A dinâmica cultural no processo de aprendizagem na Educação Física La dinámica cultural en el proceso de aprendizaje en la Educación Física |
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Mestre em Educação Pós-graduado em Treinamento Desportivo Professor estadual da rede pública do estado de São Paulo |
Alan Rodrigo Antunes (Brasil) |
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Resumo Este artigo tem como objetivo contribuir para a discussão sobre a contextualização do conhecimento na escola. Ao considerar a Educação Física como disciplina que tem como objetivo introduzir e integrar o aluno na cultura corporal de movimento tem-se a preocupação de garantir esse entendimento nas três dimensões do conteúdo (conceitual, atitudinal e procedimental). Proporcionando discussões sobre a dinâmica cultural, isto é, as mudanças sofridas pelo esporte, jogo, dança, luta, ginástica ao longo da história, os alunos poderão compreender a integração da disciplina na cultura e também a apropriação por ela de parte dessa cultura. O entendimento sobre as mudanças provocadas pela dinâmica cultural em função do desenvolvimento científico e das necessidades sociais e ambientais pode levar a uma apropriação crítica do conhecimento em benefício próprio e alheio, isto é, perceber as mudanças como oportunidade de prática consciente das manifestações corporais. Palabras clave: Educação Física. Cultura corporal de movimento. Dinâmica cultural |
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http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 136 - Septiembre de 2009 |
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O corpo além do biológico
Daolio (2007) discorre sobre a influência da sociedade na constituição do corpo:
Ao se pensar o corpo, pode-se incorrer no erro de encará-lo como puramente biológico, um patrimônio universal sobre o qual a cultura escreveria histórias diferentes. Afinal, homens de nacionalidades diferentes apresentam semelhanças físicas. Entretanto, para além das semelhanças ou diferenças físicas, existe um conjunto de significados que cada sociedade escreve nos corpos dos seus membros ao longo do tempo, significados estes que definem o que é corpo de maneiras variadas. (DAOLIO, 2007, p. 36-37)
Assim, o corpo apresenta-se como sede de signos sociais, isto é, dotado de significados específicos de cada sociedade e não apenas com características biológicas comuns a todos os seres humanos. Segundo Lévi-Strauss (apud Daolio, 2007, p. 37) “onde se manifestar uma regra nas relações humanas, pode-se reconhecer a cultura; onde se observar uma característica constante, universal nos homens, pode-se encontrar a natureza”. A cultura, então, ordena a natureza por meio da organização de regras, de modos do fazer, em função de objetivos e interesses, que seguem desejos grupais necessários a interferência do homem no ambiente e nas relações sociais.
Daolio (2007, p. 42) afirma que:
[...] as práticas institucionais que envolvem o corpo humano – e a Educação Física faz parte delas -, sejam elas educativas, recreativas, reabilitadoras ou expressivas, devem ser pensadas nesse contexto, a fim de que não se conceba sua realização de forma reducionista, mas se considere o homem como sujeito da vida social.
Portanto, os movimentos corporais presentes na Educação Física e em toda a sociedade, representam valores e princípios culturais, e devem ser contextualizados nas aulas para fugir de uma prática mecânica ou reducionista.
A Educação Física e a dinâmica cultural
Ao longo da evolução do ser humano os movimentos ganharam novos sentidos, novas formas de se fazer em função das necessidades sociais, ambientais e de sobrevivência. Segundo Galvão, Rodrigues e Neto (2005, p. 32):
Por questões biológicas, os seres humanos foram buscando recursos para suprir suas fragilidades e insuficiências. Foram sendo desenvolvidas possibilidades que tornassem nossos movimentos mais eficazes com relação à caça, à pesca, à agricultura, ao domínio de novos espaços físicos, por razões religiosas ou lúdicas. Surgiu daí uma grande diversidade de conhecimentos, os quais foram ressignificados e transformados ao longo do tempo, constituindo uma Cultura Corporal de Movimento.
Assim, essa dinâmica cultural influencia a prática das manifestações corporais no ambiente escolar: jogo, esporte, dança, luta, ginástica. O professor pode proporcionar aos seus alunos a compreensão dessa dinâmica cultura e favorecer a sua vivência crítica no ambiente escolar e fora dele (BETTI, 2006).
A capoeira foi praticada no Brasil no seu início pelos negros africanos como uma forma de manifestação cultural e também como defesa contra os seus agressores (SANTOS, 1993). Muitos dos seus movimentos, até hoje, recebem o nome de gestos do trabalho braçal realizado pelos negros e também de animais: martelo, macaco, mortal, meia-lua etc. As músicas representam as angústias dos negros, seus sofrimentos, seus desejos. Porém, ao longo do tempo outros movimentos de outras artes marciais foram incorporados pela capoeira possibilitando a modificação de sua prática. Assim, hoje é possível encontrar vários estilos de capoeira no Brasil. Entre eles os dois mais conhecidos são os estilos Angola e Regional. O estilo Angola mais tradicional e que tem como nome o mestre Pastinha (Vicente Ferreira Pastinha) e o Regional mais contemporâneo que tem como principal nome o mestre Bimba (Manoel dos Reis Machado).
Esse conhecimento conceitual sobre a capoeira enfocado na dinâmica cultural, pode ser discutido com os alunos e vivenciado. Proporcionar a aprendizagem dos dois estilos da capoeira ou a visita de algum grupo de capoeira será muito enriquecedor.
Outro exemplo sobre o ensino-aprendizagem com enfoque na dinâmica cultural está no jogo de queimada. A queimada pode ser discutida como um jogo com características presentes no Handebol e no Dodgeball. Assim, com a esportivização, isto é, com a criação de confederações, comitês, ligas e a ênfase no desempenho, na vitória um simples jogo tornou-se um esporte competitivo e com regras oficiais.
O voleibol pode ser discutido, também, nesse enfoque já que sofreu muitas mudanças em suas regras. Em 1999 o voleibol deixou ser praticado com o uso da “vantagem” (uma equipe marcava ponto apenas quando efetuava o saque, ou seja, tinha a vantagem) e deixou de perdurar por muitas horas, o que não era viável aos meios de comunicação, principalmente a televisão, que sofria mudanças em sua programação. Assim, a vivência de um jogo com e sem o uso da vantagem constituiu-se uma opção de vivência nesse enfoque.
Outras manifestações corporais possibilitam essa discussão. Beisebol pode ser discutido com o Bets e o Base 4, assim como o Jeu de Paume (jogo praticado com as mãos) com o Tênis.
Portanto, o professor pode lançar mão das manifestações corporais no âmbito mais abrangente, proporcionando uma aprendizagem significativa que possa ser relevante aos alunos, já que através da compreensão da dinâmica cultural os alunos possam usá-las em benefício próprio e alheio sugestionando ou recriando novas formas de praticar o jogo, o esporte, a dança, a luta, a ginástica segundo o consentimento do grupo em função das necessidades materiais, espaciais, temporais, físicas e psicológicas.
Considerações
Compreender a manifestação corporal (jogo, esporte, dança, luta, ginástica) além da técnica (do como fazer), permite aos alunos ampliar a aprendizagem, ou seja, contextualizar a cultura corporal incluindo-a na realidade social.
Contudo, contextualizar o conhecimento, em particular na Educação Física, não é negar o caráter prático (de vivência), mas enriquecer a prática corporal com conceitos, idéias, proposições, valores, atitudes, temas transversais. Assim, o profissional deve dosar com muita cautela a relação entre a teoria e a prática, isto é, a Educação Física não pode perder o seu caráter prático.
Referências
BETTI, M. (Org.) Educação física e mídia: novos olhares, outras práticas. São Paulo: Hucitec, 2006.
COSTA, L. P. Capoeira sem mestre. 14 ed. São Paulo: Ediouro S. A., S/D.
DAOLIO, J. Da cultura do corpo. 11. ed. Campinas: Papirus, 2007.
DARIDO, S. C. Educação física na escola: questões e reflexões. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2003.
GALVÃO, Z.; RODRIGUES, L. H.; NETO, L. S. Cultura corporal de movimento. In: DARIDO, S. C.; RANGEL, I. C. A. (Coords.). Educação Física na escola: implicações para a prática pedagógica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005. p. 25-36.
MATTOS, M. G.; NEIRA, M. G. Educação física na adolescência: construindo o conhecimento na escola. 5 de. São Paulo: Phorte, 2008.
MINAYO, M. C. S. (Org.). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 24. ed. Petrópolis: Vozes, 1994.
NETO, S. C. S. A evolução das regras visando o espetáculo no voleibol. EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, a. 10, n. 76, set. 2004. http://www.efdeportes.com/ efd76/volei.htm
SANTOS, A. O. Capoeira: arte-luta brasileira. Curitiba: Imprensa Oficial do Estado, 1993.
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