A dimensão do conhecimento técnico-instrumental nos cursos de formação em Educação Física da Bahia |
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*Graduado em Educação Física (UEFS) Mestre em Educação Física (UNICAMP) Professor da Universidade Estadual de Feira de Santana e da Faculdade Social da Bahia (Brasil) |
Osni Oliveira Noberto da Silva* Cláudio Lucena de Souza** |
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Resumo O objetivo deste trabalho foi analisar como as Instituições de Ensino Superior da Bahia que oferecem cursos de Educação Física estão defininindo as diferenças na dimensão do conhecimento didático – pedagógico entre as Licenciaturas e os Bacharelados. Para isso foi utilizado o método documental. Percebeu-se uma variedade de possibilidades de atuação profissional diante do currículo proposto, contudo sem conseguir atender de modo pleno as mesmas, já que a cada dia elas se diversificam mais e seria impossivel acompanhar tal dinâmica. Unitermos: Currículo. Educação Física. Formação profissional |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 138 - Noviembre de 2009 |
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1. Introdução
A muitos anos a Educação Física vinha estando a frente das outras áreas do conhecimento no que tange a formação profissional. Isto porque foi "a primeira no país a ter autonomia curricular em nível de graduação" (BÁSSOLI DE OLIVEIRA e DA COSTA, 1999. p.87). Isto aconteceu em 1987 no momento em foi extinguido o currículo mínimo dos seus cursos, que vinha sendo exigido pela resolução CFE nº 69/69, e que anos depois foi substituida pela resolução CFE nº 03/1987 que tinha uma proposta mais flexivel pois apenas balizava mínimos de duração e conteúdo (RAMOS, 2002).
Entretanto, no inicio do século XXI a Educação Física sofreu uma nova transfomação. Isso porque foram instituidas a resolução CNE/CES nº 01/2002 (especifica das Licenciaturas) e a resolução CNE/CES nº 07/2004 (referente as graduações em Educação Física).
Isso ocasionou uma situação inédita, pois pela primeira vez na história dois documentos diferentes balizam a formação profissional em Educação Física, o que começou a gerar implicações frente a formação profissional nos diferentes cursos de Licenciatura e Bacharelado (SILVA, 2009).
Por isso, o objetivo deste trabalho foi analisar como as Instituições de Ensino Superior do estado da Bahia que oferecem cursos de Educação Física estão defininindo as diferenças na dimensão do conhecimento didático – pedagógico entre as Licenciaturas e os Bacharelados, baseados na resoluções CNE/CES nº 07/2004, nos perfis profissionais, objetivos e grade curricular dos seus cursos.
2. Metodologia
O método da pesquisa foi a Documental baseado em Gil (2007), onde analisamos o currículo dos cursos de Licenciatura e Bacharelados das Instituições superiores baianas. Levando-se em conta que esta coerência e adequação de articulação estão atreladas às novas demandas sociais do mundo contemporâneo para os profissionais de Educação Física, refletidos nos determinantes legais elaborados ao longo das últimas décadas – as Diretrizes Curriculares Nacionais, que apontaram para a estruturação de diversas propostas de Projetos Pedagógicos de Cursos de Educação Física, escolhemos analisar um curso de cada grupo de cursos que se configuraram na área a partir destas demandas e documentos, que representassem esta diversidade, conforme esclarecemos nos procedimentos metodológicos.
2.1. Procedimentos metodológicos
Inicialmente, baseado nos documentos das instituições de ensino que apresentam os objetivos e perfil do egresso, dividimos os cursos em quatro categorias: as que oferecem cursos de licenciatura, baseados na Resolução CFE 03/87 e com reformulações curriculares fundamentadas nas Resoluções CNE 01 e 02/2002 e 07/2004; as que oferecem cursos de licenciatura para atuação apenas na educação básica, baseados na Resolução CNE 01 e 02/2002; as que oferecem cursos de Graduação (bacharelado) para atuação em todos os campos de trabalho, com exceção da escola, baseados na Resolução CFE 03/1987 e com reformulações curriculares fundamentadas na Resolução 07/2004; e as que oferecem as duas habilitações, inicialmente baseadas na Resolução CFE 03/1987 e com reformulações fundamentadas nas Resoluções CNE 01 e 02/2002 e 07/2004.
Devidamente discriminados, foi escolhido aleatoriamente um curso representativo de cada grupo e, através de pesquisa documental, foram analisados seus componentes curriculares onde foram descritos a porcentagem da dimensão do conhecimento técnico – instrumental dentro do curso, culminando com a confrontação destes dados com o que propõem os documentos referentes ao perfil do egresso e os objetivos do curso e com as Diretrizes Curriculares Nacionais. Além disso, buscou-se com esta divisão, descrever as semelhanças e diferenças entre esta estrutura nos cursos de licenciatura e Bacharelado das IES baianas, analisando se as diferenças são significativas para justificar a necessidade do bacharelado.
Para que pudéssemos unir a apresentação dos percentuais da dimensões do conhecimentos técnico – instrumental com a discussão com os documentos internos, referentes aos cursos e os documentos externos, referentes às Diretrizes Curriculares, a pesquisa baseou-se em Goode e Hatt citado por Richardson onde entende se que:
(...) a pesquisa moderna deve rejeitar como falsa a dicotomia entre estudos qualitativos e quantitativos, ou entre pontos de vistas estatísticos e não estatisticos. Alem disso, não importa quão precisas sejam as medidas; o que é medido continua a ser uma qualidade. (1985, p.38)
3. Conceito de currículo
O termo currículo tem o seu uso relativamente recente no sentido educacional. Ele se origina do latim curriculum, que expressa uma caminhada, um percurso ou uma corrida, ou seja, seria o caminho que o aluno leva para adquirir o conhecimento sistematizado em suas diversas fases (COLETIVO DE AUTORES 1992).
Além dos currículos oficiais, existem tambem outros fatores que influenciam na formação. O principal deles é o currículo oculto onde Silva (1999) o descreve como sendo todos “aqueles aspectos do ambiente escolar que, sem fazer parte do currículo oficial, explícito, contribuem, de forma implícita, para aprendizagens sociais relevantes”.
Entretanto, este trabalho terá como foco apenas a análise do curriculo oficial, em outras palavras, o conjunto de disciplinas oferecidas no curso, tambem chamada de grade curricular, matriz curricular ou fluxograma e seu respectivo perfil do egresso e objetivos do curso.
4. Dimensões do conhecimento
A resolução CNE/CES nº 07/2004 que trata sobre os conteúdos dos cursos de graduação em Educação Física (Licenciatura e Bacharelado) estabelece que a formação dos cursos tenha que obrigatoriamente agregar conhecimentos próprios da área.
Estes são chamados de Dimensões do conhecimento e são divididos em Formação ampliada, representada pelas Dimensões: Relação ser humano – sociedade, Dimensão biológica do corpo humano, Dimensão da produção do conhecimento científico e tecnológico e Formação específica representada pelas dimensões culturais do movimento humano, Dimensão técnico – instrumental e Dimensão didático – pedagógico. O documento ainda explica em seu art. 7 que:
Caberá à Instituição de Ensino Superior, na organização curricular do curso de graduação em Educação Física, articular as unidades de conhecimento de formação específica e ampliada, definindo as respectivas denominações, ementas e cargas horárias em coerência com o marco conceitual e as competências e habilidades almejadas para o profissional que pretende formar. (p.3)
No trabalho focaremos na dimensão técnico instrumental, onde baseado nos estudos de alguns autores (UNESP, 2005), (URI, 2006), (UFRJ, 2006), (UDESC, 2007) e (VIEIRA, 2009) podemos entender que esta dimensão pode ser consideradas as bases teóricas e metodológicas aplicadas ao desempenho humano nas atividades físicas. Ela pode ser representada na matriz curricular dos cursos pelas disciplinas que tratam dos conhecimentos em Treinamento Esportivo, Medidas e Avaliações, Primeiros Socorros, Exercícios Resistidos, Saúde Coletiva, Atividade Física na Terceira Idade, Atividade Física na empresa, Educação Física para Deficientes entre outros.
5. Apresentação e análise dos dados
Segundo Ministério da Educação (2009) existem no Estado da Bahia atualmente 26 cursos de Educação Física autorizados a funcionar em 17 instituições de ensino superior, entre públicas e privadas. Analisando a formação profissional e respectiva habilitação, encontramos 16 cursos com a graduação em Licenciatura, 5 com a graduação em Bacharelado e 5 com as duas habilitações (SILVA, 2009).
Para melhor análise dos dados, resolvemos discriminar os cursos da seguinte maneira:
Grupo A: Cursos de Graduação - Licenciatura com uma formação voltada para a atuação em todos os campos de intervenção da Educação Física, baseados dentro das Resoluções CNE/CES nº 01 e 02 de 2002 e CNE/CES nº 07/2004.
Grupo B: Cursos de Graduação - Licenciatura com uma formação voltada para a atuação exclusivamente escolar, baseados nas Resoluções CNE/CES nº 01 e 02 de 2002.
Grupo C: Cursos de Graduação - Bacharelado com uma formação voltada para atuação em todos os campos de atuação da Educação Física, com exceção do campo escolar, também baseados na Resolução CNE/CES nº 07/2004.
Grupo D: Cursos de Graduação de instituições que oferecem as duas habilitações, Licenciatura e Bacharelado, baseados nas Resoluções CNE/CES nº 01 e 02 de 2002. e CNE/CES nº 07/2004.
Abaixo faremos um comparativo da porcentagem das dimensões do conhecimento dentro do curso dos grupos pesquisados para que sirva de subsídios na discussão proposta neste trabalho. A legenda do gráfico é a seguinte:
Curso do grupo A (Licenciatura com formação para a intervenção plena)
Curso do grupo B (Licenciatura com formação voltada para a intervenção apenas escolar)
Curso do grupo C (Bacharelado)
Curso do grupo D (Bacharelado em instituição com duas habilitações)
Curso do grupo D (Licenciatura em instituição com duas habilitações)
6. Discussão e conclusões momentâneas
Esta dimensão do conhecimento, em tese, deveria ser a que mais poderia diferenciar a Licenciatura do Bacharelado, com a sua predominância no segundo, o que serviria como uma das justificativas para habilitações diferentes. Isto porque, inicialmente a própria origem da criação do Bacharelado se voltava para a intervenção nas diferentes campos de trabalho dos espaços não escolares e por este não necessitar ser balizado pelas resoluções CNE/CES nº 01 e 02 de 2002 que versam sobre as diretrizes das Licenciaturas (SILVA, 2009).
Porém, ao analisar o gráfico percebe-se uma distinção tanto se compararmos cursos de Licenciatura e Bacharelado, quanto se fizermos a comparação só entre os Bacharelados ou só entre as Licenciaturas. Esta incoerência é explicada se considerarmos que há inúmeras áreas de atuação dentro da Educação Física e que existem disciplinas específicas para essas diferentes áreas. O gráfico acima, por exemplo, apresenta a porcentagem desta dimensão do conhecimento técnico – instrumental dentro de cada curso analisado, porém sem distinguir as áreas de atuação proposta pelos cursos. Esta limitação evidencia a flexibilidade que cada instituição tem para eleger os conhecimentos técnicos necessários à atuação profissional.
Ao analisar o perfil profissional dos cursos estudados, foi demonstrado que eles apresentam uma variedade de possibilidades de atuação profissional muito grande diante do currículo proposto, contudo sem conseguir atender de modo pleno as mesmas, já que a cada dia elas se diversificam mais e seria impraticável acompanhar tal dinâmica. Pellegrini, no final dos anos 80 já acenava para tal questão afirmando que:
A gama de Atividades que pode ser desenvolvida por um profissional de atividade física é tão grande, que não é possível imaginar, por mais que seja o rol de disciplinas no currículo, que ele possa formar um bom profissional que vale ‘tudo’. (...) Será que em Educação Física temos que formar especialistas ou a especialização surge posteriormente à graduação? (1988, p. 253).
É importante lembrar que um dos principais argumentos defendidos pelos favoráveis à fragmentação da formação em Licenciatura e Bacharelado foi o fato das licenciaturas da resolução CFE 03/1987 tentarem abranger todas as novas possibilidades de atuação profissional, inserindo no currículo disciplinas que tratavam dessas novas áreas, o que causava descaracterizações nas licenciaturas que continuaram sem dar conta de uma preparação adequada do profissional de Educação Física, sobretudo para atuar na área não escolar, (KUNZ, 1998). Porém percebe-se então que mesmo uma formação específica para atender as áreas não escolares também passa por este mesmo problema diante do grande número de áreas de intervenção, pois como disse Faria Junior (1987, p.27):
Precisamos é de uma formação mais generalista, entendendo que o diploma de graduação não esgota as possibilidades de aprimoramento profissional, pois a formação pode ser prosseguida nos cursos de pós-graduação.
Portanto esta fragmentação tende a perder o seu sentido, pois estes conhecimentos podem ser alcançados pelos estudantes de ambas as habilitações de forma independente, pois baseado nos autores já citados, não se justifica uma formação diferenciada apenas por uma inclusão de disciplinas de “especialização” para algumas áreas de intervenção, sendo que esta inclusão poderia ser rejeitada e ao invés disso, incluídas disciplinas de caráter optativo no mesmo currículo dos cursos (SILVA, 2009), pois segundo Farias Junior (1987):
A formação geral proporciona uma visão muito mais ampla e flexível do que aquela oferecida pelo saber técnico no sentido profissional, proporcionando-lhe, simultaneamente, as condições de ultrapassá-la mediante o exercício de uma consciência reflexiva e crítica que lhe faculte a formulação de seu próprio objeto, dentro do espaço social e histórico em que está inserido (p.27).
Diante de tudo isso, recomendamos a necessidade de outras pesquisas que possam progredir no estudo e discussão das demais variáveis da questão da formação profissional em Educação Física, a fim de que se procure sempre uma formação que harmonize com as demandas da sociedade e com a sua própria identidade.
Referências
BÁSSOLI DE OLIVEIRA. Amauri A, Da COSTA, Lamartine P. Educação física/esporte e formação profissional/campo de trabalho. In: GOELLNER, Silvana V. (Org.). Educação física/ciências do esporte: intervenção e conhecimento. Florianópolis: Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte, 1999. p. 83-99.
BRASIL, Conselho Nacional de Educação – Conselho Pleno, Resolução CNE/CP nº 7, de 18 de Março de 2004.
COLETIVO DE AUTORES, Metodologia do ensino de Educação Física. São Paulo, SP: Cortez, 1992.
GIL, Antonio Carlos, Como elaborar Projetos de Pesquisa. 4 ed. 9 reimpressão. São Paulo: Atlas, 2007.
KUNZ, Elenor et alii. Novas Diretrizes curriculares para os cursos de graduação em Educação Física: justificativa, preposições, argumentações. Revista do CBCE, vol 20(1), p.37-47, 1998.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Disponível em: http://www.educacaosuperior.inep.gov.br/funcional/lista_cursos.asp . Acessado em: 07 de março de 2009.
RAMOS, Glauco Nunes Souto. Preparação profissional em Educação Física: A questão dos estágios. 10/06/2002. 126 págs. Tese (Doutorado em Educação Física). Faculdade Educação física, Unicamp, Campinas, SP, 2002.
RICHARDSON, Robert Jarry. Pesquisa Social: Métodos e técnicas, São Paulo, SP: Atlas, 1985.
SILVA, Osni Oliveira Noberto da. Implicações da fragmentação da formação profissional de Educação Física em Licenciatura e Bacharelado para as IES baianas. 2009, 88 pág. Monografia (Licenciatura em Educação Física): Universidade Estadual de Feira de Santana, Feira de Santana.
SILVA, Tomaz Tadeu da. Documentos de identidade; uma introdução às teorias do currículo. Belo Horizonte – MG: Ed. Autêntica, 1999.
UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA. Projeto Pedagógico: Bacharelado em Educação Física, Centro de Educação Física, Fisioterapia e Desportos, Florianópolis, SC, 2007. http://www.cefid.udesc.br/edf/bacharelado/ppp.pdf. Acessado em 5 de Julho de 2009.
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA JÚLIO DE MESQUITA FILHO. Reestruturação curricular, curso de Licenciatura em Educação Física, Integral e noturno, Conselho do curso de Educação Física, Bauru, SP, 2005. http://www.fc.unesp.br/upload/deptoeducacaofisica/projeto_pedagogico_ed_fis_atual.pdf. Acessado em 2 de Julho de 2009.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO. Projeto pedagógico do curso de Licenciatura em Educação Física, Comissão de Reformulação curricular, Rio de janeiro, RJ, 2006. http://www.eefd.ufrj.br/sinaes/projeto-pedagogico-do-curso-de-licenciatura-em-educacao-fisica. Acessado em 4 de Julho de 2009.
UNIVERSIDADE REGIONAL INTEGRADA DO ALTO URUGUAI E DAS MISSÕES. Projeto Pedagógico do curso Educação Física – Licencatura, RS, 2006. http://www.reitoria.uri.br/arquivos/projpedagogico/Projeto_Pedagogico_Educacao_Fisica_Licenciatura_r1.pdf. Acessado em 3 de Julho de 2009.
VIEIRA, Ana Paula, Zimbres, Sidney Forghieri, Araújo, Silvana Martins. Formação profissional em Educação Física: Apresentando o novo projeto pedagógico da UFMA. EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Año 13 - Nº 129 - Fevereiro de 2009. http://www.efdeportes.com/efd129/formacao-profissional-em-educacao-fisica-o-novo-projeto-pedagogico-da-ufma.htm. Acessado em 4 de Julho de 2009.
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