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Formação educacional do atleta brasileiro. As 

modalidades militares são medalha de ouro nos estudos

Formación educativa del deportista brasileño. Las modalidades militares son medalla de oro en los estudios

 

Graduado em Jornalismo (Unisinos) e Educação Física (Ulbra)

Pós-graduando em Administração e Marketing Esportivo (Gama Filho)

Autor dos livros “Universíade 1963, História e Resultados dos Jogos Mundiais

Universitários de Porto Alegre”, “Tie Break – A saga dourada do vôlei masculino do Brasil”

e “A Vitória vem dos Céus – A trajetória do brasileiro campeão mundial de judô”

Rodrigo Koch

rodrigokoch@radioguaiba.com.br

(Brasil)

 

 

 

Resumo

          A maior preocupação para o atleta é o futuro profissional depois de encerrada a carreira esportiva. Mas nem todos, enquanto estão em fase de competições conseguem estudar e atingir uma formação de nível superior. Para investigar a formação educacional do atleta brasileiro foi realizada pesquisa com toda a delegação do Brasil que esteve presente nos Jogos Pan-Americanos Rio 2007 e nos Jogos Olímpicos de Pequim 2008. No total, foram entrevistados 712 atletas, de 33 confederações esportivas. Os resultados em algumas modalidades foram surpreendentes e, em números gerais a grande maioria dos atletas brasileiros está com a graduação em andamento.

          Unitermos: Educação. Esporte. Jogos Olímpicos

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 139 - Diciembre de 2009

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Introdução

    O grande desafio para o atleta olímpico brasileiro poderá vir após o encerramento de sua carreira de esportista; fora dos campos, quadras, piscinas ou pistas atléticas. Trata-se da inserção no mercado de trabalho, onde nem todos conseguem obter êxito como na época em que defendiam a bandeira brasileira nas mais diversas competições de nível internacional. Nem sempre o atleta vencedor no esporte também se torna um vencedor na vida profissional. Há, ainda, falta de incentivos – não só financeiros, mas também institucionais – além de orientação e sistematização adequada para preparar e absorver estes cidadãos no processo de formação e continuidade da carreira, não só esportiva como profissional.

    Afinal, até onde chegam nossos esportistas nos estudos? Qual a modalidade que é medalha de ouro nos bancos acadêmicos? Nosso sistema educacional é preparado para receber os atletas? O que desejam após o encerramento da carreira no esporte? As respostas foram obtidas durante a realização da pesquisa, que objetivava desvendar como estão nossos atletas olímpicos em relação aos estudos. Os resultados em algumas modalidades são surpreendentes desmistificando teorias do passado baseadas no sucesso de esportes que produziram bons dirigentes.

Metodologia e pesquisa

    Entre os meses de fevereiro e julho de 2009, 712 atletas que representaram o Brasil nos Jogos Pan-Americanos Rio 2007 e nos Jogos Olímpicos de Pequim 2008 – através de suas confederações, técnicos, ou em contatos pessoais – foram questionados de forma direta até que nível haviam estudado ou estavam estudando. Para as confederações foram enviadas planilhas via e-mail, contendo a relação dos atletas da modalidade, onde cada entidade deveria assinalar o nível educacional dos esportistas. Em uma segunda fase da pesquisa, técnicos e treinadores também colaboraram através do preenchimento dos dados que faltavam em suas modalidades. Em um terceiro momento, os atletas foram consultados via telefone ou e-mail para complemento das informações. Paralelamente, com intuito de chegar aos números e resultados finais, os dados relativos ao nível educacional de alguns atletas foram obtidos através da consulta a sites especializados de cada modalidade. Os dados divulgados foram autorizados pelas confederações ou pelos próprios atletas. Para preservação dos esportistas, os resultados foram colocados em percentuais, evitando a identificação de atletas com baixa escolaridade. A pesquisa obteve percentual de mais de 90% de respostas, atendendo as exigências de validação de Foina (2000) para pesquisas por correspondência. Apenas uma parcela mínima dos atletas – 7,7% dos entrevistados – não quis informar até que grau havia estudado, ou não foram encontrados para responder a pergunta no período de 26 de fevereiro a 31 de julho. As modalidades coletivas de futebol e basquete foram pesquisadas apenas no naipe feminino devido à ausência dos homens no basquete e, a troca de categoria no torneio de futebol Pan-Americano em relação ao dos Jogos Olímpicos.

Cronograma da Pesquisa

 

Método

Modalidades

Período

Fase 1

e-mail para confederações

Badminton

Beisebol

Judô

Pentatlo

Softbol

Tênis de Mesa

Tiro Esportivo

26 de fevereiro a

11 de abril

Fase 2

e-mail para técnicos

Boxe

Canoagem

Hóquei

Luta

Remo

Squash

13 de abril a 05 de maio

Fase 3

contato telefônico com atletas

Boliche

Esgrima

Futebol (feminino)

Ginástica

Karatê

Patinação

Vôlei e Vôlei de Praia

06 de maio a 31 de julho

Fase 4

pesquisa na web

Aquáticos

Atletismo

Basquete (feminino)

Ciclismo

Esqui Aquático

Handebol

Hipismo

Levantamento de Peso

TaeKwonDo

Tênis

Tiro com Arco

Triathlon

Vela

06 de maio a 31 de julho

 

Resultados

    O tiro esportivo – esporte que trouxe a primeira medalha olímpica para o Brasil em 1920, nos Jogos da Antuérpia – é a modalidade com maior número de atletas no mestrado ou na pós-graduação. Cerca de 90% dos atiradores que representaram o Brasil nas últimas edições dos Jogos Pan-Americanos e Olímpicos já concluíram um curso superior e, destes mais de 40% iniciaram especializações e, outros 24% estão mestrando. De acordo com o gerente administrativo da Confederação Brasileira de Tiro Esportivo, Carlos Alberto Costa, o fenômeno é explicado devido ao alto número de profissionais liberais praticando a modalidade que também tem origens militares. O tiro esportivo é uma modalidade amadora no Brasil e em função disso os adeptos precisam custear seus equipamentos e financiar os demais gastos para participarem de competições de alto rendimento.

    Em um segundo degrau da pesquisa estão modalidades que concentram a maioria dos atletas com ensino superior completo ou com a maior parte dos esportistas no ensino universitário. São modalidades que também apresentam atletas em cursos de especialização ou até no mestrado, mas em menor número. Neste grupo se destacam esgrima, pentatlo, tiro com arco e remo, modalidades também de elite e com origens e tendências militares. Segundo Luiz Gustavo Trainini, atleta olímpico do tiro com arco, a formação acadêmica para os esportistas destas modalidades é uma necessidade, tanto para o melhor entendimento da mesma como para a carreira profissional. Neste segmento também estão boliche e karatê – esportes disputados apenas nos Jogos Pan-Americanos – e a vela, que concentra mais de 70% dos atletas no ensino universitário, com a maioria já tendo concluído o curso superior.

    O terceiro grupo é composto pela grande maioria das modalidades, apresentando a maior faixa percentual de atletas com graduação em andamento. Muitos esportes que estão nesta relação têm situações diferenciadas, tanto no passado como no presente. TaeKwonDo, badminton, canoagem, triathlon, lutas, handebol e ginástica tem mais de 50% dos atletas com o curso superior em andamento, o que levanta uma nova questão: Por que os atletas não conseguem ou demoram tanto para concluírem os estudos no ensino superior? A resposta está diretamente relacionada ao sistema de ensino brasileiro, que não facilita a presença do atleta de alto rendimento nas faculdades. A doutora Kátia Rubio, psicóloga do esporte e professora da USP (Universidade de São Paulo), salienta que o modelo brasileiro não foi criado para atender o atleta de alto rendimento, que não consegue conciliar competições e treinos com estudos. Rubio também destaca que nos Estados Unidos os atletas recebem tratamento diferenciado dos demais estudantes, facilitando assim a conclusão dos estudos. Esportes marginalizados no passado, como levantamento de peso e atletismo, também estão neste grupo, revelando uma nova realidade. Eram modalidades consideradas de classes humildes e para pobres, mas agora apresentam 46,7% e 31,7% dos atletas, respectivamente, cursando a faculdade. O cenário nestas modalidades mudou devido ao incentivo das confederações e a criação de equipes de alto rendimento em algumas universidades.

    Esqui aquático, tênis, vôlei, futebol e ciclismo compõem o quarto grupo da pesquisa e são esportes onde a maioria dos atletas encerra os estudos no ensino médio. Duas modalidades que chamam atenção por estarem nesta condição na atualidade são tênis e vôlei, tidas – no passado – como modalidades da classe alta brasileira. A profissionalização e popularização destes esportes nos últimos anos pode ter transformado este cenário. No entanto, o ex-jogador Bernard – atleta da chamada geração de prata do vôlei e hoje presidente da Comissão Nacional de Atletas do COB –destaca que a situação não mudou, explicando que são raros os casos de atletas de alto rendimento – com passagens pela seleção – que conseguem se dar bem nos estudos. O futebol, neste estudo apenas avaliado no naipe feminino, tem suas particularidades.

Formação Educacional do Atleta Brasileiro

    Entre as mulheres, o esporte no Brasil ainda é amador e por isso muitas têm a necessidade de terem pelo menos o ensino médio concluído. Ainda assim há um percentual considerável no esporte de atletas que nem mesmo concluem o ensino fundamental. O ex-técnico da seleção, Jorge Barcelos, lamenta a situação vivida pelas brasileiras e destaca que com a entrada da maioria na universidade o trabalho poderia se tornar ainda melhor. Atualmente trabalhando no Saint Louis, do Estados Unidos, Barcelos conta que as americanas que desejam jogar na liga de futebol feminino do país precisam obrigatoriamente passar pelo ensino universitário. Já o ciclismo é um caso raro e apresenta altos e baixos. É a segunda modalidade com maior número de atletas no mestrado – perdendo apenas para o tiro esportivo – mas ao mesmo tempo é um dos esportes com grande percentual de adeptos no ensino médio.

    Por último, o boxe é o esporte com menor índice de escolaridade de seus atletas no Brasil. Mais de 40% param no ensino fundamental e, nenhum dos esportistas pesquisados chegou a ingressar em um curso superior. De acordo com Antonio Bosco, secretário geral da Confederação Brasileira de Boxe, a explicação para esta situação é a origem humilde da grande maioria dos praticantes da modalidade. Segundo o dirigente, toda a verba que a entidade recebe através das leis de benefício ao esporte é aplicada na participação da equipe brasileira em competições internacionais.

Mestres do esporte

    Entre os 712 atletas pesquisados quatro deles já estão com o mestrado concluído: Fernando Cardoso Júnior, do tiro esportivo; Alexandre Ribas, do remo; Fernando Firmino, do ciclismo; e Jaqueline Mourão, do ciclismo e agora no esqui cross country. Jaqueline revelou que teve algumas dificuldades para concluir os estudos, mas que não desistiu. A atleta mineira – hoje morando no Canadá – disse que sempre acreditou que estudo e esporte são compatíveis. Segundo ela, não foi fácil. Jaqueline carregou inúmeros artigos e livros para a Suíça – onde foi realizar estágio – com objetivo de redigir sua dissertação durante o período que estivesse fora do país. No Brasil temos um único atleta olímpico que conseguiu completar o doutorado: Nelson Prudêncio. Medalhado nos Jogos de Munique-1972, Prudêncio – atualmente professor universitário – obteve a titulação em 2008.

Considerações finais

    Há poucos anos o Comitê Olímpico Brasileiro, através da lei Agnelo-Piva, conseguiu canalizar verbas específicas para o esporte de alto rendimento no Brasil. No entanto, o montante ainda é insuficiente para tornar o país uma potência esportiva mundial. Diante deste quadro, fica evidente que não há dinheiro para ser aplicado nos estudos dos atletas. As ações que existem neste sentido, são iniciativas individualizadas de clubes, universidades ou técnicos. Atletas e treinadores reclamam da falta de incentivos e acessibilidade a programas voltados para o estudo dos esportistas. Recentemente o COB assinou convênio com a Adecco – empresa de desenvolvimento de carreiras – que pretende auxiliar o atleta brasileiro a se preparar para a transição da carreira esportiva para a vida profissional. Em parceria com a Adecco, o COB desenvolverá o Programa de Orientação e Transição de Carreira de Atletas, visando facilitar a inserção do esportista no mercado de trabalho, durante e ao final da carreira esportiva, oferecendo serviços de avaliação de perfil, planejamento de carreira, criação e manutenção de rede de relacionamentos, e oportunidades profissionais.

    A pesquisa revelou que o esporte olímpico brasileiro é basicamente constituído e representado por universitários. Em números gerais temos quase três por cento dos atletas no ensino fundamental; 21% que pararam os estudos no ensino médio; aproximadamente 60% de atletas-universitários – a maioria com cursos de graduação em andamento –, praticamente quatro por cento em pós-graduações (especializações), apenas 1,55% no mestrado e, até agora, nenhum no doutorado.

Referências

  • FOINA, Ariel G. Métodos de Aquisição de Dados Quantitativos na Internet: O uso da rede como fonte de dados empíricos. Revista Educação Brasileira Vol.22, N.44, Janeiro / Julho de 2000, CRUB, pp 155-166

  • www.cob.org.br

Entrevistas:

  • Antônio Bosco, secretário geral da Confederação Brasileira de Boxe, por telefone, em 28 de julho de 2009.

  • Bernard Rajzman, ex-atleta olímpico e presidente da Comissão Nacional de Atletas do COB, por telefone, em 28 de julho de 2009.

  • Carlos Alberto Costa, gerente administrativo da Confederação Brasileira de Tiro Esportivo, por telefone, em 28 de julho de 2009.

  • Jaqueline Mourão, atleta olímpica de ciclismo e esqui cross country, por telefone, em 04 de agosto de 2009.

  • Jorge Barcelos, técnico de futebol feminino, por telefone, em 28 de julho de 2009.

  • Kátia Rubio, psicóloga do esporte e professora da USP, por telefone, em 04 de agosto de 2009.

  • Luiz Gustavo Trainini, atleta olímpico de tiro com arco, por telefone, em 28 de julho de 2009.

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