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O esporte enquanto fenômeno e sua relação com o corpo

El deporte como fenómeno y su relación con el cuerpo

 

*Universidade Estadual da Paraíba

**Universidade de Pernambuco/Universidade Federal da Paraíba

***Instituto Federal de Educação,Ciência e Tecnologia do Ceará

Laboratório de Crescimento e Desenvolvimento Motor Humano

Bolsista do CNPq/IFET

Emília Amélia Pinto Costa da Silva*

Priscilla Pinto Costa da Silva**

Edivan de Sousa Fernandes*

Samara Queiroz de Nascimento Florêncio**

Isnaldo de Araújo Florêncio Júnior*

Paulo Felipe Ribeiro Bandeira***

Patricia de Jesus Costa dos Santos*

p.f.5@hotmail.com

 

 

 

Resumo

          O texto constitui uma reflexão a luz das relações existentes entre o esporte e sua íntima relação com o corpo, em que está presente na sociedade pós-moderna como agente construtor de um corpo imaginário estabelecido por princípios formados por sujeitos, bem como o espetáculo esportivo apresentado pelos meios de comunicação em massa, no qual podem torna influência à sociedade.

          Unitermos: Esporte. Corpo. Espetáculo esportivo. Sociedade

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 139 - Diciembre de 2009

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Introdução

    O esporte, sendo considerado um fenômeno, possibilita congregar tanto os atletas como os espectadores. Assim, a ética está presente na constituição do arcabouço do esporte, de tal modo desenvolveu afinidades com a ética e a estética (WELSCH, 2001). Isso é visível, por exemplo, através dos estilos aparentes dos atletas, de tal modo que o esporte tornou-se, também para o espectador meio de exibição das tendências momentâneas.

    Ainda seguindo as idéias do autor, o esporte tornou-se espetáculo, em que a celebração do corpo está presente. Nesta perspectiva, recorre-se a Santin (2005), em que expõe o esporte de rendimento como o “ideário olímpico” sendo assim, o autor ressalta que o corpo empregado com esses modos, pode ser caracterizado como “corpo-instrumento de idealismo, corpo-instrumento de uso político e corpo-consumo ou corpo mercadoria (no esporte-negócio)”.

    O fenômeno do esporte desperta o desejo de expansão entre os mais jovens, aumentando o consumo de esteróide anabolizante, por exemplo, como enfatiza Lipovetsky (2007). O autor declara os diversos meios de manutenção corporal, como regimes, cirurgia estética que podem ser ponderados como manifestações de um “novo narcisismo” pelo desejo e competitividade corporal. Assim, o desejo e construção de um corpo imaginário dos espectadores, em busca da “perfeição” do corpo atlético, tornaram crescentes a procura pela biotecnologia, apostando na modificação do corpo. Todas essas modificações são consideradas assim como “corpo aparência”, ou seja, o corpo que não expressa, o corpo que não sente. Surge assim uma reflexão: Quais os limites para transformar um corpo?

    A tecnologia abraça o desejo da construção do corpo imaginário dos espectadores, através de intervenções cirúrgicas, drogas, cosméticos, alimentos diet, equipamentos sofisticados que satisfazem estes desejos. O hedonismo se faz presente cada vez na vida da sociedade e a ideologia ao corpo ideal proposto pelos indivíduos. Desta forma, os estudos de Giddens (2002) trazem reflexões que não somos o que somos, mas o que conseguimos fazer de nós mesmos.

    Gomes e Almeida (2007) caracterizam esses comportamentos do sujeito como um exercício de si sobre si, a partir de númeras operações no seu corpo, em seus pensamentos, nas condutas, buscando se transformar, atingindo certo modo de ser. Neste sentido, Foucault (2004) entende que estas práticas são estratégias subjetivas do poder disciplinar moderno e do biopoder, transformando o corpo na forma desejada de ser. Este autor apresenta estas transformações de uma “arte da existência” ou uma “estética da existência”

    Giddens (2004) contribui neste pensar, quando ressalta que a construção estética do corpo relaciona-se a reflexões do “eu” na modernidade. A promoção da autorrealização, do desejo da moldagem do próprio corpo, bem como o autogoverno declara a centralidade na construção da subjetividade humana. A estética corporal para Maffesoli (1996) é enfatizada pela questão da aparência. Para ele a estética corporal parte de uma lógica grupal, em que estão inseridos os grupos sociais ou como o autor mesmo denomina as tribos urbanas.

    O culto a aparência corporal, segundo Lipovetsky (2007) é reflexo também da sociedade de consumo, que contribui para o aumento da estética. Assim, percebe-se que a aparência vem tornando uma preocupação da sociedade capitalista. Sendo assim, observa-se uma dicotomia desta sociedade, como nos traz Tubino citando Marget Greve (2005), identificando em um referencial antropológico- fisiológico no qual o homem dicotomizado apresenta duas partes separadas, o corpo e a alma. Considera-se contudo o corpo, como externo e a alma o corpo interno. Ainda segundo o autor, há o homem indivisível, caracterizando-se assim o homem como um todo, o sentir, o agir e o pensar se completam.

    Neste sentido, torna-se necessário retornar aos escritos de Gomes e Almeida (2007) que frisam a origem do sujeito enquanto sujeito de ações éticas que geram a forma pelo qual o indivíduo deve constituir a si mesmo, como ser moral de suas próprias ações. Vargas (2007) em sua obra Ética: ensaios sobre a educação física, saúde social e esporte, retrata o profissional de educação física com a promoção da dignidade humana, a partir de um compromisso ético.

    Assim, a dignidade humana conhecida a partir da ética humana, pode se expressar através do corpo. Nesta perspectiva, refletir sobre a dignidade humana a partir de questões éticas sobre o corpo em um contexto que envolve o esporte é de fundamental importância observar que o corpo não é um objeto no qual possa moldar a partir das exigências midiáticas. O corpo sujeito é capaz de sentir, pensar, se expressar, por meio de ações e reações, no qual a cultura está inserida em uma sociedade.

    As discussões em torno do corpo e do trato com o mesmo, além da busca pelos padrões de beleza impostos e disseminados pelos meios de comunicação compõem o quadro do crescente interesse pelo corpo na sociedade ocidental. Essa busca pelos padrões de beleza impostos por essa sociedade na qual estamos inseridos transcede classes sociais.

    No programa de televisão “The Oprah Winfrey Show” 1, a apresentadora americana Oprah Winfrey discutiu a questão da beleza em vários países do mundo. A apresentadora ficou surpresa com o relato de uma moradora da Rocinha entrevistada pelo programa quando disse que gastava metade do seu salário com sua aparência. Este fato ilustra um pouco desse cuidado exagerado, dessa ditadura profunda que a sociedade moderna tem imposto para o corpo e para a vida dos indivíduos.

    Esse processo de escravização do qual o corpo tornou-se vítima, tem levado os indivíduos a submeter-se a intervenções na construção deste novo corpo, seja através das cirurgias plásticas, das dietas milagrosas ou até mesmo da utilização das práticas corporais. Todas estas questões conflitantes e paradoxais nos quais as questões que nem sempre são levadas em conta como a questão social como alerta Silva (2001, p.4).

    A expectativa de corpo fundada a partir de seu culto narcisista, contrasta com a situação vivenciada por grande parte da humanidade que convive cotidianamente, com os flagelos da fome e da doença; para a grande maioria a expectativa de corpo se pauta por seu definhamento. Constitui-se, assim, uma situação paradoxal: no momento em que toda humanidade poderia estar usufruindo das promessas e dos decantados avanços da ciência, a maior parte dela não tem, nem mesmo, as condições básicas para uma vida digna.

    Inúmeras são as práticas corporais que configuram-se nesta tentativa de modificação da aparência corporal, as academias de ginástica e os clubes esportivos são espaços físicos destinados também para a obtenção do corpo valorizado, tudo isso alinhado a utilização de medicamentos, produtos de beleza, das dietas, além das intervenções dos mais variados tipos. No caso dos freqüentadores das academias é comum perceber que mesmo os indivíduos que estão dentro dos valores considerados normais de massa corporal e percentual de gordura, há um descontentamento com a imagem corporal (DANTAS et. al, 2005).

    Na sociedade, o corpo tem sido representado de forma biológica, ou seja, uma compreensão restrita de saúde, deixando de lado as outras formas de representação do corpo, não menos importantes como as representações sócio-culturais e econômicas. A ‘medicalização da vida’, termo originário da obra de Ivan Illich (1975), tornou-se tendência na sociedade higienista na qual vivemos hoje. As intervenções médicas, a suplementação química e o consumo de bens são elementos e estratégias que utiliza-se do discurso da saúde para legitimar a sua utilização na promessa da juventude eterna ou na valorização de qualidades abstratas, tal como: a beleza, força, saúde entre outros aspectos.

    Nesse campo fértil da representação corporal, surgem numerosas de pesquisas que focaliza analisar o uso de substâncias que são ingeridas pelos indivíduos neste processo de representação do corpo e da busca incessante pelo modelo de corpo disseminado na sociedade contemporânea (SILVA, 2001).

    A insatisfação leva a intervenções drásticas sobre o corpo, como as cirurgias plásticas, as mais variadas dietas, as diferentes ginásticas cada vez mais especializadas em modelar milimetricamente o corpo humano, além da ingestão de medicamentos e produtos químicos com essa finalidade (Silva, 2001, p.3).

    Partindo desse olhar, observa-se os estudos de Fernandes e Dantas (2007), quando retrata essa insatisfação com o próprio corpo por consequência dessa manipulação, o qual é passível na construção deste novo corpo. Em meio a essa coisificação do corpo, a percepção da aparência de beleza cultuada pela sociedade moderna globalizada, o corpo assumiu um caráter de objeto/coisa que a todo e qualquer custo pode ser modificado diante das tecnologias disponíveis.

    São várias as possibilidades e técnicas que podem ser empregadas na construção e modelagem do corpo. A ciência juntamente com a tecnologia tem realizado profundas alterações no corpo humano. O corpo tem sido vítima do reducionismo imposto pelas ciências biomédicas e banalizado pela ideologia da cultura de consumo que assola a sociedade e pela mídia que anuncia padrões e normas que devem ser copiados pelos indivíduos (SILVA, 2001).

    No entanto, percebe-se que as estas incursões tecnológicas e cientificas sobre o corpo devem ser amplamente discutidas, uma vez que para o filósofo alemão Hans Jonas citado por Palma (2001), todas as promessas de felicidades advinda da biogenética deve se pautar na questão ética a medida que inúmeras conquistas tem sido alcançadas na tentativa de prolongar a expectativa de vida.

    Intrinsecamente a esta coisificação do corpo e das intervenções feitas pelas ciências biomédicas, o corpo tem sido manipulado também pelas inúmeras praticas corporais que despontam a cada verão nas academias de ginásticas de todo o país. Nesse processo da ditadura do corpo, o esporte tornou-se um dos elementos que fazem parte desse cuidado excessivo com o corpo. O prestígio social que o esporte representa, torna um importante meio para a construção do corpo personificado e idealizado pelos indivíduos na sociedade contemporânea.

    As práticas corporais despertam o desejo dos sujeitos para manter ou construir um determinado tipo de corpo desejado. De tal modo, pouco importa os procedimentos adotados para a transformação ou destruição deste novo corpo (RODRIGUES, 2005). Na busca dos padrões de beleza vigentes na sociedade ocidental contemporânea, onde cada vez mais a beleza é algo a ser conquistado.

Considerações finais

    As modificações no corpo construído pelo imaginário da sociedade proposto a partir do idealismo do corpo dito perfeito dos atletas, permite influenciar indivíduos que são insatisfeito com sua aparência com a finalidade de constituir-se em uma sociedade que aposta em padrões estéticos. A manipulação do corpo, no qual consente modelagem, está sempre a ser “refeito”, inserido nos signos de consumo.

    Trazer reflexões a luz desta temática possibilita buscar compreensões do corpo no contexto social, em que muitas vezes trazem significados evidenciados frívolos, preocupando-se com a dominação do seu eu para em um imaginário estabelecer relações sociais. Esta problemática envolve as relações humanas da pós-modernidade e do poder que cada sujeito exerce em si, no qual seu corpo passa por situações agressivas para ser aceito a partir do olhar do outro.

Nota

  1. Oprah Winfrey é uma apresentadora americana que possui um dos programas mais populares dos Estados Unidos, “The Oprah Winfrey Show” (GNT) 20/11/2008

Referências

  • DANTAS, Estélio Henrique Martin; NOAVES; Jefferson Silva; LIMA, Jorge Roberto Perrout; DAMASCENO, Vinicius de Oliveira. Imagem Corporal, Insatisfação e Tipo Físico Ideal. In: DANTAS, Estélio Henrique Martin. Pensando o Corpo e o Movimento. Rio de Janeiro: Shape, 2005.

  • FERNANDES, E. S.; DANTAS, E. R. Comportamentos de risco e estilos de vida saudáveis: o caso do boxe nas academias de ginástica de campina grande/PB. Anais do XV Congresso Brasileiro de Ciências do Esporte e II Congresso Internacional de Ciências do Esporte/ Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte. Recife: CBCE, 2007.

  • FOUCAULT, M. Ditos e escritos V. Ética, sexualidade, política (E. Monteiro & L. D. Barbosa, Trad.). Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004.

  • GIDDENS A. Modernidade e Identidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2002.

  • LIPOVETSKY, Gilles. A Felicidade Paradoxal: Ensaio Sobre a Sociedade de Hiperconsumo. Tradução Maria Lúcia Machado. São Paulo: Companhia Das Letras, 2007.

  • MAFFESOLI, M. No fundo das aparências. Rio de Janeiro, Vozes, 1996.

  • PALMA, A. Educação Física, Corpo e Saúde: uma reflexão sobre outros modos de olhar. Revista Brasileira de Ciências do Esporte. Campinas: Autores Associados. v.22, n.2, p. 23-39, 2001.

  • RODRIGUES, R. O Desempenho do Homem-massa nas práticas corporais esportivas: uma relação de amor e de ódio. Revista Brasileira de Ciências do Esporte. Campinas: Autores Associados. v.27, n.1, p.153-165, 2005.

  • SANTIN, Silvino. Perspectivas na visão da corporeidade. In: MOREIRA, W. W. (org.) Educação Física e esportes: perspectivas para o século XXI. Campinas: Papirus, 2005.

  • SILVA, A. M. Corpo, ciência e mercado: reflexões acerca da gestação de um novo arquétipo da felicidade. Campinas: Autores associados: Florianópolis: Editora da UFSC, 2001.

  • WELSCH, Wolgang. Esporte – Visto esteticamente e mesmo como arte? In: ROSENFILD, Denis L (Org.). Ética e estética. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001.

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