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Educação Física: uma prática cultural em construção

Educación Física: una práctica cultural en construcción

Physical Education: a cultural practice in construction

 

 Professor Assistente Doutor Departamento de Educação Física IB

Unesp, Rio Claro, SP

(Brasil)

Prof. Dr. Wilson do Carmo Junior

wilsonjr@rc.unesp.br

 

 

 

Resumo

          A educação física com uma disciplina ou área do conhecimento tem alcançado status e abrangência em todas as esferas da cultura contemporânea. Não por acaso que as questões relativas ao corpo e ao movimento humano, nos últimos anos foram foco de estudos, sobretudo no campo da compreensão da necessidade de estudos que escapam do campo físico no sentido tradicional. Indicativos consistente no campo científico deram vigor as questões teóricas associadas as questões da prática como resposta ao esforço físico. Nesse ínterim, estudo sobre o comportamento humano exigiu uma concepção inusitada no campo da educação física com uma prática cultural. Ainda assim, parece que um contexto científico, no sentido tradicional, enquanto método de análise sustenta a idéia de rigor conceitual. Entretanto, conteúdos associados ao uso do corpo e a motricidade humana como uma forma de expressão e de linguagem tem trazido motivações outras para estudos na área das práticas corporais. Este texto vem referendar essa necessidade, aquela na qual permitirá um debate entre outras formas de interpretar a educação física como atividade da cultura contemporânea. Com abordagens interdisciplinares e a reflexão sobre o corpo o movimento, como foco nos conceitos científicos e filosóficos percorrerá historicamente um caminho possível para repensar o projeto educação física.

          Keywords: Educação Física. Prática cultural. Práticas corporais

 

Abstract

          Physical Education as a discipline or field of knowledge has achieved status and scope in all spheres of contemporary culture. Not by chance that the issues concerning the human body and movement in recent years have been the focus of studies, especially in the understanding of the need to look beyond the physical field in the traditional sense. Consistent indicatives in the scientific field gave force to the theoretical issues associated with the issues of practice as a response to physical effort. Meanwhile, study of human behavior required an unusual conception in the field of physical education as a cultural practice. Even so, it seems that a scientific context, in the traditional sense, as a method of analyzing supports the idea of a conceptual rigor. However, contents associated with the use of human body and movement as a form of expression and language has brought other motivations for studies in the area of physical practice. This text supports this need, that will permit a debate among other ways of interpreting the physical education as an activity of contemporary culture. With interdisciplinary approaches and reflection about the body movement, as a focus on scientific and philosophical concepts, will historically course a possible way to rethink the project physical education.

          Keywords: Physical Education. Cultural practice. Physical practice

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 138 - Noviembre de 2009

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Introdução

    A questão da educação física e sua abrangência cultural, no tangente à natureza prática e aos conceitos que nos deram suporte para que seja considerada área de conhecimento e atividade da cultura. Vimos a condição da polissemia como forma de enxergar a multiplicidade de sentidos da categoria prática. Neste artigo, na tentativa de formar um eixo epistemológico, veremos a questão da corporeidade e da motricidade sob a visão da ciência e as contradições que aí são geradas. Veremos, também, as diferentes concepções que podem representar a ciência da motricidade, sobretudo, na tentativa de estabelecer referências sobre o que a educação física significou para a visão científica.

    A condição motora do homem, no seu conjunto e na sua estrutura, traz uma cadeia de significados para a cultura e para a educação como um todo. Como pudemos ver a educação no seu sentido pedagógico, deu um impulso para que pudéssemos entender o sentido do corpo e o sentido da motricidade para relevar a questão da prática cultural.

    Vimos também que, nos anos oitenta, a visão fisiológica e biomecânica tornou possível criar conceitos sobre a atividade da educação física através de conteúdos organizados em conceitos científicos, como objeto de estudo. As organizações taxionômicas referentes aos estudos de habilidades, destrezas, capacidades físicas, tanto do ponto de vista acadêmico quanto do conteúdo da profissão, foram ponto importante para direcionar a prática em todos os campos de atuação profissional. O estudo da educação física como área de conhecimento deu um salto de qualidade e, com pesquisadores de peso, tomou a ciência como ponto de referência.

    É possível pensar, entretanto, que a relação teoria-prática parece limitar-se à questão do aspecto físico, com bases técnico-científicas; e que nem sempre se formam conceitos diretamente observáveis nas disciplinas consideradas bases, tais como: aprendizagem motora, fisiologia, biomecânica, das quais derivam todas as outras que completam o conteúdo geral. Como força da tradição histórica e científica, sobretudo pela experiência acadêmica na qual os professores preocupados com a legitimidade e identidade da área, nos deram um suporte teórico importante.

    Não é uma tarefa fácil, repensar um projeto cultural nos campo das práticas corporais. Contudo, a permanência do estatus de disciplina acadêmica se confunde com as temáticas referenciais sobre o uso do corpo em outras áreas do conhecimento, sobretudo na filosofia, antropologia, sociologia, psicologia entres outras áreas correlatas. Não por acaso, que os conceitos sobre interdisciplinaridade podem estabelecer aberturas conceituais nas quais o universo teórico e prático abriu o portas para que a educação física pudesse adquirir certo respeito intelectual, e sobretudo, aceitar o debate sobre conceitos relacionados com a arte, a ciência e a filosofia na sua estrutura e na realidade da prática. É nessa perspectiva que esse artigo tentará estabelecer, de forma mais consistente, os vínculos interdisciplinares, nos quais serão permitidas abordagens importantes acerca do corpo, do movimento humano e toda cadeia conceitual que reforçará a necessidade da reflexão sobre um repensar o projeto antropológico no qual a educação física está inserida. Façamos uma reflexão sobre temas que nos reportam para uma cultura da educação física, aceitando o debate sobre ciência, filosofia, arte e linguagem.

Motricidade, ciências e contradições

    Não há como deixar de explicitar certo pioneirismo no campo a acadêmico, no qual já preocupados com a temática da identidade e legitimidade da educação física, estudiosos já tinhas. Acadêmicos de todos os centros de pesquisas e em todas as áreas, nas quais a educação física pudesse estar representada, já publicavam seus artigos com a finalidade de abrir o debate sobre a prática. Podemos dizer, todavia, que tais disciplinas formam um corpo de conhecimento básico sobre a educação física, como interpretam SIEDENTOP (1972), SEAMAN (1982), BROOKS (1982), e LAWSON (1992). Embora esses autores mostrem que tais estudos estão ligados à questão pedagógica e educativa, o uso do corpo e das práticas de exercícios se expande para outras áreas de interesse geral, como sugere a teoria da motricidade humana. Um tema tão complexo, no qual a questão pedagógica transita incessantemente entre formação e transmissão de cultura, o foco científico parece reduzir a educação física à “educação do físico”.

    Ora, sabemos que educação é algo abrangente e que o físico não se reduz ao organismo humano. Educar o físico parece limitar o conceito de educação física por aquilo que ela representa, portanto, diante de um referencial cultural, na qual a própria pedagogia nos oferece conhecimentos seguros sobre a prática, não seria coerente educar o físico sem educar o ser humano na sua totalidade. Essa condição de educação talvez seja o primeiro passo para a compreensão da corporeidade como estrutura e da motricidade como linguagem. Tal conduta implica superar o dualismo, procurando a unidade na totalidade do corpo humano; sobretudo, considerando outras linguagens que compõem a vida prática. Tal perspectiva nos oferece uma visão ampla que a perspectiva científica biológica do corpo parece não contemplar.

    Não há verdades prontas tanto na ciência como na filosofia que possam alcançar explicações de tudo e de todo o conteúdo da educação física. Há, porém, a necessidade de investigar a prática de exercícios, sobretudo a questão do uso do corpo, e não apenas pela via da ciência. Consideramos ser importante compreender melhor a teoria dessas práticas e de que maneira ela se estende à prática. Sabemos que o simples fato de estarmos nos movendo, seja por que motivo for, não é suficiente para denominar tal prática de educação física; porém pode ser o sentido desse movimento que nos leva a pensar sobre a prática e, daí, sobre a relação de múltiplos sentidos (como vimos anteriormente) fundamentando boa parte daquelas atividades que desempenhamos na vida. São formulações conceituais, advindas da vida comum das pessoas que as fazem crer que estão praticando alguma coisa, porém isto não serve de apoio teórico para a ciência da educação física.

    Parece-nos que a ciência da motricidade - como recriação conceitual para garantir um corpo de conhecimento seguro e com identidade própria -, não deu conta das necessidades de engajamento da educação física com os estudos acadêmicos e, sobretudo, com a cultura geral, mesmo porque, como veremos adiante, a questão o que é educação física? Ainda está na pauta dos pesquisadores. Na iminência de ser a educação física um corpo de conhecimentos consagrados e legítimos, a visão científica do problema parece não ser o único caminho para a organização da identidade e legitimidade dos conhecimentos. É necessária, também, a reflexão filosófica, que permite a aproximação da prática com a teoria.

    Há tempos, discursa-se sobre ciências e educação física.1 Nesses termos, questionamentos sobre a visão científica e métodos de pesquisas nos fazem refletir sobre qual o sentido de prática científica, pesquisas, métodos no campo da educação física. É com esse questionamento que Carmo (1998) aborda a questão da ciência da motricidade humana. Das diferentes abordagens as quais são dispostas para avaliar o conceito de ciência, a própria cultura dá sinais de dívidas e nos reposta para outras diferentes possibilidades de observar um fenômeno e nele extrair seus elementos para configurar um conceito de ciência.

    Já no final dos anos oitenta e meados nos anos noventa, nossos pesquisadores postularam a questão o que é educação física como tema de estudo. Esse problema implica muitos referenciais que escapam à visão científica isolada de outras visões que existem para aqueles que se dedicam à reflexão. No Brasil, foram BRACHT (1995) e TAFFAREL (1994), entre outros, que indicaram a reflexão não apenas sobre conteúdos, mas sobre a condição sob a qual a educação física contribui para formar pessoas críticas e com capacidade física, tanto quanto intelectuais para tratar da educação total, sobretudo, participando e se interessando pelas práticas sociais. Ainda, PEREIRA DA COSTA (1996) e FARIA JR. (1977), entre outros, levantaram a questão curricular e seu engajamento com outras categorias de pensamento pedagógico da educação relacionado às disciplinas de formação humana.

    Também já se refletiu sobre dimensões sociológicas, filosóficas, históricas, entre outras áreas da cultura ditas emancipadas, para contribuir com a estruturação do conceito de educação física.

    Cabe aqui, no entanto, uma reflexão importante sobre ciência, método e pesquisa: tendo a intenção de pensar temas polêmicos, surge a necessidade de inserir, nestas reflexões, a questão filosófica do conceito de prática rigorosa.

    Em face do rigor que a própria ciência criou, por que não focalizar a educação física como saber e conhecimento para o homem que exercita o corpo inteiro, aquele homem total que as teorias educacionais tanto sugerem existir? Esse é o espaço que talvez procuramos como pesquisadores do saber e do conhecimento sobre educação física. Se possível for, aceitando o desafio para localizar o saber e o conhecimento que nos permitam sentir tanto quanto pensar e fazer educação física. Assim com podemos aceitar o exercício físico como metáfora viva, o que abordaremos nos capítulos futuros, na qual a capacidade e a liberdade motora também podem ser interpretadas como forma de sentimento e expressão.

 A crise da ciência e o pensamento reflexivo para a motricidade humana

    A crise do mecanicismo, gerada pelo pensamento de uma filosofia da ciência quase humanista, liberou o pensamento científico de suas certezas. KUHN (1982), sob o signo da inquietação intelectual e sem perda do diálogo objetivo, fez a comunidade científica enxergar a crise, ou a estagnação das descobertas científicas. Nasce do pensamento do autor, um olhar mais apurado para o futuro da ciência. Um olhar para outros edifícios de conhecimentos, o que o autor interpretou com sendo novos paradigmas. A necessidade de revoluções na ciência levou à reflexão mais profunda, talvez um retorno à filosofia da ciência ou mesmo à revolução paradigmática.

    Não parece ser impossível ou impróprio pensar na relação educação física e paradigma. Seguindo Kuhn, se a ciência está em crise e há a necessidade de mudança de paradigma, para o caso da educação física, há a necessidade se não de uma revolução paradigmática, pelo menos de reflexão sobre o problema. Diante da conduta científica que conhecemos, mesmo alertados pelas limitações das verdades e certezas absolutas, a questão de um corpo de conhecimento legítimo para a educação física ainda esbarra nas incertezas científicas.

    No rigoroso entendimento de cientistas e filósofos, em momentos oportunos que exigem reflexão mais cuidadosa sobre a ciência e a humanidade, vimos ser impossível observar, pensar, refletir, conjeturar sem incluir a preocupação com o bem comum. Assim parece ter sido o nascimento do pensar científico e filosófico (MORIN, 1990 e BUNGE, 1984). Ambos os autores dão um tratamento filosófico à questão da ciência, somam a ela o pensamento reflexivo que sugere e imprime à ciência aspectos esquecidos como observação com rigor e seletividade, capacidade de sentimentos éticos nas experiências e a procura de fenômenos da natureza e valores humanos como temas inseparáveis.

    Retratar a força do conhecimento é uma lembrança fundamental. A exemplo de disciplinas consagradas, o pensamento científico poderia referendar uma idéia de renovação e de transformação na forma de pensar sobre a educação física. O que requer objetividade nas análises trás na sua estrutura a subjetividade ou mesmo o comportamento intuitivo, e que nos leva à reflexão, afirma ZIMAN (1981). No relato do autor, no final do século XIX, a física clássica de Newton apresentou um modelo de ciência como edifício acabado. Maxwell unificou eletricidade e magnetismo, e o triunfo fez elevar a auto-estima do pensamento científico. Segundo Zimam, foi o olhar clínico, sonhador, subjetivo de Einstein que fez do espaço e do tempo algo subjetivo, e foi a subjetividade de Einstein que fez a revolução paradigmática. Para ilustrar esse raciocínio, para aqueles que desejavam dominar a natureza como desejavam os físicos conservadores, vemos aí uma espécie de susto antropológico. Outra ilustração, segundo a história, é a subjetividade de Kepler, que contemplava o mundo como renascentista, com o pensar artístico, e viu nas harmonias das esferas a explicação menos matemática e mais artística da dinâmica astronômica do universo.

    Por um lado, nossa ciência já não nos leva a compreender a natureza em termos de submissão. Por outro, assistimos à tomada de consciência dos perigos ecológicos que ameaçam o planeta e da nossa responsabilidade quer em ralação a natureza, quer em relação às outras civilizações. “À visão de um progresso quase fatal, sucedeu um sentimento de inquietação e dúvida, que estou convencido, é o sinal do período de transição que a humanidade atravessa” (Prigogine 1990, p. 09).

    Seria a terminologia ciência da motricidade humana, ou qualquer mudança terminológica, uma condição fundamental para redefinir e conceituar o conceito de educação física, e desse conceito gerar a abertura para a reflexão?

    Na motricidade que conhecemos nas nossas relações com o meio, à luz de uma percepção rigorosa como o faz MERLEAU-PONTY (1994), toda motricidade é atividade da consciência e essa, a natureza mais visível e singular da qual o homem faz uso. Ou, como observa MAUSS (1974), há um comportamento motor primário, cuja referência à motricidade representa um ato tradicional e eficaz para a exploração do meio e cumprimento de tarefas básicas para manutenção da vida. Diz Mauss que a capacidade instintiva é traço legítimo da espécie humana, antes de se transformar em ato cultural. Nessa abordagem, rever conceitos parece ser tão importante quanto as investigações empíricas. Há no contexto antropológico toda uma categoria simbólica de comportamentos, os quais revelam uma corporeidade e uma motricidade cuja relação entre elas ultrapassa questões orgânicas e biológicas. O uso do corpo como função de uma cultura de formação humana e sua tarefa na prática do cotidiano já anunciava a interação do físico, do social, do psíquico no contesto da sobrevivência.

    A realidade das nossas potencialidades físicas e todo um repertório de atitudes e comportamentos motores nos faz compreender que há outras potencialidades menos assistidas na motricidade humana. Potencialidades que são expressas não como dados científicos, mas como conteúdos de significação e expressão. Quanto à corporeidade e à motricidade ocultas no ser humano, sabemos como somos impelidos a mexer os músculos, mas ainda não sabemos o porquê. Assim é a relação entre o ser humano, o brincar e a brincadeira, a dança e o dançar. Seria difícil compreendermos que estamos ‘jogando’, ao pensar ou ao sentir? Sentimentos e emoções são partes ou um todo do corpo?

    Para tal reflexão, adentraremos o campo de investigação em que vemos a possibilidade de tratar o assunto mediado por outras maneiras de ver a ciência. Para isto, ao tratarmos da ciência da motricidade, tentaremos verificar o alcance da ciência da natureza como unidade de todas as outras, sem o pré-conceito. Seria essa a pré-condição para aproximar a corporeidade humana da filosofia da ciência, e, para a educação física, o elo que talvez esteja oculto na nossa visão de filosofia. Não seria exagero ou erro de reflexão tentar buscar outras visões de ciência que nos devolvam a intuição, a subjetividade, para que o debate sobre educação física nos permita repensar paradigmas.

A motricidade humana e outras ciências

    No mundo contemporâneo, a prática da educação física tornou-se uma paráfrase do cotidiano, se não por evidência lingüística, pela frase que se formou pela conotação que expressa: não parece difícil compreender que, ao dizermos educação física, optamos por identificar uma atitude, uma relação entre a natureza de uma atividade prática e o conceito que a sustenta. Não seria equívoco, tampouco, compreender o uso do corpo e do movimento esportivo, ginástico, expressivo e lúdico como referência a um conteúdo, cuja estrutura e conjunto possuem vínculo com o sentido da vida prática, fazendo-nos compreender que se trata de atividade da educação física. Ou seja, em qualquer prática que façamos, há uma conotação clara daquilo que estamos fazendo. Portanto, fazer educação física não é uma expressão no singular.

    Como colocamos anteriormente, tanto no mundo como no Brasil, manifesta-se a tendência de pensar sobre a questão da prática por meio de um acervo de conhecimentos constituídos, e, de antemão, pelo viés da interdisciplinaridade. Na prática, essa condição já parece existir: a antropologia filosófica nos dá argumentos importantes para firmar a reflexão sobre a tradição de qualquer área da cultura e a ciência nos oferece o eixo epistemológico; e a própria educação física tenta organizar conteúdos e operar profissional e academicamente na área de conhecimento. Nessa mescla, poder confrontar tendências é tão importante quanto necessário, é fundamental. Essas confrontações nunca são tardias, elas sempre surgem em momentos de crise, e parecem seguir o fluxo natural da reflexão, tanto para tentar superações quanto entendimento, o que só enriquece o corpo de conhecimento constituído.

    Retomemos o tema da identidade e legitimidade da educação física por outro caminho: o caminho da busca do eixo epistemológico ou da matriz disciplinar que permite explanar sobre a possível sustentação da identidade científica ou mesmo filosófica da educação física.

    Alguns autores, no Brasil, têm feito grandes trabalhos que podem ser referência conceitual com conteúdos próprios da educação física e que podem ser estabelecidos como clássicos de uma literatura de reconhecimento de uma cultura da prática. No sentido acadêmico e profissional, com alcance para a identidade e a legitimidade tão necessárias à educação física, vimos autores que se destacam. Não devemos vê-los como formadores de correntes pedagógicas ou científicas, mas estudos referenciais que contribuíram para a estruturação dos conteúdos da educação física. Entre muitos, e de valores importantes, poderemos notar as correntes no Brasil e o contexto científico e filosófico, em tempo de conformidade científica com outras áreas do conhecimento, as quais procuravam legitimar suas categorias conceituais já se faziam necessárias na formação de uma cultura da educação física.

    A corrente sistêmica, idealizada há algum tempo, nos anos oitenta, em que o trabalho de Tani (1995) é esclarecedor. O autor entende por educação física um conjunto de conceitos sustentados pelo modelo sistêmico, em que a mudança de paradigma se sustentaria pelo escopo disciplinar intitulado cinesiologia. Com vertentes segmentadas e subdivididas entre modelos teóricos, sustentados pelo conceito de pesquisas básicas e aplicadas, Tani desenvolve o projeto educação física com base no modelo sistêmico de Bertalanffy (1977) e com inspirações conceituais de ciência e desenvolvimento de Bunge (1981). Nasce dessa referência, um modelo a ser amplamente sustentado por grupos de pesquisadores que adotam esse paradigma para se orientarem em pesquisa sobre educação física. Bunge indica uma teoria científica que poderia dar suporte à identidade da educação física. Segue a lógica da ciência, na qual deveríamos entender como área de pesquisa tudo que estivesse sob a responsabilidade do universo acadêmico científico e tecnológico. Segundo o autor, residiria aí a mudança de paradigma.

    Não menos atraente, é a outra vertente de natureza investigativa inspirada também na visão sistêmica, mas sob a ótica da sociologia. Com ousadia intelectual e competência, Betti (1992) desafia a versão científica ao criar, no âmbito da sociedade, a Educação Física como prática relacionada à estrutura social do mundo. Um avanço, poderíamos dizer, por ter sido talvez a primeira obra sobre educação física que abre perspectivas para a mesma como fenômeno cultural com abordagem sociológica. Entende o autor que, sob o princípio de um modelo sistêmico, toda rede de conhecimento sobre educação física tem um fluxo teórico e prático que pode ser explicado por meio do sistema sócio-cultural onde a autogestão das estruturas reverte-se, adaptando e reequilibrando seus conteúdos e conhecimentos em níveis hierárquicos diferenciados, cada vez mais complexos. Tal modelo, também inspirado em Beralanffy (1977), vigorou e inspirou novas obras do mesmo autor que enfatizam a abrangência de recursos teóricos que poderiam fortalecer e sustentar o paradigma sócio-cultural nas pesquisas em educação física. Assim, todo um instrumental teórico parece nascer e tornar-se corpo de conhecimento teórico sobre a educação física.

    A abrangência do tema e a inspiração de competentes investigadores penetram com profundidade na condução de um processo que a investiga. Tanto que, quando se trata da formação de conceitos, na partilha de idéias, tenta-se estabelecer vínculos conceituais entre educação física e outras áreas de conhecimento.

    Ainda outra tendência vem acrescentar a vertente filosófica importante aos conceitos de educação física. As forças da tradição, sobretudo, acadêmicas já consagradas, ousaram revelar o conteúdo científico agregado aos conceitos sobre o movimento humano. Talvez a primeira versão filosófica, a que trata dos conceitos de práticas corporais como filosofia: VIEIRA DA CUNHA (1987), sob influência de Parlebas (1981) foi determinante para a estrutura conceitual desse discurso. Vieira da Cunha foi o precursor do conceito de mudança de paradigma na educação física. Também precursor da relação entre educação física e cultura da prática do ponto de vista filosófico de Merleau-Ponty. O autor considera a mudança de nome algo importante para a abertura de frentes de reflexão. A questão teoria-prática, no discurso de Vieira da Cunha, diagnostica o porquê e o como fazer das práticas corporais um acervo cultural.

    Neste universo intelectual, a educação física abre-se à cultura como conceito cujo conteúdo parece ingressar no universo das pesquisas científicas interdisciplinares: psicologia da motricidade, filosofia da motricidade, sociologia da motricidade, dentre outras áreas. Se os conceitos se abrem em perspectivas interdisciplinares, ainda assim não há uma base teórica única que possa ser considerada o eixo estrutural sustentador da ciência da motricidade humana como única via. Há opiniões polêmicas e divergentes, áreas dispersas e conflitantes.

    Entendemos, pois, que não se pode consagrar de maneira apressada uma concepção científica de qualquer área sem que esta seja fruto de longo trajeto intelectual e de resultados somatórios de conhecimentos legítimos e consagrados. Não há condição para inventar ciência de última hora, diz BUNGE (1984). Ficaria a cultura da prática de um lado, e a educação física do outro. Tomar por empréstimo o conhecimento precioso e inequívoco de áreas consagradas, e, numa última hora, ajustá-las como se fosse conhecimento sobre educação física, não parece ser uma conduta segura para consagrar a idéia de motricidade.

    Surgem temas abrangentes e instigantes que inspiram à reflexão. A ciência, a arte, a filosofia, a sociologia, a antropologia, a pedagogia, enfim, um conjunto de disciplinas que nos dá indicativos de terem vínculos com a questão conceitual da educação física, como, no nosso caso, a correlação entre corporeidade, motricidade, educação e educação física. Cabe aqui uma primeira reflexão: se existe alguma ciência ou filosofia que possa explicar ou fazer valer um conceito de educação física que contempla a humanidade e a educação do homem, este conceito ainda está por vir.

    O que nos leva a pensar sobre educação física está na sua tradição, mais que como mero campo teórico. Não seria pretensão ou exagero pensar educação física como um projeto motor humano. Mas, para tal, é preciso reflexão sobre a crise da prática e suas contradições. O que de certa maneira já temos feitos, como por exemplo, a abertura acadêmica que permitiu encontrar outros campos epistemológicos independentes de qualquer visão científica ou filosófica fechadas.

    Reorientar a visão científica e filosófica não é uma tarefa fácil. Talvez o sinal mais importante projetado para uma cultura da Educação Física repousa no contexto da arte e da representação em múltiplas linguagens. A condição primária poderia vir uma unidade da arte com a ciência sem o obstáculo da separação entre sujeito-objeto, teoria-prática, corpo-mente. Temas filosóficos e científicos cujo discurso se traduz sempre pela dificuldade conceitual de transitar entre uma condição ou outra. Uma escolha que dependeria da base científica ou metafísica que a sustentaria. Compreender o corpo e o movimento humano fora do discurso biológico cientificamente correto, nos trás mais dúvidas do que soluções. Fora desse contexto, nos resta a análise subjetiva e relativamente correta. O que aceitável, em termos de debate, nos leva ao campo da arte, representação, significação e linguagem, nem sempre possível ser confirmada em todos os diferentes níveis de análises, portanto, o que foge do campo científico também escapa da confirmação e aceitação geral.

    A Educação Física, como uma área de conhecimento ingressa no universo da cultura à partir da sua tradição pedagógica. Enquanto área que cultura a prática como sendo um esforço físico, parece ter perdido seu sentido à partir do momento em que perfaz em seu corpo de conhecimentos toda cadeia de significados na formação do homem na sua totalidade. Como diz Bracht (2003), o espaço no qual se aplica e se vincula o conhecimento da realidade trazendo a prática com reflexo sempre vinculado com a realidade da cada um, com a ação direta nessa mesma realidade.

    A escola, o processo pedagógico, a formação da consciência sobre o corpo, a motricidade como expressão de si mesmo ainda é o templo da sustentação de um princípio legítimo da formação ser humano. Ali, repousa as interações de mais precisão no contexto da prática na sua total relevância. Na escola, vivencia espaços e tempos singulares, realiza-se, produz-se, transformam-se realidades. Juntam-se grupos sociais na mescla categorizadas de elementos corporais e motores cujo significado exige a interação de si com si mesmo, com o outro e com o mundo (FENSTERSEIFER et al, 2007). São construções históricas em suas peculiaridades que se espalham significados e sentidos contagiando um universo inteiro de experiências múltiplas.

Uma Perspectiva Fenomenológica

    Podemos, então, tentar aproximações filosóficas indicadas pelo pensamento da ciência da percepção e da dinâmica da antropologia filosófica de MERLEAU-PONTY (1975,1994)? Da primeira obra do autor, tomamos a questão do comportamento humano como estrutura, como dito no capítulo anterior: estrutura como unidade da totalidade, inseparáveis, simultâneas e congruentes nas ações do corpo, da alma e da mente. Da segunda obra, a reorientação sobre o nosso aparelho perceptivo, o encontro do corpo com o mundo como unidades extensivas umas a outras. O corpo forma com o mundo uma única estrutura, porém, apenas podemos fazer essa comunhão ser visível se articularmos os sentidos e, para tal, temos de enxergar o universo por outros ângulos e formas.

    Em outro momento, MERLAU-PONTY (1973) repensa a concepção de uma ciência para o homem, inspirado em HUSSERL (1965). Ambos sustentam a idéia de abertura para temas psicológicos, sob o prisma da compreensão que temos ao interpretarmos as questões humanas fundamentais. As discussões abrem-se no campo filosófico tanto quanto no científico sobre antigas oposições das categorias subjetividade e objetividade, interioridade e exterioridade, dados da natureza e fenômenos da cultura e a linguagem em suas expressões e significações. Essas discussões permitem aproximações com questões importantes para a educação física, dentre as quais, destacamos:

  1. a objetividade e a subjetividade interagindo com a questão do corpo e da motricidade;

  2. a questão entre a natureza e a cultura com fenômenos correlatos, como o instrumento de observação e de acesso à consciência como estrutura natural, e o discurso sobre o corpo, como extensão do mundo.

  3. a questão do sentido de corporeidade e de motricidade como um encontro subjetivo entre categorias que se entrelaçam no momento de uma atividade física, tanto quanto numa atividade do pensamento, com interpretações de múltiplos sentidos (polissemia).

  4. o problema de redescobrir a função da prática no sentido da linguagem e o que essa linguagem pode representar nas práticas corporais numa visão simbólica, sobretudo, apoiada no conceito de retornar às coisas mesmas (essência e evidência antropológica).

    Essa partilha de situações é que permite o enlace entre ciência, filosofia e linguagem. Permite também superpor o olhar interdisciplinar com o olhar de múltiplos sentidos. Primeiro, a questão da ciência, depois a questão filosófica e de linguagem.

    Reorientar a visão científica e filosófica poderia ser um compromisso intelectual daqueles interessados em repensar a prática de exercícios, esportes, ginástica e dança. Na prática, ser o que se é, revelação expressiva que envolve o organismo, a linguagem, significado e representação, elementos conjugados que o contexto fisiológico isoladamente não contempla. Conforme dito, não é uma tarefa fácil. A rigor, espécie de reorientação sobre como a questão da motricidade se ajusta como conteúdo ou fenômeno de estudo de muitas outras áreas. A educação física exige um olhar científico cuja referência permite uma abertura para a subjetividade, como, por exemplo, a questão da escolha social por essa ou aquela modalidade de esporte que assegura a identidade de uma cultura, de uma sociedade, ou até de uma comunidade. Outro ponto de referência teórica, com o qual tanto Merleu-Ponty quanto Husserl contribuem com novas formas de ver a ciência da motricidade, seria a dimensão que a linguagem pode alcançar ao percebermos o corpo como um enlace com o mundo. Este corpo deixa de ser objeto e passa a ser sujeito, mas um sujeito de si para si, sem a dissolução interior-exterior. Esse sujeito observável, livre de fronteiras, reflexivo, sexuado, cujas condutas motoras podem ser expressas por significados, mesmo que nem sempre possam ser explicados, sobretudo, por interação com a natureza a qual nos exige contemplação no seu sentido mais rigoroso: as ações estéticas: a fruição da experiência estética num grau mais profundo quando se dá nas relações entre as práticas corporais e a natureza no seu conjunto, no qual os sentidos adquirem mais que esforço; a possibilidade de compreender os sentidos na sua totalidade em ação (SILVA, 2007).

    Na educação física, os conteúdos referentes às praticas corporais oferecem uma cadeia de significações estreitas entre ciência e filosofia, tanto quanto significações nem tão lógicas, como é a atividade da dança e das funções lúdicas. Sem esse compartilhamento de conotações e denotações na ordem corporal e motora, poderá ocorrer, como já parece ter acontecido, separações entres duas correntes que se expandem em ângulos divergentes. Por exemplo, na escolha da área de concentração sobre estudos em educação física: uma corrente ligada à natureza sócio-cultural, outra corrente ligada à natureza biológica.

    Parece-nos, aos olhos de uma ciência rigorosa, que essas duas vertentes podem conviver pacificamente no contexto teórico-prático. Essas vertentes se encontram na mesma dimensão, sustentadas pela idéia de que a cultura da educação física engloba a experiência e a reflexão como focos mútuos. Não há objetividade científica que possa ser tão simplista a ponto de destituir a subjetividade da expressão corporal como meio de comunicação. Por outro lado, não há uma só expressão do corpo que não possa ser mensurada para a compreensão dos fenômenos biomecânicos, e, a partir destes, permitir a compreensão dos fenômenos psicológicos. Tal posicionamento filosófico imprime a cientificidade: é o que Husserl considera ser o processo transcendental na ciência. Tal transcendência é o que permite localizar um campo teórico coeso. Nossa comparação entre visões de ciência aqui reporta a Husserl - a filosofia como ciência rigorosa -, que entende filosofia e ciência como áreas não antagônicas, ou seja, a ciência pode ser pensada e a filosofia pode ser experimentada.

    Investigar o homem em movimento é investigar a própria vida humana e não um privilégio do método da ciência. Consideramos ciência tudo o que pode ser explicado, mensurado, experimentado e identificado a partir da observação e intervenção do homem no mundo natural. Percebemos que a ciência dá a sua contribuição. No entanto, no rigor e na complexidade da motricidade e da corporeidade como fenômenos da vida humana, não parecem ser ou ter sido tratada como forma de expressão, no sentido rigoroso do termo. Assim, como diria o observador mais radical da natureza motora do homem, parece que está faltando alguma coisa para ser esclarecida.

    Da natureza humana, em seu sentido mais puro, a corporeidade se confirma com o que MERLEAU-PONTY (1994) afirmou: somos corpo. A motricidade, conseqüentemente, segundo o autor, é a capacidade de movimento como expressão e sentido. No discurso: o homem, ao se mover diante do mundo e das coisas, com elas se mistura e nasce dessa correlação um novo sentido. Tal comportamento motor não pode significar apenas uma frase solta em qualquer exercício ou habilidade, destreza ou capacidade de rendimento.

    O comportamento motor deve produzir sentido assim como em quem fala com o os gestos, a corporeidade é evidente. Não por acaso que dentro dos estudos sobre o comportamento motor humano já há quem nos indica sobre a questão do universo perceptivo com um enlace integral entre o agir e o transcender do aspecto orgânico para um agir perceptivo integrado como se dá o ser-no-mundo (TAMBOER, 1999). Este ser é o sentido legítimo do corpo, do movimento na totalidade do seu efeito. Essa observação, mais que explicação, demonstra, em outra instância a afinidade entre o gesto e a fala, aproxima a lógica da motricidade com a poética que ela representa. Ninguém fala sem se mover, é um fato além da lei anatômica, é um fenômeno coreográfico singular, e a interpretação exige uma outra linguagem do corpo próprio; essa entidade, mais que uma cadeia celular, é uma fala em tom semântico e que a poética da motricidade aceita como argumento de reflexão.

    Na Educação Física, a prática do agir com sentido, e toda formas do movimento humano no campo da percepção deveria conduzir a construção de uma didática dos sentidos. Com observa Betti (2007), numa perspectiva merleu-pontyana, no sentido de observar os efeitos do corpo sobre o meio, não apenas o contrário. Se o campo da reflexão pudesse alimentar a idéia de ciência da motricidade como relações intrínsecas talvez estivessemos inaugurando a poética da motricidade humana. Devemos sim, desenvolver didaticamente o que já observado, vivido, experimentado pela expressão e significado do movimento para o homem como diz BETTI et al (2007):

    Daí o recurso semântico seguindo a lógica das capacidades perceptivas de GALLAHUE (1982), cuja explicação científica se equipara com as expressões sensíveis dos estudos de MERLEAU-PONTY (1975). Para o primeiro, o rótulo biológico, seguro, explicativo, mensurável. E, para o segundo, o enlace do aparelho psicológico com o aparelho motor interagindo com toda a arquitetura expressiva, dando ao corpo a corporeidade, dando ao ato motor a motricidade. É nas condutas primárias, que encontramos nossos traços de maior contato com o mundo da vida. Seguindo a ordem poética da observação, de que maneira a ciência pode indicar uma educação física cujo tratado conceitual e visão prática do uso do corpo poderia ser semelhante a um fazer educação física como atividade poeticamente correta? Não seria justo pensar numa arte da motricidade sem corromper a lógica das condutas motoras no exercício de rendimento? Os conceitos de ciência e filosofia não poderiam estar mais próximos? O que nos conforta é saber que a condição motora do homem educado a perceber o mundo com múltiplos olhares, permite a ele o recurso da linguagem, para que entenda as expressões físicas de maneira poética, metaforicamente condizente com o sentido de corporeidade e motricidade imanentes ao ser humano.

Conclusão

    Assim como o universo mítico que antecedeu a cultura grega inspirava a investigação das deidades, e delas extraía as explicações coerentes com a vida, vemos hoje, certa lógica nas explicações que conduz a formação de uma cultura que se forma e que se transforma em muitas áreas da existência humana. Saibamos nós que toda inspiração que motivou o pensamento lógico-formal nasceu da evidência mítico-poética. Assim foi com a filosofia, a ciência e as artes, com a linguagem e com a religiosidade e não seria diferente com a concepção sobre corporeidade, símbolo da emancipação do conceito de corpo ou mesmo sobre a motricidade, símbolo que norteia a questão do movimento humano no contexto das práticas corporais e, sobretudo, no conceito de educação física.

    Inserir a Educação Física no contexto de uma cultura geral exige mais que tratar do assunto como ciência da motricidade. Visto dessa forma, conforme indagamos no decorrer deste artigo vemos a possibilidade de compreender como e em que dimensão da cultura podemos destacar a questão da prática corporal como um fenômeno cultura. Não se trata, entretanto de apenas um acréscimo momentâneo ou singular sobre o discurso na educação física e toda cadeia de significados cujo reflexo seja a tendência de resignificar a prática. Trata-se de evidências dentro da ordem da cultura corporal e motora do ser humano dentro de um contexto no qual coloca o conceito de educação física numa visibilidade universal pela dinâmica da sua relação com a cultura geral. Verdadeiramente multidisciplinar e o sentido polissêmico, de domínio do ser humano quando o vemos na sua totalidade de sentido. Ciências e contradições e a formação da cultura científica na educação física, crise na ciência e o discurso da prática científica, como modelo e método de pesquisa na educação física, o conceito de ciências da motricidade e educação física como arte, expressão e linguagem; são as práticas que poderíamos visar como projeto antropológico para uma educação física legítima e identificada como cultura da prática. Visar também as práticas corporais e fenomenologia como sensomotricidade: as relações entre percepção e antropologia dos sentidos. Viriam junto dessa premissa as lições da ética e estética no campo pedagógico.

Nota

  1. Uma publicação especial da Revista Brasileira de Ciências do Esporte, em documentação publicada em Setembro/1998, fez uma coletânea de artigos referentes à comemoração de 20 anos do CBCE, que, de maneira indireta, reporta o conhecimento sobre a Educação Física no período. Tal repertório de temas acerca da Educação Física nos põe, praticamente, o sentido do saber sobre a área e sua contribuição para a cultura.

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