A Cultura Corporal na Educação Física Escolar La Cultura Corporal en la Educación Física Escolar |
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*Autora. Licenciada em Educação Física (UFPEL) Especializanda em Educação Física Escolar (UFSM) Professora de Educação Física da rede de ensino estadual em Santa Maria-RS Integrante do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Física (GEPEF/UFSM) **Orientador. Doutor em Educação (UNICAMP/UFSM) Doutor em Ciência do Movimento Humano (UFSM) Professor Adjunto do Departamento de Metodologia do Ensino (MEN/CE/UFSM) Líder do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Física (GEPEF/UFSM) |
Viviane Tunes da Rosa Hugo Norberto Krug (Brasil) |
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Resumo Compreende-se cultura como um conjunto de conhecimentos adquiridos. Pode-se dizer que é o desenvolvimento da instrução mais apurada sobre determinado assunto e esse entendimento possibilita contextualizar o saber. A educação física na escola tem alguns conceitos já formados, pré-estabelecidos, por parte de educadores da área e de outras áreas, de pais e educandos, sobre sua prática pedagógica e conhecimentos que devem ser explorados/desenvolvidos nesta disciplina e até mesmo a forma de fazê-los. Essa visão restrita direcionada para o esporte, para a formação de atletas, ou aquela visão enfocada no “fazer pelo fazer”, passada para a sociedade em geral, levam a uma compreensão equivocada do sentido pedagógico que a disciplina deve ter no contexto escolar. Unitermos: Cultura. Cultura corporal. Educação Física Escolar |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 139 - Diciembre de 2009 |
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A palavra cultura remete-nos a significados próprios de um povo, de um grupo, de suas tradições, de seus usos e costumes repassados e/ou seguidos para um determinado fim. Algo a que damos importância, por julgarmos ser imprescindível ao nosso “viver em sociedade”.
O termo cultura é muito amplo, abrange múltiplos significados, no contexto social é utilizado para especificar, dar sentido a algum termo: cultura familiar, regional, religiosa, alimentar, artística, estética, esportiva, lingüística, corporal, etc. Hábitos que são incorporados por indivíduos inseridos em um grupo social, costumes repassados de geração para geração, que servem para identificar, caracterizar, aquilo que é próprio de um determinado grupo. Compreende-se cultura como um conjunto de conhecimentos adquiridos. Pode-se dizer que é o desenvolvimento da instrução mais apurada sobre determinado assunto e esse entendimento possibilita contextualizar o saber.
Na sociedade contemporânea vivenciamos uma cultura basicamente capitalista, onde os indivíduos são direcionados ao consumo de bens e materiais. Essa cultura capitalista, por vezes, torna o “ter” mais importante que o “ser”, ou seja, indivíduos mais preocupados em produzir meios para acumular bens e menos crítico reflexivo sobre as condições socioculturais do meio em que está inserido. A escola está inserida em uma sociedade, seu corpo docente e discente traz essa cultura social para o âmbito escolar, logo, o conhecimento desenvolvido neste meio, também sofre influências de diferentes culturas.
DAOLIO (2004) fez algumas colocações sobre o termo cultura relacionado à educação física, com base na análise de abordagens pedagógicas de alguns autores contemporâneos, evidenciando que em todo o fazer pedagógico há um conceito implícito ou explicito, de cultura. “É possível perceber a utilização da expressão “cultura” acompanhada de termos como “física”, “corporal”, “de movimento”, “corporal de movimento”, e outros. Entretanto, essa utilização aparece de forma superficial, por vezes incompleta ou de forma reducionista” (Daolio, 2004, p.13).
A educação física na escola tem alguns conceitos já formados, pré-estabelecidos, por parte de educadores da área e de outras áreas, de pais e educandos, sobre sua prática pedagógica e conhecimentos que devem ser explorados/desenvolvidos nesta disciplina e até mesmo a forma de fazê-los. A cultura do jogar, do competir, do atleta escolar, do padrão de corpo, das atividades que exploram só o físico, etc. Essa “cultura educacional”, desenvolvida e fomentada na educação física escolar, por alguns professores da área é, por vezes, responsável por alguns conflitos entre educadores, que ao pensarem de forma diferenciada não exploram “essa cultura” em suas aulas, gerando em alguns contextos escolares a falta de reconhecimento da disciplina, devido a não adotar essa concepção essencialmente prática. Vale aquela prática que produz indivíduos aptos a competirem em uma ou mais modalidades esportivas, de modo a representarem à escola na qual estão inseridos. Essa visão restrita direcionada para o esporte, para a formação de atletas, ou aquela visão enfocada no “fazer pelo fazer”, passada para a sociedade em geral, levam a uma compreensão equivocada do sentido pedagógico que a disciplina deve ter no referido contexto. Daí a vincular Educação Física a formação de atletas escolares, para aqueles que reúnem as condições (físicas e motoras, principalmente) que possibilitem torná-lo um competidor potencial, ou vinculá-la a prática pela prática, para aqueles menos privilegiados, “desprovidos das condições necessárias à formação de um atleta”, restando-lhes, nesta perspectiva, o desenvolvimento de atividades sem qualquer contexto. Entre outras concepções pedagógicas que fazem parte do atual cenário da Educação Física.
Como tornar claro, para a sociedade, o conhecimento de que trata a disciplina, se para os próprios educadores isto ainda é confuso, ou ainda pior, por alguns nem sequer é questionado?
Cada educador trata este conhecimento com base em concepções próprias. Se considerarmos que, durante o ensino fundamental o educando passa por diferentes professores e concepções por eles adotadas (cultura física, de movimento, de competição, etc.). A produção de conhecimentos ao longo deste processo, fará com que o indivíduo construa, com base em suas vivencias, um entendimento sobre o assunto, o qual poderá se alterar, dependendo das relações que este indivíduo vai estabelecer ao longo de sua vida.
Daolio (2004, p.72), propõe uma educação física que considere o indivíduo numa relação intersubjetiva, como indivíduo socializado que compartilha o mesmo tempo histórico do educador que faz a intervenção. Nesta perspectiva, o indivíduo é considerado como parte importante, necessário e participante do processo pedagógico a ser planejado pelo educador. Para possibilitar que o indivíduo estabeleça relações entre subjetividades diferentes. O indivíduo é pensado/considerado como ser que pensa, sente, se expressa, age, faz parte de um grupo é sociocultural e deverá estar preparado para intervir no mundo, portanto, não pode ser visto só como um corpo. Esta forma tão reducionista de conceber o indivíduo, não contempla tudo o que representa em si.
O professor de educação física quando desenvolve atividades corporais lúdicas, recreacionistas e esportivas, danças, jogos, fora desta concepção do esporte sistematizado, do rendimento acima de tudo, do trabalho meramente corporal, da prática pela prática e visa esclarecer o educando para o conhecimento mais reflexivo dos conteúdos trabalhados, leva o educando a perceber-se como um todo. Ou seja, quando o professor leva-o a perceber o significado, o sentido da atividade que vivencia, através da ação reflexiva e consciente de diferentes práticas corporais. O porquê de realizá-lo, desta ou daquela maneira? Que contribuições esta prática trará para sua vida? Com estes procedimentos, o professor possibilita que o educando realmente se aproprie de uma cultura corporal e estabeleça relações deste saber, com outros saberes que fazem parte deste mesmo ser.
Daolio (2004) sobre a “cultura” em Coletivo de Autores (1992, p.62) “[...] os temas da cultura corporal, tratados na escola, expressam um sentido/significado onde se interpenetram, dialeticamente, a intencionalidade/objetivos do homem e as intenções/objetivos da sociedade”.
Quando o professor adota uma prática pedagógica, com princípios diferentes daqueles comumente adotados, sua disciplina deixa de ser reconhecida pela comunidade escolar como “a educação física”, que necessariamente objetiva trabalhar o corpo, que o explora visando obter músculos bem definidos, melhor performance nas modalidades esportivas, para competir mais, etc. Passa a ser uma disciplina reconhecida, respeitada e ter mais credibilidade, pelo processo pedagógico que desenvolve. Possibilita despertar nos indivíduos, um olhar diferenciado, sob outra ótica, fazendo-lhes perceber que o conhecimento de que trata esta disciplina, não se restringe a mera prática corporal esportiva.
Para o Coletivo de Autores, a cultura corporal é vista como patrimônio da humanidade, mas Daolio critica a falta de avanço na idéia de que os conhecimentos produzidos ao longo da vida vão sendo atualizados e ressignificados pela consciência e significado produzidos pelo ser humano. O ser humano é o produto de uma determinada cultura e ao mesmo tempo, produtor de cultura.
Chauí: “(...) cultura é a maneira pela qual os humanos se humanizam por meio de práticas que criam a existência social, econômica, política, religiosa, intelectual e artística” (1994, p. 295). Geertz, utilizando uma metáfora de Weber, define “a cultura como sendo uma teia de significados, que dá sentido e orienta a vida de todos os homens em todos os momentos. Segundo este autor, a cultura é essencialmente pública, porque os significados são públicos” (1989). (Fensterseifer org., 2005, p.107). Para que o indivíduo construa essa teia de significados, não lhe pode ser negado o direito ao conhecimento de uma cultura corporal no sentido amplo, a que o termo refere-se.
Construir esse conhecimento sobre a cultura corporal, implica oportunizar ao indivíduo vivenciar de forma crítica, participativa, e acima de tudo reflexiva, a diversidade da cultura corporal (dança jogos, recreação, esporte, ginástica, etc.). Através das relações que o individuo estabelece entre essas vivências e destas, com outros saberes que adquire, torna-o capaz de apropriar-se da cultura corporal a ser desenvolvida na prática pedagógica escolar.
Referências
BETTI, M. Valores e Finalidades na Educação Física Escolar: uma Concepção Sistêmica. Revista Brasileira de Ciências do Esporte. Santa Maria, v.16, n.1, p.14-21, 1994.
DAOLIO, J. Da Cultura do Corpo. Campinas: Papirus, 1995.
FENSTERSEIFER, P. E.; GONZÁLEZ, F. J. (Orgs.). Dicionário Crítico de Educação Física. Ijuí: Ed. Unijuí, 2005.
LDBEN, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº9. 394/96. Diário Oficial da União, Brasília, 1996.
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