Treino mental: estratégias
para uma melhor eficácia Entrenamiento mental: estrategias para mejorar la eficacia |
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*Docente do Mestrado em Promoção de Saúde. Curso de Educação Física Universidade de Franca UNIFRAN. Docente do Ceuclar Batatais ** Mestre em Educação Especial – UFSCar Membro do LAHMIEI: Laboratório de Aprendizagem Humana, Multimídia Interativa e Ensino Informatizado ***Docente da Universidade Federal de São Carlos, UFSCar Coordenador do LAHMIEI: Laboratório de Aprendizagem Humana, Multimídia Interativa e Ensino Informatizado |
Profa. Dra. Maria Georgina Tonello* Prof. Ms. Paulo Augusto Costa Chereguini** Prof. Dr. Antonio Celso de Noronha Goyos*** (Cuba) |
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Resumo O treino mental é uma variável importante na aprendizagem e desempenho de habilidades motoras. Ele corresponde à recapitulação cognitiva de uma habilidade física na ausência de movimentos físicos explícitos. Em termos gerais, a atuação do treino mental pode ser explicada a partir de duas hipóteses: as psicológicas e as fisiológicas Por hipóteses psicológicas entendem-se aquelas que buscam explicar a influência do treino mental recorrendo a fatores tais como motivação do sujeito, capacidade de imaginação ou atenção seletiva. Segundo a hipótese fisiológica, os efeitos do treino mental são atribuídos a fatores orgânicos tais como a estimulação subliminar da musculatura envolvida no movimento ou o despertar sensorial do organismo. Algumas variáveis influenciam o resultado do treino mental tais como: relaxamento, demonstração, posição corporal do praticante, tipo de instrução. Portanto, ele deve ser estruturado considerando todas as suas possibilidades de utilização, visando o melhor aproveitamento dessa técnica. Unitermos: Aprendizagem. Treino mental. Relaxamento. Habilidades motoras |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 137 - Octubre de 2009 |
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Introdução
O treino mental é uma técnica utilizada para efetuar mudanças no comportamento e auxiliar o processo de aprendizagem. Ele corresponde à recapitulação cognitiva de uma habilidade física na ausência de movimentos físicos explícitos. É entendido como o pensar ou o imaginar certos aspectos da habilidade que se está aprendendo, sem envolvimento em qualquer movimento real.
Outros termos que aparecem na literatura referente ao treino mental são: prática mental, imagem mental, treinamento mental, ensaio mental, visualização, ensaio visual de comportamento motor. A sua prática, no entanto, deve ser entendida e estruturada para possibilitar melhores resultados.
Em termos gerais, a atuação do treino mental pode ser explicada a partir de duas hipóteses: as psicológicas e as fisiológicas (MARQUES; LOMÔNACO, 1992). Por hipóteses psicológicas entendem-se aquelas que buscam explicar a influência do treino mental recorrendo a fatores tais como motivação do sujeito, capacidade de imaginação ou atenção seletiva.
Segundo a hipótese fisiológica, os efeitos do treino mental são atribuídos a fatores orgânicos tais como a estimulação subliminar da musculatura envolvida no movimento ou o despertar sensorial do organismo.
Ainda sobre a explicação fisiológica, Franco (2000) afirmou que um movimento imaginado e exercitado mentalmente produz microcontrações e conseqüentemente uma melhora da coordenação neuromuscular – há um efeito fisiológico significativo, pois uma maior irrigação de sangue é constatada na musculatura envolvida. De acordo com Mackay (1981), as unidades musculares são preparadas para a ação durante o treino mental. A produção da atividade elétrica na musculatura envolvida num movimento, como resultado do imaginário do praticante de uma ação, sugere que, durante o treino mental, são ativados os trajetos neuromotores adequados envolvidos na ação. Essa ativação auxilia a aprendizagem de habilidades ajudando a estabelecer e a reforçar os padrões de coordenação adequados que precisam ser desenvolvidos.
O suporte para essa hipótese é citado por Schmidt (1993). Segundo o autor, quando indivíduos imaginam um movimento, uma fraca atividade elétrica ocorre na musculatura participante do movimento real, embora a atividade eletromiográfica seja muito menor em tamanho do que aquela necessária para produzir a ação. O que o autor propôs é que, quando as pessoas se imaginam se movendo, um plano de ação é disparado pelo Sistema Nervoso Central para os músculos, proporcionando uma forma de treinamento na ausência de movimento real do corpo. Dessa maneira, a excitação do padrão neuromuscular pode ser iniciada pelo treino mental, mas sem o risco de interferência da fadiga, o que facilita o rendimento do aluno (RUSHALL; LIPPMAN, 1997).
Os mecanismos fisiológicos que envolvem o treino mental no desempenho cognitivo foram investigados por Papadelis et al. (2007). O esforço mental dos sujeitos durante uma imagem mental foi avaliado usando-se medidas psicofisiológicas e particularmente a atividade de piscar o olho como uma medida indireta da atenção dos sujeitos. Um programa de simulação de vôo eletrônico, denominado Multiple Attribute Task Battery-MATB, foi usado para avaliar o desempenho. Vinte participantes voluntários foram divididos em dois grupos: grupo controle e grupo de treinamento mental. Desempenhos e parâmetros fisiológicos como freqüência cardíaca, taxa respiratória, atividade do olho e atividade muscular, foram registrados durante todas as sessões.
Os resultados revelaram um nível de desempenho significativamente mais alto do grupo de treinamento mental em relação ao grupo controle. Verificou-se também a freqüência cardíaca e a respiratória significantemente aumentadas durante sessões de treino mental. Uma atividade eletromiográfica leve foi observada durante a imaginação do movimento. Os resultados do estudo apóiam à noção de que o treino mental melhora o desempenho motor em uma tarefa na qual a localização espaço-temporal e o controle dinâmico da ação são altamente requeridos.
No estudo de Bulhões (1997), foram verificados os efeitos do treino mental no desempenho técnico do saque no tênis. As variáveis investigadas envolveram respostas psicofisiológicas como freqüência cardíaca (FC), ansiedade traço, ansiedade de estado e resposta galvânica de pele. Os participantes foram divididos em grupos de prática física e prática combinada (prática física combinada com relaxamento e treino mental). Participaram nove alunos de um curso de educação física, faixa etária 19 a 34 anos, sendo o grupo de prática combinada composto por cinco participantes que realizavam relaxamento, treino mental e a tarefa fisicamente e o grupo de prática física por quatro. Para a aferição das variáveis foi utilizada uma escala de critérios de valores, filmagens, questionário de ansiedade de traço-estado, monitor de FC marca polar modelo sport tester e o aparelho de resposta galvânica do tipo relaxo-trainer. Todas as execuções do saque no pré-teste e pós-teste foram filmadas para avaliação técnica posterior. Dois tipos de comparações foram feitos: intra e intergrupos. A partir da discussão dos dados conclui-se que o grupo de prática combinada teve escores superiores aos do grupo de prática física em todas as variáveis analisadas, embora algumas não fossem significantes estatisticamente. Essas evidências denotam que a aplicação de um programa de treinamento mental pode ser de grande valor na aprendizagem do saque no tênis e que pode haver uma relação entre as respostas psicofisiológicas adequadas e um melhor desempenho motor.
Com o objetivo de verificar os efeitos do treino mental sobre o controle postural de homens com idade média de 23 anos, Rodrigues et al. (2003) realizaram um experimento em que os participantes foram posicionados em uma plataforma de força e solicitados a realizar as seguintes tarefas: 1. manter a postura durante 20 segundos; 2. contar mentalmente de um a 15; 3. imaginar-se realizando o movimento plantar 15 vezes; 4. executar fisicamente o movimento imaginado por 15 vezes. Por meio de análise por cronometria, que se constitui na medição do tempo pelo cronômetro, verificou-se que o tempo gasto para simular o movimento não foi diferente daquele gasto para realizar o movimento fisicamente. Resultados diferenciados em relação à oscilação postural foram encontrados para os participantes que realizaram o treino mental utilizando a imaginação interna, ou seja, sentindo-se realizando o movimento, em comparação aos que realizaram o treino mental utilizando a imaginação externa, isto é, se vendo realizando o movimento.
O estudo de Erfani e Erfanian (2004) teve como objetivo verificar os efeitos do treino mental em padrões de eletrencefalograma (EEG). Os resultados indicaram que o treino tem um efeito significante em padrões de EEG, aumentando o ritmo do córtex motor significantemente.. O cérebro humano pode simular ações motoras sem que o corpo possa executá-las fisicamente e há uma relação neuropsicológica entre imagem e execução de um movimento. Há evidência científica mostrando que o treino mental de uma ação é correlato a uma ativação subliminal do sistema motor.
Os estudos citados discutem o papel dos métodos neurofisiológicos para avaliar a exatidão do treino mental. Esses métodos são baseados em gravações de índices periféricos tais como: sistema nervoso, atividade eletromiográfica, taxa cardíaca, taxa respiratória, movimento dos olhos, tempo de movimento. Fornecer sinais fisiológicos pode ser considerado uma aproximação objetiva para a análise do treino mental. Entretanto, embora resultados apontem para os efeitos fisiológicos do treino mental, avaliar unicamente esses aspectos pode parecer insuficiente para compreender o importante papel desse procedimento na aprendizagem. Dessa forma, entender o treino mental no papel ensino-aprendizagem pode abranger aspectos comportamentais importantes não explicados no contexto fisiológico.
Princípio do condicionamento respondente e treino mental
Parte da explicação dos benefícios das imagens mentais pode também ser explicada através do princípio do condicionamento respondente da Psicologia comportamental (MARTIN, 2001). Segundo o autor, quando se imagina uma situação, está-se pareando as sensações à de uma ação real. A imagem provavelmente elicia seu sistema visual, de maneira a vivenciar o comportamento de “ver” a cena real. Isso é chamado de “visão condicionada”.
Dessa forma, o treino mental deve envolver todos os sentidos normalmente utilizados ao se executar realmente a habilidade que está sendo treinada mentalmente. O comportamento encoberto (comportamento não observável) operante (controlado por suas conseqüências), por exemplo, de olhos fechados chutar uma bola imaginária, é semelhante, em termos de suas variáveis controladoras, ao comportamento de, publicamente, chutar uma bola (MARTIN, 2001). A prática encoberta é vista por muitas pessoas como uma ferramenta valiosa para melhorar o desempenho esportivo.
Ainda segundo o mesmo autor, com relação às hipóteses psicológicas, vários benefícios são apontados:
um deles é a eliminação de distrações do ambiente, como outros alunos ou a torcida;
o aluno tem também menor probabilidade de ter pensamentos negativos que possam causar excesso de nervosismo e de tensão, que prejudicam o desempenho, ao realizar o treino mental;
durante o treino mental, o aluno tem mais chances de se concentrar no que vai fazer em vez de se preocupar com o que não fazer, o que é um dos componentes da autoconfiança;
esse treino pode também ajudar a diminuir preocupações a respeito de um desempenho inferior, preocupações com o que os outros vão dizer, que são fatores que afetam negativamente o desempenho do aluno;
pode auxiliar na melhoria do desempenho de uma habilidade ao motivar o aluno para a prática;
dar energia antes dos treinos;
auxiliar na aprendizagem das sensações das habilidades;
pode aumentar a probabilidade de executar uma habilidade corretamente, quando utilizado para visualizar e simular o ambiente competitivo;
auxiliar o aluno a desenvolver habilidades de autocontrole e de concentração.
Ainda dando suporte à hipótese Paivio (1985) sugeriu que a utilização desse treino se traduz em freqüência, persistência e eficiência no desempenho motor.
Estratégias para melhor eficácia
De acordo com as várias referências citadas acima, o treino mental oferece inúmeros benefícios à aprendizagem. A sua prática, no entanto, deve ser estruturada para possibilitar melhores resultados. Variáveis que influenciam o resultado do treino mental como: relaxamento, demonstração, posição corporal do praticante, tipo de instrução, devem ser examinadas.
Relaxamento
Algumas recomendações são importantes para a efetividade do treinamento mental, uma delas é o relaxamento, que deve preceder o treino mental. A importância do relaxamento foi destacada por Souza e Scalon (2004). Os autores recomendam seu uso para que o aluno possa focalizar a sua atenção mais efetivamente para o treino mental.
Martin (2001) também propôs que o primeiro passo para realizar o treino mental seja o relaxamento, pois a combinação do relaxamento com o treino mental é superior a qualquer um dos procedimentos utilizados separadamente. Se uma pessoa está ansiosa ou excitada, é difícil para ela imaginar todas as sensações vivenciadas ao se executar uma habilidade. Depois do processo de relaxamento, os alunos devem ser solicitados a sentir todos os aspectos daquela determinada habilidade, como se as tivessem executado a fim de vivenciar a imaginação operante.
Demonstração do movimento
Estudos realizados por Warner e Mcneill (1988) investigaram uma combinação de treino mental precedente de uma demonstração do movimento, treino físico e uso do relaxamento antes da imaginação. Há evidências de que o treino mental associado aos procedimentos de demonstração do movimento e de relaxamento pode aumentar a aquisição de habilidades motoras. Em algumas situações, foi achado que o treinamento mental pode ser tão benéfico quanto o treinamento real e que é mais benéfico nenhum treinamento em habilidades motoras para pessoas com inaptidões para aprender.
Posição corporal do praticante
Outro aspecto importante, diz respeito à posição corporal do praticante para a execução do treinamento mental. Segundo Souza e Scalon (2004), para a realização do treino mental poderá haver três posições: deitada, sentada e em pé. Na posição deitada, o atleta fica mais acomodado, sendo recomendada a posição deitada em decúbito dorsal ou frontal ou, se preferir, na posição lateral. A posição sentada pode facilitar para que a execução da técnica acontecesse uns momentos antes de entrar em quadra, por exemplo. A posição em pé permite ao praticante efetuar o treinamento mental dentro da competição, uns instantes antes que o atleta executasse uma ação de grande responsabilidade. Segundo os autores, essas são as posições corporais que têm sido citadas pela literatura; porém, não vêm sendo realizadas investigações científicas que possam determinar as possíveis vantagens de uma das posições em relação às demais.
Tipo de instrução
Os tipos de treino mental dizem respeito à maneira da sua realização, ou seja, como ele será proposto e conduzido pelo professor, técnico ou terapeuta. Ele pode ser realizado por meio da simples instrução, para que o aluno visualize o movimento que irá executar, denominado treino mental externo. Ele também pode ser realizado pela visualização de um movimento já executado acompanhado da percepção das sensações corporais que o movimento proporcionou, denominado treino mental interno. E outra maneira bastante utilizada é o treino mental por roteiro que contém instruções verbais relativas ao movimento que deverá ser lido pelo professor e visualizado pelo aluno.
Considerações finais
Além das recomendações referidas no estudo, há outras citadas com menor ênfase pela literatura, são elas: imaginar os movimentos ou as tarefas de forma real para conseguir uma imagem clara; focalizar a atenção em uma execução perfeita; realizar o treino mental através de diferentes estratégias utilizadas no decorrer de um jogo; usar todas as modalidades sensoriais: visão, olfato, audição, tato e degustação e; praticar o treino dentro de bases realistas, isto é, adaptado aos níveis do rendimento do aluno.
O treino mental é uma variável importante na aprendizagem e desempenho de habilidades motoras. Portanto ele deve ser estruturado considerando todas as suas possibilidades de utilização, visando o melhor aproveitamento dessa estratégia. Futuros estudos podem investigar como os diferentes tipos de utilização do treino mental podem contribuir para uma melhor eficácia do procedimento.
Referências bibliográficas
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Warner, L.; McNeill, M. E. Mental imagery and its potential for physical therapy. Physical therapy. Apr;68(4):516-21, 1988.
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