Atendimento fisioterapêutico hospitalar em paciente pós-operatório de troca de válvula aórtica. Estudo de caso Atención fisioterapéutica hospitalaria en un paciente post operatorio de cambio de válvula aórtica. Estudio de caso |
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Fisioterapeuta Cursando Especialização em Fisioterapia Ortopédica e Traumatológica Associação Catarinense de Ensino – ACE (Brasil) |
Letícia Miranda |
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Resumo Por ser considerada um problema de saúde pública a Insuficiência Cardíaca é uma doença preocupante que deve ser tratada de forma multiprofissional. O presente trabalho descritivo na forma de estudo de caso teve como objetivo descrever o tratamento fisioterapêutico no ambiente hospitalar e sua evolução, em uma paciente em pós-operatório de troca de válvula aórtica (prótese mecânica), que apresenta Insuficiência Cardíaca Congestiva (ICC). Para obtenção dos dados a paciente foi avaliada, tratada e reavaliada. Os atendimentos ocorreram na enfermaria do Instituto catarinense de Cardiologia do Hospital Regional de São José (HRSJ). Após o período de tratamento, os dados obtidos permitem observar a evolução do paciente no seu âmbito funcional. Unitermos: Fisioterapia. Pós-operatório. Troca de válvula aórtica |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 138 - Noviembre de 2009 |
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Introdução
A insuficiência cardíaca congestiva é uma síndrome que apresenta a via final comum de diversas doenças do coração, caracterizada por disfunção sistólica e/ou diastólica de um ou mais, freqüentemente, dos dois ventrículos do coração, de evolução progressiva e quase sempre fatal (PORTO, 1998).
A insuficiência cardíaca ocorre quando, qualquer disfunção cardíaca, provocada por lesão miocárdica ou sobrecarga hemodinâmica, aguda ou crônica, gera comprometimento do débito cardíaco, aumento das pressões de enchimento dos ventrículos e alterações na perfusão tissular periférica (PORTO, 1998) (CHUNG, 1994) (BRAUNWALD, 1996).
Os principais sintomas da insuficiência cardíaca refletem, em geral, as anormalidades hemodinâmicas. Essas anormalidades ocorrem inicialmente durante esforços intensos, a seguir durante atividades rotineiras e por fim no repouso. Quando a insuficiência cardíaca evolui lentamente para o estágio sintomático, o primeiro sinal é, em geral, dispnéia aos esforços ou fadiga. Na avaliação inicial e em cada consulta subseqüente, devem-se determinar a duração e a freqüência da atividade responsável por esses sintomas. (GOLDMAN & BRAUNWALD, 2000).
A insuficiência cardíaca congestiva (ICC), constitui atualmente um importante problema de saúde pública. Estima-se que 1% dessa população é portadora, sendo que cerca de um quinto morre anualmente, surgindo à razão de 3/1.000 habitantes/ano. (SILVA, 2002).
A gravidade dos sintomas decorrentes da ICC parece correlacionar-se com a mortalidade. A classificação mais utilizada para quantificar os sintomas é a classificação da New York Heart Association (NYHA).
Essa classificação da New York Heart Association, citada por Braunwald (1996), divide:
Classe I – sem limitações: as atividades físicas normais não provocam fadiga excessiva, dispnéia ou palpitação.
Classe II – Limitação leve da atividade física: os pacientes são assintomáticos em repouso. As atividades físicas normais provocam fadiga, palpitação, dispnéia ou angina.
Classe III – Limitação acentuada da atividade física: embora os pacientes sejam assintomáticos em repouso, atividades mais leves que as habituais provocarão os sintomas.
Classe IV – Incapacidade de realizar qualquer atividade física sem desconforto: os sintomas de ICC estão presentes mesmo em repouso. Qualquer atividade física suscita a presença de desconforto.
As causas da ICC, segundo Porto (1998), podem ser classificadas em dois grupos, levando em conta ou não a presença de disfunção miocárdica. Na ICC sem falência miocárdica a origem pode ser por sobrecargas pressóricas ou de volume, alterações no enchimento cardíaco ou estados de baixo débito cardíaco secundários à bradiarritmia. Na ICC com comprometimento do miocárdio as causas podem ser lesão miocárdica aguda ou crônica causada por: doença arterial coronariana, infecção, doença valvar, distúrbio metabólico (diabetes), deficiências nutricionais, dentre outras causas relacionadas.
No caso das doenças valvares, a valva aórtica pode tornar-se incompetente devido à deficiência dos seus folhetos ou da raiz. (GOLDMAN & BRAUNWALD, 2000).
As características morfológicas da insuficiência aórtica dependem basicamente da etiologia do processo degenerativo que acomete a valva. A doença reumática, responsável por aproximadamente 46% dos casos de insuficiência aórtica isolada, provoca calcificação em apenas 10% dos casos e geralmente é focal. Mais freqüentemente, a doença reumática provoca retração que com o passar do tempo, leva a insuficiência central da valva aórtica (KIRKLIN & BARRAT-BOYES, 1993) (COSGROVE et al, 1991).
Dentre as etiologias mais freqüentes da insuficiência aórtica, podemos destacar também a doença valvar congênita, que ocorre em 13% dos casos, representada morfologicamente pela presença de valva aórtica bi ou univalvulada. Essas alterações podem provocar insuficiência aórtica por prolapso, serem agravadas pela ocorrência de endocardite ou comissurotomia inadequada (KIRKLIN & BARRAT-BOYES, 1993).
A correção da insuficiência aórtica precisa ser realizada antes do desenvolvimento de disfunção irreversível do ventrículo esquerdo para o alívio dos sintomas (se presente) da insuficiência cardíaca, e para que o paciente apresente uma vida normal após a cirurgia. Na maioria das vezes é necessário troca da válvula ao invés de reparo. Ao decidir realizar a cirurgia é necessário avaliar os riscos da prótese e o de adiar a cirurgia. A “regra do 55” diz que se o diâmetro ecocardiográfico do eixo menor telessistólico do ventrículo esquerdo não deve exceder 55 mm e que a fração de ejeção ventricular esquerda não seja inferior a 55%. Assim em pacientes assintomáticos a cirurgia pode ser adiada até que os sintomas apareçam ou até os limiares antes descritos. Se o diâmetro sistólico final for < 40 mm é improvável que a disfunção ventricular venha a ocorrer em 2 anos e a ecocardiografia pode ser realizada seguramente de 2 em 2 anos. Nos pacientes com diâmetros sistólicos finais de 40 a 50mm, recomenda-se o acompanhamento ecocardiográfico anual, e se, o diâmetro sistólico final for >50 mm e < 55mm, o acompanhamento deve ser realizado a intervalos de seis meses. Quando o paciente com insuficiência aórtica demonstra sintomas de insuficiência cardíaca a cirurgia deve ser realizada independentemente dos achados ecocardiográficos, porque o início recente de insuficiência cardíaca indica uma descompensação cardíaca. (GOLDMAN & BRAUNWALD, 2000).
Várias técnicas e tipos de próteses valvares têm sido empregados para esse fim, desde 1957, quando Hufnagel implantou a primeira “prótese de bola” em aorta descendente (KIRKLIN & BARRAT-BOYES, 1993). Atualmente, a maioria dos centros utiliza prótese mecânica com resultados favoráveis (OBADIA et al, 1991). Entretanto, o tromboembolismo ocorre, ainda que, em algumas séries, com freqüência baixa (AROM et al, 1987) (BLACKSTONE & KIRKLIN, 1985).
Todas as próteses valvares têm as suas desvantagens. Embora a inserção de uma prótese melhore a condição que a exigiu e, quando a cirurgia é realizada no momento adequado, possa oferecer ao paciente uma expectativa da vida normal, a tromboembolia, endocardite e insuficiência valvar primária são condições que complicam o uso de próteses valvares. Além disso, todas as próteses são inerentemente estenóticas, quando comparadas à valva original normal. Por esse motivo, enfatiza-se o reparo da valva, e existe um consenso de que, sempre que possível, a valva original do paciente deve ser reparada em vez de substituída por uma prótese. Hoje em dia, o reparo é possível em 10% a 15% dos casos de regurgitação aórtica. As opções de prótese valvares são as próteses biológicas heterólogas, próteses biológicas homólogas e valvas mecânicas. O transplante da valva pulmonar para a posição aórtica, como uso de um homoenxerto na posição pulmonar é atraente em pacientes jovens, porque o auto-enxerto pulmonar pode crescer com o paciente. (GOLDMAN & BRAUNWALD, 2000).
As valvas mecânicas são extremamente duráveis, e algumas têm perfil hemodinâminco excelente com baixos gradientes transvalvulares, mesmo nas valvas de tamanho pequeno. Entretanto, todas exigem anticoagulação durante toda vida, para evitar o alto risco de tromboembolia. As valvas mecânicas são particularmente úteis nos pacientes com anel aórtico pequeno e nos indivíduos jovens com expectativa de vida longa. Essas valvas devem ser evitadas nos pacientes que não desejam tomar varfarina constantemente ou naqueles que correm alto risco de sangramento. (GOLDMAN & BRAUNWALD, 2000).
Ao escolher a prótese valvar, é preciso considerar a necessidade da durabilidade, o alto risco de anticoagulação, a hemodinâmica da prótese e a preferência do paciente. A decisão final amiúde não é tomada, até que a valva original seja examinada na cirurgia, ocasião em que o cirurgião escolhe a valva que maximiza os benefícios e minimiza os riscos. (GOLDMAN & BRAUNWALD, 2000).
No pós-operatório de cirurgia cardíaca, em virtude da técnica e da via de acesso, os pacientes apresentam disfunções respiratórias restritivas e alvéolos capilares difusionais, em função da esternotomia e da circulação extracorpórea (CEC) (REGENGA, 2000).
A mesma autora afirma que as causas para tais alterações estão relacionadas com a divisão do esterno, que acarreta em menor estabilidade e consequentemente piora da complacência torácica, e com o contato do sangue, na CEC, com diferentes materiais, ocorrendo um efeito em cascata das cadeias enzimáticas, ao invés da hemóstase e da inflamação. A ativação inflamatória se traduz pela secreção de citocinas inflamatórias e também antinflamatórias, causando um efeito imunosupressor, aumento intrapulmonar de neutrófilos e aumento transitório do líquido intrapulmonar extravascular (REGENGA, 2000).
Estudos mais recentes sugerem que as complicações pulmonares após a cirurgia devem-se a uma soma de fatores, incluindo a redução da estimulação, diminuição dos volumes pulmonares e da ventilação alveolar, alteração do mecanismo pulmonar, tosse deficiente e dor. Além de traumas pulmonares diretos, aumento das pressões vasculares pulmonares e lesão do nervo frênico (IRWIN & TECKLIN, 2003).
Frente a estas complicações, a fisioterapia foi introduzida nestas últimas décadas visando adicionar qualidade de vida por meio de aumento da capacidade de trabalho, recreação, atividade física em geral e melhora da capacidade pulmonar, auxiliando com isso, a normalizar o estilo de vida (REGENGA, 2000).
O objetivo deste estudo foi descrever o tratamento fisioterapêutico no ambiente hospitalar e sua evolução em paciente pós-operatório de troca de válvula aórtica (prótese mecânica), que apresenta ICC.
Relato de caso
R. M. V., 27 anos, do sexo feminino, natural e procedente de Tubarão. Foi admitida no Hospital Regional de São José (HRSJ) no dia 17/02/06.
Apaciente já havia sido atendida pelo HRSJ no início do mês de fevereiro com quadro de desconforto respiratório e cansaço. Segundo relato da paciente permaneceu em internação no mesmo por volta de um mês recebendo tratamento para Bronquite Asmática, período no qual foram realizados exames laboratoriais e radiológicos. Ao findar da invertigação médica foi diagnosticado Edema Agudo de Pulmão.
Através de Ecocardiografia realizado no dia 07/02/06 foi encontrado:
Válvula Aórtica Malformada
Insuficiência Aórtica Severa
Aumento do Diâmetro do Átrio Esquerdo
Aumento do Diâmetro do Ventrículo Esquerdo
Aumento da Aorta Ascendente
Fluxo de Ejeção do Ventrículo Esquerdo de 56%
No Exame Radiológico (raios-X) de 11/02/06 foi encontrado aumento da área cardíaca, espaços intercostais diminuídos, ângulo costo-frênico direito diminuído e esquerdo pouco definido, ângulo cardio-frênico direito e cúpula direita do diafragma elevados e esquerda deprimida, deslocamento do coração para esquerda, infiltrados pulmonares em região de hilo e base pulmonar bilaterais. (Figura 1).
Figura 1. Raio-X AP em 11/02/06
Na História Pregressa a paciente relatou saber de defeito congênito “sopro” (SIC) (Comunicação Interventricular) desde o nascimento, porém não foi realizada uma cirurgia corretiva. Posteriormente, com o passar dos anos, não ocorreram manifestações de problemas cardíacos, entretanto sentia desconforto para atividades como corrida e outras de maior exigência física. Paciente sem história familiar de cardiopatia, não tabagista e sem vícios.
Em virtude do quadro clínico encontrado no Ecocardiograma realizado em 07/02/2006 foi constatada a necessidade de intervenção cirúrgica. Portanto, a paciente foi encaminhada para cirurgia cardíaca de Troca de Valva Aórtica e Correção da Comunicação Interventricular.
Dentre os exames pré-operatórios realizados destacamos o Ecocardiograma Transesofágico de 03/03/06 (Quadro 1).
ECOCARDIOGRAMA TRANSESOFÁGICO 03/03/06 |
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VALORES ENCONTRADOS |
VALORES DE REFERÊNCIA |
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Aorta |
38mm |
21 - 37 |
Átrio Esquerdo |
43mm |
28 - 40 |
Septo Interventricular |
10mm |
7 - 11 |
Parede Posterior do VE |
10mm |
7 - 11 |
Diâmetro VE Diastólico |
70mm |
38 - 50 |
Diâmetro VE Sistólico |
43mm |
26 - 34 |
Volume Diastólico do VE |
255ml |
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Volume Sistólico do VE |
83ml |
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Fluxo de Ejeção |
67% |
58% - 85% |
Massa do VE |
387,84 |
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Índice de Massa do VE |
213,80gr/m2 |
Até 125gr/m2 |
Quadro 1. Ecocardiograma da paciente em 03/03/06
Como diagnóstico clínico apresentou Insuficiência Cardíaca Congestiva de Capacidade Funcional III, Insuficiência Aórtica Grave, Aumento do Ventrículo Esquerdo, Válvula Aórtica Bicúspide.
A intervenção cirúrgica foi realizada no dia 08/03/06, das 12:00h às 16:00h. A paciente recebeu anestesia geral inalatória. Foi submetida à Circulação Extracorpórea (CEC) das 13:30h às 15:10h, neste período foi investigada a gasometria demonstrando baixa pressão de CO2 e O2, baixa concentração de bicarbonato (HCO3) e gás carbônico (CO2) (Quadro 2).
GASOMETRIA |
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Resultados |
Valores de Referência |
Sangue Arterial |
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pH |
7,44 |
7,405±0,035 |
PCO2 |
26 |
39,5 ± 5,5 mmHg |
PO2 |
29,0 |
85 ± 5 mmHg |
HCO3 |
17 |
26 ± 3 mmol/l |
CO2 |
18 |
25 ± 2 mmol/l |
BE |
- 5 |
± 2 mmol/l |
O2sat |
100% |
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Quadro 2. Gasometria do período de CEC durante a cirurgia (08/03/06).
No período pós-operatório a paciente apresentou febre e suspeita de Endocardite Infecciosa, entretanto na cultura bacteriológica não foram encontradas bactérias.
Os achados radiológicos e clínicos no pós-operatório imediato e tardio foram obtidos através de Raios-X, Eletrocardiogramas e hemogramas a fim de identificar os quadros apresentados pela paciente nestes períodos.
Nos Raios-X de pós-operatório imediato (Figura 2) percebe-se a presença das suturas da toracotomia, eletrodos do eletrocardiograma, tubo endotraqueal, válvula aórtica substituída, diminuição dos espaços intercostais, radiopacidade dos ângulos costo-frênicos e cardio-frênicos, aumento da área cardíaca, infiltrados pulmonares em base, cúpulas diafragmáticas elevadas.
Figura 2. Raio-X AP de 08/03/06 do pós-operatório imediato da Troca Valvar
A paciente permaneceu na Unidade Coronariana desde a saída do centro cirúrgico até o dia 11/03/06, de onde saiu para reabilitação e estabilização do quadro clínico na Enfermaria do Instituto do Coração, para tanto tomou-se como base a investigação através do eletrocardiograma.
No 5º dia de pós-operatório (13/03/06) foi dado início ao tratamento fisioterapêutico na Enfermaria do Instituto Catarinense de Cardiologia do HRSJ.
No 6º dia de pós-operatório (14/03/06) a radiografia de tórax demonstra diminuição do volume pulmonar do pulmão esquerdo, atelectasia em base esquerda, infiltrados pulmonares na região basal e de hilos pulmonares, espaço intercostal diminuído, aumento da área cardíaca, ângulos costo-frênicos e cardio-frênicos indefinidos, cúpula diafragmática deprimida. (Figura 3).
Figura 3. Raios-X AP de 14/03/06. 6º PO de Troca de Valvar
Durante o período de acompanhamento da fisioterapia (13/03/06 a 17/03/06) a paciente apresentou quadros de Taquicardia Sinusal, Flutter Atrial, com sintomas de sudorese, náusea, tontura, enjôo, aumento da freqüência cardíaca, aumento da freqüência respiratória, fraqueza generalizada e dispnéia.
Estes episódios variaram conforme horário e, a princípio, não demonstraram ligação com esforço físico, já que a paciente relata estar em repouso na maioria dos eventos.
Exames laboratoriais (hemograma) foram realizados na manhã do dia 15/03 demonstrando que não havia alterações nos parâmetros dos componentes sanguíneos.
No último exame radiológico do período em que a fisioterapia foi realizada (17/03/06) observou-se a cardiomegalia, deslocamento acentuado do coração para esquerda, atelectasia no lobo inferior esquerdo, diminuição do volume pulmonar esquerdo, infiltrados na base pulmonar, entretanto em relação ao raio-X anterior (14/03/06) observa-se espaços intercostais aumentados, hemicúpula diafragmática direita um pouco mais deprimida, expansão do ápice pulmonar, diminuição dos infiltrados na região de hilo pulmonar, seios costo-frênicos e cardio-frênicos do lado direito mais definidos. (Figura 4: Raio-X de tórax AP de 17/03/06)
Figura 4. Raio-X de tórax AP de 17/03/06. 9ºPO de Troca valvar
Intervenção fisioterapêutica
Segundo a Organização Mundial da Saúde, a reabilitação dos pacientes cardíacos pode ser definida como a soma das atividades necessárias para assegurar as melhores condições físicas, sociais e mentais, de maneira que eles sejam capazes, por seus próprios esforços, de retomar o mais normalmente possível o seu lugar na comunidade e levar uma vida ativa produtiva. (REGENGA, 2000).
Diagnóstico fisioterapêutico
Após o levantamento da história pregressa, informações cirúrgicas e exames anteriores, fez-se abordagem direta à paciente.
Na avaliação subjetiva a paciente relatava cansaço, fraqueza, tremores, sudorese excessiva, náuseas, tosse produtiva, dor na incisão cirúrgica e limitação aos mínimos esforços.
Na avaliação objetiva foi observado que a paciente encontrava-se hipocorada, taquipneica; taquicárdica; com tosse produtiva, porém pouco eficaz, em virtude da dor no local da incisão cirúrgica; acesso venoso pela jugular por onde recebia os medicamentos; fiação abdominal externa do marcapasso; não apresentava edema de membros inferiores ou de membros superiores; tronco longelíneo com ângulo de Charpy < 90°; pouca mobilidade torácica; respiração costo-diafragmática; diminuição dos espaços intercostais; períodos inspiratórios e expiratórios curtos; amplitude de movimento dos membros inferiores e superiores preservada, com exceção da abdução horizontal e flexão de ombro restringidas pela dor na incisão cirúrgica; força muscular grau 4 nos membros inferiores e superiores; prejuízo da higiene brônquica; murmúrio vesicular diminuído em bases com roncos em ápices; hipercifose torácica; protusão de ombros; retificação lombar.
Objetivos fisioterapêuticos
Como objetivos do tratamento fisioterapêutico foram estabelecidos: higiene brônquica; reexpansão pulmonar; aumentar a mobilidade da caixa torácica; restabelecer amplitude de movimento e força muscular; incentivar a tosse e orientar a forma correta de eliminação de secreções; aumentar os períodos de inspiração e expiração.
Conduta fisioterapêutica
A conduta fisioterapêutica baseou-se nos objetivos do tratamento e ficou organizada da seguinte forma: manobras de higiene brônquica; manobras de aumento do fluxo expiratório (AFE rápido e lento ativo-assistido sentado; TEMP) e inspiratório (Inspirometria de incentivo); estimulação da respiração diafragmática e controle respiratório (apoio tóraco-abdominal); manobras de prolongamento dos tempos inspiratório e expiratório (inspiração máxima e profunda seguida de apnéia, inspiração fracionada, freno labial); técnicas de expansão torácica, propriocepção diafragmática, estimulação da tosse e huffing. Ainda foram realizados exercícios metabólicos, mobilização ativa-assistida dos membros inferiores e superiores, deambulação, marcha estacionária e alongamento passivo. Em todas as manobras foi utilizado comando verbal.
Evolução do paciente
O tratamento fisioterapêutico foi realizado durante os dias 13/03/06 a 17/03/06, com duração máxima de 40 minutos, pelo período da manhã na Enfermaria do Instituto Catarinense de Cardiologia do HRSJ.
Os atendimentos eram iniciados pela inspeção do prontuário e da paciente, estado físico, disposição atividade que realizava no momento em que foi encontrada. Durante os cinco dias de atendimento a paciente sempre foi encontrada, no quarto, sentada ou deitada no leito ou na poltrona, em repouso, nunca realizando esforço físico e na maioria das vezes acompanhada pela mãe ou pela colega de quarto.
Posteriormente, eram mensurados e analisados os sinais vitais (pressão arterial freqüência cardíaca, freqüência respiratória, ausculta pulmonar). A paciente não demonstrou hipertensão ou hipotensão em nenhum dos atendimentos.
No 1º dia de atendimento apresentava taquicardia (FC=180 bpm), dispnéia leve, náusea, tontura, cansaço e sonolência. Realizou-se inspiração diafragmática, inspiração lenta e prolongada seguida de apnéia, inspiração fracionada, orientação e incentivo a tosse, exercícios metabólicos, alongamento passivo de cintura escapular e de membros superiores e peitorais. Durante a sessão paciente continuou sentido-se nauseada e regurgitou, sentiu-se melhor após esse episódio e não demonstrou alteração na taquicardia. Demais sinais vitais sem alteração.
No 2º e 3º dias a paciente referiu ter tido episódios de arritmia cardíaca no período da tarde do dia anterior, solucionando o quadro com medicamentos, sentindo-se melhor até o momento. A conduta do 1º dia foi mantida e acrescentados deambulação, manobras de aumento de fluxo expiratório, incentivadores inspiratórios e mobilização ativa-assistida dos membros inferiores e superiores. Paciente sentiu-se bem, referiu pouco cansaço ao final das sessões e satisfeita pelo fato de ter deambulado. Sinais vitais permaneceram estáveis do início ao final da sessão. (SV: PA=120/100mmHg, FC=105bpm, FR=22rpm)
No 4º dia paciente relatou outro episódio de arritmia cardíaca no início da tarde anterior, foi encaminhada à UTI Coronariana onde o quadro foi solucionado através de administração de medicamentos, retornando à Enfermaria no início do 4º dia. Foram realizados ECG durante a taquicardia, após a medicação e no período da noite antes de retornar à Enfermaria. A fisioterapia foi então realizada colocando-se a paciente sentada no leito com elevação da cabeceira (<90°) e, posteriormente, com os membros inferiores para fora do mesmo. Após esclarecimentos e liberação médica ao exercício leve foi realizada marcha estacionária, paciente deambulou até o banheiro do quarto e permaneceu sentada na cadeira. A conduta realizada foi a mesma do 1º dia. (SV: PA=110/90, FC=80bpm, FR=22rpm)
No 5º dia paciente encontrava-se bem relatou outro episódio de taquicardia no final da noite anterior, também controlada por medicamentos, relatava cansaço leve. A conduta realizada foi a mesma do dia anterior. Segundo informações médicas a respeito da paciente o quadro é de flutter atrial os episódios são de taquicardia sinusal. A paciente permanecerá internada na Enfermaria para avaliação da evolução do quadro. (SV: PA= 120/80 mmHg, FC 65bpm, FR 24rpm)
Em todos os atendimentos a paciente apresentou à ausculta pulmonar diminuição do murmúrio vesicular nas bases pulmonares, principalmente em base esquerda.
Os exames radiológicos que comprovam as condições pulmonares da paciente durante o tratamento foram citados acima. Percebe-se poucas diferenças entre os exames, com pouca resolução do quadro de atelectasia em base esquerda, entretanto nota-se diminuição dos infiltrados na região hilar e aumento dos espaços intercostais e expansão pulmonar discreta (maior ventilação em ápices).
Considerações finais
A paciente manteve o quadro de diminuição da capacidade pulmonar, apresentando ainda atelectasia no pulmão esquerdo após a intervenção fisioterapêutica, porém o quadro de congestão do pulmão direito apresentou alguma melhora.
Quanto ao aparelho músculo-esquelético, a paciente obteve melhora do quadro, conseguindo deambular em alguns atendimentos, fato que não havia acontecido antes dos atendimentos.
O quadro geral da paciente se manteve estável, apesar das intercorrências acontecidas nos últimos dias.
A atuação da fisioterapia foi de grande valia no tratamento da paciente, estabilizando o quadro e dando mais confiança para que a mesma voltasse a executar suas atividades.
Apesar do curto período de atendimento, podemos concluir que a presença do fisioterapeuta compondo a equipe multiprofissional responsável pelo tratamento de pacientes em pós-operatório de cirurgia cardíaca é de suma importância.
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Outros artigos em Portugués
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