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O instrutor de esporte de aventura no Brasil: 

implicações ligadas ao processo ensino aprendizagem

El instructor de deporte de aventura en Brasil: implicancias vinculadas al proceso de enseñanza aprendizaje

The instructor of adventure sport in Brazil: professional practice and implications connected with the instrucional process

 

*Doutorando em Ciência do Desporto pela

Universidade de Trás-os-Montes & Alto Douro, Portugal

**Professora Dra do Programa de Pós-Graduação em Educação Física

da Universidade Gama Filho, RJ. Brasil

***Professor PhD do Departamento de Ciência do Desporto da

Universidade de Trás-os-Montes & Alto Douro, Portugal

Jairo Antônio da Paixão*

Vera Lucia de Menezes Costa**

Ronaldo Eugenio Calçada Dias Gabriel***

jairopaixao2004@yahoo.com.br

 

 

 

Resumo

          Ao se considerar a inexistência, no Brasil, de um perfil do profissional que atua no segmento do esporte de aventura, incluindo o tipo de formação e ou habilitação do mesmo, bem como as implicações e especificações que perpassam o processo instrucional das respectivas modalidades desportivas levou-nos a enveredar pelo caminho de uma investigação. Nesse sentido, o objetivo desta pesquisa bibliográfica foi analisar aspectos intervenientes à prática profissional do condutor no decurso do processo instrucional das diferentes modalidades de esporte de aventura no Brasil.

          Unitermos: Prática profissional. Condutor. Esporte de aventura

 

Abstract

          Considering the non-existence, in Brazil, of a profile of the professional who works in the segment of the adventure sport, including the type of formation and competences necessary, as well as the implications and specifications of the instructional process of the respective sporting kinds stimulated us following the road of an investigation. In this way, the objective of this bibliographical inquiry was to analyze intervenient aspects to the professional practice of the instructor in the course of the instructional process of the different kinds of adventure sport in Brazil.

          Keywords: Professional practice. Instructor. Adventure sport

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 134 - Julio de 2009

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Introdução

    O surgimento de novas modalidades de atividades físicas é um fenômeno que ocorre numa seqüência ininterrupta ao longo dos tempos no contexto da sociedade brasileira. Nesse sentido, notá-se que aquelas modalidades ligadas à natureza crescem numa proporção maior devido a diferentes fatores como a necessidade de o homem afastar-se do estresse das grandes cidades; a ruptura com os esportes convencionais olímpicos e aqueles veiculados pelo esporte espetáculo; a retomada do espírito aventureiro que encaminha o homem a um ambiente selvagem, carregado de incertezas, permitindo-lhe jogar com as chances de conquistar, jogar com as adversidades; a íntima ligação com a lógica atual da sociedade, que interage diretamente com o aumento da incerteza política, econômica, social e cultural; o desenvolvimento tecnológico que proporcionou mais segurança e a vivência da ousadia; e a emergência de um sentimento ecológico e de preservação da natureza como condição de sobrevivência no planeta (COSTA, 1999; 2007).

    As vivências decorrentes da prática do esporte de aventura propiciam ao homem moderno não só o reencontro com ambiente natural, como ainda oportunidade de se aventurar e por sua vez, estabelecer novos desafios à sua vida (MELO & ALMEIDA, 2007).

    Ao se considerar as diferentes modalidades que compõem o esporte de aventura, e os respectivos ambientes naturais como o terrestre, aquático e aéreo nos quais são praticadas no Brasil (fig. 1), evidencia-se a figura do praticante, que, se coloca frente a uma situação de risco muito maior, se comparado com as modalidades de esporte clássico, como por exemplo, futebol, voleibol, handebol, basquete. Torna-se oportuno ressaltar que, o risco – seja objetivo ou simbólico - juntamente com as fortes emoções desencadeadas pela adrenalina e vertigem vivenciadas num dado ambiente natural, imprimem a estas práticas físicas a denominação de esporte de aventura e risco calculado na natureza.

    Nessa perspectiva, percebe-se que as modalidades de esporte de aventura e risco calculado na natureza demandam certos pré-requisitos à sua prática como o desenvolvimento de habilidades e adaptações de ordem física, psicológica, além de uma série de procedimentos ligados à integridade física e emocional do praticante e à preservação do ambiente natural.

Figura 1. Relação das atividades físicas em ambiente natural praticadas no Brasil em diferentes 

perspectivas do turismo de aventura (lazer) e ou esporte de aventura (lazer e ou competição).

    Vem se constatando, ainda de forma empírica, que na grande maioria das vezes, as pessoas encarregadas pela condução deste segmento de esporte não possuem formação na área da Educação Física, em áreas afins ou, sequer, qualquer tipo formação acadêmica. Trata-se de um fenômeno comum nas modalidades de esporte de aventura no Brasil. Tais considerações suscitam reflexões acerca do tipo de orientação recebida pelo aprendiz nas respectivas modalidades de esporte. Outro ponto que merece ser destacado é o fato de os praticantes, ao buscarem essas práticas em condições arriscadas numa procura incessante de emoções e de lugares especiais o estão fazendo-o sob a segurança de um condutor profissional competente ou se foram orientados de igual forma antes de autonomizar-se em suas atividades, o que poderia concorrer no sentido de minimizar riscos que podem vir a ser submetidos.

    Ao se considerar a inexistência, no Brasil, de um perfil do profissional que atua no segmento do esporte de aventura, incluindo o tipo de formação e ou habilitação do mesmo, bem como as implicações e especificações que perpassam o processo instrucional das modalidades de esporte de aventura, levou-nos a enveredar pelo caminho de uma investigação. Nesse sentido, este estudo, buscou discutir aspectos intervenientes à prática profissional do condutor no decurso do processo instrucional das diferentes modalidades de esporte de aventura no Brasil.

Procedimentos metodológicos

    Tendo como referência para este estudo levantar a produção do conhecimento sobre o condutor de esporte de aventura e sua tematização acerca de sua prática profissional e implicações ligadas ao processo instrucional, estabeleceu-se como referência para este estudo o emprego de técnicas de uma pesquisa bibliográfica, feito desta uma análise qualitativa. De acordo com Marconi & Lakatos (2007), a bibliografia pertinente oferece meios para definir e resolver não somente problemas já conhecidos, como também explorar novas áreas em que os problemas não se cristalizaram suficientemente.

    Nessa perspectiva, é importante ressaltar que o ponto de partida não é desse modo, a pesquisa do material bibliográfico, mas a elaboração de um questionamento. Na verdade, esses questionamentos realizados pelo pesquisador que irão conferir sentido à fonte estudada e, no limite, enquanto houver perguntas, essa fonte não estará suficientemente explorada. Sobre esse aspecto Gil (2008) salienta que depois que se decide fazer uma pesquisa bibliográfica deve-se considerar as seguintes fases: 

  1. determinação dos objetivos; 

  2. elaboração do plano de trabalho;

  3. identificação das fontes; 

  4. localização das fontes e obtenção do material 

  5. leitura do material 

  6. tomada de apontamentos 

  7. confecção de fichas e 

  8. redação do trabalho.

    Buscou-se contemplar as fases acima ressaltadas, de forma que o presente estudo tivesse o caráter de objetividade e riqueza de dados, que possam contribuir no entendimento da discussão envolvendo a prática profissional do condutor e implicações ligadas ao processo instrucional das diferentes modalidades que compõem o esporte de aventura nesta contemporaneidade.

Risco: fator inerente ao esporte de aventura

    O risco, conforme Le Breton (1995) tornou-se a referência essencial da sociedade contemporânea nos domínios da epidemiologia, saúde pública, tecnologia, meio ambiente, trabalho social e lazer. Nesta perspectiva, o risco calculado impõe-se como uma noção essencial para pensar a juventude, ou para encarar numerosas condutas próximas à modernidade como as atividades esportivas na natureza e aquelas voltadas ao lazer de risco.

Ao analisarmos o risco devemos considerar aspectos como, por exemplo, a manutenção da integridade física e mental do praticante, o condicionamento físico, o desenvolvimento de habilidades necessárias à modalidade de aventura em questão, além de estratégias que visem à conscientização do praticante para com a preservação do meio natural em que se desenrola determinada modalidade de aventura.

    Incontestavelmente o risco configura-se como característica inerente ao esporte de aventura, e, muitas vezes, o êxito do praticante reside na sua capacidade de prevê-lo e controlá-lo considerando para isso o emprego da tecnologia voltada para este segmento de esporte bem como o domínio da técnica por parte do praticante. Em contra partida, a não observância de aspectos ligados a segurança no momento da prática de uma dada modalidade torná-se passível a acidentes de diferentes níveis de comprometimento à integridade física e emocional do praticante.

    Nesse sentido, uma estimativa precisa do número e tipos de acidentes ocorridos por meio da prática de esporte de aventura numa determinada faixa de tempo, é algo impreciso no Brasil. Tal situação se deve em sua maioria pelo desinteresse por parte das empresas especializadas em esporte de aventura na divulgação dessas informações e ou criação e manutenção de um banco de dados sobre esses eventos. Na verdade, estas informações não combinam com a imagem geralmente veiculada por estas empresas nas quais o praticante se encontra livre para vivenciar fortes emoções e adrenalina.

O condutor de esporte de aventura: considerações

    Através de observações empíricas e da literatura que aborda esta temática, percebe-se, até o presente momento, a inexistência no Brasil de um curso de graduação voltado à formação específica do profissional que conduz o esporte de aventura como ocorre, por exemplo, com a Educação Física. Como afirma Costa (2007), esses profissionais se auto-formam ou recebem um curso de mínima duração de algumas confederações esportivas ou de associações internacionais certificadoras. Ou seja, não se tem uma formação oficial a oferecer para essa especificidade.

    Estas constatações fornecem subsídios teóricos para se refletir acerca da categoria profissional em que se insere o condutor de esporte de aventura. Afinal, o processo instrucional das diferentes modalidades que compõem o esporte de aventura é desenvolvido por este individuo como uma profissão ou uma ocupação? No inicio da década de 90, autores como Flexner citado por Barros (1993) dedicaram-se ao estudo de critérios básicos para se definir e caracterizar uma profissão e que por sua vez possibilita diferenciar profissão de ocupação. Assim, nas palavras do autor, inicialmente é fundamental que as atividades desenvolvidas numa dada profissão sejam de natureza intelectual, embasadas por um conjunto de conhecimento. Em seguida, há que se considerar que toda profissão é prática, ou seja, é prestadora de serviços a sociedade. Uma profissão também deverá ser dinâmica, mantendo-se aberta a novas idéias e conhecimentos. Somado a essas características, uma profissão deverá assentar-se sob uma organização, ou seja, deverá possuir uma instituição que a represente, que discuta a qualidade dos serviços prestados, criando códigos e normas de conduta. Além disso, é preciso comunicabilidade, ou seja, os conhecimentos e habilidades desenvolvidos na profissão precisam ser comunicados e ensinados. E por fim, a característica altruísta, ou seja, existir para prestar sempre o melhor serviço.

    A análise de modalidades de esporte de aventura praticadas no Brasil revela que durante um tempo considerável aspectos ligados ao tipo de formação do condutor esportivo de aventura não constituiu preocupação no contexto da formação profissional em Educação Física, no âmbito acadêmico - cientifico ou ainda por órgãos representativos da referida área do saber.

    Recorre-se à Educação Física pela sua vinculação histórica com o esporte, e o fato, no Brasil, dessa prática física, estar sob a responsabilidade de um profissional da referida área. Notá-se que o processo ensino aprendizagem e as discussões referentes às dimensões que perpassam o esporte mantêm-se por longos tempos atrelados à referida área do conhecimento.

    Os cursos de bacharelado em Educação Física trazem em suas matrizes curriculares uma disciplina voltada para o esporte de aventura no meio natural. Ainda que a carga horária desta disciplina esteja aquém de subsidiar o profissional de informações e competências para a condução das modalidades do esporte de aventura na natureza, se percebe que dentre as áreas que se relacionam com esta especialização esportiva, a formação em Educação Física ainda é aquela que mais se aproxima do ideal de profissional para estes fins.

    Como afirma Costa (2007), ao receber um grupo de pessoas, o condutor esportivo de aventura geralmente o faz desconhecendo uma série de informações essenciais à prática coerente de uma atividade física como: a heterogeneidade entre as pessoas, os níveis de habilidade, de condicionamento físico e de saúde (possibilidades de doenças pregressas) e, finalmente, os tipos de atividades que lhes são permitidas ou proibidas.

    Além das condutas físico-motoras específicas e necessárias às diversas manifestações motrizes, surge a obrigação de adaptação do corpo a diferentes ambientes naturais, a capacidade de manipulação de materiais e equipamentos específicos à modalidade, o transporte de carga extra ao peso corporal (equipamentos obrigatórios, alimentos, líquidos e materiais de primeiros socorros) e a preparação do estado psíquico visando o controle da ansiedade e da capacidade de antecipação de uma ação que se fizer necessária no decorrer da realização de uma modalidade de aventura.

    Desta forma, aqueles interessados em conhecer e experimentar uma modalidade, como tratou Aragão Jr (2007), podem estar colocando a própria integridade física e mental em risco.

    Somado a essas considerações, há que se ressaltar o trabalho de conscientização dos aprendizes no que concerne a preservação dos diferentes meios naturais nos quais ocorrem as modalidades de esporte de aventura e risco calculado. Como nos alerta Marinho e Inácio (2007), nas atividades físicas na natureza, a desorganização na interação homem-meio natural pode levar à destruição dos elementos constituintes da flora e da fauna do entorno, acarretando efeitos ecossistêmicos que em longo prazo comprometerão determinado meio natural. Com tal procedimento, corre-se o risco de a natureza reduzir-se na visão de praticantes e pessoas ligadas ao esporte de aventura a um mero lócus atrativo e destinado a prática desportiva, limitando-se ao atendimento do praticante na busca de aventura, sensação de risco, vertigem, momentos de lazer dentre outros.

    É possível observar no contexto atual, ainda que tímida, uma preocupação sobre a referida situação em matéria publicada em nov. 2005 na revista EF n.18 que veicula informações do órgão oficial do CONFEF. Evidenciou-se o tipo de formação dos condutores das modalidades do esporte de aventura e risco calculado na natureza. A referida matéria levanta algumas implicações da falta de um profissional com formação especializada na área que venha proporcionar aos adeptos desta especialidade esportiva um melhor acompanhamento, segurança e conscientização da necessidade de preservação do meio natural.

    Não há dúvidas que o aprendizado do trabalho docente não passa somente pela formação acadêmico-profissional na qual são fornecidos conhecimentos teóricos e técnicas para o exercício da docência. Tardif e Raymond (2000), explicam que, além dos referidos conhecimentos, as experiências (práticas) diretas com o fazer do próprio trabalho são fundamentais, pois é nesta instância que serão aprendidos e produzidos saberes práticos essenciais ao exercício da prática profissional. Outro aspecto a ser considerado sobre a atuação do condutor de esportes de aventura, que não possui uma formação especializada, é a relação que se estabelece entre conhecimentos acadêmicos [Esses conhecimentos, segundo Tardif (2002), correspondem aos saberes pedagógicos e disciplinares] e as práticas docentes [correspondem às decisões e ações empreendidas pelo professor no âmbito de sua intervenção. A essas práticas incluem-se os saberes experienciais, que são aqueles saberes adquiridos no âmbito da prática da profissão docente e que não provêm das instituições de formação e nem se encontram sistematizados sob a forma de teorias. São saberes práticos (TARDIF, 2002) ] estabelecidas (ou não) por esses indivíduos.

Considerações finais

    A partir do presente estudo é possível afirmar que a prática de esporte de aventura suscita pré-requisitos específicos se comparado com àquelas relacionadas às modalidades de esporte ditas convencionais (como as modalidades de esportes coletivos, natação, tênis dentre outras). Dentre essas especificações encontra-se o fator de risco que requer uma série de procedimentos de seus praticantes como a manutenção de sua integridade física e mental, o condicionamento físico, o desenvolvimento de habilidades necessárias à modalidade de aventura em questão e estratégias que visem ainda à preservação do meio ambiente.

    Estas considerações reforçam a responsabilidade que pesa sobre as ações empreendidas por esses profissionais no decorrer do processo instrucional, na tarefa de proporcionar não somente o domínio da técnica, mas, sobretudo a autonomia do praticante embasada em conhecimentos necessários no momento da prática de uma modalidade de esporte de aventura em questão.

    Geralmente, a condução dessas práticas no que concerne ao processo instrucional das diferentes modalidades que compõem o esporte de aventura ocorre em sua maioria pelo conhecimento resultante da vivência prática dos condutores que, de alguma forma, socializaram seus saberes entre si ou de acordo com a autorização - por meio de cursos de mínima duração - de confederações esportivas ou de associações internacionais certificadoras relativas determinadas modalidades do referido segmento esportivo.

    O entendimento e a consideração por parte do condutor das considerações ressaltadas neste estudo poderão contribuir como elementos para reflexão junto às ações e procedimentos a serem adotados ao longo do processo instrucional das diversas modalidades que se manifesta o esporte de aventura.

    Sendo assim, parece-nos que o desafio a se vencido pelo condutor no decorrer do processo ensino aprendizagem de uma modalidade de esporte de aventura é conscientizar o aprendiz/praticante de que o êxito nas práticas físicas no meio natural através das diferentes modalidades de esporte de aventura precisa ser buscado na mesma proporção de que o são as fortes emoções, a vertigem e o risco. 

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