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Introdução

    De acordo com a Federação Internacional de Natação (FINA), o ato de nadar pode ser definido como representação de auto-sustentação na água, que o homem aprendeu por instinto próprio ou observando os animais (1). Já a natação é entendida como a ação, exercício ou arte de nadar (2).

    Esta modalidade esportiva é praticada de diferentes maneiras e com objetivos recreativos, desportivos e terapêuticos, sendo considerada uma das atividades físicas mais completas, pois consegue mobilizar vários grupamentos musculares, simultaneamente (3).

    Segundo informações da Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA), existem mais de 11 milhões de praticantes de natação no Brasil (4). Em pesquisa realizada em 1996, pelo jornal O Estado de São Paulo, citado por Nolasco et al. (5), foi verificado que a natação era o segundo esporte mais praticado (26,7% dos desportistas), ficando atrás apenas do futebol (46,7%).

    Apesar deste número, existem poucos estudos sobre os motivos para a prática da natação, a maioria envolvendo crianças e adolescentes (6-9). Motivos são fatores que determinam o comportamento do indivíduo em situações específicas e podem ser tanto de ordem interna como externa, despertando nas pessoas a vontade de praticar certas atividades (10).

    A principal finalidade dos estudos sobre motivos é determinar as ações e analisar as razões que levam os indivíduos a fazer algo e executar algumas tarefas com maior empenho do que outras, ou, o que leva as pessoas a permanecerem em alguma atividade por determinado período de tempo (11). Os fatores motivacionais que influenciam a prática esportiva são, geralmente, investigados usando-se o Participation Motivation Questionare (PMQ), validada no Brasil por Barroso (12) e apresentada como Escala de Motivos para Prática Esportiva (EMPE).

    A identificação dos motivos que levam as pessoas a buscarem determinadas práticas desportivas pode ser um dos caminhos para aumentar à participação e melhorar a aderência de populações nas práticas desportivas (13), contribuindo para o melhor planejamento e execução das oportunidades oferecidas às comunidades. Sendo assim, o objetivo do presente estudo foi verificar a associação entre motivos para a prática da natação em adultos e variáveis sócio-demográficas.

Material e métodos

    Trata-se de estudo observacional de caráter transversal, utilizando-se de métodos descritivos. A pesquisa foi realizada por meio de questionário individual, com perguntas objetivas.

    A amostra (acidental) foi composta por 155 indivíduos adultos (20 a 60 anos), de ambos os sexos, matriculados em um projeto de extensão desenvolvido junto ao Centro de Desportos, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). A proposta do projeto é oferecer a prática da modalidade a indivíduos da comunidade (acadêmica ou não) com idade entre 14 e 60 anos, mediante pagamento de taxa de contribuição. As aulas têm freqüência de uma, duas ou três vezes por semana (a depender da turma); duração de 50 minutos e; são ministradas por acadêmicos do curso de Educação Física, sob a coordenação de professores do Centro de Desportos, durante período letivo. Todas as pessoas matriculadas no projeto e na idade delimitada para estudo foram elegíveis para a pesquisa. Foram incluídas todas as pessoas presentes, nos dias estabelecidos para coleta e que concordaram em participar do estudo. Todos os participantes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

    A coleta dos dados ocorreu no período de 18 de agosto de 2008 ao dia 05 de setembro de 2008, durante as três primeiras semanas de aulas de cada turma. Os formulários foram entregues aos indivíduos, no local das aulas, pelo autor da pesquisa, e recolhidos no mesmo dia (imediatamente após o preenchimento) ou na aula posterior (quando os alunos preferiam preencher em casa). Foram coletados dados que objetivam obter informações demográficas, sócio-econômicas e de motivos para a prática desportiva.

    Os dados demográficos incluíram informações sobre: sexo; grupo etário, ≤ 28 anos e > 28 anos (mediana da idade da amostra); Estado civil (com cônjuge/companheiro e sem cônjuge/companheiro); Escolaridade, ensino básico (analfabeto, primário completo, ginasial completo e colegial completo) e ensino superior (superior completo/pós-graduação).

    Nível sócio-econômico - O nível sócio-econômico de cada indivíduo foi verificado por meio da utilização de um questionário que consiste em um “Critério de Classificação Econômica” da ABA/ANEP/ABIPEME (http://www.cotrim.com/qcdromqcriterio.html), o qual é constituído por dados como o grau de instrução e itens de posse da família. Para fins estatísticos foi necessário alterar a classificação proposta pelo Critério Padrão de Classificação Econômica Brasil/2008, sendo as classes econômicas agrupadas como: baixa (E, D, C1/C2), média (B1/B2) e alta (A1/A2).

    Motivos para a Prática da Natação - Os motivos para a prática da natação foram verificados por meio da EMPE, desenvolvida nos Estados Unidos por Gill et al. (14) e adaptada e validada para uso no Brasil por Barroso (12).

    A EMPE visa determinar os motivos de prática esportiva de quem a preencher, sendo que esses motivos, apresentados em 33 itens em escala likert, variando de 0 a 10, foram agrupados posteriormente em sete fatores motivacionais: status, condicionamento físico, energia, contexto, técnica, afiliação e saúde. Para determinar o score de cada fator motivacional, foi calculado a média, somando os valores assinalados nas questões a ele pertencentes e dividindo pelo número de questões (12). Portanto, se um fator abriga quatro itens, basta somar os valores assinalados em cada um deles e dividir por quatro.

    Foram utilizados procedimentos da estatística descritiva (freqüências absoluta e relativa, média, desvio-padrão (DP), mediana e variação). A associação entre motivos para a prática da natação e variáveis sócio-demográficas foi verificada por meio dos testes de Mann-Whitney (sexo, grupo etário, estado civil e escolaridade) e Kruskal-Wallis (classe econômica), adotando-se nível de significância de 5% (α = 0,05). As análises foram conduzidas no SPSS® 15.0.

Resultados

    A amostra do presente estudo foi composta por 155 indivíduos com idade média de 31,7 ± 11,9 anos (desvio padrão), variando de 20 a 60 anos. As características da amostra são apresentadas na tabela 1. Pode-se observar que houve maior freqüência de indivíduos do sexo masculino, do grupo etário mais jovem, sem cônjuge e de classe média.

Tabela 1. Características da amostra. Florianópolis – SC, Brasil, 2008

Variáveis	n	%
Sexo
Masculino	91	58,7
Feminino	64	41,3
Grupo etário
≤ 28 anos	86	55,5
> 28 anos	69	44,5
Estado civil
Com cônjuge	62	40,0
Sem cônjuge	93	60,0
Escolaridade
Ensino básico	74	47,7
Ensino superior	81	52,3
Classe econômica
Baixa	38	24,5
Média	86	55,5
Alta	31	20,0

    A descrição dos scores para cada um dos fatores motivacionais para a prática da natação é apresentada na tabela 2. Os resultados mostram que o fator saúde, seguido pelo condicionamento físico foram os principais motivos para a prática da natação na amostra estudada.

Tabela 2. Média, desvio padrão (DP), mediana e variação dos scores das categorias motivacionais para a prática da natação em adultos. Florianópolis – SC, Brasil, 2008

Motivos	Média	DP	Mediana	Variação
Status	2,99	2,14	2,86	0,00 – 8,00
Condicionamento físico	7,74	2,19	8,33	0,00 – 10,00
Energia	5,92	2,15	6,00	0,00 – 10,00
Contexto	4,11	2,08	4,20	0,00 – 9,40
Técnica	5,92	2,26	6,00	0,00 – 10,00
Afiliação	5,07	2,38	5,20	0,00 – 10,00
Saúde	8,86	1,65	9,33	0,00 – 10,00

    A associação entre os motivos para a prática da natação e as variáveis sócio-demográficas do estudo é mostrada na tabela 3. O sexo foi associado ao motivo saúde, indicando que esse fator é mais importante para as mulheres do que para os homens. Também foi observada tendência de associação entre sexo e o fator status, sugerindo que, embora não significativo, esse motivo é mais forte nos homens. Os motivos condicionamento, energia, contexto, técnica e afiliação não diferiram estatisticamente entre os sexos.

    Verificou-se que o estado civil foi associado ao fator técnica, demonstrando que esse motivo foi mais importante para indivíduos solteiros que para aqueles que possuem cônjuge. Já os motivos status, condicionamento, energia, contexto, afiliação e saúde não apresentaram diferenças significativas entre as duas categorias de estado civil.

    Os resultados mostraram que todos os motivos para a prática da natação foram independentes das variáveis: grupo etário, escolaridade e classe econômica.

Tabela 3. Associação entre motivos para a prática da natação em adultos e variáveis sócio-demográficas. Florianópolis – SC, Brasil, 2008.

Variáveis	Status		Condicionamento		Energia		Contexto		Técnica		Afiliação		Saúde
	Md	p	Md	p	Md	p	Md	p	Md	p	Md	p	Md	p
Sexo
Masculino	3,00		8,00		5,83		4,20		6,25		5,20		9,33
Feminino	2,14	0,055	8,33	0,730	6,17	0,547	4,40	1,000	5,50	0,348	5,80	0,640	10,00	0,002
Grupo etário
≤ 28 anos	2,86		8,00		6,17		4,20		6,12		5,20		9,33
> 28 anos	2,71	0,815	8,33	0,271	5,67	0,157	4,40	0,282	5,50	0,206	5,20	0,479	9,67	0,942
Estado civil
Com cônjuge	2,71		8,33		5,92		4,40		5,25		5,50		9,33
Sem cônjuge	2,86	0,881	8,00	0,869	6,00	0,432	4,20	0,387	6,25	0,048	5,00	0,267	9,67	0,365
Escolaridade
Ensino básico	2,86		8,33		6,17		4,20		5,75		4,90		9,83
Ensino superior	2,71	0,971	8,00	0,772	5,83	0,747	4,40	0,991	6,00	0,761	5,60	0,557	9,33	0,101
Classe econômica
Baixa	2,86		8,33		6,17		3,70		6,12		4,80		9,50
Média	2,64		8,00		6,00		4,30		5,62		5,20		9,33
Alta	2,86	0,931	8,33	0,335	6,00	0,903	5,00	0,563	6,75	0,329	5,40	0,867	9,67	0,424

Md: mediana.

Discussão

    Este parece ser o primeiro estudo, realizado com adultos brasileiros, com o objetivo de investigar a relação entre motivos para a prática da natação e fatores sócio-demográficos. Como a pesquisa foi conduzida em amostra não representativa, os resultados não podem ser extrapolados para a população do estudo e representam, apenas, as características da amostra investigada.

    A amostra foi composta, em sua maioria, por indivíduos do sexo masculino e sem cônjuge, sugerindo que homens e pessoas solteiras são mais envolvidos com a prática da natação do que seus pares. Alguns estudos mostram que o sexo masculino e o estado civil solteiro são associados à prática de atividades físicas em adultos jovens e de meia idade (15,16).

    A amostra também contou com número significativo, quando comparado aos padrões brasileiros, de indivíduos com nível superior e de classe econômica média e alta. Isso pode ter ocorrido pelo fato do projeto “Natação para Jovens e Adultos” ser desenvolvido na UFSC, o que beneficia o acesso da comunidade acadêmica da instituição. Além disso, escolaridade e condição sócio-econômica podem favorecer o acesso a práticas de atividades físicas em geral (17).

Motivos Determinantes para a Prática da Natação

    De acordo com Barroso (12), as categorias motivacionais mais importantes são aquelas que atingem scores médios iguais ou superiores a sete, enquanto as menos importantes são as que atingem pontuação média igual ou inferior a três. Ao analisar os dados obtidos da amostra, verificou-se que apenas duas categorias motivacionais apresentaram média igual ou superior a 7: a categoria saúde apresentou a maior média (8,86), seguido pela categoria condicionamento físico (7,74). Dessa forma, os resultados demonstraram que saúde e condicionamento físico foram os motivos mais importantes para a prática da natação.

    A categoria motivacional status, foi a única que apresentou média inferior a 3, mostrando ser o motivo menos importante para a prática da natação. Os demais fatores (energia, contexto, técnica e afiliação) obtiveram escores intermediários.

    Como a EMPE é um instrumento recentemente validado e adaptado para população brasileira, são escassas as pesquisas para efeito de comparação. Entretanto, foi possível observar que, os resultados do presente estudo foram semelhantes aos da pesquisa realizada por Bertuol (18), que aplicou o mesmo instrumento em universitários de 17 a 58 anos, matriculados nas disciplinas de Educação Física Curricular da UFSC. Ao analisar somente os dados da modalidade natação, o autor verificou que os principais motivos foram saúde e condicionamento físico, com médias de 8,5 e 8,1, respectivamente. Da mesma forma, a categoria status foi citada pela maioria dos indivíduos como a menos importante, atingindo média inferior a 2,5.

    Benassi (19), em estudo com 137 participantes de dois centros esportivos de Maringá-PR, verificou que entre os indivíduos acima de 20 anos, os principais motivos para a prática da natação estavam relacionados à saúde e questões ligados a afiliação. Já o motivo considerado como menos importante foi o status.

    Estudos utilizando a versão portuguesa do PMQ, o Questionário de Motivação para Atividades Desportivas (QMAD) (21), também encontraram que o fator condicionamento físico, mas não saúde, exerce grande influência para prática da natação. Em adolescentes de 14 a 18 anos, verificou-se que os motivos mais importantes foram o aperfeiçoamento técnico, condicionamento físico e divertimento (9).

    Os resultados do presente estudo estão de acordo com diversas outras pesquisas (18-20,22) que demonstraram que itens como saúde, condicionamento físico e aperfeiçoamento técnico fazem parte dos motivos mais importantes para a prática esportiva. Porém esses motivos são descritos relativamente de acordo com o tipo de prática e/ou interesse do participante, sugerindo que praticantes de atividades com fins competitivos primam pelo aperfeiçoamento técnico, enquanto àqueles considerados não atletas são motivados por questões de saúde e condicionamento físico.

    O motivo menos importante para as práticas desportivas, em geral, independente da idade, forma de participação e modalidade, é o status. Dessa forma, acredita-se que a prática esportiva pouco tem a ver com pretensões relacionadas ao reconhecimento ou prestígio perante outras pessoas.

Fatores associados aos motivos para a prática da natação

    Apenas duas categorias motivacionais apresentaram associações com características sócio-demográficas da amostra. O escore do fator saúde foi significativamente mais alto em mulheres e a pontuação do fator técnica foi mais elevada em indivíduos sem cônjuge.

    Outros estudos também sugerem maior preocupação com a saúde no sexo feminino (8). Em pesquisa de base populacional, realizada em São Paulo, foi verificado que as mulheres atingiram maior nível de atividade física voltada à saúde, quando comparadas a indivíduos do sexo masculino (23).

    De maneira geral, ao praticarem alguma atividade física, as mulheres procuram atividades leves ou moderadas, objetivando obter benefícios à saúde. Apresentam também maior esclarecimento sobre a atividade física e procuram seguir orientações médicas. Esses fatores geram, entre indivíduos do sexo feminino, maior envolvimento com atividades físicas, relacionadas à motivos como saúde e bem-estar (17).

    A maior importância dada ao fator técnica, por indivíduos solteiros, pode estar relacionada à valorização do aperfeiçoamento técnico em pessoas mais jovens (6,8). Além disso, a preocupação com a técnica pode ser definida como motivo intrínseco voltado para o ego e está ligado à auto-realização. Nota-se maior necessidade de auto-realização entre indivíduos solteiros quando comparados a indivíduos casados (12).

    Observou-se forte tendência de associação entre a categoria status e sexo, com os escores se apresentando maior nos homens. Alguns estudos (7,13, 24) revelaram que motivos relacionados ao status apresentam maior relevância para indivíduos do sexo masculino quando comparados aos indivíduos do sexo oposto.

    No presente estudo não foram encontradas associações entre variáveis sócio-demográficas e os fatores motivacionais afiliação, energia, contexto e condicionamento físico. Esses achados sugerem que, para praticantes de natação, tais motivos independem de sexo, grupo etário, estado civil, escolaridade e classe econômica.

    Resultados contrários foram observados em outros estudos. Fernandes (13) encontrou associação entre a categoria motivacional afiliação e o sexo feminino, entre praticantes da modalidade coferbol (modalidade derivada do basquetebol), concluindo que a mulheres preocupam-se mais em fazer parte de um grupo e fazer novas amizades quando comparadas aos homens. Já Murcia et al. (25) indicou associação entre a afiliação e indivíduos com idade superior a 24 anos, praticantes de diversas modalidades esportivas coletivas. Andrade et al. (7), verificou que entre nadadores, há maior valorização do condicionamento físico em indivíduos do sexo masculino.

    Acredita-se que as associações encontradas por outros autores e não observadas no presente estudo, devam-se às características específicas da amostra e da modalidade na qual as mesmas estão inseridas.

    Este estudo apresenta limitações inerentes aos estudos transversais, não sendo possível definir a direção das associações encontradas. Além disso, foi utilizado um instrumento auto-aplicável, em que a confiabilidade das informações depende da veracidade das respostas prestadas pelos participantes. Observou-se que muitos dos questionários não foram respondidos pela não disposição dos alunos; outros levaram para responder em casa, mas não retornaram.

    De acordo com os resultados do estudo, pode-se concluir que os participantes do projeto de natação para adultos da UFSC, que fizeram parte desta pesquisa, são, em sua maioria, do sexo masculino, com idade superior a 28 anos, solteiros, com alta escolaridade e pertencentes às classes econômicas média e alta. A saúde e o condicionamento físico são os principais motivos que determinaram a prática de natação. Os solteiros têm maior preocupação com os motivos relacionados à técnica, enquanto as mulheres apresentam maior preocupação com a saúde.

Referências

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