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A natação como esporte de inclusão em um

ambiente considerado excludente por ser seletivo

 

*Mestrado em Ciência da Motricidade Humana (Concluíndo em 2009)

Pós-Graduado em Treinamento Desportivo - Universidade Gama Filho

Pós-Graduado em Teoria e Metodologia do Treinamento Desportivo,

Universidade Camilo Cienfuegos - Matanzas (Cuba)

**Doutor em Educação Física pela Université Libre de Bruxelles - Bélgica

Doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro

***Doutora em Educação Física e Cultura pela Universidade Gama Filho

Mestre em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro

André Gonçalves Yatsuda*

Manoel Gomes Tubino (in memorian)**

Vera Lucia de Menezes Costa***

andreyatsuda@terra.com.br

(Brasil)

 

 

 

Resumo

          Esta pesquisa apresenta um estudo com 10 (Dez) atletas de natação competitiva com diferentes deficiências físicas ou mentais, todos na faixa etária acima de 18 anos, representando o sexo masculino e feminino. O principal objetivo deste estudo é compreender as condições de inclusão do ambiente competitivo para atletas com necessidades especiais nos aspectos sociais, motores, afetivos e as limitações que estes atletas enfrentam no cotidiano para iniciarem e se manterem praticando nesta modalidade esportiva profissionalmente. Ao discutir o esporte competitivo, usou-se a natação para necessitados especiais como uma atividade inclusiva em um ambiente considerado excludente por ser seletivo, comparando os valores do jogo com os da sociedade contemporânea.

          Unitermos: Necessitado especial. Natação adaptada. Inclusão social

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 139 - Diciembre de 2009

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Introdução

    Muitos artigos citam a evolução do esporte paraolímpico e de seus idealizadores, mas os atores destes espetáculos são sempre lembrados como “aqueles que venceram” até “outros” superarem os seus limites tornando-os esquecidos pela população e pela mídia. A vitória é almejada por todos os atletas que treinam e superam a cada dia os limites do corpo e da mente, mas poucos conseguem chegar ao tão sonhado resultado da medalha de ouro. A exclusão inicia-se no sistema de organização das competições, pois no processo seletivo em que o atleta se submete a ser avaliado, é possível que um grande percentual de nadadores com necessidades especiais não consigam estar com o tempo de prova de acordo com o índice da competição, tornando-se excluídos. A falta de competições que estimulem a busca pelo resultado e incentivem o treinamento para este esporte no Brasil, acaba aglomerando um grande número de nadadores com necessidades especiais nas competições do Comitê Paraolímpico Brasileiro (CPB), e esses, por não conseguirem o resultado, acabam ficando até meses sem competir, desestimulando a sua vontade de ser profissional ou de continuar na carreira.

    No Brasil, apenas o CPB planeja as suas competições objetivando os resultados comparando com os índices do Comitê Paraolímpico Internacional (IPC), pois este é o órgão responsável pelas competições internacionais para necessitados especiais. Algumas Federações como a Federação Aquática do Estado do Rio de Janeiro ainda incluem os necessitados especiais em seus eventos, mas esses ambientes tornam-se excludentes por não direcionarem as provas de acordo com cada tipo de deficiência física, transformando esta manifestação esportiva em um local que diferencia a “capacidade motora” com a “limitação motora”, incapacitando e dificultando o necessitado especial de concluir a prova com boa colocação.

    O esporte, neste caso a natação adaptada, deixaria de ser excludente quando um ou vários sistemas parecidos com o CPB e IPC tivessem a mesma força que estes dois órgãos têm em organizar eventos para esta modalidade esportiva em todas as regiões brasileiras, isentando a responsabilidade de somente 1(um) órgão nacional para a função de recrutamento de atletas.

    Alguns resultados da pesquisa apontam a insatisfação pelo incentivo das empresas e indústrias brasileiras em apoiarem o atleta com necessidade especial, apontando um problema social e econômico em que o país está passando com a crise econômica mundial. A falta de patrocinadores acaba excluindo a pessoa com necessidade especial da natação competitiva por ser necessário o capital para o sustento dos materiais de treinamento, transporte, alimentação, educação e saúde.

    De acordo com a pesquisa, os nadadores avaliados começaram a praticar a natação competitiva após as Olimpíadas de Atenas com a brilhante participação do nadador Clodoaldo Silva em que conquistou 7 (sete) medalhas, sendo 6(seis) de ouro e 1(uma) de prata. A mídia começou a divulgar o esporte como um local de superação e apresentou a natação brasileira adaptada para os necessitados especiais como uma potência mundial, os nadadores brasileiros passaram a ser considerados exemplos no mundo a fora, transformando muitos sonhos em realidade.

    A inclusão se faz quando existe o comprometimento e interesse do praticante nesta modalidade esportiva, sendo assim, qualquer pessoa com necessidade especial tem direito de praticar a natação competitiva. O resultado das competições não impede esse ingresso e principalmente, a continuação desta prática esportiva para a vida toda. Usam-se como exemplos, atletas da categoria Máster que participam de competições e torneios realizados por Federações e Confederações nacionais e internacionais. Existem vários fatores endógenos e exógenos que podem ser identificadores importantes para a continuação dos atletas na condição de competidor, sendo eles: Idade, tipo de deficiência quanto à recuperação sensório-motora devido ao treinamento, ambiente em que são organizadas e realizadas algumas competições e torneios de natação para necessitados especiais, condição social, tipo de prova que competem, entre outros.

    De acordo com Piaget (1971) o jogo potencializado pelo prazer gerado em sua prática, pode ser dividido em três níveis: 

  1. Jogo de exercício (ou de repetição); 

  2. Jogos simbólicos; 

  3. Jogos com regras.

    A natação para necessitados especiais é um esporte que utiliza a regra para organizar condições iguais para aqueles que disputam a competição e tem na sua prática exercícios que estimulam a repetição biomecânica de cada nado, sendo eles: Golfinho, Costas, Peito e Crawl (Estilo Livre). Alguns movimentos utilizados na água, neste caso na piscina, são simbolizados pelas características biomecânicas de um peixe, pois a propulsão acontece quando é realizada uma força contra a resistência da água. A dificuldade em se movimentar na água é aparentemente maior comparada com as condições humanas que vivemos fora do ambiente aquático, sendo um fator que pode influenciar na exclusão de necessitados especiais neste esporte por ser desconhecido e visualmente perigoso.

    O medo de se tornar um deficiente físico ou mental, talvez seja um pré-conceito daquilo que idealizamos como é ser necessitado especial, mas as condições sociais e desumanas que os necessitados especiais convivem com a realidade no Brasil é que reforçam esse medo. Com a desigualdade social e as dificuldades que os brasileiros sofrem em sobreviver com dignidade neste país, torna-se evidente o desafio que os atletas convivem com esta realidade, o que dificulta a continuidade nesta modalidade.

    O necessitado especial em muitos casos é considerado como aquele que é incapaz de desenvolver tarefas diárias e até mesmo no esporte sem ajuda. Podemos comparar esse pré-conceito com aquele vivido por Jesse Owens (1936) em Berlim nos Jogos Olímpicos, quando conquistou quatro medalhas de ouro e frustou o plano nazista no sentido de que fosse um ato internacional de constatação da superação da raça ariana sobre os demais.

    O Brasil é um país de cultura escravocrata e com grande miscigenação de raças, fatores estes que contribuem com a existência de diversidades culturais, de valores e de crenças. Com tanta diferença é inaceitável que a discriminação aconteça no esporte. De acordo com TUBINO (1999), o esporte é um fenômeno profundamente humano, de visível relevância social na história da humanidade e intimamente ligado ao processo cultural de cada época.

    Estamos passando por um momento importante na história do esporte brasileiro e principalmente do esporte do continente sul-americano em que realizaremos no Rio de Janeiro a nossa primeira Olimpíada deste continente. O Brasil, em especial o Rio de Janeiro, conseguiu organizar pela primeira vez na história, os Jogos Parapan-americanos juntos no mesmo estado e na mesma época, pois geralmente disputados em cidade e datas diferentes. Com essa evolução, podemos perceber que é possível incluir o atleta necessitado especial em eventos com a mesma grandeza dos eventos esportivos convencionais, apenas modificando instalações para atender as necessidades físicas e mentais dos participantes.

    Foi possível perceber que a divulgação da mídia antes de iniciar o evento Parapan-americano 2007 e a valiosa equipe brasileira formada por atletas e técnicos que apresentaram importantes resultados em competições internacionais e nacionais, não foram suficientes para “profissionalizar” a natação para necessitados especiais e o próprio sistema organizacional destes eventos é que transformam essas manifestações esportivas amadoristas. Com pouca visibilidade pela população brasileira e descuido dos sistemas televisivos em não transmitirem os jogos Parapan-americanos é que tornam esse tipo de manifestação esportiva desconhecida e pouco praticada, com isso marginalizada.

Pesquisa com atletas e amadores praticantes de competições de natação para necessitados especiais no Brasil

    Observa-se na pesquisa da Tabela I realizada com atletas profissionais e amadores que algumas características sociais, motoras e afetivas, impedem ou favorecem a continuação da prática da natação como esporte adaptado competitivo.

Tabela I

1. Você considera a natação competitiva uma linha esportiva que ajuda na sua reabilitação motora e principalmente na integração social, mesmo sendo praticado individualmente em seus treinos e competições?

2. A sua participação no esporte competitivo é influenciada por resultados de atletas paraolímpicos nos últimos anos em competições esportivas?

3. Você é feliz praticando esporte competitivo?

4. Começou a praticar a natação competitiva por vontade própria?

5. Seu plano futuro é se tornar um atleta paraolímpico bem sucedido e utilizar o esporte competitivo como profissão? Se já é, como é essa experiência?

6. Quais as adaptações necessárias ao esporte para atender os necessitados especiais nas competições de natação?

7. Qual a maior dificuldade para uma pessoa com deficiência física, neste caso no Brasil, se tornar um atleta de natação adaptada competitiva?

8. Na tua opinião o Brasil oferece oportunidade para pessoas com necessidades especiais se tornarem atletas competitivos? Quais são essas oportunidades?

9. Você foi estimulado (a) na Educação Física Escolar a praticar a natação adaptada competitiva ou algum (a) profissional de Educação Física apresentou este esporte por você desempenhar algum talento?

10. Você conhece alguma lei de amparo ao necessitado especial que garante o seu direito de praticar esporte, neste caso, natação competitiva?Explicite:

11. Você concorda que a natação competitiva mesmo sendo considerada seletiva é possível se sentir integrado na sociedade quando praticada?

12. Quando você está nadando, neste caso participando de uma competição, quais são as emoções e sentimentos naquele momento?

Respostas da pesquisa da tabela I

RESPOSTAS

  • 1 – 10 (sim) e 0 (não) 

  • 2 – 10 (sim) e 0 (não) 

  • 3 – 10 (sim) e 0 (não) 

  • 4 – 5 (sim) e 5 (não)

  • 6 –RT 

  • 7 – RT 

  • 8 – 0 (sim) 10 (não) 

  • 9 – RT

  • 10 – RT 

  • 11 – 10 (Sim) e 0 (não) 

  • 12 – RT

Legenda

RT– Resposta da tabela

    De acordo com a Subchefia para Assuntos Jurídicos da Casa Civil (2009) o desporto brasileiro abrange práticas formais e não-formais e obedece às normas gerais, inspirado nos fundamentos constitucionais do Estado Democrático de Direito. A prática desportiva formal é regulada por normas nacionais e internacionais e pelas regras de prática desportiva de cada modalidade, aceitas pelas respectivas entidades nacionais de administração do desporto. A prática desportiva não-formal é caracterizada pela liberdade lúdica de seus praticantes.

    Clodoaldo Silva afirma nesta pesquisa que a maior dificuldade para o necessitado especial é sair de casa e que a competição é mais fácil de ser superada. Pode-se afirmar que os nadadores e admiradores pelo esporte adaptado, em especial a natação para necessitados especiais, acreditam que o ambiente competitivo pode ser um local que favorece a inclusão e que apresenta características sociais importantes para o a sua reabilitação e cidadania.

Conclusão

    Sabe-se que o esporte adaptado no Brasil é praticado por pessoas com diversas necessidades especiais e buscam na sociedade e na sua prática a auto-afirmação. Cada desafio superado é cada limite alcançado, tornando essa manifestação esportiva um local integrador e desafiador para o ser humano e principalmente para a Ciência. Incluir é respeitar as diferenças e exclusão é discriminar o desconhecido. A participação em competições torna-se evidente a melhora da auto-estima e encoraja o necessitado especial a sobreviver neste mundo com tantas diferenças e que só neles são vistas e discriminadas. Competir contra o preconceito é talvez o maior dos desafios, pois nas piscinas de eventos competitivos oficiais todos são iguais, com os mesmo direitos e deveres para garantir a tão almejada medalha de ouro.

Bibliografia

Outros artigos em Portugués

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