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Prazeres e angústias. Qual o sentimento que 

predomina no Professor de Educação Física?

Placer y angustia. ¿Cuál es el sentimiento que predomina en el Profesor de Educación Física?

 

Doutorando em Ciências do Desporto

Centro de Estudos em Motricidade Humana

Escola Superior de Educação e Ciências Sociais – I.P. Leiria

Campus 1. Leiria

Pedro Gil Frade Morouço

pmorouco@esecs.ipleiria.pt

(Portugal)

 

 

 

Resumo

          Este texto trata-se de uma reflexão pessoal em torno do Ensino da Educação Física em Portugal. Tem por base vivências passadas e trocas de ideias constantes com vários colegas profissionais.

          Unitermos: Educação Física. Formação de professores. Atitude no ensino

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 139 - Diciembre de 2009

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O Professor e a escola...

    “A educação não é o encher de um pote, mas o atear de uma chama”

    Era uma vez um rapaz que pretendia iniciar o seu estágio pedagógico numa das escolas da redondeza. Calhando-lhe a destinada, a ela se dirigiu com o intuito de se dar a conhecer.

    Erguia-se entre zonas urbanas, sem grande design atractivo, muito embora com inúmeras viaturas à porta. Embocou pelo portão dentro, questionando-se onde seria a secretaria. Facilmente deu conta do recado.

    Abriu a porta e:

- O que desejas?

- Bom dia; eu vinha para tratar de uns papéis por causa do estágio que venho fazer nesta escola.

- Ai, peço imensa desculpa Sr. Professor! Confundi-o com um aluno… (corou)

    (O rapaz sociável e amigo do seu amigo gosta de discutir, conversar e trocar ideias. Todavia, receia um pouco tomar estas atitudes quando não conhece o receptor.)

    Respondendo apenas que não havia problema, ele gostaria de ter-lhe dito que não errou; até mais... agradecer. Que ele pretendia ser aluno durante toda a sua vida. Que todos aqueles que o rodeiam lhe ensinariam algo e que, como tal, a sua construção pessoal seria um processo interminável.

    Deitou mãos à obra!

    Chegou o dia da sua primeira aula. Não dormiu nessa noite. Não comeu, parecia nem sequer respirar. Os suores, os calafrios e as “borboletas no estômago” apoderavam-se do seu interior A garganta apertava a cada passo que dava depois de sair da sala dos professores.

    Chegou ao local…. (a garganta apertou mais, bem mais…)

    Os pupilos olhavam-no da cabeça aos pés e pareciam sussurrar comentários que não conseguiu perceber.

- Bom dia – saiu-lhe com uma voz fininha, fininha. Qual marcar posição com sua postura e voz de comando, qual quê….

- Bom dia – responderam em coro.

    Bela resposta (pensou ele para os seus botões). Começou então a fornecer as informações que havia planeado. A cada sorriso e a cada olhar de um aluno, um tremor desaparecia e parecia desatar-se o seu âmago. Ao fim de cinco minutos tinha-se criado um clima invejável e já reinava a boa disposição. Qual nervosismo, qual quê? O rapaz é forte e seguro.

    Couberam-lhe duas turmas. Uma de oitavo ano, outra de décimo; uma de ensino básico, outra de secundário; uma com vinte alunos, outra com catorze. A heterogeneidade implantada no seio de cada uma fazia prever uma enorme discrepância na actividade lectiva. A necessidade de providência obrigou-o a diversas tomadas de decisão, justas e injustas, mas sempre reflectidas.

    O seu horário abrangia seis blocos de 45minutos de lição, três para cada turma e destes, dois de forma agrupada. Bem... cinco minutos para se equiparem, dez minutos para tomarem banho, levam-no a questionar a consideração que dão à sua disciplina. Não é a Educação Física a disciplina que requer maior porção de tempo de preparo e despreparo da mesma? E é presumido que em 30 minutos os aprendizes apreendam de forma global e integrante tudo aquilo que o rapaz anseia?

    Já as aulas de 90 minutos parecem-lhe ter a duração ideal. Não muito curtas, não muito longas, mas que, com uma densidade elevada, possibilitam-lhe levar a cabo todo o processo de instrução que havia planeado. Sim, este rapaz possui um apanágio muito próprio; não basta arquitectar os exercícios, transições ou organizações, mas idear o procedimento de instrução, saber o que vai dizer, como o vai evidenciar, de forma a não se perder nos calaboiços da barafunda.

    No entanto, o rapaz apercebeu-se que nem tudo é como desejamos. Numa certa manhã, o sentimento de angústia e aflição consumiu o seu íntimo. Tomou consciência do que o rodeia e apercebeu-se do comodismo que os seus colegas apresentam. Que se passa com os professores de Educação Física dos dias de hoje? – questionou-se.

    Até à data, havia notado um desmazelo (quem sabe negligência) por parte de alguns dos seus pares. No entanto, era mais fácil assumir que não havia razão para alarmismos, seria só uma excepção. Os professores de Educação Física não eram assim.

    Mas, nesse dia, essa dúvida ultrapassou todos os limites, ficando o rapaz atónito com a forma de levar a cabo as aulas a que assistiu. Reflectiu e lobrigou que odiava a docilidade, o aprovar de um destino cinzento, o deleite pateta com a ausência de sobressaltos. O marasmo de imaginar que este conformismo doentio poderia parecer-lhe tolerável. Fosse como fosse, se era aquele o destino que o esperava, saberia escapar-se: “Não, eu não serei assim! A minha vida será outra coisa.”

    Quando pensava no seu destino, quando tinha a certeza de que seria especial, não sonhava com as formas triviais de felicidade que o mundo propunha como objectivo às pessoas da sua geração. Só um maluquinho acharia especial o que, ao fim e ao cabo, era válido para todos.

    Tendo a inovação como mote, procurou diversas estratégias que o pudessem adjuvar no seu constructo pessoal.

    A filmagem da sua própria prestação, e posterior análise, revelou-se como uma das melhores formas de interiorizar os seus erros e arranjar soluções. Foram vários os momentos em que afirmou que aquele não era ele. Que não havia proferido aquelas palavras ou permitido tais comportamentos. No entanto, a tomada de consciência dessas situações tornaram-no mais homem e mais capaz na sua actividade pedagógico-didata.

    Errou! Errou bastante. Erros iniciais que necessitaram de ser vivenciados para serem corrigidos. Aulas demasiado extensas para a sua duração, ou excessivamente curtas, foram pratos do dia nas primeiras aulas leccionadas. Mas o rapaz sentia-se bem. Começava a desenvolver um conjunto de estratégias que lhe permitiam um espaço de manobra eficiente.

    E o rapaz, certo dia, foi surpreendido por uma atitude de um dos seus alunos. De facto, vários haviam sido os esforços para a criação de um clima agradável e de convívio nas suas aulas, mas nunca esperou que chegasse onde chegou.

    Foi numa aula de terça-feira... um dos seus pupilos abordou-o:

    - Professor, gostaria de falar consigo no final da aula – disse de forma algo introvertida e sem grandes certezas.

    O rapaz ficou algo intrigado com o que poderia ser, ou mesmo com o que se passaria com o dito pupilo.

    Mas o final da aula chega. Após a despedida e pequena conversa informal com todos os alunos, aquele pupilo específico aproximou-se.

- Então? Diz lá o que se passa – o rapaz questionava, intrigado.

- Só queria dizer que adoro o professor, que se não se importar gostaria de o considerar como um irmão mais velho, não gostaria de perder o contacto consigo nos próximos anos.

    Caiu-lhe tudo! De tudo o que lhe tinha passado pela cabeça durante este período, nunca havia sequer imaginado, ou melhor, sonhado, que fosse esta a intenção do pupilo. Ficou arrepiado. Parecia ter ouvido daquelas frases que acarretam mais emoção do que palavra. Tremelicou e abriu a boca.

- É com muito prazer...

O Professor e o mundo...

    Mas porquê só leccionar aulas? Porquê limitarmo-nos à linearidade de um ensino já de si tão dentro da normalidade? Porque não ir mais longe e criar laços com o que nos envolve?

    É depois se fazer estas interrogações a si mesmo que o professor desenvolve outro tipo de actividades, não ficando pelo cumprimento do esquema: planeamento, execução, relatório escrito. É aqui que entra a reflexão das amarguras e conquistas inerentes à sua realização de algo diferente… É neste exercício de inovação e originalidade que o professor sobrepõe escola e mundo, alunos e comunidade; é pela realização destas iniciativas novas que nasce interacção entre todos os intervenientes na educação de hoje (em dia), que não se restringem apenas a alunos e professores, mas se alargam e vão para além das portas da sala de aula, dos portões da escola, do quarteirão, da cidade, e porque não do país… Hoje em dia há milhares de agentes educadores, para o bem e para o mal…

    Encarnemos o espírito do educador. O educador ensina e, quem ensina, pode não educar. O espírito crítico não pode ser impingido a qualquer indivíduo. Nasce com ele. Vive e morre com ele.

    O horário do professor não é só de x blocos de 45 minutos, mas sim de uma semana densa de trabalhos e reflexões, que se multiplica vezes sem conta no ano lectivo e que implica um empenho particular, uma entrega total.

    Sobrepondo as barreiras das próprias aulas, deparamo-nos com todo um agregado de intervenientes, directos ou dissimulados, que influenciam a nossa conformidade com o mundo. Pesa como essencial a criação de laços com os alunos, professores, funcionários ou órgãos de gestão, sendo cortês colocar à parte a relação com entidades e instituições locais, por encararmos que somente o feito-dentro-de-portas pode interessar.

O mundo, muito mais do que o Professor...

“Nós devemos ser a mudança que queremos ver no mundo” – Gandhi

    Fomos nós que, há muito, moldámos a sociedade e é a sociedade que vivemos que molda os nossos hábitos e costumes. Sociedade e homem são conceitos indissociáveis, inerentes um ao outro: o homem não existe como pessoa fora da sociedade, e nem a sociedade funciona como instituição sem o homem.

    Crescemos enquadrados em padrões, que ditam o certo e o errado, o bom e o mau, e ao longo da vida poucos são aqueles que se insurgem contra aquilo de que discordam. Regemo-nos pelas maiorias e achamos muito mais fácil baixar os braços em atitude de conformismo do que nos erguermos com ânimo e poder de labor... porque estamos em crise. Uma palavra que parece ser a desculpa para tudo e todos... porque estamos em crise.

    Agora, pergunto: o que haveis feito, para não estarmos?

    Os míudos não aprendem. Vêm para a escola sem motivação, sem ânimo, movem-se maquinalmente em direcção aos portões, de cabeça baixa, mochila às costas (quando não se esquecem dela em casa), e é maquinalmente que entram nas salas, que saem das salas mal a campainha soa, e que chegam atrasados porque a rua se tornou mais atractiva que a escola. O que haveis feito para os motivar? Cumprir todo o programa estabelecido, perfazendo um reduzido número de aulas para cada matéria?

    E depois? A sociedade está em crise, e depois? Melhorará pelas vossas acções, pela formação e valores que transmitem aos alunos?

    São estes os homens e mulheres de amanhã. E que queremos nós? Que eles saibam que no Basquetebol devem driblar para progredir no terreno? E que no Voleibol a equipa só pode realizar três toques antes de reenviar a bola para o lado contrário?

    E aquela área denominada de conceitos psicossociais? Onde fica? Restringida a um recôndito absoluto? E (mesmo) a condição física, cujo papel numa sociedade cada vez mais consumista, é esquecida? Mas não, desde que ele saiba que no Andebol não pode entrar na área, tudo bem… Desde que saiba entreter-se durante os cinquenta minutos de aula a fazer pinotes ou a dar caneladas aos colegas, desde que faça isso tudo bem… não pode é interromper a conversa de telemóvel ou a leitura do Jornal Desportivo (leia-se futebolístico) … É assim que hoje em dia, atrevo-me a dizer, metade das aulas de Educação Física funcionam. Os alunos vêem a nossa disciplina como “a-hora-do-descanso-a-queimar-calorias” e não creio que a desmotivação seja só da parte deles…

    Mas é dócil satirizar o sistema, obstar seus conceitos e progressões. Repulsa de me postar a seu benefício! No entanto, inúmeras são as situações em que permanece solidariedade com essa mesma doutrina, com a falta de preocupação em atentar os objectivos a que nos propomos. NÓS compactuamos com isso, e como tal, somos cúmplices. Revoguemo-nos?

E o Professor amanhã?

    Porque a vida não é feita de fins, mas de sucessivos princípios e contínuos, de emoções, reflexões, ensinamentos e aprendizagens. Porque obra do passado, vivemos o presente, ansiamos o futuro. E agora? Não caiamos nas tentações medianas do vazio; na corrida sem barreiras. Procuremos, sim, a superação de todos os obstáculos, deixando o prazer pateta do conformismo remetido aos recônditos do obscuro.

    E agora? Surgem dois trilhos. Um empolgado, aberto à promessa insinuada de qualquer coisa; outro, húmido, o do pranto reprimido a qualquer custo. Sabemos que é o final, mas não o fim. Que vida será? Uma planície infinita, lisa, sem cor? Recusemo-nos a contemplar tal posição. Qualquer dia, também nós vamos desenterrar o machado de guerra.

    O mais desconcertante talvez seja que, apesar de tudo, a vida, de um modo ou de outro, continua

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