças (CARVALHO, 2003).

    Por sua vez, se a escola se preocupa com o desenvolvimento motor na primeira infância, encontramos duas realidades bem distintas. Uma provém da escola privada, onde a participante 3 relata que na instituição em que atua existe uma preocupação quanto ao aspecto motor e as propostas são realizadas através de (...) atividades lúdicas, brinquedos adequados, aulas específicas com professores de Educação Física, atividades em aula, exercitando as motricidades. A participante 4 inclui ainda a natação como outra opção que a escola oferece.

    Uma realidade completamente diferente que as participantes 1 e 2 relatam do seu cotidiano, mostrando que essas práticas só ocorrem se o educador responsável as desenvolver. (...) Neste sentido, cada um busca oferecer o que acha mais adequado, tendo como fundamentação sua concepção de infância e sua formação profissional. Outra dificuldade destacada são as múltiplas funções do professor em sala, a falta de material simples como bolas e cordas, (...) ficando a dependência da criatividade do professor para oportunizar tal competência, ressalta a participante 2.

    A participante 5 coloca que na sua escola há espaços e materiais diversificados como uma brinquedoteca, dois pátios grandes, um com areia e outro com grama, fantasias, jogos de encaixe, quebra-cabeças, legos, biblioteca, sala de vídeo e de informática. (...) as professoras são estimuladas pela coordenação e direção a realizar com as crianças atividades diversas, aproveitando os espaços e recursos que a escola oferece.

    Segundo Carvalho (2003, p. 17) é necessário fazer uma boa organização do trabalho e planejar as atividades. Uma proposta pedagógica envolve a organização de variadas atividades com diferentes materiais e diferentes espaços físicos.

    Referente a categoria sobre a primeira infância nos dias atuais a maioria das professoras concorda que esta vem sendo cada vez mais valorizada e levada mais a sério pela escola, governo e sociedade. Porém, admitem que ainda há muito no que avançar. Conforme a participante 1 (...) as mudanças estão ocorrendo e desafios estão sendo superados (...). No entanto, o que a deixa preocupada é o descomprometimento por parte de alguns profissionais que não planejam, não conhecem as faixas-etárias em que atuam e muito menos querem enfrentar as dificuldades e desafios lançados diariamente nesta profissão, onde relatam (...) profissionais que não observam e não avaliam suas práticas (...).

    Nas escolas infantis, assim como em qualquer outra etapa da educação escolar o professor deve planejar, avaliar e revisar as propostas realizadas, alterando e mudando quando for oportuno. Toda atuação deve ter um espaço de valorização e de reflexão, na tentativa de melhorar e avançar suas práticas (BASSEDAS, et al,1999).

    A participante 5 atuante na rede municipal de ensino contraria as demais participantes e acredita que a primeira infância não está sendo valorizada (...) primeiramente pela falta de igualdade de direitos entre as professoras de Educação Infantil e Anos iniciais (...). Além de ter um dia da semana para planejar e elaborar as avaliações, ainda contam com dois meses de férias enquanto que as educadoras de Educação Infantil levam serviço para casa.

    Kulisz (2004) considera que o professor de educação infantil sofre um enorme desestímulo que vai desde a remuneração até a formação, trabalhando muitas vezes em condições precárias.

    Outra realidade é que a própria família e a comunidade não valorizam a educação infantil, deixando de levar a criança à aula, (...) retornando somente se correm o risco de perder a vaga (...). Estes a meu ver, são alguns dos fatores que indicam uma falta de preocupação com a Educação Infantil na rede pública de ensino).

    Na etapa da educação infantil, convém propor que as famílias conheçam e valorizem o que se faz na escola, já que muitos têm a idéia de que as crianças pequenas só vão para “brincar” e serem cuidadas. Sabe-se que estes conceitos são inseparáveis e o provimento de boa qualidade para crianças pequenas envolve estas duas dimensões. (UNESCO, 2007.)

    Bassedas, et al, (1999) complementa que é necessário o envolvimento dos familiares, auxiliando e discutindo o que for melhor para a criança, através de trocas participando, sugerindo atividades e compreendendo melhor a função educativa da escola.

Considerações finais

    Partindo das respostas obtidas através dos questionários é possível refletir e considerar a relevância que o pedagogo representa atualmente no desenvolvimento psicomotor na primeira infância. A primeira consideração a fazer, parte da realidade das escolas infantis municipais, onde verifica-se que a falta de materiais e profissionais que possam exercer a função motora na criança dificulta a execução destas vivências, sendo que esta responsabilidade fica a cargo do educador atuante daquela turma e obviamente do seu interesse em realizar as mesmas.

    A segunda consideração provém da proposta da escola quanto ao desenvolvimento motor sendo que no setor privado além de contar com psicomotricistas e profissionais de educação física estas dispõem de recursos e uma carga horária destinada exclusivamente para este momento, o que nas escolas municipais é o professor quem inclui em seu planejamento atividades que contemplem a prática motora das crianças. Ou seja, é o professor quem executa e traz estas vivências corporais aos pequenos, ficando visível que estas atividades ainda não são consideradas relevantes por muitos, pois não existe de fato uma preocupação ou conhecimento do quanto tais experiências refletem no desenvolvimento das crianças.

    A última consideração remete ao profissional comprometido e atuante na sua escola, e que segundo Kulis (2004) na Educação Infantil muitos professores recebem uma baixa remuneração, tornando esta profissão um tanto desestimuladora, pois além de normalmente ter uma carga horária superior comparada ao ensino fundamental, carrega consigo a responsabilidade de assumir diversos papéis e funções. O que acaba fazendo com que muitos se descomprometam com o seu trabalho. No entanto, podemos observar alguns avanços em relação à educação infantil, inclusive no que diz respeito à formação destes profissionais que a LDB instituiu como mínima o Magistério para exercer este cargo.

    Contudo, o sentimento maior que fica é saber que a mudança está ocorrendo, mesmo que lentamente e que, o mais importante é o sentimento e o prazer de estar envolvidos com crianças tão dependentes da nossa vontade e de tudo que oferecemos a elas.

    A prática motora pode sim estar presente no cotidiano infantil, basta o professor ter vontade e coragem para acrescentar e tornar aquela realidade diferente, beneficiando as crianças que na maioria das vezes dependem do que a escola propõe e isto é o que deveria ser gratificante ao profissional antes de mais nada.

    Assim sendo, refletir sobre o nosso papel é explorar as nossas potencialidades e perceber o quanto podemos modificar e acrescentar amplamente vivências na vida destas crianças, diferente da realidade em que provém e este poder que nos compete é simplesmente maravilhoso e muitos não sabem o quanto podemos mudar o dia a dia de uma criança.

Referências

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revista digital · Año 14 · N° 140 | Buenos Aires, Enero de 2010  
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